versão On-line ISSN 2317-6431
Audiol., Commun. Res. vol.19 no.2 São Paulo abr./jun. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312014000200012
A categoria de Desordens do Espectro do Autismo (DEA) baseia-se em quatro critérios: atraso e desvios sociais; problemas de comunicação; comportamentos incomuns, tais como movimentos estereotipados e maneirismos e início antes dos 30 meses de idade(1).
Crianças com DEA, mesmo apresentando desenvolvimento deficitário das habilidades de linguagem, cognição e socialização, são capazes de extrair pistas linguísticas e não linguísticas do meio comunicativo e utilizá-las de forma contextual em sua vida social(2). Essas Desordens estão entre as dificuldades de desenvolvimento mais comuns, afetando aproximadamente um em cada 200 indivíduos(3).
As DEA se caracterizam pela presença de desenvolvimento acentuadamente atípico na interação social e comunicação, características essas que podem levar a um isolamento contínuo da criança e sua família. Entretanto, acredita-se que a inclusão escolar pode proporcionar a essas crianças oportunidades de convivência com outras da mesma faixa etária, constituindo-se, a escola, em um espaço de aprendizagem e de desenvolvimento da competência social(4).
É difícil definir o termo inclusão e o quanto esse processo está sendo efetivo. Mesmo apresentando muitas falhas, o ensino inclusivo traz benefício para todos os envolvidos, porém, profissionais despreparados e desmotivados são alvos de críticas na sociedade quando o assunto é a inclusão de portadores de necessidades especiais na rede pública(5).
O modo de educar indivíduos com DEA é significativamente limitado, devido às alterações envolvidas nesse espectro (comportamento, socialização e comunicação) e à falta de profissionais especializados. O profissional deve manter-se informado, participando de ações de formação contínua e precisa receber suporte de equipes multidisciplinares e da instituição(6).
Atualmente, o sistema escolar brasileiro busca encontrar soluções que respondam ao acesso e à permanência dos alunos com deficiência nas escolas regulares. Algumas instituições públicas e particulares já mudaram sua organização pedagógica, valorizando e reconhecendo as diferenças, sem discriminar os alunos e/ou segregá-los. Ainda existe resistência, porém, as redes de ensino, escolas, professores, pais e instituições dedicadas à inclusão de pessoas com deficiência estão aceitando a inclusão e vivendo novas experiências(7).
Os fatores em destaque que dificultam a educação da criança deficiente incluem aqueles inerentes ao próprio indivíduo, à pessoa do professor e à estrutura escolar atual(8).
As expectativas de diferentes grupos envolvidos no processo de inclusão escolar, ou seja, professores, pais de alunos com deficiência e sem deficiência são divergentes. Os professores se preocupam, principalmente, com as questões sociais das crianças inclusas, enquanto os pais esperam que eles se atentem para os aspectos pedagógicos(9).
Apesar do crescimento das matrículas de crianças com deficiência na escola regular, o déficit de vagas é muito grande e constitui um desafio para os sistemas de ensino. Para que todos os indivíduos com deficiência possam estar matriculados, diversas ações devem ser realizadas ao mesmo tempo. Entre elas, destacam-se a sensibilização dos demais alunos e da comunidade em geral e as adaptações curriculares(10).
Professores da escola básica do Vale dos Sinos, Região Metropolitana de Porto Alegre/RS, mostraram que há desconforto no que se refere à diferença, à diversidade e à inclusão(11). Em Belo Horizonte, percebeu-se a falta de investimento para o aperfeiçoamento dos professores, bem como para a orientação aos pais acerca do processo de inclusão(12). A prefeitura de Belo Horizonte (MG) vem desenvolvendo ações com o intuito de favorecer o acesso de estudantes com DEA em escolas regulares do município, porém há evidências de que eles participam pouco das atividades da escola, a interação com os colegas é escassa e a aprendizagem de conteúdos pedagógicos é limitada(13).
No Distrito Federal, pesquisas apontaram que ainda há um grande contingente de pessoas excluídas do processo educacional e do atendimento educacional especializado. Esse atendimento vem sendo desenvolvido, prioritariamente, em classes e escolas especiais, em salas de recursos, por meio de serviços de itinerância, dentre outras modalidades(14).
