Compartilhar

A influência da função mastigatória na deglutição orofaríngea em idosos saudáveis

A influência da função mastigatória na deglutição orofaríngea em idosos saudáveis

Autores:

Fabio Shigueru Yoshida,
Cláudia Tiemi Mituuti,
Tatiane Totta,
Giédre Berretin-Felix

ARTIGO ORIGINAL

Audiology - Communication Research

versão On-line ISSN 2317-6431

Audiol., Commun. Res. vol.20 no.2 São Paulo abr./jun. 2015

http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312015000200001433

INTRODUÇÃO

No Brasil, o crescimento da população idosa tem despertado o interesse dos profissionais para o desenvolvimento de pesquisas que abordem essa temática, havendo, ainda, a preocupação com a formação e capacitação de recursos humanos, fundamentada no cuidar gerontológico(1). Neste sentido, a compreensão das modificações fisiológicas resultantes do processo de envelhecimento e a relação entre as diferentes funções estomatognáticas e sistemas têm sido foco de estudo, tanto na área de Fonoaudiologia, como na de Odontologia.

As mudanças fisiológicas provenientes do envelhecimento, na deglutição, propiciam um alto risco para disfagia(2). Estudos videofluoroscópicos e radiográficos em idosos evidenciaram alterações na fase oral, tais como dificuldades de controle e ingestão do bolo; diminuição da força mastigatória e aumento da quantidade de tecido conjuntivo na língua. Também mostraram disfunções na fase faríngea, caracterizadas por retenção do bolo e paresia dos constritores da faringe, redução do grau de elevação da laringe, atraso no início da excursão hiolaríngea, bem como discreto aumento do trânsito faríngeo em mulheres e aumento da duração da onda de pressão faríngea em homens. Além disso, os estudos mencionam a necessidade de deglutições múltiplas, maior ocorrência de tosse, movimentos laríngeos polifásicos e maior probabilidade de inspiração após a deglutição(3). Em relação à fase esofágica, ocorre aumento da sua duração devido ao prolongamento do tempo de relaxamento do esfíncter esofágico superior (EES), diminuição da pressão do EES com preservação da resposta à distensão esofágica e anormalidades no segmento faringoesofágico(4). Os efeitos do envelhecimento sobre a função normal, algumas vezes confundem-se com os achados encontrados em doenças específicas ou quadros degenerativos(5).

Observações sobre a influência da idade na adaptação mastigatória de idosos desdentados mostram relação entre a senilidade e o aumento no número de ciclos mastigatórios, para alimentos padronizados, e na atividade eletromiográfica dos músculos masseter e temporal, no que se refere à duração dos ciclos e duração da abertura das fases(6), bem como hiperatividade dos músculos mastigatórios durante a postura de repouso e leve hipoatividade desta musculatura durante a mastigação(7). As condições mastigatórias de idosos também podem estar comprometidas em decorrência da deficiência da arcada dentária ou uso de próteses inadequadas. Com a perda dos dentes, há redução da força de mordida, bem como da eficiência mastigatória, havendo melhora após a reabilitação oral com próteses e, neste caso, a prótese fixa por implante se mostra superior comparada às próteses removíveis(8). A estabilização da mandíbula pela oclusão dos dentes posteriores ou próteses é importante na função de deglutição.

A literatura relata que há influência da mastigação sobre a deglutição. Em um estudo, foi verificada correlação entre as características da mastigação, o pressionamento de língua e a movimentação de cabeça durante a deglutição, em adultos, durante a avaliação da mastigação de sólido(9). Por outro lado, por meio de um questionário com perguntas relativas ao processo de alimentação, outro estudo verificou que houve influência significativa da dificuldade de mastigar na dificuldade de engolir e na presença de tosse e resíduos alimentares(10).

Diversos estudos demonstram o impacto do avanço da idade sobre as funções de mastigação e deglutição. No entanto, observando a literatura, nota-se que ainda não foram realizados estudos abordando a influência das condições mastigatórias sobre o grau da disfunção da deglutição, na população idosa.

Assim, o objetivo do estudo foi verificar se as características da mastigação em idosos influenciam os achados da deglutição orofaríngea, a fim de buscar novos conhecimentos sobre essa população específica, possibilitando futuras ações voltadas à prevenção, diagnóstico e reabilitação de distúrbios de mastigação e deglutição, resultando em melhor qualidade de vida.

