versão impressa ISSN 1413-8123
Ciênc. saúde coletiva vol.19 no.11 Rio de Janeiro nov. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320141911.13922013
This study sought to identify factors involved in access to the services of a basic health unit. It is a cross-sectional, population-based study involving 101 randomly-selected families residing in the area covered by the health unit. An adult resident of each household was interviewed. The response variable was whether or not the resident frequented the health unit if he/she or anyone in the family required assistance to resolve a health issue. The independent variables investigated were service provision aspects, demographic and socio-economic characteristics, individual habits, morbidities and use of the health unit. In addition to descriptive and univariate analysis, logistic regression was applied in the multivariate analysis. The results show that access to the basic health unit is associated with the treatment received previously (OR = 3,224) with accessibility (OR = 0,146) and micro-area of residence (OR = 10,918). These findings suggest that access is related to the impressions created by the care received at the health unit and is based on experiences with the service, but can also be strongly modulated by individual aspects and factors related to the territory.
Key words: Access; Accessibility; Basic health services
O conceito de acesso aos serviços de saúde se relaciona: às necessidades de saúde, à demanda, à oferta e ao uso desses serviços.
Andersen1 e Penchansky e Thomas2, mencionam que o conceito de acesso ainda não está bem definido e que, por isso, ele é empregado de forma imprecisa. Esses autores1,2 consideram que a operacionalização do conceito de acesso é complexa e que os métodos para sua avaliação ainda precisam ser melhor elucidados.
Travassos e Martins3 analisaram o conceito de acesso formulado por diferentes autores e concluíram que: o entendimento sobre o que é acesso apresenta variações amplas entre eles e que estas são fruto de suas diferentes visões e enfoques sobre o tema. Assim podemos dizer que existe uma dispersão de sentidos no conceito de acesso.
Para Andersen1, acesso é um dos elementos dos sistemas de saúde, ligado à organização dos serviços, abrangendo tanto a entrada como o recebimento dos cuidados subsequentes. Para esse autor1, a influência do acesso no uso de serviços de saúde é mediada por fatores individuais. Posteriormente, Andersen1 ampliou o seu conceito de acesso, incluindo a etapa de utilização de serviços de saúde, passando a considerar que também é influenciado por fatores contextuais (políticas de saúde e oferta de serviços)1. Nas últimas revisões do seu conceito, Andersen1 procura incluir os efeitos do uso dos serviços na saúde e a satisfação das pessoas com os serviços.
Donabedian4 utiliza o termo acessibilidade, o qual define como um dos aspectos da oferta de serviços que interfere na capacidade de os indivíduos fazerem uso dos mesmos e destes responderem às necessidades de saúde de uma determinada população. Este autor4 distingue duas dimensões da acessibilidade que se inter-relacionam: a sócio-organizacional e a geográfica.
Para Penchansky e Thomas2, o acesso é o reflexo do grau de ajuste entre os clientes e o sistema de saúde, uma relação entre a oferta e os indivíduos. Ideia semelhante à de Donabedian4, contudo, diferem desse autor4 ao inserirem no conceito atributos dos indivíduos. O conceito de acesso de Penchansky e Thomas2 é composto por várias dimensões que expressam a relação entre a oferta e os indivíduos: disponibilidade de serviços; acessibilidade (geográfica); acolhimento; capacidade de compra; e, aceitabilidade.
Para Santos5, o acesso representa uma dimensão associada à organização do sistema e dos serviços de saúde importante e imprescindível para que os princípios básicos do Sistema Único de Saúde (SUS), entre os quais estão a universalidade e a equidade, sejam alcançados.
Diante desses diferentes referenciais, a ideia que prevalece para nós é que o acesso é uma condição necessária para que a população faça uso dos serviços de saúde quando sentir necessidade1-5.
Na organização do SUS, o acesso dos usuários deve ocorrer preferencialmente na atenção básica. Contudo, Campos et al.6 e Santos5,7 mencionam que a atenção básica está longe de constituir a principal porta de entrada no sistema, perdendo espaço para os serviços de média complexidade.
Entendemos que estudar o acesso buscando conhecer quais os fatores que o favorecem e os que o dificultam é importante e necessário para que os serviços básicos de saúde possam organizar e planejar sua atuação.
Assim, este trabalho teve como objetivo identificar os fatores associados ao acesso aos serviços básicos de saúde partindo do pressuposto de que fatores atrelados a diferentes dimensões do indivíduo e dos serviços de saúde se relacionam na sua construção.
