versão On-line ISSN 2316-9117
Fisioter. Pesqui. vol.24 no.1 São Paulo jan./mar. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/00000024012017
No ano de 2015, iniciou-se no Brasil o surto de infecção pelo vírus Zika (ZIKV), transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. Os graves danos neurológicos nos recém-nascidos fizeram que a síndrome congênita do ZIKV ganhasse repercussão mundial, sendo declarada “questão internacional de emergência” pela Organização Mundial de Saúde. Entre as principais consequências da infecção pelo ZIKV estão as anormalidades fetais detectadas por meio do ultrassom em 30% das gestantes comprovadamente positivas para o ZIKV. Alterações fetais, como diminuição do crescimento intrauterino, volume do líquido amniótico anormal, fluxo cerebral ou umbilical anormal, calcificações ventriculares e outras alterações do sistema nervoso central, além da morte fetal, foram encontradas. Parte dos achados ultrassonográficos durante a gestação foram confirmados nos recém-nascidos avaliados até o momento. Nos casos mais graves, as alterações neurológicas podem resultar na microcefalia, que é acompanhada de grande comprometimento funcional e atraso no desenvolvimento neuropsicomotor.
Esses sinais e sintomas foram elegantemente reportados no New England Journal of Medicine1 a partir do estudo de coorte conduzido pelo Laboratório de Doenças Febris Agudas da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Desde o início de 2016, o Laboratório de Avaliação Neurofuncional do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo tem colaborado na avaliação de riscos para danos neurológicos e caracterização do desenvolvimento neuropsicomotor dos recém-nascidos e lactentes dessa coorte. Nossos resultados até o momento demonstram que cerca de 40% desses recém-nascidos e das lactentes apresentam riscos para disfunções neurológicas, e a grande maioria não possui microcefalia.
Diante disso, nosso alerta é para a necessidade de acompanhamento pela equipe multiprofissional de todos os filhos das gestantes infectadas com o ZIKV, mesmo na ausência da microcefalia. Cabe ressaltar, também, que somente 20% das pessoas infectadas pelo ZIKV apresentam sintomas. Ou seja, existe uma população de lactentes quatro vezes maior do que a vista até então com risco potencial para alterações no desenvolvimento neuropsicomotor. A fisioterapia tem seu papel fundamental na avaliação e na escolha das condutas adequadas para estimular o desenvolvimento motor desses bebês.
Devem ser implementadas políticas assistenciais para a busca ativa desses lactentes, entre os filhos de mães infectadas, com risco para alterações no desenvolvimento das sintomáticas ainda sem comprovação da exposição ao ZIKV, bem como dos residentes em áreas de risco. Profissionais da saúde e gestores devem, portanto, direcionar seus esforços em estratégias para a identificação e intervenção para minimizar os danos ao desenvolvimento neuropsicomotor dessa população, ainda muito subestimada, de crianças com a síndrome congênita do ZIKV.