MÉTODOS

Casuística

Este trabalho fez parte do projeto de pesquisa “Voz, Fala e Funções Orofaciais de Idosos Submetidos a Diferentes Estratégias de Reabilitação Oral Protética”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo (FOB-USP), sob processo nº 111/2006. Todos foram informados sobre a utilização dos dados para fins de pesquisa e assinaram o TCLE, concordando com a participação no estudo.

Foram selecionados 47 idosos, sendo 29 mulheres e 18 homens, usuários de prótese parcial (PP), prótese total removível em ambos os arcos dentários (PTR) e reabilitados com prótese total removível no arco superior e prótese total implantossuportada mandibular (PTFIS). A caracterização dos indivíduos incluídos está descrita no Quadro 1.

Quadro 1 Caracterização dos indivíduos de acordo com o gênero, idade e tipo de prótese dentária 

Gênero n (%)
Homens 18 (38,30)
Mulheres 29 (61,70)
Idade
Mínima 60
Máxima 82
Média 68,08
DP 5,59
Tipo de prótese n (%)
Prótese parcial 17 (36,17%)
Prótese total removível 18 (38,3%)
Prótese total implantossuportada 12 (25,53%)

Legenda: DP = desvio padrão

Foram considerados critérios de inclusão: ambos os gêneros; idade igual ou superior a 60 anos (mínimo = 60; máximo = 82; média = 68,08 ± 5,59 anos) e boa condição de saúde geral e oral. Os critérios de exclusão foram: histórico de doenças neurológicas e oncológicas da região de cabeça e pescoço; doenças psiquiátricas; anomalias ou deformidades dentofaciais; cirurgias laríngeas; alcoolismo e tabagismo; uso de medicamentos que pudessem ocasionar xerostomia, como antidepressivos, antiespasmódicos, broncodilatadores, anticolinérgicos, anti-histamínicos e sedativos; necessidade de troca de prótese dentária.

Todos os indivíduos foram submetidos à avaliação clínica da mastigação e da deglutição, realizadas por uma fonoaudióloga.

Avaliação da mastigação

A avaliação da mastigação foi realizada a partir do Protocolo AMIOFE(11), utilizando as imagens registradas em vídeo. Analisou-se o tipo mastigatório a partir da contagem visual do número de golpes mastigatórios realizados, sendo considerado: 1) unilateral crônico - quando cerca de 95-100% dos ciclos mastigatórios aconteceram no mesmo lado (1 = padrão alterado); 2) unilateral preferencial - quando os ciclos mastigatórios ocorreram do mesmo lado da cavidade oral em 66-94% das vezes; 3) bilateral simultâneo - quando o alimento foi triturado em ambos os lados; 4) bilateral alternada - quando o alimento foi triturado no lado direito e esquerdo, alternadamente, podendo haver predomínio de até 65% dos ciclos no mesmo lado (2, 3 e 4 = padrões normais)(11). Para a verificação da capacidade de formação do bolo alimentar, foi solicitado ao paciente que afastasse os lábios, permitindo a visualização da formação de uma massa homogênea sobre o sulco longitudinal da língua. Assim, classificou-se de acordo com a presença ou ausência de formação do bolo(12). Avaliou-se, também, o tempo mastigatório, representado pela duração da trituração, pulverização, organização e propulsão posterior do bolo alimentar pela língua antes de ser deglutido. O paciente foi orientado a realizar a mastigação do alimento concomitantemente ao disparo do cronômetro, que era cessado quando visualizado o movimento de elevação da laringe para a deglutição(13).

Avaliação da deglutição

Durante a avaliação clínica da deglutição, foi verificado o desempenho dos pacientes quando testado o alimento sólido - meia fatia de pão de água de 1 cm de espessura. Esta avaliação foi registrada com uma filmadora digital, para auxiliar na posterior análise de dados.

Durante o processo de deglutição, os indivíduos foram avaliados clinicamente e por meio de filmagem, analisando-se os seguintes parâmetros preconizados e estabelecidos em estudos já realizados: alteração de esfíncter labial; incoordenação de língua; tempo de trânsito oral; alteração da ausculta cervical; alteração na elevação da laringe(14); alteração respiratória; alteração vocal; tosse e/ou pigarro e a oximetria de pulso(15).

Após a realização da avaliação clínica, os indivíduos foram classificados quanto ao grau da disfagia, de acordo com o Protocolo para Classificação do Grau da Disfunção da Deglutição Orofaríngea, utilizado na Clínica de Fonoaudiologia da FOB-USP, proposto em um estudo realizado(16) (Quadro 2).