Nos Estados Unidos, a inclusão de crianças com DEA em escolas públicas permite que os colegas não deficientes apresentem progressos com relação aos fatores sociais. Por outro lado, os professores não se atêm a essa questão, direcionando a atenção ao progresso acadêmico e às transgressões disciplinares(15).
Para uma inclusão eficiente, é fundamental a atuação do professor e o preparo dele como mediador e o papel da escola como o espaço propício para isso(16). São diversos os aspectos que necessitam ser melhorados para que a educação de alunos com DEA se torne mais efetiva. Um desses aspectos envolve uma rede específica de apoio aos professores, a presença de monitores ou professores, adaptações curriculares e medidas para facilitar a comunicação e o trabalho entre os profissionais envolvidos(17).
No Brasil, algumas leis existem, mas ainda não estão totalmente implementadas e a inclusão escolar brasileira segue a cultura norte-americana. Alguns acreditam que o fato de seguir o modelo de outros países pode ampliar o acesso à escola para crianças e jovens com necessidades educacionais especiais, podendo, com isso, avançar na educação especial e na educação geral do país(18).
As políticas públicas para a inclusão devem ser concretizadas na forma de programas de capacitação e acompanhamento contínuo, que orientem o trabalho do docente, na perspectiva da diminuição gradativa da exclusão escolar(19).
Os professores, com a prática, aprendem a lidar com o aluno com deficiência, porém, não contam com conhecimento teórico que apoie essa prática(20). Professores de educação infantil que têm contato direto com o processo de inclusão, ressaltam que as principais dificuldades são com o espaço físico, recursos materiais e humanos e relativos a sua própria formação(21). Na visão dos professores, a inclusão deveria ser realizada em turmas menores, pois, dessa forma, seria possível dedicar mais atenção aos alunos(22).
Existe um despreparo para lidar com alunos com DEA, bem como para educá-los e ensiná-los. Tal despreparo, aparentemente, é causado pela formação profissional insuficiente nas áreas especiais e pela falta de informação sobre DEA e suas manifestações(23).
A inclusão escolar de crianças com DEA é algo possível, desde que fundamentada no conhecimento, garantindo os recursos necessários e a clareza acerca do papel da escola(24). Os docentes com formação específica estão mais preparados para a inclusão de alunos com DEA do que aqueles sem essa formação(25).
Faz-se necessária uma reforma aprofundada nos cursos de formação, para que as pessoas por eles formadas possam, elas próprias, tornarem-se agentes de mudança na escola(26). O processo de inclusão demanda, além de informações técnicas, um espaço de cuidado emocional a esses profissionais(27).
O objetivo deste estudo foi identificar e descrever as perspectivas de professores de escolas regulares e/ou especiais, que têm crianças e adolescentes com DEA em suas salas de aula, a respeito das características, das dificuldades comportamentais, sociais e comunicativas de seus alunos.
Este estudo foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP), nos termos da resolução 196/96, adotados pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), e aprovado sob parecer nº 193/10. A pesquisa teve inicio após a aprovação pelo Comitê de Ética.
Participaram desta pesquisa 51 professores de escolas regulares e especiais, que tinham crianças e/ou adolescentes com diagnóstico psiquiátrico incluído no Espectro do Autismo, dentre seus alunos. Todos tiveram conhecimento dos procedimentos necessários à realização da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O tipo de escola (regular, especial, pública, particular) não interferiu no estudo e, por essa razão, esses dados não foram discriminados. Não houve qualquer forma de seleção do local de trabalho desses professores. Constituiu-se assim, uma amostra de conveniência que, por seu caráter aleatório, refletiu um ângulo representativo da realidade educacional das crianças com DEA.
Foi aplicado um questionário para os professores (Anexo 1), com 11 questões fechadas e de classificação, elaborado pela pesquisadora. Por meio dele, buscou-se identificar as percepções dos professores sobre o papel que exercem em relação ao aluno, suas dificuldades e habilidades no que se refere ao aluno, suas observações sobre comportamentos e interesses do aluno e estratégias de comunicação usadas por ambos.