Este foi um estudo quantitativo com desenho transversal, de caráter descritivo e de base populacional, feito com os moradores da área de abrangência da Unidade de Saúde Américo Bertão, Jardim Eldorado, município de Cordeirópolis, SP, Brasil.
Foi selecionada uma amostra aleatória simples, constituída por 100 famílias cadastradas no Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). O cálculo amostral foi realizado partindo da hipótese de que o fator considerado tinha uma prevalência de 50%, que é a que fornece a amostra de maior tamanho, aceitando-se que aquela a ser encontrada variasse em 10%, com nível de 95% de confiança (IC95%), obtendo-se um número igual a 85 famílias, sendo acrescidos 20%, considerando possíveis casos de perdas e recusas durante a coleta, para totalizar uma amostra final próxima a 100 famílias. De cada família foi incluído na pesquisa um morador com 18 anos ou mais para ser entrevistado.
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista, no período compreendido entre 27/06 e 01/07/2011, no horário comercial por uma equipe treinada e calibrada por um dos autores. Se o entrevistador não encontrasse ninguém do domicílio da família sorteada, ele retornaria à casa por mais três vezes, em dias e horários diferentes. Se persistisse o insucesso nas tentativas de entrevista, a família selecionada seria substituída pela família subsequente, de acordo com o cadastro do SIAB. No momento da entrevista, os moradores foram informados sobre os objetivos da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizado junto ao Comitê de Ética, de acordo com Resolução CNS/MS 196/968.
As informações foram obtidas por meio de um questionário semiestruturado com questões abertas e fechadas, elaborado conjuntamente pela pesquisadora, pela coordenadora e pelos agentes comunitários de saúde (ACS) do serviço de saúde, levando em consideração o referencial teórico, as características do serviço e as particularidades da população. A fim de validar o instrumento elaborado, foi realizado um estudo piloto em duas etapas, permitindo, desta maneira, fazer ajustes para uma melhor compreensão do entrevistado e do entrevistador antes da realização do estudo.
A variável resposta deste estudo foi a informação do entrevistado ao responder a seguinte pergunta: "Procura a unidade de saúde como primeira opção, quando alguém na família precisa de atendimento de saúde?" A questão permitia as respostas sim e não. Caso a resposta fosse negativa, o entrevistado precisava informar os motivos de não procurar primeiro esse serviço de saúde.
As variáveis preditoras investigadas abrangiam as características da oferta do serviço de saúde que facilitam ou dificultam o seu uso pelos clientes (variáveis geográficas e sócio-organizacionais). Foram também incluídas variáveis demográficas, socioeconômicas, morbidades, composição familiar, uso do serviço de saúde, costumes individuais com influência no acesso e uso dos serviços de saúde.
As variáveis de ordem "geográfica" foram analisadas a partir das seguintes informações: dificuldades para chegar à unidade de saúde (sim e não), se sim quais?; tempo gasto para chegar (trajeto) à unidade de saúde (relato do tempo em minutos); localização da unidade de saúde (classificação e expressão da percepção desse aspecto).
As variáveis "sócio-organizacionais" foram estudadas a partir das seguintes informações: dificuldades para conseguir o agendamento da consulta com o médico (sim e não), se sim quais?; tempo de espera para ser atendido pelo médico (relato do tempo em dias e expressão da percepção desse tempo); espaço físico, atendimento, rotina de trabalho, horário de funcionamento e profissionais (inclusive o profissional médico) da unidade de saúde (classificação e expressão da percepção desses aspectos).
As variáveis "socioeconômicas" e "demográficas" foram: a data de nascimento (dia/mês/ano); idade (anos completos); sexo (masculino ou feminino); cor (autorreferida); ocupação (Classificação Brasileira de Profissões); escolaridade (anos completos de estudo); problema de saúde grave (sim ou não); se sim quais?; convênio médico (sim ou não); se sim, qual?; renda familiar per capita (salários mínimos); disponibilidade de computador no domicilio (sim ou não); disponibilidade de acesso à Internet no domicílio (sim ou não); disponibilidade de automóvel no domicílio (sim ou não); microárea de residência (1, 2, 3, 4); naturalidade (cidade e estado); tempo de moradia no bairro (dias, meses ou anos).