Quadro 2 Classificação do grau da disfunção da deglutição orofaríngea (proposto por Totta 2008) 

Classificação Aspectos observados
Deglutição normal (nível 0A) Não são observadas alterações para quaisquer aspectos avaliados entre as consistências testadas;

Deglutição funcional (nível 0B) Representa a deglutição sem sinais de risco de penetração e aspiração, porém, sendo esperadas dificuldades, tais como: participação excessiva da musculatura facial e/ou cervical, movimento de cabeça, tempo de trânsito orofaríngeo adequado, estando ausentes os demais fatores;

Disfagia orofaríngea Leve (nível I) Presença dos sinais clínicos citados no nível IA, podendo envolver, também, escape oral anterior, resíduos em cavidade oral, tempo de trânsito orofaríngeo aumentado e ausência dos demais fatores;

Disfagia orofaríngea Moderada (nível II) Presença de sinais que sugiram a presença de penetração laríngea (tosse, pigarro, ausculta cervical alterada, alteração da qualidade vocal, alteração na elevação da laringe, e alteração respiratória), podendo ser encontrados sinais do nível IB, além de refluxo nasal e deglutições múltiplas;

Disfagia orofaríngea Grave (nível III) Presença dos aspectos descritos para o nível II, com presença de resíduos substanciais na cavidade oral, redução ou dificuldade na elevação da laringe, tosse ineficiente ou ausente, acrescidos de sinais que sugiram presença de aspiração, como a cianose (alteração da coloração facial).

Análise estatística

Para a comparação entre os gêneros quanto ao tipo mastigatório, formação do bolo alimentar durante a mastigação e grau da disfunção da deglutição, foi aplicado o teste de Mann Withney.

O teste de correlação de Spearman foi utilizado para verificar a relação entre os escores da avaliação da mastigação e a classificação do grau da disfunção da deglutição dos idosos saudáveis. Além disso, as relações entre as idades e as avaliações da mastigação e deglutição também foram realizadas.

RESULTADOS

Quanto à avaliação da mastigação, mais da metade dos sujeitos apresentou mastigação do tipo bilateral alternado ou simultâneo (83%). A formação do bolo foi classificada como adequada para a maioria dos indivíduos (75%) e o tempo médio de mastigação do alimento correspondeu a 32,45 segundos. Os resultados da avaliação da mastigação, quanto ao tipo mastigatório, formação do bolo alimentar e tempo mastigatório estão descritos na Tabela 1.

Tabela 1 Distribuição dos indivíduos e medidas descritivas referentes ao tempo mastigatório 

Tipo mastigatório n (%)
Formação do bolo alimentar n (%)
Tempo mastigatório*
UC UP BA BS Inadequada Parcial Adequada Mínimo – máximo Média+DP
8 (17) 10 (21) 25 (53) 4 (9) 2 (4) 10 (21) 35 (75) 16 – 77 32,45+12,12

*Em segundos

Legenda: UC = unilateral crônico; UP = unilateral preferencial; BA = bilateral alternado; BS = bilateral simultâneo; DP = desvio padrão

No que se refere à classificação do grau da disfunção da deglutição de sólido dos indivíduos idosos saudáveis, por meio da avaliação clínica, aproximadamente metade dos indivíduos foi classificada com disfagia de grau moderada (47%), seguida de deglutição funcional (23%), disfagia leve (21%) e deglutição normal (9%) (Tabela 2).

Tabela 2 Distribuição dos indivíduos segundo a classificação do grau da disfunção da deglutição de alimento sólido 

Grau da disfunção da deglutição n (%)
Deglutição normal 4 (9)
Deglutição funcional 11 (23)
Disfagia leve 10 (21)
Disfagia moderada 22 (47)

Não houve diferença entre os gêneros na avaliação da mastigação e na classificação do grau da disfunção da deglutição, de acordo com o teste de Mann-Whitney (Tabela 3).

Tabela 3 Medidas descritivas referentes à mastigação e deglutição do alimento sólido 

Gênero Mastigação e deglutição Valor de p
Masculino x Feminino Tipo mastigatório 0,69
Formação do bolo alimentar 0,61
Tempo de mastigação 0,39
Grau de disfunção da deglutição 0,10

Teste de Mann Withney (p<0,01)

O teste de correlação de Spearman demonstrou não haver correlação entre a idade dos participantes e os resultados do tipo mastigatório, formação do bolo, tempo de mastigação e o grau de disfunção da deglutição (Tabela 4).