O questionário foi enviado por intermédio dos cuidadores de crianças e adolescentes atendidos em um serviço de fonoaudiologia especializado em DEA, junto com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e uma carta para o professor. Foram enviados 89 questionários e 51 foram respondidos e devolvidos.
A análise quantitativa foi feita por meio de análise estatística, com a aplicação dos testes de Kruskal-Wallis, dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, Análise de Correlação de Spearman e teste t-Student, considerando p<0,05 como índice de significância.
A análise qualitativa dos dados ocorreu mediante as respostas obtidas no questionário aplicado inicialmente, referente ao conhecimento que os entrevistados apresentavam sobre como trabalhar com um aluno com DEA. Os dados foram avaliados de forma isolada, considerando-se cada questão.
Dos 51 professores que responderam ao questionário – menos de 60 % dos questionários enviados - 49 eram do gênero feminino. A idade dos professores variou de 20 a 60 anos. A maioria tinha formação em pedagogia, com 11 a 20 anos de experiência profissional como professor.
A partir das respostas fornecidas, observou-se que a grande maioria acreditava estimular e contribuir, principalmente na comunicação e nas relações interpessoais do indivíduo. As áreas em que tinham mais dificuldade para estimular eram as relações interpessoais e a autonomia.
Os professores consideraram que a escola, em geral, oferece apoio suficiente para seu trabalho, mas que há pouca contribuição de outros profissionais e falta tecnologia de ensino adequada. Segundo esses professores, o meio mais utilizado para se comunicar com o aluno é o oral. As respostas em relação à circunstância em que o aluno autista tem maior dificuldade em se comunicar e os comportamentos mais observados nos alunos foram muito variadas. Isso pode ter ocorrido pela diversidade de características que os indivíduos com DEA apresentam, ou pela falta de experiência desses professores com essas crianças, gerando dificuldades para observar e destacar tais habilidades.
A questão que perguntava em qual área o professor acreditava mais estimular e contribuir para o desenvolvimento da criança e do adolescente com DEA foi usada como parâmetro, com o intuito de verificar possíveis diferenças entre as duas categorias da variável (Teste de Kruskal-Wallis).
Ao relacionar as alternativas dessa questão com a idade dos professores, a formação e o tempo de atuação, observou-se que não existe diferença significativa, quando associados o tempo de atuação e a idade dos professores.
As variáveis ‘formação’ e ‘tempo de atuação’ contêm muitas categorias, com baixíssima representatividade, ou seja, com poucos sujeitos em cada grupo, o que não permitiu avaliações estatísticas nos termos propostos (Tabela 1).
Tabela 1 Áreas em que o professor acredita mais estimular e contribuir para melhorar o desenvolvimento de seu aluno autista
Variável | n | Média | Desvio-padrão | Mínimo | Máximo | Percentil 25 | Percentil 50 (Mediana) | Percentil 75 | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Comunicação | 41 | 3,29 | 2,11 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 5,00 | 0,905 |
Aprendizagem | 41 | 3,80 | 1,91 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 5,00 | 0,265 |
Relações interpessoais | 41 | 3,41 | 2,00 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 5,00 | 0,715 |
Comportamento | 41 | 4,24 | 1,91 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 4,00 | 6,00 | 0,836 |
Desenvolvimento neuropsicomotor | 41 | 4,93 | 1,85 | 1,00 | 7,00 | 4,00 | 5,00 | 7,00 | 0,203 |
Raciocínio | 41 | 4,93 | 1,66 | 1,00 | 7,00 | 5,00 | 6,00 | 6,00 | 0,298 |
Autonomia | 41 | 3,39 | 1,91 | 1,00 | 7,00 | 1,00 | 3,00 | 4,00 | 0,690 |
Teste de Kruskal-Wallis (p<0,05)
Em relação à questão sobre a área em que o professor mais encontrava dificuldades, quando suas alternativas foram relacionadas com o item “idade dos professores”, a resposta “comportamento” foi significativa (p<0,05). Assim como na questão anterior, em relação aos itens “formação” e “tempo de atuação”, existem muitas categorias, com baixíssima representatividade, o que não permitiu avaliações estatísticas nos termos propostos (Teste de Kruskal-Wallis) (Tabela 2).
