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A maconha, seu uso terapêutico e o preconceito | Colunistas

A maconha, seu uso terapêutico e o preconceito | Colunistas

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O canabidiol e o tetra-hidrocanabidiol (THC)

O canabidiol (CBD) e o tetra-hidrocanabidiol (THC) são dois princípios ativos da planta Cannabis sativa, a qual é uma das subespécies mais conhecidas da Cannabis, popularmente conhecida como maconha.

Na década de 1960, o CBD e o THC foram identificados na planta em questão pelo grupo do professor israelense Raphael Mechoulam, o que estimulou diversos pesquisadores do mundo todo a desenvolverem estudos científicos sobre a Cannabis sativa, assim evidenciando que o canabidiol e o tetra-hidrocanabidiol, possuem ações terapêuticas.

Uso terapêutico

Atualmente, com base nos estudos já realizados, foram estabelecidos os usos com alguma eficácia dos derivados da Cannabis e também seu uso in natura em determinadas situações. Já foram identificados vários efeitos benéficos do CBD, como o anticarcinogênico, anticonvulsivante, antioxidante, ansiolítico, neuroprotetor, sedativo, antidepressivo e estabilizador de humor. Tais efeitos indicam que a substância pode ser usada para o tratamento de doenças como Alzheimer, artrite, epilepsia, síndromes ansiolíticas, Parkinson, esquizofrenia, dor neuropática, lesão renal, patologias neurodegenerativas e neoplasias.

O uso dos agentes canabinoides como analgésicos para a dor crônica também é amplamente defendido, o que se justifica principalmente por ser uma opção para o tratamento da dor neuropática, a qual é extremamente complicada de ser manejada em seu tratamento clínico.

Ademais, um outro uso terapêutico especifico seria para o tratamento da esclerose múltipla (EM); evidentemente os sintomas de cada paciente em questão devem ser avaliados antes da indicação desta substância. Um preparado comercial usado amplamente em outros países para tratar em específico a EM é o naxibimol, o qual contém THC e CDB, e que atualmente necessita de autorização judicial para ser importado e usado no Brasil.

ONU reconhece oficialmente as propriedades medicinais da Cannabis

                A Organização Mundial da Saúde (ONU) reconheceu no dia 02 de dezembro de 2020 que a planta possui propriedades medicinais e tal fato histórico ocorreu durante uma votação da Comissão de Entorpecentes, órgão executivo das Nações Unidas para as políticas de drogas. Foi decidido que a Cannabis deveria ser retirada da lista de drogas, e a resina da Cannabis também saiu da lista IV da Convenção sobre Drogas de 1961, fazendo com que o uso medicinal desta planta seja oficialmente reconhecido como eficaz. Além disso, é importante ressaltar que o uso sem fins médicos da planta ou qualquer substância derivada da mesma continua a ser proibido em regulamentos internacionais.

Venda de produtos à base da Cannabis em farmácias brasileiras

Desde dezembro de 2014, o Conselho Federal de Medicina (CFM) autoriza o uso do CBD no tratamento de epilepsias refratárias em crianças e adolescentes, o que foi determinado pela publicação da Resolução nº 2.113. No entanto, tal resolução não supria as necessidades médicas da população brasileira quanto ao uso terapêutico da maconha, uma vez que os medicamentos à base dessa planta precisavam ser exclusivamente importados para cada paciente, o que demandava uma logística muito complexa e demorada, sendo assim, a liberação de produtos à base da Cannabis foi colocada em pauta nas discussões políticas do Brasil.

Depois de diversos anos em discussão, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou apenas a comercialização de um fármaco à base de Cannabis no país, que é um fitofármaco, com concentração de THC de até 0,2%. A resolução foi publicada no Diário Oficial em abril desse ano.

Os demais medicamentos derivados da planta, inclusive o uso medicinal da planta in natura, devem ser obtidos através de autorização da justiça brasileira, o que pode demorar um longo período de tempo; por esse fato, as empresas farmacêuticas ainda “lutam” pelo direito da venda no Brasil dos demais medicamentos, assim como outros interessados reivindicam a liberação do uso in natura.

Universidades brasileiras e os estudos sobre a terapêutica com a Cannabis

A indústria farmacêutica, em conjunto com cientistas da FMRP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP (Universidade de São Paulo), universidades que pesquisam há décadas sobre o uso terapêutico de derivados da Cannabis sativa, desenvolveu um canabidiol fabricado pelo laboratório Prati-Donaduzzi, no Paraná, e o produto já está liberado para comercialização pela Anvisa. No entanto não é qualquer pessoa que pode adquirir esse medicamento, a venda só pode ocorrer mediante apresentação de receita tipo B (azul), a qual é de numeração controlada.

O medicamento já era comercializado no Brasil como Mevatyl (ou Sativex), produzido pela britânica GW Pharma, porém essa versão do fármaco só possui indicação para o tratamento da esclerose múltipla, já a medicação brasileira desenvolvida foi registrada sem indicação clínica pré-definida, ou seja, ela pode ser utilizada no tratamento de outras patologias.

Conclusão

Os canabinoides estão se tornando uma importante opção terapêutica no tratamento de diversas patologias, uma vez que possuem diversos efeitos farmacológicos, porém ainda há a necessidade de estudos de longo prazo com um maior número de pacientes, o que é facilitado com a retirada da Cannabis da lista de drogas. Com isso, atente-se às informações acima e procure olhar o uso dos canabidioides e até mesmo da maconha, ou seja, a planta in natura, como algo palpável e que realmente tem efeitos benéficos no tratamento de doenças. Assim, seja apoiador do incentivo à pesquisa de novos tratamentos, afinal, ao longo das décadas, substâncias inimagináveis foram descobertas como terapêuticas e passaram a salvar milhões de vidas.


O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.


Referências