versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.107 no.3 supl.3 São Paulo set. 2016
https://doi.org/10.5935/abc.20160153
Os principais objetivos da avaliação clínica e laboratorial são apresentados no Quadro 1. Atingir essas metas permite o diagnóstico correto da HA e seu prognóstico, possibilitando a escolha da melhor terapêutica para o paciente.
Quadro 1 Objetivos da avaliação clínica e laboratorial
Confirmação do diagnóstico de HA por medição da PA |
Identificação dos FRCV |
Pesquisa de LOAs, sejam elas subclínicas ou clinicamente manifestas |
Pesquisa da presença de outras doenças associadas |
Estratificação do risco CV global |
Avaliação de indícios para a suspeita de HA secundária |
Deve-se obter história clínica completa com perguntas sobre o tempo de diagnóstico, evolução e tratamento prévio. As informações sobre a história familiar são fundamentais para aumentar a certeza do diagnóstico de HA primária.1 (GR: I; NE: B). O paciente deve ser interrogado sobre FR específicos para DCV, comorbidades, aspectos socioeconômicos e estilo de vida,2 além do uso prévio e atual de medicamentos ou outras substâncias que possam interferir na medição da PA e/ou no tratamento da HA. Da mesma forma, devem ser pesquisados indícios que sugiram uma causa secundária para a HA.
A PA deve ser medida com técnica adequada (ver Capítulo 2). Dados antropométricos, como peso, altura (para cálculo do índice de massa corporal [IMC]), circunferência abdominal (CA) e frequência cardíaca (FC), devem ser registrados. Os valores de normalidade da CA e do IMC são aqueles recomendados pela IDF de 2006, podendo variar de acordo com a origem étnica.3,4 (GR: IIa; NE: C).
A avaliação (Quadro 2) deve englobar palpação e ausculta do coração, carótidas e pulsos, medida do índice tornozelo-braquial (ITB) e realização da fundoscopia.
Quadro 2 Avaliação clínica
Exame Físico |
---|
Medição da PA nos dois braços |
Peso, altura, IMC e FC |
CA |
Sinais de LOA |
Cérebro: déficits motores ou sensoriais |
Retina: lesões à fundoscopia |
Artérias: ausência de pulsos, assimetrias ou reduções, lesões cutâneas, sopros |
Coração: desvio do ictus, presença de B3 ou B4, sopros, arritmias, edema periférico, crepitações pulmonares |
Sinais que sugerem causas secundárias* |
Características cushingóides |
Palpação abdominal: rins aumentados (rim policístico) |
Sopros abdominais ou torácicos (renovascular, coartação de aorta, doença da aorta ou ramos) |
Pulsos femorais diminuídos (coartação de aorta, doença da aorta ou ramos) |
Diferença da PA nos braços (coartação de aorta e estenose de subclávia) |
*Para maior detalhamento, consulte Capítulo 12.
Para o cálculo do ITB, utiliza-se a medição da PAS no braço e no tornozelo, em ambos os lados. Define-se como normal uma relação PAS braço/PAS tornozelo acima de 0,90, definindo-se a presença de DAP como: leve, se a relação é 0,71-0,90; moderada, 0,41-0,70; e grave, 0,00-0,40.
A avaliação complementar tem como objetivo detectar lesões subclínicas ou clínicas em órgãos-alvo, no sentido de melhorar a estratificação de risco CV. Para a estratificação do risco CV global, deverão ser levados em conta os FR clássicos (Quadro 3), assim como novos FR que foram identificados, apesar de ainda não incorporados nos escores clínicos de estratificação de risco.4,5
Quadro 3 Fatores de risco cardiovascular adicionais
Idade (homem > 55 e mulheres > 65 anos) |
Tabagismo |
Dislipidemias: triglicérides > 150 mg/dl; LDL-C > 100 mg/dl; HDL-C < 40 mg/dl |
DM |
História familiar prematura de DCV: |
homens < 55 anos e mulheres < 65 anos |
Entre os novos FR destacam-se glicemia de jejum entre 100 mg/dL e 125 mg/dL, hemoglobina glicada (HbA1c) anormal, obesidade abdominal (síndrome metabólica), PP (PAS-PAD) > 65 mmHg em idosos,5 história de pré-eclâmpsia e história familiar de HA (em hipertensos limítrofes).
A avaliação laboratorial em seguida (Quadro 4) deve fazer parte da rotina inicial de todo paciente hipertenso.4
Quadro 4 Exames de rotina para o paciente hipertenso
Análise de urina (GR: I; NE: C) |
Potássio plasmático (GR: I; NE: C) |
Glicemia de jejum (GR: I; NE: C) e HbA1c (GR: I; NE: C) |
Ritmo de filtração glomerular estimado (RFG-e) (GR: I; NE: B) |
Creatinina plasmática (GR: I; NE: B) |
Colesterol total, HDL-C e triglicérides plasmáticos (GR: I; NE: C)* |
Ácido úrico plasmático (GR: I; NE: C) |
Eletrocardiograma convencional (GR: I; NE: B) |
*O LDL-C é calculado pela fórmula: LDL-C = colesterol total - (HDL-C + triglicérides/5) (quando a dosagem de triglicérides for menor que 400 mg/dL).
