versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.15 no.3 São Paulo jul./set. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082017ao4048
As doenças cardiovasculares (DCV) são a principal causa de morte ao redor do mundo, e a hipertensão arterial sistêmica (HAS) é um problema clínico associado à alta morbimortalidade cardiovascular.(1) A HAS é uma das doenças crônicas de maior prevalência na população idosa – no Brasil mais de 50% dos idosos são considerados hipertensos.(2)
O treinamento físico (TF) é uma abordagem não farmacológica bem estabelecida na prevenção e tratamento de HAS, já que reduz a pressão arterial (PA) e os fatores de risco associados, como obesidade, resistência à insulina e dislipidemia.(3) Além disso, o TF multicomponente (exercícios de resistência, força, coordenação, equilíbrio e flexibilidade) é capaz de aumentar níveis de força e atenuar o declínio da função física em idosos.(4-6) No entanto, os efeitos benéficos do TF podem ser interrompidos ou regredir durante períodos em que são suspensos. Isto pode ser especialmente problemático no caso de indivíduos idosos, que são mais suscetíveis a situações que levam à interrupção do TF, como trauma grave (por exemplo: lesão cerebral ou fratura complexa) e apresentam menor adesão a programas de TF – nestas situações, estes indivíduos apresentam os efeitos da falta de treino.(4) Assim, estratégias para atenuar estes efeitos podem ser eficazes, minimizando o problema ou evitando que o indivíduo volte às condições fisiológicas pré-treino.
Algumas estratégias nutricionais, como o alto consumo de leite e laticínios, apresentam associação inversa com a incidência de DCV.(7) Uma das possíveis explicações para os efeitos benéficos do consumo de leite na saúde cardiovascular é seu potencial de redução da PA, especialmente em indivíduos hipertensos.(8) Há também evidências de que a proteína do leite pode indiretamente melhorar a saúde metabólica, aumentando a massa corporal magra e a função musculoesquelética, o que pode reverter a perda progressiva de massa, força e função muscular trazidas pelo avanço da idade.(9)
Investigar se a preservação dos efeitos do treinamento físico, após 6 semanas de destreino em pacientes idosos hipertensos, está associada ao consumo adequado de leite e produtos lácteos (≥3 porções diárias).
Foram recrutados 44 indivíduos (>60 anos) diagnosticados com HAS e atendidos em uma Unidade Básica de Saúde, em Fortaleza, Ceará, para participar de um estudo quase-experimental. O objetivo foi avaliar os efeitos de um programa de treinamento multicomponente na capacidade funcional, aptidão física e na redução da PA.(6) Os dados foram coletados entre agosto de 2008 e fevereiro de 2009 no Centro Comunitário Luiza Távora da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social. Todos os participantes receberam as informações necessárias sobre o estudo e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, seguindo as normas do Conselho Nacional de Saúde e da Declaração de Helsinque. O protocolo da pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza (protocolo 120/2007, CAAE: 1146.0.000.037-07 e Registro de Ensaio RBR-2xgjh3). Foram considerados critérios de exclusão não cumprimento de pelo menos 80% das sessões e avaliações de destreino; participação em outro programa de TF; restrição calórica significativa; falta de entendimento das instruções devido a problemas cognitivos; hipertensão não controlada (>160/100mmHg); dor torácica; tontura ou desconforto; problemas articulares ou musculares ou qualquer condição prévia que impedisse a participação no programa de TF.
O programa de TF consistiu em sessões multicomponentes, duas vezes por semana, durante 16 semanas. As sessões tiveram duração aproximada de 60 minutos, conforme previamente descrito.(6) Após as 16 semanas, o programa de TF foi interrompido por 6 semanas. Dos 44 indivíduos selecionados, 8 deixaram o programa e 2 não obtiveram 80% de frequência. Desta forma, 34 pacientes completaram o programa, dos quais dois não completaram as avaliações de destreino (Figura 1). Para minimizar possíveis interferências de marcadas restrições calóricas, foram excluídos pacientes que apresentaram consumo de energia <2 desvios padrão do gasto calórico estimado (n=4). Assim, 28 indivíduos foram estratificados em dois grupos, de acordo com o consumo relatado de produtos lácteos: Grupo Baixo Consumo de Lácteos (BC), composto por pacientes com baixo consumo de leite e produtos lácteos (<3 porções/dia), e o Grupo Alto Consumo de Lácteos (AC), formado por indivíduos com consumo adequado de leite e produtos lácteos, conforme as recomendações atuais (≥3 porções/dia)(10) (Figura 1).