As variáveis relacionadas à "composição familiar" foram: estado civil (casado, solteiro, amasiado, viúvo, divorciado, separado e outros); número de moradores no domicílio (total de moradores); número de moradores no domicílio que pertencem à família (total de moradores que pertencem à família); número de filhos na família que residem no domicílio (total de filhos).
A variável "uso dos serviços de saúde" foi avaliada mediante a seguinte informação: uso da unidade de saúde, pelo entrevistado ou por alguém da família, nos últimos 6 meses (sim ou não); se sim, quantas vezes e por qual motivo?
As variáveis relacionadas aos "costumes individuais" foram investigadas a partir das às seguintes informações: participação em algum espaço social no bairro (sim ou não); se sim, qual?; participação nas atividades realizadas pelo Posto de Saúde do bairro?" (sim ou não); se não, por qual motivo?; procura de outros serviços para resolver seus problemas de saúde (sim ou não); se sim, quais?
A análise quantitativa dos dados contou com a descritiva, a qual foi realizada por meio do cálculo da média e desvio-padrão para as variáveis numéricas com distribuição normal; da apresentação da mediana e da distribuição de quartis para as variáveis numéricas com distribuição não normal; e por meio de proporções para as variáveis categóricas e lógicas.
Para estudar a associação das variáveis independentes com a variável resposta, algumas variáveis categóricas foram transformadas em variáveis lógicas. A análise univariada foi realizada por meio da razão de Chances, ou do teste qui-quadrado de Pearson (χ2), ou do teste exato de Ficher. Apenas as variáveis que estavam associadas com a variável resposta com nível de significância de 5% foram levadas para o modelo de regressão logística binária, utilizando o procedimento stepwise, sendo adotado o nível de significância de 5%.
Todas as análises foram feitas com os programas estatísticos Epi Info e o SAS (Statistical Analysis System).
Na análise dos dados qualitativos, para cada questão aberta foram criadas categorias a partir da leitura prévia de todo o conteúdo do questionário respondido. Todas as respostas categorizadas foram convertidas em variáveis lógicas. A validação das categorias criadas foi realizada conjuntamente por um dos autores junto a todos os entrevistadores por meio de um processo que buscou, através da leitura de questionários sorteados aleatoriamente e discussões, a classificação das respostas, por todos os envolvidos, de forma idêntica ou semelhante em todos os questionários escolhidos aleatoriamente.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.
No total, foram entrevistados 101 moradores da área de abrangência da unidade de saúde, 77 (76.2%) deles referiram procurar o serviço de saúde como primeira opção (Tabela 1).
Tabela 1 Distribuição dos moradores entrevistados segundo a procura da unidade de saúde como primeira opção, quando alguém na família precisa de atendimento de saúde, Jardim Eldorado, Cordeirópolis, 2011.
Variáveis e categorias | n = 101 | |
---|---|---|
Procura a unidade de saúde como primeira opção | ||
Sim | 77 (76.2%) | |
Não | 24 (23.8%) |
Fonte: Questionários de avaliação do acesso 2011.
A média de "idade" dos entrevistados é de 41 anos (±15.6) e 74,3% deles são do sexo feminino, 59.4% têm a cor autorreferida branca, 75,2% são naturais de fora do estado de São Paulo; 69.4% moram no bairro há mais de 10 anos, 25.7% residem na microárea 1, 28.7% na microárea 2, 31.7% na microárea 3 e 13.9% na microárea 4, 51.5% possuem mais de 08 anos completos de estudo; 73,3% referiram que a renda per capita na sua família era de até um salário mínimo, 37.6% referiram ter problemas de saúde, 55.4% não possuem convênio médico, 64.4% dispõem de computador, 70.3% não dispõem de internet, 53.5% possuem automóvel e 28.7% trabalham como ceramista (Tabela 2).
Tabela 2 Distribuição dos moradores entrevistados segundo as variáveis preditoras, Jardim Eldorado, Cordeirópolis, 2011.