Tabela 4 Correlação entre idade e os resultados das avaliações de mastigação e de deglutição do alimento sólido 

n Coeficiente de correlação Valor de p
47 Idade X Tipo mastigatório -0,17 0,25
Formação do bolo alimentar 0,02 0,91
Tempo de mastigação -0,125 0,40
Grau de disfunção da deglutição -0,07 0,65

Teste de correlação de Spearman (p<0,01)

Foi encontrada correlação positiva moderada, significativa, entre o grau da disfunção da deglutição e o tempo de mastigação, indicando que quanto maior o tempo de mastigação, mais elevado o grau de disfunção da deglutição (Tabela 5).

Tabela 5 Correlação entre os resultados da avaliação da mastigação e o grau de disfunção da deglutição do alimento sólido 

Coeficiente de correlação Valor de p
Grau de disfunção da deglutição X Tipo mastigatório 0,15 0,33
Formação do bolo alimentar -0,21 0,16
Tempo de mastigação 0,48 0,001*

Teste de correlação de Spearman (p<0,01)

DISCUSSÃO

A literatura tem referido que as mudanças fisiológicas inerentes ao processo de envelhecimento podem levar a dificuldades no desempenho das funções do sistema estomatognático(6). Diversos estudos vêm demonstrando o impacto do avanço da idade sobre as funções de mastigação e deglutição. No entanto, ainda não foram encontrados estudos que abordassem a influência das condições mastigatórias sobre o grau da disfunção da deglutição na população idosa, sendo este o objetivo deste estudo.

Os resultados deste trabalho mostraram que mais da metade dos sujeitos apresentou mastigação do tipo bilateral alternado ou simultâneo, sendo divergentes em relação à literatura, na qual se evidenciou um maior número de idosos classificados com tipo mastigatório unilateral(17-19) associado à dificuldade de adaptação a nova prótese ou a um padrão já previamente estabelecido(17), podendo retornar ao padrão bilateral a partir dos seis meses de adaptação, nos casos de próteses implantossuportadas(18). Pode-se verificar que os achados semelhantes com relação às características da mastigação ocorreram quando os idosos já passaram pela fase de adaptação das próteses, e os trabalhos divergentes são aqueles que avaliaram idosos com próteses dentárias novas ou em fase de adaptação, demonstrando a grande influência da reabilitação oral na performance mastigatória.

A formação do bolo foi classificada como adequada para a maioria dos indivíduos e o tempo de mastigação do alimento correspondeu à média de 32,45 segundos. Em relação à formação do bolo alimentar, os achados são semelhantes aos encontrados para idosos adaptados com próteses mandibulares fixas implantossuportadas(18). Porém, foram divergentes aos resultados encontrados em outro estudo(19), que observou dificuldade de preparo e organização do alimento sólido para mais da metade dos sujeitos. Entretanto, nem todos os indivíduos avaliados no estudo eram reabilitados com próteses dentárias, sendo identificados idosos edêntulos ou com falhas dentárias, o que difere das condições de reabilitação oral dos participantes da presente pesquisa. As características de tempo mastigatório em idosos submetidos a diferentes estratégias de reabilitação oral protética também foram semelhantes àquelas encontradas na literatura(16,20).

Na avaliação clínica da deglutição orofaríngea, foi verificado número maior de indivíduos classificados com grau de disfagia moderada, seguido de deglutição funcional, disfagia leve e deglutição normal, o que concorda com estudo(9)que encontrou deglutição alterada para a maior parte dos idosos avaliados. A população de idosos apresenta alto risco para disfagia orofaríngea, em consequência dos efeitos do processo fisiológico do envelhecimento nas diferentes fases da deglutição(19). Alguns estudos têm demonstrado que a maior parte dos idosos desenvolve adaptações na deglutição diante das alterações do envelhecimento(19).

Não houve diferença ao comparar as características de gênero e a idade dos indivíduos entre os resultados da avaliação da mastigação. Alguns trabalhos encontrados na literatura tiveram como objetivo comparar o gênero e a idade com a função mastigatória. Em um estudo que avaliou a mastigação de 67 pacientes adultos, não foi verificada diferença entre os gêneros no número total de ciclos por sequência, mas a frequência média da mastigação foi ligeiramente superior no gênero masculino(6). Em outro trabalho, não houve diferença na média de frequência dos ciclos mastigatórios entre adultos jovens e indivíduos idosos, concordando com os resultados do presente estudo(21).