BC: Grupo Baixo Consumo de Lácteos; AC: Grupo Alto Consumo de Lácteos.
Figura 1 Esquema de participação dos voluntários
Os níveis de PA, peso corporal e testes motores foram medidos em três momentos: pré-treino, após 16 semanas de TF e após 6 semanas de destreino. Dados alimentares foram coletados após 6 semanas de destreino.
Para medições de altura, foi utilizado um estadiômetro (Altura Exata, Brasil) com precisão de 1mm; para peso corporal, balança Plenna®, com precisão de 100g. O índice de massa corporal (IMC) foi calculado por meio da equação massa corporal (kg)/altura2 (m2). Os níveis de glicemia, colesterol total (CT), colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL) e triglicérides foram obtidos a partir de formulários de registro individuais.
A medição da PA foi feita utilizando-se um esfigmomanômetro de coluna Missouri® e um estetoscópio Rappaport®, com o paciente sentado, com as pernas descruzadas e pés plantados. Para a análise, considerou-se a média de três medições feitas no braço esquerdo.(11) A análise teste-reteste apresentou um coeficiente de correlação intra-avaliador acima de 0,85 para PA sistólica (PAS) e PA diastólica (PAD).(8) A PA média (PAM) foi calculada por meio da fórmula: PAM = PAD + (PAS – PAD)/3.
Para a medição da capacidade aeróbica, utilizou-se o teste de marcha estacionária (TME),(12) em que os participantes iniciaram flexão do joelho, simulando a marcha sem sair do lugar, e o resultado foi o número de passos dados em um período de 2 minutos. A força muscular de membros inferiores e superiores foi determinada pelo teste da cadeira (TC) e pelo teste de flexão de cotovelo (TFC), respectivamente.(12) Para o TC, os pacientes iniciaram o teste sentados em uma cadeira com altura do assento de 43cm, com braços cruzados apoiados no tórax. Para o TFC, os participantes, sentados em uma cadeira, fizeram flexões do cotovelo e ciclos de extensão segurando um haltere (2kg para mulheres e 4kg para homens). Os resultados foram o número total de repetições feitas em 30 segundos.
Para avaliar a capacidade funcional, foi usado o teste de sentar, levantar e andar pela casa (SSMT - sit down, stand up, and move around the house test).(13) O SSMT consistia no paciente mover-se ao redor de dois cones, alternando duas vezes virar para a esquerda e para a direita. Todos os participantes tinham conhecimento dos testes motores antes de realizá-los.
Foi utilizado um questionário de frequência de alimentos previamente elaborado,(14) com aplicabilidade local, para avaliar a ingestão de energia e nutrientes. As quantidades foram registradas utilizando-se medições domésticas (gramas e porções) para facilitar o diálogo sobre as quantidades dos alimentos. Os dados sobre o consumo de alimentos foram processados pelo software DietWin®.(15) A ingestão de cálcio, sódio e macronutrientes foi comparada às recomendações atuais.(10,16,17)
A necessidade energética estimada (NEE) foi baseada na equação NEE = 662 – (9,53 x idade) + [AF x (15,91 x peso + 539,6 x altura)], em que AF corresponde ao nível de atividade física.(17)
Foi feita uma Análise de Variância Multivariada (MANOVA) de mudanças repetidas para examinar as diferenças entre os grupos e dentro deles, ao longo do tempo. Comparações post-hoc foram utilizadas quando p≤0,05.
Ademais, para verificar se existia associação entre a ingestão adequada de produtos lácteos durante a fase de destreino e a preservação dos ganhos observados com o programa de TF, foi calculado o porcentual delta (%) por meio da fórmula padrão: delta % = [(escore pós-destreino – escore após TF)/escore pré-teste]/100.
A média de idade nos grupos BC e AC foi 70,2±4,9 e 70,3±5,0 anos, respectivamente. Os valores iniciais para os dois grupos foram, respectivamente, 26,2±2,7kg/m2 e 25,5±2,3kg/m2 para IMC; glicemia de 109,5±15,3mg/dL e 107,4±14,6mg/dL; colesterol LDL de 108,2±13,7mg/dL e 111,7±10,3mg/dL; triglicérides de 164,3±26,4mg/dL e 158,2±24,7mg/dL. Indivíduos do sexo feminino representavam 71,4% dos participantes (n=20). As características clínicas estão descritas na tabela 1.
