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Acompanhe o que mudou na discussão sobre a vacinação para covid-19 e fique por dentro do assunto! Acesse agora!
Mesmo após mais de um ano do primeiro caso relatado na China, temos que entender que tudo sobre a COVID-19 continua sendo novo e principalmente urgente. Nesse contexto, também se enquadram as vacinas, sendo sua busca uma esperança para vencermos a pandemia.
Há um grande otimismo em relação às vacinas como forma de controle da pandemia, fato decorrente do sucesso de grandes programas de vacinação para diversas outras doenças, como poliomielite, atualmente presente em apenas 2 países, varíola, erradicada do mundo, e sarampo, que, apesar de surtos recentes, já houve períodos em que encontravam-se zerados os casos no Brasil1. As três doenças citadas são alguns dos motivos para o otimismo presente, todavia o cenário não é tão positivo assim.
Os desafios que encontramos atualmente ultrapassam o limite do coronavírus e estão presentes na “viralização” de conteúdos falsos na internet. A onda das fake news não para de crescer e, de acordo com o projeto CoronaVirusFacts Alliance, entre 24 de janeiro e 1º de setembro de 2020 mais de 8,6 mil postagens com informações falsas sobre a COVID-19 já haviam circulado por todo o mundo. O projeto pode ser acessado pelo link a seguir, sendo uma ótima forma de avaliar a veracidade das notícias (https://www.poynter.org/coronavirusfactsalliance/).
À vista do contexto retratado, é evidente que, com as vacinas, tal cenário não seria diferente, e as fake news já estão presentes, aumentando a desconfiança que já se instalava em torno da vacinação para a COVID-19. Soma-se a esse cenário o fenômeno de hesitação vacinal que vivíamos anteriormente à pandemia.
Diante disso, é fundamental compreendermos a importância da vacinação, os problemas que essas notícias falsas podem gerar e, por fim, o básico das vacinas mais avançadas e promissoras, de modo que informações sem confirmação não nos enganem. Dessa maneira podemos compreender o porquê de tanta discussão em torno da vacinação para a COVID-19.
Importância da vacinação para covid-19
Recentemente foi publicada pela BBC Brasil, a partir de dados obtidos com a Organização Mundial da Saúde (OMS), que a vacinação em massa evita atualmente ao menos 4 mortes por minuto no mundo. Tal estimativa evitaria por ano de 2 a 3 milhões de mortes e ainda poderia salvar mais de 1,5 milhão de vidas se ocorresse uma ampliação da cobertura2.
Esses dados correspondem a doenças como difteria, sarampo, coqueluche, poliomielite, rotavírus, pneumonia, diarreia, rubéola e tétano2. Além da enorme importância em termos de vidas salvas, ainda podemos citar os benefícios econômicos.
Pesquisadores na Johns Hopkins analisaram dados de 94 países de baixa e média renda, e avaliaram 10 infecções evitáveis pela vacinação, sendo elas: Haemophilus influenzae tipo b, hepatite B, papilomavírus humano, encefalite japonesa, sarampo, neisseria meningitis sorogrupo A, rotavírus, rubéola, Streptococcus penumoniae e febre amarela. Por meio dos programas de vacinação, que tiveram um custo total estimado de 34 bilhões, houve uma economia de 586 bilhões em custos com doenças evitáveis por vacinas, tendo assim um retorno de 16 dólares para cada dólar investido3.
Como disse o autor do estudo, Sachiko Ozawa, “nossos achados devem encorajar doadores e governos a continuarem seus investimentos financeiros em programas de imunização. Mas devemos manter em mente que essas são estimativas que assumem que a cobertura da imunização continua a se expandir e melhorar”3.
Qual o impacto das fake news?
O impacto das fake news tem se tornado cada dia maior, sendo assim, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBim) lançou um PDF com diversas informações sobre elas intitulado “As fake news estão nos deixando doentes?”. Apesar do excelente conteúdo disponibilizado gratuitamente, essa discussão ainda é necessária e será apresentada de forma mais detalhada neste texto4.
Dentre as quatro principais razões para a não vacinação, duas encontram-se na categoria de desinformação pela SBim. Além disso, no grupo em que não se vacinaram ou não vacinaram uma criança, 57% citam uma razão considerada incorreta, mostrando, assim, a repercussão das fake news4.
Somado a esses dados, inclui-se o fato de que 72% dos brasileiros que consideram as vacinas parcialmente inseguras viram notícias negativas sobre vacinas nas redes sociais4. Mas essa não é uma tendência apenas brasileira. No Reino Unido, através de uma consulta em setembro de 2020, o instituto Ipsos Mori revelou que 16% dos britânicos não tomariam a vacina se ela estivesse disponível. Já nos Estados Unidos o número é ainda maior, de acordo com o instituto Gallup: uma em cada três pessoas afirmaram a mesma coisa5.