Tabela 2 Verificação estatística das variáveis a respeito das áreas em que o professor relata mais dificuldades com seu aluno autista
Variável | Idade | n | Média | Desvio-padrão | Mínimo | Máximo | Percentil 25 | Percentil 50 (Mediana) | Percentil 75 | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Comunicação | 20 a 60 anos | 42 | 3,98 | 2,38 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 7,00 | 0,104 |
Aprendizagem | 20 a 60 anos | 42 | 3,45 | 1,94 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 4,00 | 0,524 |
Relações interpessoais | 20 a 60 anos | 42 | 4,62 | 1,89 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 5,00 | 6,00 | 0,122 |
Comportamento | 20 a 60 anos | 42 | 4,12 | 2,07 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 4,00 | 6,00 | 0,026* |
Desenvolvimento neuropsicomotor | 20 a 60 anos | 42 | 4,14 | 1,76 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 6,00 | 0,379 |
Raciocínio | 20 a 60 anos | 42 | 3,24 | 1,75 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 4,00 | 0,366 |
Autonomia | 20 a 60 anos | 42 | 4,52 | 1,93 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 4,00 | 6,00 | 0,627 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste de Kruskal-Wallis
Quando comparadas as questões sobre a capacidade de maior estimulação do professor e sua maior dificuldade, encontrou-se diferença significativa nos itens “relações interpessoais”, “desenvolvimento neuropsicomotor”, “raciocínio” e “autonomia”. Dessa forma, confirma-se que, realmente, a maioria dos professores considera ter as mesmas habilidades e dificuldades ao trabalhar com crianças e adolescentes autistas em suas salas de aula (teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon) (Tabela 3).
Tabela 3 Comparação estatística das variáveis de áreas de contribuições e dificuldades
Par de Variáveis | n | Média | Desvio-padrão | Mínimo | Máximo | Percentil 25 | Percentil 50 (Mediana) | Percentil 75 | Valor de p | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Comunicação | + | 37 | 3,27 | 2,05 | 1,00 | 7,00 | 1,50 | 3,00 | 5,00 | 0,151 |
– | 37 | 4,19 | 2,38 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 7,00 | ||
| ||||||||||
Aprendizagem | + | 37 | 3,70 | 1,90 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 5,00 | 0,384 |
– | 37 | 3,24 | 1,88 | 1,00 | 7,00 | 1,50 | 3,00 | 4,50 | ||
| ||||||||||
Relações interpessoais | + | 37 | 3,30 | 2,01 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 5,00 | 0,015* |
– | 37 | 4,59 | 1,88 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 5,00 | 6,00 | ||
| ||||||||||
Comportamento | + | 37 | 4,41 | 1,89 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 4,00 | 6,50 | 0,836 |
– | 37 | 4,27 | 2,08 | 1,00 | 7,00 | 3,00 | 4,00 | 6,00 | ||
| ||||||||||
Desenvolvimento neuropsicomotor | + | 37 | 5,00 | 1,81 | 1,00 | 7,00 | 3,50 | 5,00 | 7,00 | 0,038* |
– | 37 | 4,05 | 1,81 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 4,00 | 6,00 | ||
| ||||||||||
Raciocínio | + | 37 | 5,11 | 1,54 | 1,00 | 7,00 | 4,50 | 6,00 | 6,00 | 0,000* |
– | 37 | 3,27 | 1,69 | 1,00 | 7,00 | 2,00 | 3,00 | 4,50 | ||
| ||||||||||
Autonomia | + | 37 | 3,22 | 1,86 | 1,00 | 7,00 | 1,00 | 3,00 | 4,00 | 0,029* |
– | 37 | 4,38 | 1,96 | 1,00 | 7,00 | 2,50 | 4,00 | 6,00 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon
Foi aplicado o teste t-Student entre as variáveis da questão referente à contribuição da escola para o desenvolvimento do trabalho do professor com o aluno autista. O item “material didático” foi escolhido como parâmetro, pois foi a variável em que muitos relataram encontrar menos contribuições. Observou-se que, em relação à infraestrutura, aprimoramento profissional e apoio da diretoria ocorreu diferença significativa, ou seja, considerou-se que o material didático realmente precisa ser modificado, para que os professores possam melhorar a qualidade do trabalho que realizam com seus alunos. A análise aplicada entre os itens “material didático” e “auxílio de outros profissionais” não revelou diferença significativa.