Tabela 1 Características clínicas iniciais dos participantes
Parâmetro | Grupo Baixo Consumo de Lácteos n (%) | Grupo Alto Consumo de Lácteos n (%) |
---|---|---|
Dislipidemia | 8 (28,6) | 6 (21,4) |
Sobrepeso* | 7 (25) | 6 (21,4) |
Diabetes mellitus tipo 2 | 4 (14,3) | 4 (14,3) |
Alcoolismo* | 1 (3,6) | 2 (7,1) |
Tabagismo | 3 (10,7) | 3 (10,7) |
Tratamento farmacológico | ||
IECAs | 11 (39,3) | 13 (46,4) |
Bloqueadores dos receptores AT1 da angiotensina II | 2 (7,1) | 1 (3,6) |
Betabloqueadores | 3 (10,7) | 3 (10,7) |
Diuréticos | 6 (21,4) | 5 (17,9) |
Bloqueadores de canais de cálcio | 1 (3,6) | 2 (3,6) |
Estatinas | 6 (35,7) | 4 (35,7) |
Aspirina | 1 (3,6) | 1 (3,6) |
Hipoglicemiantes orais | 6 (21,4) | 5 (17,9) |
* IMC>27kg/m2.
IECAs: i da enzima conversora da angiotensina; AT1: receptor de angiotensina.
No período pós-destreino, a ingestão média de leite e produtos lácteos relatada pelo grupo BC (1,7 porção por dia) mostrou-se significativamente mais baixa do que aquela reportada pelo grupo AC (3,3 porções por dia). A ingestão de cálcio do grupo BC (704mg/dia) também ficou muito abaixo do número relatado pelo grupo AC (1.396mg/dia). Além disso, 100% dos indivíduos do grupo AC apresentavam ingestão de cálcio maior que a Ingestão Diária Recomendada (IDR),(16) o que indicava leite e produtos lácteos como a fonte principal de cálcio. Todos os indivíduos consumiam os valores da IDR para proteínas (pelo menos 0,8g de proteína por quilo),(17) e a ingestão de proteína não apresentou diferença significativa entre os grupos (0,93g/kg no BC, e 1,19g/kg no AC). Isso sugeriu que os resultados não estava relacionados à ingestão de proteína total entre os grupos.
O aporte calórico relatado nos grupos BC e AC foi de 1.594,2±126,4kcal e 1.628,4±141,2kcal, respectivamente, e não apresentou diferença significativa entre os grupos (p>0,05). A ingestão de carboidratos correspondeu a 241,0g (56,5% das calorias totais) no grupo BC e 238,1g no grupo AC (54,7% das calorias totais). A ingestão de lipídeos foi de 53,3g (27,1% das calorias totais) no grupo BC e 49,1g (24,1% das calorias totais) no grupo AC (p>0,05). A ingestão de sódio relatada pelo grupo BC foi de 1.637mg, e 1.724mg, no grupo AC (p>0,05).
A tabela 2 mostra os resultados de massa corporal, IMC, níveis de PA e testes motores nos períodos pré-treino, pós-treino e pós-destreino para os grupos BC (n=16) e AC (n=12). Os valores pré-treino para cada variável não apresentaram diferenças entre os grupos. Após 16 semanas de TF, houve melhora significativa (p<0,05) na força de extremidades inferiores e superiores avaliada pelos testes TC e TFC, respectivamente. Também houve, em ambos os grupos, importante melhora da capacidade aeróbica e funcional no TME e no SSMT (p<0,05).