Tais dados mostram uma realidade preocupante, haja vista que a parcela da população que não irá se vacinar por diferentes motivos pode fazer com que a pandemia ainda continue de forma grave e trazendo grandes repercussões mundiais.
O que precisamos saber sobre a vacinação para covid-19?
Anteriormente à atual pandemia, era natural que o desenvolvimento e criação de novas vacinas costumassem demorar em torno de 10 anos, todavia esse prazo foi diminuído para menos de um ano, o que gerou muita discussão e desconfiança em torno da vacinação da COVID-19.
Como foi possível a obtenção de forma rápida e segura?
O principal erro em tal discussão é pensar que o trabalho se iniciou com a pandemia, pois na verdade foi antes. Apesar de o vírus SARS-COV-2 ser, até o início da pandemia, desconhecido, muito se sabia sobre suas outras variantes, incluindo nesse conhecimento teste de possíveis vacinas6. Dessa forma, nota-se que não partimos do zero, muito pelo contrário, havia grande conhecimento produzido.
Tal conhecimento foi vantajoso, principalmente por saber como o vírus se comportava e qual era seu mecanismo de ação, com a “proteína da espícula” sendo o principal fator para entrada do vírus.
Além disso, os SARS-COV-2 causam infecções de curto prazo, demonstrando que o nosso sistema imune é capaz de combater o vírus, sendo necessário para a vacina a exploração desse processo natural, facilidade que não ocorreria se o vírus fosse uma infecção crônica ou de longo prazo que o corpo não combatesse sozinho6.
Além disso, é evidente que houve muito investimento para a criação dessas vacinas, e houve mobilização do mundo inteiro, seja na forma de estudos ou no financiamento dos projetos.
Nesse contexto, não podemos esquecer da agilidade das burocracias, sendo, sim, respeitadas as diversas fases do processo, mas sem tempo de atraso entre uma fase e outra, trazendo maior agilidade ao processo6.
Por fim, uma das maiores dificuldades na criação de novas vacinas, que é o contato dos imunizados com a doença para testar a eficácia, foi algo fácil, já que estamos no meio de uma pandemia e o efeito da vacina é constantemente testado.
Quais as principais vacinas atualmente?
Muitas vacinas estão sendo estudadas e, pelo excesso de informação, muitas vezes há confusão entre elas.
Em destaque, para a compreensão delas, devemos mencionar a divulgação do Plano Nacional de Operacionalização da Vacina Contra a COVID-19 formulado pelo Ministério da Saúde7.
Vacina Pfizer
A vacina conhecida com Pfizer, tem seu desenvolvimento pelas farmacêuticas Pfizer (EUA), BioNTech (Alemanha) e Fosun Pharma (China) e atua utilizando uma parte do código genético do SARS-CoV-2. Essa parte do código, também conhecida como RNA mensageiro, irá levar instruções para a produção de uma proteína encontrada no vírus, despertando, assim, uma reação do sistema imune do indivíduo7.
Tal vacina teve os dados dos estudos de fase II e III divulgados e apontaram uma eficácia de 95%, sendo necessárias 2 doses, com 4 semanas de diferença entre elas. Um de seus problemas é o sistema de armazenamento, pois requer uma boa estrutura, haja vista que deve ocorrer a -70°C7.
A vacina já começou a ser aplicada no Reino Unido, com as autoridades britânicas relatando que mais de 140 mil pessoas já tinham sido vacinadas até o dia 16 de dezembro, com a ocorrência de 2 reações alérgicas8. Todavia o Departamento Científico de Imunização da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) diz que é muito precoce fazer qualquer análise das duas ocorrências de reação alérgica ocorridas no Reino Unido logo após a vacinação contra a COVID-199. De modo preventivo, o órgão regulador de medicamentos no país emitiu um alerta que orienta as pessoas com histórico “significativo” de alergias a não tomarem a vacina8.
Além do Reino Unido, os EUA, Canadá, Arábia Saudita e Israel também iniciaram a vacinação e até agora mais 6 casos de alergia grave foram relatados nos EUA. Vale ressaltar que mais de 100 mil pessoas já foram vacinadas. Sendo assim, ainda devem ocorrer mais estudos para compreender esses relatos de modo mais preciso10.
Vacina Moderna
A vacina conhecida como Moderna tem seu desenvolvimento pelo National Institutes of Allergy and Infectious Diseases (EUA) e atua seguindo o mesmo perfil da Pfizer7.