Para o cálculo da depuração de creatinina, utiliza-se a fórmula de Cockroft-Gault:6 RFG-e (ml/min) = [140 - idade] x peso (kg) /creatinina plasmática (mg/ dL) x 72 para homens; para mulheres, multiplicar o resultado por 0,85.
Para o cálculo do ritmo de filtração glomerular estimado (RFG-e) preconiza-se a utilização da fórmula CKD-EPI.7 A interpretação dos valores (estágios) para classificação de DRC é feita de acordo com a National Kidney Foundation (NKF).7
RFG-e calculado pela fórmula do CKD-EPI,8 que pode ser acessada em: www.nefrocalc.net
RFG-e (ml/min/1,73m2)
Estágio 1: ≥ 90 = normal ou alto;
Estágio 2: 60-89 = levemente diminuído;
Estágio 3a: 45-59 = leve a moderadamente diminuído;
Estágio 3b: 30-44 = moderada a extremamente diminuído;
Estágio 4: 15-29 = extremamente diminuído;
Estágio 5: < 15= doença renal terminal (KDIGO).
Figura 1 Prognóstico de DRC de acordo com a categoria do RFG e a albuminúria. Verde: baixo risco; Amarelo: risco moderadamente aumentado; Laranja: risco alto; Vermelho: risco muito alto.
Em algumas situações clínicas, há indicação de exames complementares mais detalhados, discutidos no Quadro 5.
Quadro 5 Exames recomendados em populações indicadas
Exame/ avaliação | População recomendada e indicação |
---|---|
Radiografia de tórax | Acompanhamento de pacientes com suspeita clínica de comprometimento cardíaco (GR: IIa; NE: C) e/ou pulmonar. Avaliação de hipertensos com comprometimento da aorta quando o ecocardiograma não está disponível.9 |
Ecocardiograma Mais sensível do que o ECG no diagnóstico de HVE. Agrega valor na avaliação das formas geométricas de hipertrofia e tamanho do átrio esquerdo, análise da função sistólica e diastólica. Considera-se HVE quando a massa ventricular esquerda indexada para a superfície corpórea é igual ou superior a 116 g/m2 em homens e 96 g/m2 em mulheres.10 |
Presença de indícios de HVE ao ECG ou pacientes com suspeita clínica de IC (GR: I; NE: C). |
Albuminúria Mostrou prever eventos CV fatais e não fatais. Valores normais < 30 mg/24h (GR: I; NE: C).7,11 * | Pacientes hipertensos diabéticos, com síndrome metabólica ou com dois ou mais FR. |
US das carótidas A medida da EMI das carótidas e/ou a identificação de placas predizem a ocorrência de AVE e IM independente de outros FRCV. Valores da EMI > 0,9 mm têm sido considerados como anormais, assim como o encontro de placas ateroscleróticas (GR: IIa; NE: B).12 |
Presença de sopro carotídeo, sinais de DCbV ou presença de doença aterosclerótica em outros territórios. |
US renal ou com Doppler | Pacientes com massas abdominais ou sopro abdominal (GR: IIa; NE: B).13 |
HbA1c | - Quando glicemia de jejum > 99 mg/dl - História familiar de DM tipo 2 ou diagnóstico prévio de DM tipo 2 e obesidade (GR: IIa; NE: B).14 |
Teste ergométrico | - Suspeita de DAC estável, DM ou antecedente familiar para DAC em pacientes com PA controlada (GR: IIa; NE: C).15 |
MAPA/medidas residenciais de pressão arterial. | - Segue a indicação convencional dos métodos (GR: IIa; NE: B). |
VOP Considerado “padrão” para avaliação da rigidez arterial. Valores acima de 12m/s são considerados anormais (GR: IIa; NE: B).16 |
- Hipertensos de médio e alto risco. |
RNM do cérebro: para detecção de infartos silenciosos e micro hemorragias (GR: IIa; NE: C).17 | - Pacientes com distúrbios cognitivos e demência |
HVE: hipertrofia ventricular esquerda; CV: cardiovascular; FR: fator de risco; US: ultrassonografia; EMI: espessura mediointimal; AVE: acidente vascular encefálico; IM: infarto do miocárdio; FRCV: fator de risco cardiovascular; DCbV: doença cerebrovascular; HbA1c: hemoglobina glicada; DM: diabetes figmelito; DAC: doença arterial coronariana; MAPA: monitorização ambulatorial da pressão arterial; VOP: velocidade da onda de pulso; RNM: ressonância nuclear magnética.
*A figura a seguir apresenta a classificação e a nomenclatura atual para albuminúria e RFG de acordo com KDIGO, 2012.7