versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.112 no.4 São Paulo abr. 2019 Epub 15-Abr-2019
https://doi.org/10.5935/abc.20190052
A cardiologia intervencionista representa uma área de atuação em constante evolução, avançando a passos largos na abordagem terapêutica das doenças cardiovasculares congênitas ou adquiridas. Atua-se hoje com eficácia e segurança atestadas na correção das cardiopatias congênitas septais e de shunt,1 das doenças valvares, notadamente no tratamento percutâneo da estenose aórtica em pacientes de risco cirúrgico elevado ou intermediário,2,3 adentrando recentemente no aparato mitral e tricuspídeo.4,5
A intervenção coronária percutânea assumiu protagonismo em lesões de tronco de coronária esquerda e coronariopatia multiarterial, na ausência de complexidade anatômica elevada,6 ultrapassando agora com resultados consistentes a fronteria das oclusões crônicas.7
Os desafios técnicos conferem àqueles envolvidos na rotina de um laboratório de intervenção maiores riscos à saúde de natureza ocupacional, sobretudo aos cardiologistas intervencionistas. Além de patologias ortopédicas ou músculo-esqueléticas, relacionadas ao uso do avental plumbífero, evidências atuais sugerem que a exposição radiológica prolongada acarretaria um risco 4,5 vezes maior de câncer e 9 vezes maior de catarata entre estes profissionais.8 Além disso, doses baixas crônicas de radiação ionizante poderiam promover alterações na biologia celular endotelial, culminando com dano vascular, aterosclerose subclínica e consequentemente maior prevalência de doença cardiovascular.9
Na presente edição dos Aquivos Brasileiros de Cardiologia, Barbosa AHP et al.10 ilustram, de forma pioneira, os efeitos nocivos da exposição radiológica em uma amostra voluntária de cardiologistas intervencionistas, com representatividade nacional. No grupo exposto, a prevalência de catarata subcapsular posterior, variante mais frequentemente encontrada nesse cenário, foi de 13%, comparada a 2% no grupo controle (p = 0,0081), em consonância com os achados da literatura internacional. De forma alarmante, os autores reportam uma frequência aquém da desejada e recomendada de utilização de blindagens de posicionamento ajustáveis, como anteparo suspenso e faixas plumbíferas posicionadas na lateral da mesa de exames, assim como de óculos de proteção. A adoção dessas medidas preventivas, comprovadamente, reduz a exposição radiológica aos operadores.11
Os riscos inerentes à exposição crônica à radiação ionizante certamente configuram tópico de extrema relevância, a ser considerado nas normativas de qualidade profissional que norteiam a especialidade, bem como nas relações empregatícias. Individualmente, quantos profissionais abdicariam da escolha por essa área de atuação em virtude dessa constatação? Como inferência a esse questionamento, observamos uma recente mudança de paradigma em relação ao acesso vascular na realização de procedimentos coronários invasivos, com a adoção preferencial da técnica radial em detrimento à femoral, em prol dos pacientes, pela redução de complicações relacionadas ao sítio de punção arterial, da taxa de sangramento grave e da morbimortalidade, a despeito de uma maior e comprovada exposição radiológica ao operador.12
Com a palavra os cardiologistas intervencionistas.