Variáveis e categorias | n =101 | |
---|---|---|
Idade média (dp), anos | 41 anos (±15.6) | |
Sexo | ||
Feminino | 75 (74.3%) | |
Masculino | 26 (25.7%) | |
Cor (autorreferida) | ||
Branca | 60 (59.4%) | |
Outras | 41 (40.6%) | |
Naturalidade | ||
São Paulo | 25 (24.8%) | |
Outros Estados | 76 (75.2%) | |
Tempo moradia bairro | ||
Até 10 anos | 31 (30.6%) | |
Mais de 10 anos | 70 (69.4%) | |
Microárea de residência | ||
1 | 26 (25.7%) | |
2 | 29 (28.7%) | |
3 | 32 (31.7%) | |
4 | 14 (13.9%) | |
Ocupação | ||
Ceramista | 29 (28.7%) | |
Outras | 72 (71.3%) | |
Escolaridade | ||
Até 08 anos | 49 (48.5%) | |
Mais de 08 anos | 52 (51.5%) | |
Renda familiar per capita | ||
Até um SM | 72 (73.3%) | |
Mais de um SM | 29 (26.7%) | |
Estado civil | ||
Casado | 57 (56.4%) | |
Outros | 44 (43.6%) | |
Moradores no domicílio | ||
Até cinco | 84 (83.2%) | |
Mais de cinco | 17 (16.8%) | |
Moradores da família no domicílio | ||
Até cinco | 85 (84.2%) | |
Mais de cinco | 16 (15.8%) | |
Filhos no domicílio | ||
Até três | 92 (91.0%) | |
Mais de três | 09 (9.0%) | |
Problema de saúde grave | ||
Sim | 38 (37.6%) | |
Não | 63 (62.4%) | |
Convênio médico | ||
Sim | 45 (44.6%) | |
Não | 56 (55.4%) | |
Computador | ||
Sim | 36 (35.6%) | |
Não | 65 (64.4%) | |
Estado civil | Até 15 dias | |
Casado | 57 (56.4%) | |
Outros | 44 (43.6%) | |
Moradores no domicílio | ||
Até cinco | 84 (83.2%) | |
Mais de cinco | 17 (16.8%) | |
Moradores da família no domicílio | ||
Até cinco | 85 (84.2%) | |
Mais de cinco | 16 (15.8%) | |
Filhos no domicílio | ||
Até três | 92 (91.0%) | |
Mais de três | 09 (9.0%) | |
Problema de saúde grave | ||
Sim | 38 (37.6%) | |
Não | 63 (62.4%) | |
Convênio médico | ||
Sim | 45 (44.6%) | |
Não | 56 (55.4%) | |
Computador | ||
Sim | 36 (35.6%) | |
Não | 65 (64.4%) | |
Internet | ||
Sim | 30 (29.7%) | |
Não | 71 (70.3%) | |
Automóvel | ||
Sim | 54 (53.5%) | |
Não | 47 (46.5%) | |
Uso da unidade de saúde nos últimos seis meses | ||
Sim | 90 (89.1%) | |
Não | 11 (10.9%) | |
Participação atividades da unidade | ||
Sim | 10 (9.9%) | |
Não | 91 (90.1%) | |
Participação espaço social | ||
Sim | 51 (50.5%) | |
Não | 97 (96.0%) | |
Procura outros serviços | ||
Sim | 84 (83.2%) | |
Não | 17 (16.8%) | |
Dificuldade para chegar à unidade de saúde | ||
Sim | 04 (4.0%) | |
Não | 97 (96.0%) | |
Tempo de trajeto | ||
Até 30 minutos | 98 (97.0%) | |
Mais de 30 minutos | 03 (3.0%) | |
Dificuldade agendamento consulta | ||
Sim | 54 (53.5%) | |
Não | 47 (46.5%) | |
Tempo de espera | ||
Até 15 dias | 53 (52.5%) | |
Mais de 15 dias | 48 (47.5%) |
Fonte: Questionários de avaliação do acesso 2011.
Em relação às variáveis "composição familiar"; "uso da unidade nos últimos 6 meses" e "costumes individuais", 56.4% dos moradores entrevistados são casados, 83.2% referiram ter até cinco moradores no domicílio; 84.2% até cinco moradores no domicílio que pertencem à família; e 91.0% até três filhos que residem no domicílio; 89.1% referiram ter usado a unidade nos últimos 6 meses; 90.1% não participam das atividades da unidade de saúde; 50.5% participam de algum espaço social no bairro; e 83.2% procuram outros serviços para resolver problemas de saúde (Tabela 2).
Em relação às variáveis de ordem "geográfica" e "sócio-organizacional", 96.0% dos entrevistados não referiram dificuldade para chegar à unidade de saúde; 97.0% referiram gastar menos de 30 minutos para chegar a ela; 53.5% referiram dificuldade no agendamento da consulta; 52.5% relataram ser necessário esperar até 15 dias pela consulta, e 56.4% percebem este tempo como adequado (Tabelas 2 e 3).
