versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756
J. bras. pneumol. vol.41 no.6 São Paulo nov./dez. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562015000600001
A DPOC envolve a destruição de septos alveolares nos pulmões, associada a uma dilatação parcialmente irreversível de pequenas vias aéreas.1 O primeiro processo leva a perda de superfície para trocas gasosas (componente restritivo), enquanto o segundo acarreta prejuízos a um adequado ciclo ventilatório (componente obstrutivo). Revela-se uma entidade de extrema relevância em saúde pública, devido a sua elevada prevalência, e estando associada à ocorrência de câncer de pulmão e à diminuição de expectativa e de qualidade de vida.2
O diagnóstico da DPOC baseia-se na combinação de achados clínicos e alterações nos testes de função pulmonar, sobretudo a espirometria. A obtenção de um índice de Tiffeneau (relação VEF1/CVF) inferior a 70% do previsto após prova broncodilatadora é considerada como critério diagnóstico da doença.1-4 Além disso, a classificação da Global Initiative for Chronic Obstructive Pulmonary Disease agrupa pacientes em classes de gravidade, no intuito de sistematizar as abordagens terapêuticas.3 Entretanto, a relação entre o VEF1 e a sintomatologia demonstra ser limitada,4 havendo dissociação entre a classe Global Initiative for Chronic Obstructive Pulmonary Disease e a gravidade dos sintomas em diversos pacientes.4,5
Atualmente, a tentativa de dividir os pacientes com DPOC em vários grupos tem sido muito explorada na literatura. O termo fenótipo na DPOC é definido como "uma combinação única de atributos ou de doença que descreve as diferenças entre os indivíduos com DPOC e como eles se relacionam com os resultados clínicos significativos". Entre todos os fenótipos descritos, três são os que estão associados com o prognóstico e, especialmente, com uma diferente resposta a terapias correntemente disponíveis. Os fenótipos são os seguintes: exacerbador, sobreposição DPOC-asma; e sobreposição enfisema-hiperinsuflação. A expectativa é a de que, ao identificarem-se as peculiaridades dos diferentes fenótipos da DPOC, isso nos permitirá implantar um tratamento mais personalizado, de forma que as características dos doentes e a gravidade da doença possam ser a chave para a escolha da melhor opção de tratamento.5
Neste contexto, para a caracterização do enfisema, a imagem é essencial. Na opinião de vários autores, a quantificação de enfisema pela radiologia convencional é falha.3-7 Por isso, a TC tomou tamanha importância na avaliação imagética do enfisema pulmonar. Vários estudos têm sido dedicados à detecção, à correlação com a anatomia patológica e à quantificação de enfisema por TC.8 Uma das maiores vantagens da TC é a possibilidade de classificação anatomopatológica do enfisema pulmonar. A classificação anatomopatológica atual do enfisema foi proposta por Reid,8 fundamentada na sua distribuição em relação ao ácino, e dividida em quatro grandes grupos: centroacinar; parasseptal ou periacinar; panacinar; e irregular. Entretanto, a distribuição destes achados no parênquima pulmonar e sua relação com o diagnóstico, a gravidade, o tratamento e o prognóstico do DPOC ainda não é bem entendida.5-7
A quantificação do enfisema por um escore visual geralmente utiliza escalas que vão de 1 a 4 ou de 1 a 5, graduando a doença conforme a proporção do acometimento (0%, 25%, 50%, 75% ou 100% dos pulmões). A correlação dessa técnica com a anatomia patológica apresenta uma correlação de r = 0,91 in vitro (com espécimes pulmonares de cadáveres). Deve-se considerar, contudo, que existem limitações naturais quando se utiliza uma análise subjetiva para a quantificação de enfisema, seja por método radiológico, seja por avaliação macro ou microscópica da anatomia patológica.1-5
Como se poderia prever, a comparação entre os métodos de quantificação por escores visuais e aqueles realizados automaticamente por computação gráfica demonstrou uma diferença significativa a favor da automação. A máscara de densidades apresentada por Müller et al.9 foi uma das técnicas de maior importância na avaliação automatizada do enfisema, sendo citada em praticamente todos os demais artigos. Aquele foi o primeiro estudo em grande escala com o objetivo de diagnóstico do enfisema com a utilização da TC com auxílio computacional. A correlação da graduação por máscaras de densidades com a anatomia patológica chega a r = 0,89. Entretanto, a avaliação visual, por sua simplicidade, ainda tem sido utilizada e facilita sua utilização na prática clínica.
O estudo publicado no presente número do JBP por Bastos et al.10 avalia uma coorte de pacientes enfisematosos e demonstra que o enfisema pulmonar predominante nos lobos inferiores está relacionado à doença mais grave que aquele predominante nos lobos superiores. Outrossim, os autores descrevem que pacientes com enfisema homogêneo tendem a ter maior hiperinflação. Tais dados são importantes na construção de um conhecimento sobre a influência das diferentes alterações morfoestruturais dos fenótipos da DPOC, para que possamos chegar a um tratamento individualizado e mais eficaz.