Coronavírus

A área cirúrgica e a COVID-19

A área cirúrgica e a COVID-19

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A área cirúrgica enfrentou desafios peculiares durante a pandemia da COVID-19. Sendo a natureza intrínseca da área cirúrgica o contato íntimo com o paciente, e não podendo este ser substituído pela telemedicina, várias questões podem ser discutidas então, do ponto de vista das mudanças e desafios enfrentados pela área.

Esse é o tema do nosso post de hoje, que segue a sequência de análises de áreas específicas da medicina, e como estas foram afetadas durante a pandemia. Desta vez, baseamos nossas ponderações no artigo publicado pela cirurgiã e professora de cirurgia da Universidade da Carolina do Norte, EUA, a Dra. Melina R. Kibbe, em artigo publicado na revista JAMA Surgery.

Proteção da equipe de cirurgia

Na área cirúrgica, o trabalho é sempre multiprofissional. Isto significa que realizar um procedimento cirúrgico envolverá, via de regra, uma grande equipe de profissionais. O que nos leva ao primeiro ponto: a necessidade de proteção de toda a equipe.

Se lembrarmos que, no início da pandemia, um dos pontos sofridos se deu na falta de equipamentos de proteção individual (EPI’s), veremos o desafio apresentado para as equipes de cirurgia.

Além daquelas medidas gerais adotadas durante a pandemia, como distanciamento social, uso de máscara, higiene das mãos, limpeza regular de superfícies, no campo das cirurgias há alguns elementos particulares.

Por exemplo: o uso de sistemas de evacuação de fumaça cirúrgica, geradas pela eletrocauterização, foram encorajados como medida protetiva aos profissionais de saúde, devido ao risco de geração de aerossóis a partir da manipulação tecidual do paciente.

Precauções especiais tiveram que serem tomadas quando em cirurgias do trato gastrointestinal ou respiratório. Procedimentos que envolvem geração de pneumoperitônio foram manejadas cuidadosamente, e evitadas quando possível.

O risco cirúrgico de pacientes com COVID-19

Pacientes com COVID-19, que precisaram ser submetidos à cirurgia, estiveram sob um risco maior. E o risco independia da presença, ou não, de sintomas da COVID-19. Um estudo da Itália avaliou o risco de mortalidade em 30 dias nos pacientes que receberam cirurgia e estavam com COVID-19, comparando-os com aqueles sem COVID-19.

O resultado mostrou que pacientes infectados tiveram mortalidade significativamente maior. Não apenas o risco de morrer era maior, como também o de complicações perioperatórias: complicações pulmonares e trombóticas.

Uma das alternativas ao problema acima apresentado foi a estratégia de realizar testagem para SARS-CoV-2 em todos os pacientes cirúrgicos, durante o pré-operatório. Aqueles que testassem positivo e tivessem condições, mesmo que assintomáticos, tinham sua cirurgia adiada, se fosse seguro para sua condição de saúde.

A medida visava proteger tanto a equipe da exposição ao vírus, como o paciente, ao submetê-lo à procedimento cirúrgico com risco maior de mortalidade e complicações.

O desafio de adiar cirurgias eletivas

Tomando como gancho o último parágrafo, outra medida adotada pelos profissionais da cirurgia, que é ao mesmo tempo um desafio, se deu em manejar o adiamento de cirurgias eletivas, aquelas que não possuíam caráter emergencial.

Conforme os suprimentos de EPI’s e a disponibilidade de testes tornaram-se mais acessíveis, as cirurgias eletivas voltaram a acontecer. Obviamente, o adiamento de cirurgias causou acúmulo das mesmas.

Dessa forma, cada instituição precisou adotar medidas para “correr atrás do prejuízo”, mantendo a segurança da equipe, mas, ao mesmo tempo, a agilidade requerida do processo, de acordo com as condições locais.

Desafios para o ensino durante a pandemia da COVID-19

Que os estudantes e residentes enfrentaram desafios para continuar seu aprendizado, não é nenhuma novidade. No entanto, na área da cirurgia, este ponto é ainda mais delicado. Sendo uma área que se desenvolve estritamente no contato com o paciente, o ensino à distância não teve um lugar tão favorável.

No início da pandemia, quando a escassez de EPI’s se fazia presente, estudantes precisaram ser afastados dos rodízios de cirurgia. Com a brusca queda do número de cirurgias eletivas, os residentes perderam no ganho de experiência, tanto na realização das cirurgias, como na prática da clínica cirúrgica.

Programas de residência médica certamente tiveram que passar por mudanças estruturais. Nos EUA, onde é comum o grande afluxo de graduados de outros países para realização de residência médica, muitos enfrentaram desafios para obter o visto e entrar no país, afetando a força de trabalho da área.

O impacto na escolha da área cirúrgica

Há ainda um aspecto não tão óbvio à primeira vista, mas certamente influenciador. A pandemia pode gerar causar o fenômeno de um número menor de estudantes de medicina escolhendo a área cirúrgica como especialização.

Veja, não apenas estes estudantes tiveram exposição limitada à área cirúrgica, como enfrentaram questões de preocupação relativas ao íntimo contato médico-paciente necessário e intrínseco à profissão, o que pode afastá-los da carreira.

Para aqueles que permanecem na decisão de seguir a área cirúrgica, pode ainda haver ansiedade e confusão na escolha da subárea, já que a participação nos diferentes rodízios foi limitada, ou seu planejamento de estágio foi frustrado.

Conclusão

Vimos neste post algumas das inúmeras limitações enfrentadas pela área cirúrgica durante a pandemia da COVID-19. Os efeitos e consequências serão de longo prazo, e não puderam ainda ser mensuradas de forma precisa.

Muitos dos desafios apresentados durarão ainda por longo tempo. Por isso, é salutar para os serviços de cirurgias a adaptação ao novo cenário. A comunidade cirúrgica deve aprender a lidar com os desafios apresentados, pois disto dependerá o futuro da profissão.

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