Tabela 3 Distribuição dos moradores entrevistados segundo a percepção e a classificação dos aspectos geográficos e sócio-organizacionais, Jardim Eldorado, Cordeirópolis, 2011.
Variáveis e categorias | n=101 | ||
---|---|---|---|
Percepção | |||
Percepção do tempo espera | |||
Adequado | 57 (56.4%) | ||
Inadequado | 44 (43.6%) | ||
Percepção da localização | |||
Adequada | 90 (89.1%) | ||
Inadequada | 11 (10.9%) | ||
Percepção do espaço físico | |||
Adequado | 81 (80.2%) | ||
Inadequado | 20 (19.8%) | ||
Percepção do atendimento | |||
Adequado | 62 (61.4%) | ||
Inadequado | 39 (38.6%) | ||
Percepção da rotina trabalho | |||
Adequada | 58 (57.4%) | ||
Inadequada | 43 (42.6%) | ||
Percepção do horário de funcionamento | |||
Adequado | 60 (59.4%) | ||
Inadequado | 41 (40.6%) | ||
Percepção dos profissionais | |||
Adequado | 72 (71.3%) | ||
Inadequado | 29 (28.7%) | ||
Classificação | |||
Classificação da localização | |||
Ótimo | 14 (13.8%) | ||
Bom | 78 (77.3%) | ||
Regular | 06 (5.9%) | ||
Ruim | 03 (3.0%) | ||
Péssimo | - | ||
Não sabe | - | ||
Classificação do espaço físico | |||
Ótimo | 04 (4.0%) | ||
Bom | 79 (78.2%) | ||
Regular | 15 (14.8%) | ||
Ruim | 01 (1.0%) | ||
Péssimo | - | ||
Não sabe | 02 (2.0%) | ||
Classificação do atendimento | |||
Ótimo | 10 (9.9%) | ||
Bom | 57 (56.4%) | ||
Regular | 24 (23.7%) | ||
Ruim | 02 (2.0%) | ||
Péssimo | 03 (3.0%) | ||
Não sabe | 05 (5.0%) | ||
Classificação do horário de funcionamento | |||
Ótimo | - | ||
Bom | 72 (71.3%) | ||
Regular | 23 (22.7%) | ||
Ruim | 04 (4.0%) | ||
Péssimo | - | ||
Não sabe | 02 (2.0%) | ||
Classificação dos profissionais | |||
Ótimo | 07 (7.0%) | ||
Bom | 66 (65.3%) | ||
Regular | 23 (22.7%) | ||
Ruim | 02 (2.0%) | ||
Péssimo | - | ||
Não sabe | 03 (3.0%) |
Fonte: Questionários de avaliação do acesso 2011.
Ao analisar a percepção e a classificação dos aspectos "geográficos" e "sócio-organizacionais", a maior parte dos moradores entrevistados percebe de forma adequada e classificou de forma positiva todos os aspectos abordados. Entretanto, um incremento no percentual de entrevistados que percebem a "rotina de trabalho" (42.6%) de forma inadequada é notado quando comparado ao percentual de entrevistados que percebem da mesma forma os demais aspectos. Da mesma maneira é observado um aumento no percentual de moradores que classificou a "rotina de trabalho" (25.6%) como regular quando comparado ao percentual de entrevistados que classificou da mesma forma os demais aspectos (Tabela 3).
A análise univariada (Tabela 4) aponta que as variáveis associadas com a variável resposta foram: "microárea de residência" (X2 = 7.83 p = 0.04957112), "naturalidade" (OR = 6.40 IC95% = 2.327-17.61), "uso da unidade nos últimos seis meses" (OR = 4.80 - IC95% = 1.316-17.51), "participação nas atividades da unidade de saúde" (Teste Fisher p = 0.0570978), "procura de outros serviços" (Teste Fisher p = 0.0061348), "classificação do atendimento da unidade de saúde" (X2 = 20.20 p-valor 0.00114526), "classificação do horário de funcionamento da unidade de saúde" (X2 = 11.36 p-valor 0.02281417) e "classificação dos profissionais da unidade de saúde" (X2 = 11.29 p-valor 0.02352699).
Tabela 4 Resultados da análise univariada - associação entre procura da unidade de saúde como primeira opção quando alguém na família precisa de atendimento de saúde e as variáveis de interesse do estudo, Jardim Eldorado, Cordeirópolis, 2011.