Por outro lado, o apoio familiar foi a área em que os professores mais disseram encontrar meios facilitadores para o seu trabalho. Assim, verificando o grau de relação entre o apoio familiar e as variáveis “infraestrutura”, “auxilio de outros profissionais”, aprimoramento profissional” e “apoio da diretoria”, constatou-se que não houve associação significativa. Apenas o item “material didático” teve correlação negativa significativa com o apoio familiar. Isso confirma o resultado encontrado na análise estatística. Desse modo, pode-se concluir que os professores indicaram a necessidade de melhorias na qualidade do material didático, para, assim, aprimorar seu trabalho e contribuir com o aprendizado desses alunos (Tabela 4).
Tabela 4 Verificação estatística das variáveis a respeito das áreas em que o professor considera que a escola mais contribui para o desenvolvimento de seu trabalho com o aluno autista
Variável | Estatística | Apoio familiar |
---|---|---|
Infra-estrutura | Coeficiente de correlação (r) | -0,122 |
Valor de p | 0,431 | |
n | 44 | |
| ||
Auxilio de outros profissionais | Coeficiente de correlação (r) | 0,024 |
Valor de p | 0,875 | |
n | 44 | |
| ||
Aprimoramento profissional | Coeficiente de correlação (r) | -0,173 |
Valor de p | 0,262 | |
n | 44 | |
| ||
Apoio da diretoria | Coeficiente de correlação (r) | -0,129 |
Valor de p | 0,402 | |
n | 44 | |
| ||
Material didático | Coeficiente de correlação (r) | -0,349 |
Valor de p | 0,020* | |
n | 44 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste de Correlação de Spearman
Ao aplicar o teste da Análise de Correlação de Spearman, com o intuito de verificar o grau de relacionamento entre a fala e as variáveis “gestos”, “sinais”, e “escrita”, encontrou-se correlação negativa significativa com “gestos” e “sinais”. Assim, embora não se possa afirmar que a fala seja o meio de comunicação exclusivo entre professor e aluno, observou-se que é o meio privilegiado para essa comunicação (Tabela 5).
Tabela 5 Comparação estatística das variáveis das variáveis a respeito do meio comunicativo mais utilizado pelo professor
Variável | Estatística | Fala |
---|---|---|
Gestos | Coeficiente de correlação (r) | -0,306 |
Valor de p | 0,039* | |
n | 46 | |
| ||
Escrita | Coeficiente de correlação (r) | -0,182 |
Valor de p | 0,225 | |
n | 46 | |
| ||
Sinais | Coeficiente de correlação (r) | -0,448 |
Valor de p | 0,002* | |
n | 46 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste de Correlação de Spearman
Na questão sobre como o professor observa a funcionalidade comunicativa de seu aluno, a variável “para pedir informação” foi a que mais apareceu como resposta. Dessa forma, o teste t-Student foi o aplicado, utilizando essa variável como parâmetro. Observou-se que ocorreu diferença significativa em relação às variáveis “para protestar” e “nunca tenta se comunicar”. Assim, não se pode afirmar que os professores observaram que seu aluno utiliza sua comunicação apenas e/ou principalmente para pedir informação.
Foi aplicado o teste t-Student entre as variáveis a respeito dos comportamentos e interesses dos alunos com DEA, observados pelos professores. O item “relaciona-se com colegas de sala” foi escolhido como parâmetro, pois foi a variável em que os professores mais observaram manifestações de comportamento e interesse no individuo com DEA. Observou-se que esse item apresentou diferença significativa em relação a todas as variáveis dessa questão, ou seja, o aluno com DEA, segundo a visão do professor, tem interesse e tenta se relacionar com seus colegas.