Da mesma maneira, não houve diferença ao comparar as características de gênero e a idade dos indivíduos entre os resultados da avaliação da deglutição. Os resultados são divergentes aos encontrados na literatura, uma vez que um estudo verificou diferença entre homens e mulheres adultos e idosos na ingestão de água, relacionada à maior cavidade oral e faríngea dos homens em relação às mulheres, permitindo maior volume para ser deglutido(22). Em outro estudo realizado com jovens, indivíduos de meia idade e idosos, foi observado que idade e gênero influenciam no comportamento da deglutição, sendo o efeito do gênero mais evidente em indivíduos mais jovens e os efeitos da idade mais evidentes em homens(23). Neste caso, a discordância dos achados citados com o presente estudo poderia ser explicada devido à ausência de equilíbrio em relação ao número de indivíduos em cada década, bem como aos distintos procedimentos metodológicos aplicados em cada um dos estudos.

De acordo com os resultados desta pesquisa não houve significância estatística quanto à influência das condições do tipo mastigatório e da formação do bolo alimentar sobre o grau de disfunção da deglutição dos idosos. Porém, houve relação significativa entre o grau de disfunção da deglutição e o tempo de mastigação, constatando-se que, com o aumento do tempo mastigatório do alimento, ocorreu maior prejuízo na função de deglutição.

O aumento do tempo de preparo e de controle do bolo alimentar pode alterar a fase oral da deglutição, além de colocar em risco a integridade da via aérea em razão da possibilidade de penetração e aspiração dos alimentos. Em um estudo com análise videofluoroscópica da deglutição de idosos acometidos por acidente vascular encefálico(24), observou-se que pacientes que aspiraram tinham atraso no tempo de disparo da fase faríngea da deglutição e tempo de trânsito faríngeo aumentado, sendo estas medidas preditoras da aspiração. Pode-se inferir que o tempo mastigatório aumentado, verificado no presente estudo, influenciou no maior tempo de disparo da fase faríngea da deglutição, aumentando o risco de penetração.

Este estudo teve como objetivo verificar a influência das características da mastigação sobre a deglutição de idosos saudáveis. As características mastigatórias em idosos devem ser observadas como um fator preditivo de alterações relacionadas à fase oral da deglutição, aumentando a possibilidade de disfagia orofaríngea. Limitações da avaliação clínica devem ser consideradas, uma vez que a mesma pode subestimar ou superestimar o grau de disfagia, apresentando um alto número de sinais clínicos falsos negativos ou falsos positivos, que representam risco de aspiração ou penetração, efetivamente confirmados pela avaliação instrumental(25).

Estudos futuros devem ser realizados, a fim de verificar o impacto dos aspectos da mastigação sobre a disfagia orofaríngea, considerando as diferentes faixas etárias, o tipo e a condição da reabilitação oral, além de utilizar métodos instrumentais para a avaliação da deglutição.

CONCLUSÃO

Houve relação entre o tempo de mastigação e a classificação da deglutição, demonstrando que quanto maior o tempo de mastigação, maior o grau de disfunção da deglutição em idosos, porém, não houve influência do tipo mastigatório e da formação do bolo alimentar sobre os achados da deglutição orofaríngea.