Variáveis | Procura a unidade | n | Análise univariada (n=101) | |
---|---|---|---|---|
Sexo | OR= 1.257 (0.453-3.491) | |||
Feminino | 58 | 75 | ||
Cor | OR= 1.06 (0.418-2.688) | |||
Branca | 46 | 60 | ||
Estado civil | OR= 2.193 (0.864-5.569) | |||
Casado | 47 | 57 | ||
Moradores no domicílio | OR= 0.985 (0.288-3.362) | |||
Até cinco | 64 | 84 | ||
Moradores fam. domicílio | OR= 1.083 (0.314-3.735) | |||
Até cinco | 65 | 85 | ||
Filhos no domicílio | OR= 0.375 (0.044-3.161) | |||
Até três | 69 | 92 | ||
Naturalidade/ Estado | OR= 6.402 (2.327-17.61) | |||
Outros Estados | 65 | 76 | ||
Microárea de residência | p= 0.04957112x | |||
01 | 17 | 26 | ||
02 | 26 | 29 | ||
03 | 26 | 32 | ||
04 | 08 | 14 | ||
Tempo de moradia bairro | OR= 1.015 (0.405-2.547) | |||
Até 10 anos | 42 | 55 | ||
Ocupação | OR= 0.75 (0.28-2.01) | |||
Ceramista | 21 | 29 | ||
Escolaridade | OR= 1.437 (0.569-3.628) | |||
Até oito anos | 39 | 49 | ||
Renda familiar per capita | OR= 0.889 (0.311-2.543) | |||
Até um SM | 56 | 74 | ||
Convênio médico | OR= 0.602 (0.239-1.513) | |||
Sim | 32 | 45 | ||
Computador | OR= 0.568 (0.223-1.446) | |||
Sim | 25 | 36 | ||
Internet | OR= 0.625 (0.238-1.643) | |||
Sim | 21 | 30 | ||
Automóvel | OR= 0.772 (0.306-1.95) | |||
Sim | 40 | 54 | ||
Problema de saúde grave | OR= 2.133 (0.762-5.97) | |||
Sim | 32 | 38 | ||
Uso unidade últimos 6 meses | OR= 4.8 (1.316-17.51) | |||
Sim | 72 | 90 | ||
Participação espaço social | OR= 1.026 (0.410-2.566) | |||
Sim | 39 | 51 | ||
Participação ativ. unidade | p= 0.0570978y | |||
Sim | 10 | 10 | ||
Procura outros serviços | p= 0.0061348y | |||
Sim | 60 | 84 | ||
Dificuldade chegar unidade | OR = 0.932 (0.092-9.404) | |||
Sim | 03 | 04 | ||
Tempo de trajeto | OR = 6.909 (0.598-79.82) | |||
Até 30 minutos | 76 | 98 | ||
Dificuldade agendamento | OR = 2.344 (0.913-6.015) | |||
Sim | 45 | 54 | ||
Tempo de espera consulta | OR = 0.585 (0.228-1.496) | |||
Até 15 dias | 38 | 53 | ||
Percepção tempo de espera | OR = 0.445 (0.166-1.195) | |||
Adequado | 40 | 57 | ||
Percepção localização | OR = 1.232 (0.3-5.067) | |||
Adequado | 69 | 90 | ||
Percepção espaço físico | OR = 0.504 (0.134-1.895) | |||
Adequado | 60 | 81 | ||
Percepção atendimento | OR = 1.180 (0.420-3.340) | |||
Adequado | 48 | 62 | ||
Percepção rotina trabalho | OR = 1.19 (0.473-2.992) | |||
Adequado | 45 | 58 | ||
Percepção horário func. | OR = 1.06 (0.418-2.688) | |||
Adequado | 46 | 60 | ||
Percepção dos profissionais | OR = 1.029 (0.375-2.825) | |||
Adequado | 55 | 72 | ||
Classificação localização | p = 0.31300020x | |||
Bom | 61 | 78 | ||
Classificação espaço físico | p = 0.08812636x | |||
Bom | 60 | 79 | ||
Classificação atendimento | p = 0.00114526x | |||
Bom | 48 | 57 | ||
Classificação rot. trabalho | p = 0.23902314x | |||
Bom | 48 | 58 | ||
Classificação horário func | p = 0.02281417x | |||
Bom | 58 | 72 | ||
Classificação profissionais | p = 0.02352699x | |||
Bom | 51 | 66 |
Fonte: Questionários de avaliação do acesso 2011.
xp valor - teste qui-quadrado;
yp valor - teste exato de Fisher.