As DEA envolvem uma tríade de sintomas que se manifestam nas áreas de desenvolvimento da comunicação, comportamento e socialização(28). As questões formuladas foram baseadas nesses aspectos.
Muitos dos professores responderam contribuir principalmente no desenvolvimento da comunicação e relações interpessoais, o que concorda com estudo(24), que investigou o perfil de competência social de uma criança com DEA, comparando-a com uma criança com desenvolvimento típico, evidenciando que a criança com DEA demonstrou maior frequência de comportamentos de cooperação e asserção social do que a criança com desenvolvimento típico. Essa conclusão e a resposta dos professores da presente pesquisa demonstram que a inclusão escolar de crianças com DEA é algo possível e que o desenvolvimento dos fatores sociais foi o que mais se destacou. Já outro estudo(6), apontou que o modo de educar indivíduos com DEA é significativamente limitado, devido às alterações envolvidas nesse espectro (comportamento, socialização e comunicação) e à falta de profissionais especializados. Assim, entende-se que a inclusão de crianças com DEA é realmente possivel, pois, afinal, existem respostas positivas quanto a essa viabilidade, porém, a escola necessita ter estrutura, os profissionais precisam ser qualificados e é imprescindível o apoio de uma equipe multidisciplinar. Além disso, os profissionais necessitam ser orientados e acompanhados, sempre, para que a inclusão possa ser contínua.
Os professores afirmaram interferir menos no desenvolvimento da criança e do adolescente com DEA, principalmente na aprendizagem e no desenvolvimento neuropsicomotor, confirmando a visão dos professores analisados em um trabalho(22), que viam a escola apenas como um veículo para a socialização. De certa forma, isso indica falta de conhecimento e descrença no desenvolvimento escolar de crianças com DEA.
Por outro lado, outros docentes estudados, consideraram que os alunos com DEA se beneficiam da interação proporcionada pela inclusão(25). Outra pesquisa(29), confirmou a influência exercida pelo professor no desempenho comunicativo de alunos com DEA. Assim, entende-se que a escola é importante para o desenvolvimento social do aluno com DEA e que o professor é a peça fundamental para esse desenvolvimento, pois além de influenciar diretamente, é quem gerencia a relação desse aluno com os outros e com os demais membros da escola.
As escolas, de maneira geral, segundo a percepção dos professores estudados, não têm estrutura adequada para apoiar o desenvolvimento escolar, social, cultural e emocional do aluno com DEA. Não têm base para acolher a família, nem tecnologia e infraestrutura apropriadas, nem professores especializados. Isso condiz com uma pesquisa(22), no sentido de que o processo de inclusão revelou o desconhecimento dos professores e o despreparo para trabalhar com a inclusão de alunos que, supostamente, não aprendem. A escola, para os professores, seria apenas um veículo para a socialização e, segundo eles, a inclusão deveria ser realizada em turmas menores. Relatam dificuldades para dedicar-se aos alunos especiais, pelo fato das salas serem muito populosas, além de não estarem devidamente preparados - nem eles, nem a escola - para receber esses alunos. Nesse sentido, já haviam observado a necessidade de implementação de espaços para a construção de conhecimentos e a troca de experiências, instrumentalizando o professor, teórica e emocionalmente(20).
Os professores, nesta pesquisa, consideram que a escola oferece apoio suficiente para seu trabalho, mas que há pouco apoio de outros profissionais e falta tecnologia de ensino adequado. Cabe ao fonoaudiólogo atuar no respaldo a educadores quanto à identificação de necessidades educacionais especiais de alunos com DEA, à estruturação de práticas de ensino e de adequações curriculares, a fim de melhorar o desenvolvimento de linguagem, a interação social e aumentar a participação desses alunos em atividades acadêmicas(29).
