Anatomia de órgãos e sistemas

Apache II e Ranson: Pancreatite Aguda | Colunistas

Apache II e Ranson: Pancreatite Aguda | Colunistas

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Imagem de perfil de Talita Bigoli

A pancreatite aguda é uma inflamação do pâncreas, onde ocorre ativação das enzimas pancreáticas e mediadores inflamatórios, em geral devido ao excesso de álcool ou litíase biliar. Devemos ter atenção, pois, na maioria das vezes, o paciente tem um quadro de dor abdominal intensa, difusa em região epigástrica. Em até 20% dos casos, o quadro pode ser mais intenso com repercussão sistêmica e índice de mortalidade de até 40%. O paciente pode apresentar classicamente dor abdominal em faixa que pode irradiar para dorso, tórax ou flancos, associado a náuseas e vômitos com piora após alimentação. No exame físico, abdome doloroso, porém sem relação com a gravidade da doença.

Já nos achados laboratoriais podemos encontrar amilase e/ou lipase bem acima do limite normal. Vale ressaltar que essas enzimas isoladas não fecham o diagnóstico de pancreatite, a lipase é um pouco mais específica em relação à amilase e também mantém uma elevação mais prolongada. Os exames de imagens que podem ajudar sao: RX de abdome – pode ter achados como sinal de “cut-off”, alça sentinela. Na ultrassonografia de abdome, podemos ver litíase biliar, coleções pancreáticas e a tomografia com contraste tem 90% de especificidade, porém não é um exame necessário a todos os pacientes.

As classificações de APACHE e Ranson são comumente utilizadas no dia a dia da prática medica. Já sabemos que a pancreatite aguda é um processo inflamatório agudo do pâncreas desencadeado pela ativação anômala das enzimas pancreáticas e consequentemente uma liberação de vários mediadores inflamatórios, em geral, autolimitada, mas podendo levar tanto a complicações locais, como necrose e infecção, quanto a complicações sistêmicas, sendo que, nestes casos, o índice de mortalidade pode chegar a até 40%.

Nos EUA a pancreatite é a quinta causa de morte intra-hospitalar. Dentre as etiologias prováveis, destaca-se a litíase biliar, etilismo, medicamentos e hipertrigliceridemia, sendo a litíase biliar a causa mais comum, chegando a ser responsável por 80% dos casos. O seu diagnóstico deve ser estabelecido de forma precoce e se dá por parâmetros clínicos, laboratoriais ou de imagem.

Mas aqui vamos enfatizar as classificações da pancreatite, o que inclusive pode ser feito de varias maneiras:

  • Edematosa x necro-hemorrágica – se avaliarmos o âmbito das complicações;
  • Classificação de Atlanta – se avaliarmos a gravidade (leve ou edematosa x grave);
  • Ranson– se avaliarmos o índice de mortalidade desde o momento da admissão até a evolução em 48h;
  • Critérios de Balthazar – se avaliarmos os achados radiológicos.

No entanto, vale destacar os critérios de Ranson e APACHE II.

Os critérios de Ranson foram descritos pelo médico cirurgião inglês John Ranson (1938-1995), em 1974, incialmente englobando 43 parâmetros clínicos e laboratoriais, porém apenas 11 destes mostraram critérios modificadores de mortalidade, portanto, em 1982, os critérios de Ranson foram modificados, sendo cinco avaliados na admissão e os restantes durante as primeiras 48h. A presença de três ou mais critérios nas primeiras 48h da admissão classifica a pancreatite como grave, apresentando uma sensibilidade de 75 a 87%.

A pontuação entre 0 e 2 representa uma mortalidade de 2%; já se a pontuação estiver entre 3 e 4, aumenta a chance de óbito para 15%; e, se a pontuação cursar entre 5 e 6, o risco de mortalidade alcança os 40%, chegando até a 100% se a pontuação atingir 7 ou 8.

Alguns estudos sugerem a associação de um score multifatorial, aumentando, assim, a acurácia da predição prognóstica, no entanto as preferências do profissional, o serviço e as ferramentas disponíveis são fatores que determinam a escolha do score mais adequado.

O tratamento da pancreatite é de certa maneira bastante simples. Na pancreatite aguda leve, envolve hospitalização, em geral de curto período, hidratação, analgésicos e jejum com o intuito de descansar o pâncreas. Já na pancreatite moderadamente grave, a internação tende a ser mais prolongada, e os pacientes também recebem hidratação e analgesia; se o jejum precisar ser muito prolongado, usa-se uma sonda nasoenteral para alimentação, e, se houver sinais de infecção, administra-se antibiótico. E finalmente, no caso de pancreatite aguda grave, os pacientes costumam ser internados em unidade de terapia intensiva, onde haverá monitorização dos sinais vitais, o débito urinário, controle periódico do hematócrito, glicemia, eletrólitos e leucócitos e os níveis de uréia no sangue, podendo ser necessário o uso de sonda nasogástrica para retirar conteúdo liquido e ar do estômago, além de suporte ventilatório se necessário. Vale ressaltar que os cuidados médicos serão realizados em âmbito hospitalar mesmo se tratando de uma pancreatite leve, portanto os critérios e classificações têm a função de orientar o tratamento, local de internação (se enfermaria ou UTI) e até mesmo o prognóstico.

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.

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Referências:

FERREIRA Alexandre de Figueiredo, BARTELEGA Janaina Alves, URBANO Hugo Corrêa de Andrade, SOUZA Iure Kalinine Ferraz de. FATORES PREDITIVOS DE GRAVIDADE DA PANCREATITE AGUDA: QUAIS E QUANDO UTILIZAR?. ABCD, arq. bras. cir. dig. [Internet]. 2015. Sep [citado 2020 Dic 07]; 28( 3 ): 207-211. Disponible en: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-67202015000300207&lng=es. https://doi.org/10.1590/S0102-67202015000300016.

Kumar V, Abbas A, Aster J. Robbins. Bases patológicas das doenças. 9th ed. Elsevier, 2016.