versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.110 no.3 São Paulo mar. 2018
https://doi.org/10.5935/abc.20180050
A associação entre osteoporose e doença cardiovascular aterosclerótica, independente da idade, tem sido descrita nos últimos anos e enfatiza semelhanças epidemiológicas e fisiopatogênicas entre a calcificação da parede arterial e osteogênese.1,2 Estudos transversais e prospectivos têm ressaltado associação negativa e significativa entre baixos valores das medidas de massa óssea, fratura por osteoporose, calcificação vascular, extensão de lesão coronariana e de aorta abdominal e mortalidade cardiovascular.3-5 Acredita-se que a ocorrência concomitante das duas doenças seja decorrente dos fatores de risco e mecanismos fisiopatológicos e moleculares comuns. No entanto, ainda é controverso se a baixa massa óssea resulta de maior calcificação arterial ou vice-versa, ou ainda, se compartilham apenas o mesmo mecanismo fisiopatológico.
Os fatores de risco para osteoporose e doença aterosclerótica incluem a falta de estrogênio, hormônio da paratireoide, homocisteína e vitamina K, produtos de oxidação lipídica, processo inflamatório, excesso de vitaminas D, vias moleculares similares envolvidos na mineralização óssea e vascular e mecanismos de calcificação que parecem ser semelhantes na estrutura vascular e no osso.6 A calcificação arterial é um achado presente em mais de 90% das lesões por aterosclerose. O processo inicia-se com a formação de vesículas na matriz endotelial, seguida por proliferação da camada médio-intimal da artéria e posterior mineralização, semelhante à ocorrida no tecido ósseo. Vários reguladores da remodelação óssea, como a osteocalcina, cristais de hidroxiapatita, osteopontina, proteína morfogenética óssea 2 (BMP-2), osteoprotegerina, esclerostina, proteína dikkopf (DKK), leptina, lipídios oxidados e o fator relacionado ao sensor de cálcio, já foram descritos em lesões ateroscleróticas calcificadas.7
A doença vascular aterosclerótica é mais comum em mulheres com osteoporose e osteopenia quando comparadas com mulheres sem osteoporose e osteopenia.5,6 Foi relatado aumento nas taxas de mortalidade relacionadas com doença cardiovascular em idades avançadas para mulheres pós-menopausa com baixo conteúdo mineral ósseo. Apesar de um aumento não significativo do infarto do miocárdio com uma taxa de 22% em mulheres com baixa densidade mineral óssea (DMO), há aumento significativo em homens com DMO baixa, com uma taxa de 39%.2
O artigo de Cheng et al.,8 nesta edição traz mais uma contribuição a esse cenário. Os autores demonstraram uma associação inversa entre DMO e extensão de doença arterial coronariana em mulheres na pós-menopausa. Eles estudaram 122 mulheres na pós-menopausa com diagnóstico de doença arterial coronariana (síndrome coronariana aguda ou angina estável) com densitometria óssea prévia de rotina com até 1 ano antes da avaliação da carga aterosclerótica definida pelo escore de Gensini pela angiografia invasiva. A densidade mineral do colo femoral foi medida por absorção de raios-X de dupla energia (DXA). A presença de osteopenia/osteoporose no colo do fêmur associou-se com um risco aumentado de apresentar lesões coronarianas graves. O modelo de regressão múltipla mostrou que os escores T foram preditores independentes de maior gravidade de escore de Gensini. Este estudo soma-se a outros trabalhos, indicando uma associação entre a DMO e gravidade de doença aterosclerótica coronariana, sugerindo que a DMO possa ser um marcador independente de gravidade da doença.
Estudos prospectivos com um maior número de pacientes e com exames seriados de DMO se faz necessário para estabelecer o real papel preditor de risco dos escores T para desenvolvimento de CAD grave em mulheres e homens. Na prática clínica, sugere-se que pacientes com osteoporose deveriam também ser avaliados para o risco de doença arterial coronária mais grave.