REFERÊNCIAS

1 Freitas MC, Maruyama SAT, Ferreira TF, Motta AMA. Perspectivas das pesquisas em gerontologia e geriatria: revisão da literatura. Rev Lat Am Enfermagem. 2002;10(2):221-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692002000200015
2 Nasi A. Disfagia no indivíduo idoso. In: Macedo Filho E, Pissan JC, Carneiro J, Gomes G. Disfagia: abordagem multidisciplinar. São Paulo: Frôntis; 1998. p. 47-62.
3 Nilsson H, Ekberg O, Olsson R, Hindfelt B. Quantitative aspects of swallowing in an elderly nondysphagic population. Dysphagia. 1996;11(3):180-4. http://dx.doi.org/10.1007/BF00366381
4 Jaradeh S. Neurophysyology of swallowing in the aged. Dysphagia. 1994;9(4):218-20. http://dx.doi.org/10.1007/BF00301913
5 Ekberg O, Feinberg MJ. Videofluoroscopy in elderly patients with aspiration: importance of evaluating both oral and pharyngeal stages of deglutition. AJR Am J Roentgenol. 1991;156(2):293-6. http://dx.doi.org/10.2214/ajr.156.2.1898801
6 Peyron MA, Blanc O, Lund JP, Woda A. Influence of age on adaptability of human mastication. J Neurophysiol. 2004;92(2):773-9. http://dx.doi.org/10.1152/jn.01122.2003
7 Galo R, Vitti M, Santos CM, Santos CM, Hallak JE, Regalo SC. The effect of age on the function of the masticatory system: an electromyographical analysis. Gerodontology. 2006;23(3):177-82. http://dx.doi.org/10.1111/j.1741-2358.2006.00113.x
8 Oliveira TRC, Frigerio MLMA. Avaliação nutricional e protética de pacientes senescentes desdentados: estudo comparativo entre pacientes portadores de próteses totais mucoso-suportada implanto-retidas e próteses totais convencionais. RPG Rev Pós Grad. 2005;12(2):255-63.
9 Cavalcanti RVA, Bianchini EMG. Verificação e análise morfofuncional das características da mastigação em usuários de prótese dentária removível. Rev CEFAC. 2008;10(4):490-502.
10 Fazito LT, Perim JV, Di Ninno CQMS. Comparação das queixas alimentares de idosos com e sem prótese dentária. Rev CEFAC. 2004;6(2):143-50.
11 de Felício CM, Medeiros AP, de Oliveira Melchior M. Validity of the ‘protocol of oro-facial myofunctional evaluation with scores’ for young and adult subjects. J Oral Rehabil. 2012;39(10):744-53. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2842.2012.02336.x
12 Felício CM, Ferreira CL. Protocol of orofacial myofunctional evaluation with scores. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2008;72(3):367-75. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijporl.2007.11.012
13 Whitaker ME, Trindade Junior AS, Genaro KF. Proposta de avaliação clínica da função mastigatória. Rev CEFAC. 2009;11 suppl 3:311-23. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000030
14 Bretan O. Excursão da cartilagem laríngea como parâmetro de comprometimento functional da deglutição. In: Macedo Filho E, Pissan JC, Carneiro J, Gomes G. Disfagia: abordagem multidisciplinar. São Paulo: Frôntis; 1998. p. 78-83.
15 Padovani AR, Moraes DP, Mangili LAD, Andrade CRF. Protocolo fonoaudiológico de avaliação do risco para disfagia (PARD). Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000300007
16 Totta T. Características da deglutição em idosos submetidos a diferentes estratégias de reabilitação oral protética [dissertation]. Bauru: Universidade de São Paulo, Faculdade de Odontologia de Bauru; 2008.
17 Cunha CC, Zuccolotto MCC. Prótese total: avaliação e tratamento dos usuários. In: Felício CM. Fonoaudiologia aplicada a casos odontológicos: motricidade oral e audiologia. São Paulo: Pancast; 1999. p. 197-222.
18 Berretin-Felix G, Machado WM, Genaro KF, Nary Filho H. Effects of mandibular fixed implant-supported prostheses on masticatory and swallowing functions in completely edentulous elderly individuals. Int J Oral Maxillofac Implants. 2009;24(1):110-7.
19 Tanure CMC, Barboza JP, Amaral JP, Motta AR. A deglutição no processo normal de envelhecimento. Rev CEFAC. 2005;7(2):171-7.
20 Silva LG, Goldenberg M. A mastigação no processo de envelhecimento. Rev CEFAC. 2001;3(1):27-35.
21 Karlsson S, Carlsson GE. Characteristics of mandibular masticatory movement in young and elderly dentate subjects. J Dent Res. 1990;69(2):473-6. http://dx.doi.org/10.1177/00220345900690021101
22 Alves LM, Cassiani RdeA, Santos CM, Dantas RO. Gender effect on the clinical measurement of swallowing. Arq Gastroenterol. 2007;44(3):227-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0004-28032007000300009
23 Dantas RO, Alves LM, Santos CM, Cassiani RdeA. Possible interaction of gender and age on human swallowing behavior. Arq Gastroenterol. 2011;48(3):195-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0004-28032011000300008
24 Han TR, Paik NJ, Park JW, Kwon BS. The prediction of persistent dysphagia beyond six months after stroke. Dysphagia. 2008;23(1):59-64. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-007-9097-0
25 Leder SB, Espinosa JF. Aspiration risk after acute stroke: comparison of clinical examination and fiberoptic endoscopic evaluation of swallowing. Dysphagia. 2002;17(3):214-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-002-0054-7