versão impressa ISSN 0101-2800versão On-line ISSN 2175-8239
J. Bras. Nefrol. vol.38 no.4 São Paulo out./dez. 2016
http://dx.doi.org/10.5935/0101-2800.20160078
Prezado Editor,
Li o artigo de pesquisa intitulado "Preditores de Insuficiência Renal Aguda e Mortalidade em uma Unidade de Terapia Intensiva," de autoria de Luis Alberto Batista Peres, Vanessa Wandeur e Tiemi Matsuo, publicado em seu prestigioso periódico, o Jornal Brasileiro de Nefrologia (2015; 37:38-46).1 Gostaria de parabenizar os autores pelo bem-sucedido artigo e fazer algumas contribuições.
No artigo, os autores envidaram vigorosos esforços para identificar os preditores mais significativos para insuficiência renal aguda (IRA) e mortalidade entre pacientes atendidos em uma unidade de terapia intensiva (UTI). Para tal fim, os autores ofereceram abrangentes comparações como IRA x não-IRA, mortalidade x não-mortalidade e diálise x não-diálise. Ventilação mecânica invasiva (VMI), creatinina sérica e ureia foram identificados como preditores significativos de IRA, enquanto VMI, ureia, hipernatremia e lactato foram elencados como fatores de risco significativos para mortalidade no estudo em questão.
IRA em UTI é normalmente definida em função dos níveis de creatinina sérica (SCr) ou diurese, como fizeram os autores do estudo.2 Na Tabela 4, os autores incluíram SCr e diurese na análise univariada e SCr na análise multivariada. Acreditamos que a análise destas variáveis nos casos de IRA não é adequada, especialmente porque todas são marcadores de função renal com base nas quais os critérios para IRA são definidos. Pode ser esta a razão para haver razões de chance (odds ratios) tão elevadas nas análises univariada e multivariada (diurese: 2936,00 (univariada) e SCr: 96,08 (univariada) e 67,65 (multivariada).
Além disso, o intervalo de confiança (IC) mais amplo de 95% na regressão logística corrobora ainda mais o fato de a inclusão destas variáveis ter distorcido o modelo da regressão. Não identificamos estudos que avaliem SCr e diurese enquanto preditores independentes de IRA, uma vez que tais variáveis servem para definir a IRA e não predizer sua ocorrência. Até onde sabemos, quase todos os estudos que avaliam os fatores de risco da IRA excluem variáveis diretamente relacionadas à presença de IRA da análise de regressão.3-5
Distúrbios eletrolíticos são manifestações comuns em IRA; os autores testaram também estas manifestações (hiper e hiponatremia, hiper e hipocalemia, bicarbonato) na análise univariada, o que pode minar ainda mais a robustez do modelo de regressão. As variáveis diretamente relacionadas a IRA (SCr, BUN, baixa diurese, sedimento urinário e distúrbios eletrolíticos) devem ser excluídas da análise, uma vez que são características cardeais da IRA (variáveis dependentes).
Com efeito, os autores ofereceram dados detalhados e abrangentes sobre os pacientes atendidos em UTI. Uma maior cautela na seleção das variáveis independentes para a análise de regressão identificará importantes preditores para IRA e mortalidade. A exclusão de SCr, diurese e distúrbios eletrolíticos da regressão logística poderá proporcionar a identificação de outros preditores úteis para IRA e a produção de um modelo de regressão mais robusto.