No modelo final da regressão logística (Tabela 5) as variáveis que permaneceram foram: "naturalidade" - "ter nascido no Estado de São Paulo" (OR = 0.146 IC95% = 0.045- 0.476), "uso da unidade de saúde" - "ter usado a unidade" (OR = 5.594 IC95% = 1.443- 21.695), "microárea de residência" - "residir na microárea 2" (OR = 10.918 IC95% = 1.495-79.726) e "classificação do atendimento da unidade de saúde" - "ter classificado o atendimento como bom" (OR = 3.224 IC95% = 1.002-10.378).
Tabela 5 Modelo Final - Regressão Logística - aspectos associados à procura da unidade de saúde como primeira opção, quando alguém na família precisa de atendimento. Jardim Eldorado, Cordeirópolis, 2011.
Variável | Coeficiente | OR | IC95% |
---|---|---|---|
Intercepto | 0.0365 | - | - |
Naturalidade "ter nascido no Estado de São Paulo" | - 0.9637 | 0.146 | 0.045 - 0.476 |
Uso da unidade de saúde nos últimos seis meses "S" | 1.0880 | 5.594 | 1.443 - 21.695 |
Microárea "residir na microárea 2" | 1.4699 | 10.918 | 1.495 - 79.726 |
Atendimento "bom" | 0.5854 | 3.224 | 1.002 - 10.378 |
Fonte: Regressão Logística - dados questionários de avaliação do acesso 2011.
O presente estudo traz informações sobre o acesso aos serviços básicos. Os resultados mostram que os fatores associados ao acesso dos moradores ao serviço no qual estão adstritos são: a naturalidade; o uso da unidade de saúde nos últimos seis meses; o local de residência; e a classificação do atendimento da unidade.
Para estudar o acesso, utilizou-se um instrumento elaborado conjuntamente pela pesquisadora, pela coordenadora da unidade de saúde e pelos agentes comunitários, levando-se em consideração o referencial teórico, as características do serviço e as particularidades da população, optando-se por um delineamento de estudo no qual o entendimento de acesso é o de ser uma condição necessária para que o morador faça uso dos serviços de saúde quando sentir necessidade1-5, e que este uso se dá em função de fatores relacionados tanto com a oferta de serviços4, como com os indivíduos1,2. Dessa forma, para operacionalizar o conceito de acesso, foi tomado como indicador a propensão do morador procurar ou não a unidade de saúde a que está adstrito. Entendemos que na resposta que o morador deu na entrevista estão envolvidas, dentre outras, as dimensões apontadas no modelo conceitual adotado.
Os resultados do estudo mostram que 76.2% dos moradores entrevistados procurariam a unidade de saúde como primeira opção. Esse dado sugere que a unidade de saúde constitui uma referência para o atendimento de saúde para a maior parte deles, o que indica que a maior parte dos entrevistados tem acesso ao serviço e, por meio deste, ao sistema de saúde. Resultados semelhantes ao do estudo em questão foram encontrados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)9 e nas investigações realizadas por Corrêa10 e Oliveira et al.11.
Os achados deste estudo apontam que a naturalidade; o uso da unidade de saúde; o local de residência; e a classificação do atendimento da unidade são os fatores associados ao acesso dos moradores ao serviço no qual estão adstritos.
A condição "ter nascido no Estado de São Paulo", associa-se negativamente com a "procura da unidade de saúde", sugerindo uma relação entre a história de vida dos moradores com o acesso ao serviço ao qual estão adstritos. Este dado diverge dos encontrados por Halfon et al.12 e Newbold13 que, investigando a naturalidade entre outras variáveis, não confirmam a sua associação com o acesso aos serviços de saúde. Da mesma forma, Flores e Vega14, após revisarem as barreiras no acesso aos serviços de saúde, concluíram que a "naturalidade" parece não atuar como uma barreira. A diferença pode ter acontecido pela forma como o dado foi obtido e analisado e pelos contextos diferentes em que os estudos foram realizados. Os resultados do estudo em questão mostram que o acesso está associado com a naturalidade do morador. Essa variável aponta uma característica do morador, cujo significado ainda precisa ser explicado.