Tabela 2 Massa corporal, índice de massa corporal, níveis de pressão arterial e testes motores nos períodos pré-treino, pós-treino e pós-destreino nos grupos Baixo Consumo de Lácteos e Alto Consumo de Lácteos
Parâmetros | Pré-treino | Pós-treino | Pós-destreino | |||
---|---|---|---|---|---|---|
|
|
|
||||
BC | AC | BC | AC | BC | AC | |
Massa corporal, kg | 70,1±7,6 | 68,6±7,7 | 69,7±7,4* | 68,0±6,1* | 70,1±7,5*† | 68,1±6,2* |
IMC, m/kg2 | 26,2±2,7 | 25,5±2,3 | 26,1±2,7* | 25,3±2,2* | 26,2±2,7*† | 25,3±2,2* |
PAS, mmHg | 137,6±3,6 | 138,3±4,6 | 134,7±4,0* | 135,2±4,5* | 135,9±3,6*† | 135,8±4,7* |
PAD, mmHg | 90,1±4,4 | 91,3±5,3 | 87,5±4,3* | 88,3±4,9* | 88,8±4,3*† | 88,8±5,0* |
PAM, mmHg | 105,9±3,1 | 103,7±5,7 | 103,2±3,2* | 103,8±2,8* | 104,4±3,0*† | 104,2±2,9* |
TC, repetições | 10,3±2,6 | 9,6±2,1 | 11,2±2,0* | 12,0±1,8* | 10,4±2,0*† | 11,5±1,2* |
TFC, repetições | 11,5±2,4 | 10,8±1,6 | 13,5±2,1* | 13,0±1,4* | 13,2±1,9* | 12,7±1,3* |
TME, passos | 71,7±9,7 | 72,4±9,2 | 78,1±10,2* | 79,5±8,8* | 75,1±9,7*† | 77,8±8,6* |
SSMT, segundos | 42,1±6,9 | 42,0±8,0 | 38,2±5,0* | 38,0±6,3* | 40,2±6,0*† | 38,6±6,4* |
Valores expressos em média±desvio padrão. * diferença significativa versus pré-treino; p<0,001; † diferença significativa versus pós-treino; p<0,001.
BC: Grupo Baixo Consumo de Lácteos; AC: Grupo Alto Consumo de Lácteos; IMC: índice de massa corporal; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; PAM: pressão arterial média; TC: teste da cadeira; TFC: teste de flexão do cotovelo; TME: teste da marcha estacionária; SSMT: teste de sentar, levantar e andar pela casa.
Após 6 semanas de destreino, houve declínio da massa corporal, IMC, níveis de PA, força nas extremidades inferiores e capacidade aeróbica e funcional em comparação ao período pós-treino no grupo BC, observando-se aumento na massa corporal, IMC, PAS, PAD e PAM, e piora nos resultados dos testes TC, TME e SSMT. No grupo AC, não foram observadas diferenças na massa corporal, IMC, níveis de PA, ou nos testes TC, TME e SSMT entre os períodos pós-treino e pós-destreino. Não houve relação significativa entre as alterações nos testes motores e PA, e valores iniciais de massa corporal e IMC. Estes dados sugerem que a ingestão adequada de leite pode atenuar ou desacelerar a perda de benefícios trazidos pelo TF, como a melhora na massa corporal, níveis de PA, força de extremidades inferiores e capacidade aeróbica e funcional. Com relação à força de membros superiores, não foram observadas mudanças significativas entre os períodos pós-treino e pós-destreino nos dois grupos, conforme verificado pelo TFC (p>0,05).
Considerando-se que o principal objetivo do presente estudo era investigar os efeitos da ingestão de leite e produtos lácteos durante o destreino, os dados sobre ingestão nutricional foram coletados no período pós-destreino. Conforme observado na figura 2, as alterações relativas, que ocorreram entre os períodos de pós-treino e após 6 semanas de destreino, mostraram-se mais proeminentes no grupo BC para todos os parâmetros, exceto para resultados do TFC. Estes dados corroboram os achados demonstrados na tabela 2 e sugerem que a ingestão adequada de leite e produtos lácteos pode ajudar na manutenção de ganhos obtidos por meio do TF.
Dados expressos em média±desvio padrão.
BC: Grupo Baixo Consumo de Lácteos; AC: Grupo Alto Consumo de Lácteos; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; PAM: pressão arterial média; TFC: teste de flexão do cotovelo; TME: teste da marcha estacionária; SSMT: teste de sentar, levantar e andar pela casa.
Figura 2 Mudanças médias relativas nos níveis de pressão arterial e resultados dos testes motores, entre os períodos pós-treino e 6 semanas de destreino, nos Grupos Baixo Consumo de Lácteos e no Grupo Alto Consumo de Lácteos
O principal achado deste estudo foi a demonstração de que indivíduos idosos hipertensos foram capazes de manter os ganhos obtidos com 16 semanas de TF multicomponente após 6 semanas de destreino, quando sua ingestão de leite e produtos lácteos estava de acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira.(10) Esses efeitos foram observados nos níveis de PA, força nas extremidades inferiores e capacidade aeróbica e funcional. A manutenção dos efeitos hipotensivos induzidos pelo TF pode ajudar no controle da hipertensão, e melhorar a força muscular e a capacidade aeróbica, trazendo, assim, mais facilidade no desempenho de atividades diárias e melhor qualidade de vida.