Assim como os professores de uma pesquisa(23), que não possuem conhecimento suficiente e apropriado para lidar com alunos com DEA em sala de aula, os professores desta pesquisa também relataram despreparo para lidar com esses alunos. Referiram não receber formação e orientação suficientes para trabalhar com esse público, além da falta de apoio e salas de aulas numerosas. A inclusão que a Lei de Diretrizes e Bases(30) estabelece, com garantia de escolas regulares adequadas, com professores capacitados, adaptações curriculares, serviços de apoio especializado, classes especiais em caráter transitório, ainda não existe. Para que de fato ocorra, ainda precisam ser feitas adaptações estruturais e curriculares, além de apoio adequado para os professores e famílias e conscientização de toda a população.
O professor é quem tem maior contato com o aluno, é o responsável pela sala de aula, o mensageiro do conteúdo escolar. É quem observa a relação dos alunos entre si e faz a intermediação dessas relações. É também a quem a família confia seu filho, enquanto não estão presentes. Enfim, o professor tem muitas responsabilidades e, na maioria das vezes, pouco apoio, tanto de outros profissionais, quanto da direção e da coordenação da escola, conforme relatos desta pesquisa.
Este estudo apresentou algumas limitações, como o número restrito de sujeitos e o fato de que menos de 60% dos questionários enviados terem sido respondidos. Porém, mesmo com um número reduzido de respostas, o trabalho traz informações sobre a realidade brasileira, de como até mesmo os professores que fazem parte do que se chama inclusão escolar, estão desinformados e despreparados para essa inclusão. Vale, ainda, ressaltar que o tipo de escola (regular, especial, pública ou particular) não fez parte das variáveis estudadas, dando-se ênfase ao impacto que o aluno com DEA causa no trabalho do professor e o que essa vivência traz, em termos de perspectiva.
De acordo com os resultados encontrados nesta pesquisa, os professores demonstraram não conhecer muito sobre o DEA e, em alguns momentos, sentem-se despreparados para trabalhar com a inclusão. Nesse sentido, o presente estudo reafirma a importância de programas de formação de professores para a implementação da política de inclusão de alunos com deficiência no ensino regular, pois não basta a promulgação de leis que determinem a criação de cursos de capacitação básica de professores, nem a obrigatoriedade de matrícula nas escolas da rede pública(19). Essas são, sem dúvida, medidas essenciais, porém não suficientes.
Reafirma-se que o tipo de escola (regular, especial, pública, particular...) não foi especificado, pois o intuito desse estudo foi avaliar o impacto que o aluno com DEA causa no trabalho do professor e o que essa vivência traz de perspectiva. O fato dos autores não terem comparado os questionários de professores dos dois tipos de escola foi uma limitação desse estudo, que, entretanto, corresponde a um critério específico de coleta de dados. Os professores que responderam ao questionário tinham, em suas classes, as crianças e adolescentes que são pacientes do serviço em que a pesquisa foi realizada. Dessa forma, não houve qualquer forma de seleção do local de trabalho desses professores. Constitui-se assim, uma amostra de conveniência que, por seu caráter aleatório, reflete um ângulo representativo da realidade educacional das crianças com DEA.
A perspectiva desses professores, que têm crianças e adolescentes com DEA em suas salas de aula, é que eles sentem falta de conhecimento sobre o quadro, falta de formação, dificuldade para encontrar apoio de outros profissionais, dificuldade para saber que conteúdo ensinar, descrença no desenvolvimento escolar de crianças com DEA, falta de base para acolher a família e falta de suporte tecnológico e de infraestrutura. O professor não acredita estar bem preparado para receber em sua sala de aula alunos com DEA. Necessitam de preparo mais especifico e de mais conhecimentos sobre os DEA e suas manifestações.
De acordo com os resultados encontrados nesta pesquisa, os professores demonstraram estar desorientados sobre inclusão e sobre como trabalhar com o aluno com DEA. Dessa forma conclui-se que os professores consideram-se despreparados e necessitam de ajuda para estruturação de práticas de ensino e de adequações curriculares, a fim de melhorar o desenvolvimento de linguagem, a interação social e aumentar a participação desses alunos em atividades acadêmicas.
Mais pesquisas como esta precisam ser realizadas, trabalhos a respeito do assunto necessitam ser publicados, para que a população brasileira possa se informar e entender melhor o significado da inclusão escolar e para que os alunos com necessidades especiais possam, efetivamente, se beneficiar.