A condição "ter usado a unidade de saúde" associa-se positivamente com a "procura da unidade de saúde". Acesso e uso dos serviços de saúde são dimensões muito próximas, sendo natural e esperado que o fato de o morador ter usado a unidade de saúde aumentasse a sua chance de tornar a procura-la como primeira opção. Vários fatores podem explicar este efeito, como a necessidade de saúde percebida, os aspectos da oferta de serviço, a qualidade e a efetividade do cuidado oferecido, a satisfação do cliente com a assistência recebida, a configuração da unidade de saúde como uma referência para o atendimento e o vínculo criado entre o serviço e os moradores adstritos a ele. Andersen1 define acesso a partir do conceito de uso dos serviços de saúde, como exemplo da associação que existe entre o uso da unidade de saúde e o acesso a ela. Para nós, esta associação existe, mas cabe ressaltar que a chance de um morador ter acesso à unidade de saúde está mais associada ao território do que ao uso desta nos últimos seis meses. Ao tentar estabelecer uma correlação entre a "procura da unidade de saúde como primeira opção" e o "uso da unidade de saúde nos últimos seis meses", observa-se um padrão semelhante: 76.2% dos moradores entrevistados referiram procurar a unidade; e 89.1% dos entrevistados referiram ter usado o serviço, percentual 12.9% maior em relação ao percentual dos entrevistados que referiram procurar a unidade de saúde.
Morar na microárea de residência 2 foi mais um fator que aumentou a chance de o morador procurar a unidade de saúde. Esses resultados apontam que o território interfere no acesso ao serviço de saúde considerado. Para Santos15, o território é o espaço do acontecer solidário, que gera uso de diferentes naturezas, as quais pressupõem coexistências e um espaço geográfico15. Assim, entendemos que nesse território estão implicados os valores, a cultura e a história dos indivíduos que nele moram, como também os valores desenvolvidos localmente; e que esses fatores desempenham importante influência no acesso que os indivíduos fazem a este serviço. A influência do território também foi encontrada por Kontopantelis et al.16, ao estudarem a satisfação do paciente e analisarem a experiência com o acesso aos cuidados primários. Esses16 autores atribuem esses achados ao fato de as expectativas individuais do atendimento e a tendência de avaliação do serviço poderem ser modificadas pelo ponto de vista dominante da comunidade local. Travassos et al.17, avaliando o padrão de desigualdades geográficas e sociais no acesso aos serviços de saúde, reafirmam que o acesso no Brasil é fortemente influenciado pelo local de residência dos indivíduos.
Outro fator que aumentou a chance de o morador procurar a unidade de saúde foi a de ele ter classificado positivamente o atendimento que recebeu na unidade de saúde. Esse resultado confirma a influência positiva da percepção dos indivíduos no acesso. A influência da percepção que os indivíduos têm em relação aos aspectos da oferta de serviços também foi apontada nos estudos realizados por Barr e Wanat18, Garza-Elizondo et al.19 e Reed et al.20.
Tais autores18-20 consideram importante lembrar que a interpretação dada pelos indivíduos é mediada por aspectos sociais, culturais, valores e subjetividade.
Dentre as limitações do estudo, destacam-se o horário em que a coleta de dados foi realizada, o que pode ter comprometido a participação e a obtenção de informações dos moradores que trabalham em jornada integral. Uma pesquisa realizada por Kontopantelis et al.16 mostrou que pessoas que trabalham em tempo integral apresentam maior dificuldade no acesso aos serviços básicos de saúde em decorrência da indisponibilidade de atendimento fora do horário normal de trabalho. A estratégia utilizada para a coleta de dados, na qual o entrevistado forneceu as informações pela família, pode ter ocultado ou sobressaído informações. O fato do local de realização do estudo ter envolvido apenas uma unidade de saúde pode ser interpretado como uma dificuldade para a expansão dos seus resultados. Entretanto, entendemos que o rigor no método utilizado permite que os seus achados sejam disseminados. Soma-se a isso a configuração do instrumento construído, o que pode ter direcionado as manifestações da população. Contudo, consideramos que o conjunto articulado do conhecimento, da experiência do cotidiano de trabalho nos serviços de saúde e da perspectiva da população trouxe contribuições que valorizaram o significado dos resultados encontrados.
Enfim, os achados sugerem que a concepção e a interpretação que o morador faz do serviço de saúde desempenham importante influência no acesso a ele. Essa concepção e interpretação podem se basear na experiência do atendimento feito nesse serviço e na classificação que foi feita desse atendimento, mas também podem ter sido fortemente moduladas por aspectos individuais e fatores ligados ao território onde moram.