O consumo adequado de produtos lácteos (≥3 porções/dia), especialmente como parte do plano Dietary Approaches to Stop Hypertension (DASH), apresenta muitos benefícios no controle da PA.(18) A ingestão destes produtos inclui contribuição significativa para os valores diários recomendados de proteína e cálcio, bem como presença de peptídeos bioativos.(19) A ingestão de cálcio pode influenciar diversos mecanismos que envolvem hormônios calciotróficos, reatividade vascular, níveis de cálcio intracelular e interações com sistema renina-angiotensina.(19,20) Os peptídeos bioativos agem principalmente no sistema renina-angiotensina, exibem propriedades antioxidantes e alteram os níveis lipídicos no sangue.(19)
Os resultados do presente estudo corroboram o fato de que é difícil manter níveis adequados de cálcio quando o consumo de leite e produtos lácteos é menor do que 3 porções/dia.(21) Isso demanda atenção, pois a ingestão média de cálcio em indivíduos idosos é de 527mg/dia, e aproximadamente 90% dos brasileiros idosos têm ingestão de cálcio abaixo dos valores de IDR.(22)
Ademais, a manutenção dos ganhos relacionados a testes motores no grupo AC após o período de destreino indica efeitos benéficos da ingestão adequada de leite e produtos lácteos para a saúde musculoesquelética. Embora a quantidade de proteína ingerida seja similar entre os grupos, sabe-se que as proteínas com alto valor biológico, especialmente aquelas derivadas do leite, podem melhorar propriedades contráteis de fibra única por meio da otimização da síntese proteica, o que leva a melhores força e função musculares.(9)
A melhora na função muscular mecânica induzida pelo TF geralmente resulta em uma melhor capacidade funcional dos idosos para o desempenho das atividades diárias.(9) O teste SSMT enfatiza atividades de locomoção e, como indicador de capacidade funcional, sugeriu que o grupo AC conseguiu preservar os ganhos obtidos com o TF. Isso foi provavelmente devido à retenção de ganhos obtidos na força de extremidades inferiores e na capacidade aeróbica. Este aspecto é de particular importância, já que os idosos hipertensos têm 4,2 vezes mais chance de desenvolverem limitações funcionais do que aqueles sem hipertensão.(23)
Ao contrário do observado na força de extremidades inferiores, a força de extremidades superiores permaneceu significativamente mais alta, após as 6 semanas de destreino, do que estava antes do TF em ambos os grupos. Estes resultados corroboram estudos prévios com indivíduos idosos incluindo a mesma duração de destreino e frequência semanal.(4) Isso sugere que intervenções de TF podem ter impacto diferente em diversos grupos musculares, provavelmente devido às características das sessões, com a considerável utilização de extremidades superiores, e à duração total do programa de TF que, em nosso estudo (16 semanas), foi mais longa que na investigação de Toraman (9 semanas).(4)
Estima-se que entre 20 e 25% dos indivíduos hipertensos não apresentam redução na PA após o exercício físico. A heterogeneidade da resposta individual aos efeitos anti-hipertensivos do exercício físico é amplamente atribuída a componentes genéticos e polimorfismos.(24) Porém, os componentes genéticos não são suficientes para explicar esta variação, e há evidências que sugerem que a ingestão de nutrientes e componentes alimentares podem contribuir para esta resposta heterogênea ao exercício físico.(20) No presente estudo, a influência da ingestão de produtos lácteos sobre os níveis de PA também pode ser observada nos períodos de destreino. Portanto, componentes alimentares devem ser investigados mais a fundo, com relação à sua possível interferência na resposta anti-hipertensiva ao exercício físico.
As limitações do presente estudo devem ser reconhecidas. Considerando-se que os dados sobre consumo nutricional foram coletados apenas no período pós-destreino, não podemos garantir que os participantes tenham mantido os mesmos hábitos alimentares durante todo o período de TF e destreino. Os estudos futuros devem considerar uma coleta de dados mais frequente sobre o consumo alimentar, tendo controle mais rígido sobre as variáveis que podem interferir em níveis de PA.
Oferecemos evidências de que a retenção de benefícios do treinamento físico está associada à ingestão adequada de leite e produtos lácteos (≥3 porções/dia) em idosos hipertensos, atenuando o aumento de níveis da pressão arterial e a perda de força muscular nas extremidades inferiores e a capacidade aeróbica, resultando em melhor retenção da capacidade funcional após 6 semanas de destreino.