Sua eficácia, segundo a empresa, é de 94,1% e também são necessárias 2 doses com o intervalo de 4 semanas entre elas. Diferentemente da Pfizer, seu armazenamento é mais acessível sendo a -20°C7.
Até o momento, ela foi aprovada para o uso apenas nos EUA, e ainda não temos dados após o início do seu uso10.
Vacina de Oxford
A vacina conhecida como Oxford foi desenvolvida pela University of Oxford (Reino Unido) e AstraZeneca (Suécia)e tem seu mecanismo utilizando-se de um vírus geneticamente modificado para expressar proteínas características do SARS-COV-2, induzindo a resposta imune do organismo7.
Sua eficácia média nos estudos foi de 70%, tendo variações que precisam ser melhor estudadas, pois algumas pessoas receberam 2 doses completas e outras receberam a 1ª dose fracionada e a 2ª completa. O tempo necessário entre as 2 doses também foi de 4 semanas. Seu armazenamento ocorre entre 2°C e 8°C7.
Até o momento, não foi autorizada para uso em nenhum país.
Vacina Sputnik V
A vacina apelidada como Sputnik V tem seu desenvolvimento pelo Gamaleya Research Institute (Rússia) e segue o mesmo princípio da Vacina de Oxford7.
Segundo o governo russo, possui 95% de eficácia e são necessárias 2 doses, com intervalo de 3 semanas entre elas. Pode ser armazenada e transportada em pó em temperaturas de 2oC a 8oC7.
Apesar de seu uso na Rússia ter começado, não há informações disponíveis sobre seus resultados a curto prazo.
Vacina CoronaVac
A vacina conhecida popularmente como CoronaVac tem seu desenvolvimento pela Sinovac Life Science (China)e opera com o SARS-COV-2 inativado pela ação de produtos químicos ou calor7.
A eficácia, segundo estudos de fase II, foi de 97% e são necessárias 2 doses com um intervalo de 2 semanas entre elas. Seu armazenamento também ocorre entre 2°C e 8°C7.
A China já vacinou mais de 1 milhão de pessoas com doses de emergência desta e da vacina criada pela Sinopharm e, até o dia 19 de dezembro, disseram que “nenhuma reação adversa séria” foi detectada10.
Conclusão sobre vacinação para covid-19
Em síntese, temos acompanhado como a liberdade individual não é absoluta quando contraposta às necessidades essenciais das coletividades11 e devemos lembrar que a vacinação é essencial para o coletivo.
Percebemos, assim, a importância e o potencial benéfico das vacinas, porém não podemos deixar com que a desinformação e a infodemia prejudiquem planos nacionais e mundiais como a vacinação contra a COVID-19.
À guisa de Harrison, E.A and Wu, J.W, “o clamor pela vacina contra o SARS-CoV-2 vem contextualizado pelo imediatismo de sentimentos de medos e incertezas, mas provavelmente não cessará o fenômeno da hesitação vacinal de forma mais ampla”12.
O presente texto foi escrito ainda em 2020, dia 24 de dezembro, e várias modificações até a data da publicação podem ocorrer devido ao dinamismo que estávamos vivenciando em relação aos avanços durante a pandemia.
O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.
Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.
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Referências
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OZAWA, S. et al. Methodologies to estimate the health and economic impact of vaccination against 10 vaccine-preventable diseases. Baltimore: Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health, 2016.
AVAAZ; IMUNIZAÇÕES, Sociedade Brasileira de. As Fake News estão nos deixando doentes? Como a desinformação antivacinas pode estar reduzindo as taxas de cobertura vacinal no brasil. Como a desinformação antivacinas pode estar reduzindo as taxas de cobertura vacinal no Brasil. 2020. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/po-avaaz-relatorio-antivacina.pdf. Acesso em: 24 dez. 2020.
SANAR MEDICINA. Fake news sobre as vacinas para Covid-19 podem atrapalhar imunização. Acesso em: 22 dez. 2020.
GALLAGHER, James. 10 anos em 10 meses: como cientistas de Oxford criaram em tempo recorde um novo modelo de vacina contra o Coronavírus. BBC News. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-55049893. Acesso em: 22 dez. 2020.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações. Plano Nacional de Operacionalização da Vacina Contra a COVID-19. Brasil, 2020 – Informe Técnico Operacional. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/media/pdf/2020/dezembro/16/plano_vacinacao_versao_eletronica.pdf. Acesso em 24 dez. 2020.
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GOSTIN, L. O.; WILEY, L. F. Governmental Public Health Powers During the COVID-19 Pandemic: Stay-at-home Orders, Business Closures, and Travel Restrictions. JAMA, doi:10.1001/jama/2020.5460, 2020.
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