versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.20 no.10 Rio de Janeiro out. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015204.16302015
Prezados editores,
Recente publicação neste periódico1, abordando a sobrevida de mulheres portadoras de câncer de mama, observou sobrevida em dez anos de 83,1%, sendo a razão de risco de morte 17,1 vezes maior entre as diagnosticadas em estádios avançados. Com base nessas informações, os autores destacam a importância do diagnóstico precoce para a redução da mortalidade e para o aumento das taxas de sobrevida.
A carta enviada por Migowski2 acrescentou informações interessantes no contexto do rastreamento mamográfico do câncer de mama. Entre as suas citações, o ensaio canadense3 foi utilizado para exemplificar alguns efeitos desfavoráveis do rastreamento. No entanto, esse estudo3 deve ser analisado com cautela em decorrência das suas limitações metodológicas e das diferenças socioeconômicas entre a população brasileira e a canadense. Ainda, a dificuldade de acesso aos serviços de saúde no Brasil representa um fator limitante para a aplicação dos resultados canadenses no cenário nacional.
Recentemente, estudo realizado pelo Grupo Brasileiro de Pesquisa em Câncer de Mama (GBCAM) observou que a sobrevida global foi influenciada pelo tipo de seguro de saúde, com redução significativa da sobrevida entre as pacientes do sistema público em relação às usuárias do sistema privado4. Na avaliação por subgrupo, deve-se destacar que não houve diferença significativa entre as pacientes com estadiamento clínico 0-II; porém aquelas com estágio III-IV, do sistema público, apresentaram sobrevida global significativamente inferior na comparação com o subgrupo do sistema privado4. Utilizando casuística nacional, esses dados confirmam a importância do estadiamento clínico para o diagnóstico do câncer de mama, cuja detecção precoce pode minimizar as diferenças na sobrevida observadas entre o sistema público e o privado de assistência.
Em relação ao sobrediagnóstico, Migowski2utilizou dados canadenses3 para destacar o aumento artificial da sobrevida, sem diferenças significativas na mortalidade por câncer de mama. No entanto, dados recentes do estudo pancanadense5 observaram redução de 40% na taxa de mortalidade entre as mulheres submetidas ao rastreamento, em comparação ao grupo controle. No Brasil, observa-se distribuição heterogênea dos mamógrafos e desigualdade no desempenho dos centros de diagnóstico no que se refere à classificação dos laudos dos exames de mamografia6. Esses fatores podem reduzir os benefícios do rastreamento populacional e devem ser monitorados para garantir o adequado controle de qualidade.
Por fim, diante da consolidação das terapias sistêmicas, é provável que o aumento da sobrevida tenha associação com os avanços no tratamento do câncer de mama. No entanto, estudos utilizando registros de câncer de base hospitalar, onde se considera o mesmo protocolo de tratamento para todos os casos de câncer de mama, também observaram associação entre a sobrevida e o estádio da doença ao diagnóstico7. Portanto, os avanços no tratamento do câncer de mama não reduzem o impacto do rastreamento e do diagnóstico precoce na evolução favorável das curvas de sobrevida observadas nos estudos nacionais1,7.
A presente carta acrescenta informações relevantes acerca da detecção precoce do câncer de mama e do impacto do rastreamento mamográfico nas taxas de sobrevida, valorizando o estudo de Hoffeman et al.1 e as considerações de Arn Migowski2.