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Acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes: revisão integrativa de literatura

Acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes: revisão integrativa de literatura

Autores:

Cáren Coronel da Silva,
Cristiane Medianeira Savian,
Bruna Pivetta Prevedello,
Cláudia Zamberlan,
Débora Martini Dalpian,
Bianca Zimmermann dos Santos

ARTIGO ORIGINAL

Ciência & Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561

Ciênc. saúde coletiva vol.25 no.3 Rio de Janeiro mar. 2020 Epub 06-Mar-2020

http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232020253.01192018

Introdução

O período gestacional é marcado por diversas transformações, tanto físicas, hormonais como psicológicas, e as mesmas requerem atenção durante a realização do pré-natal1. Nesta etapa, tornam-se favoráveis abordagens para a promoção de saúde2 pois a gestante está receptiva a adquirir informações, mudar seus hábitos e melhorar suas práticas de saúde para seu próprio benefício e também do seu bebê1.

No decorrer da gestação, o corpo da mulher passa por diversas mudanças relacionadas ao seu funcionamento, ocasionando alterações nos níveis dos hormônios estrogênio e progesterona, que interferem na cavidade bucal, com o agravo de patologias, como as doenças periodontais3. Para populações com alta ocorrência de parto prematuro e baixo peso ao nascer, o tratamento periodontal parece reduzir o risco destes desfechos negativos para a gestação4.

Neste contexto, fica clara a necessidade da mulher receber o acompanhamento odontológico, também durante a gestação5. Entretanto, parece existir, por parte das gestantes, desinformação sobre a importância da consulta odontológica no pré-natal e/ou receio de realizá-la, já que muitas vezes acreditam que esta possa implicar em riscos para a sua saúde e a de seu filho6-8. Ainda, corroborando com este fato, há profissionais que consideram adiar ou mesmo não realizar procedimentos clínicos no período gestacional, por desconhecimento ou receio de causar algum agravo à saúde do binômio mãe-bebê6-9.

Outros fatores também parecem estar associados a um menor acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes, entre eles o nível socioeconômico, desinteresse, falta de tempo e necessidade de repousar devido à hipertensão, impossibilitando o deslocamento para a consulta3. Quanto à escolaridade das mães, observa-se que independentemente do nível, a maioria recusa-se ao tratamento odontológico no período gestacional, evidenciando que a falta de informação sobre o tema não é restrita às gestantes com menor nível educacional9.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo é identificar as produções científicas desenvolvidas sobre o acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes.

Metodologia

Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, realizado através de uma revisão integrativa de literatura, que permite a identificação, síntese e a realização de uma análise ampliada da literatura, acerca de uma temática específica10.

Para tanto, foram seguidas as seguintes etapas: definição do tema e elaboração da questão de pesquisa; elaboração dos critérios de elegibilidade, inclusão e exclusão dos estudos; levantamento das publicações nas bases de dados; categorização e análise das informações encontradas nas publicações; avaliação dos estudos selecionados; apresentação dos resultados, incluindo análise crítica dos achados e síntese da revisão11.

Para direcionar a presente revisão delineou-se como questão: “Qual o conhecimento científico produzido na literatura sobre o acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes?”.

Para a construção deste trabalho, as bases de dados utilizadas foram a BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) e a MEDLINE/PubMed. A busca dos artigos foi realizada em formulário avançado, sendo considerados os descritores do DeCS para a base de dados BVS: “acesso aos serviços de saúde”, “saúde bucal” e “gestantes”. Já para a busca na MEDLINE/PubMed foram considerados os termos indexados no MeshDatabasehealth services accessibility”, “oral health” e “pregnant women”. Todos foram associados entre si pelo operador booleano AND. A busca foi realizada no mês de março de 2017.

Foram elencados como critérios de inclusão: artigos completos disponíveis integralmente, nas bases de dados elencadas. Não houve restrições em relação ao tempo de publicação, nem ao idioma. Foram excluídas publicações que não respeitassem a delimitação do tema e o objetivo do estudo; bem como as resultantes de artigos de opinião, estudos de caso ou reflexão, editoriais, documentos ministeriais, capítulos de livro, teses e dissertações.

Na primeira fase, dois revisores treinados (R1 e R2) fizeram a leitura e avaliação independente dos títulos e resumos dos artigos identificados nas bases de dados eletrônicas. Conforme os critérios de inclusão/exclusão pré-estabelecidos, selecionaram os artigos para leitura completa. Quando houve divergências entre os revisores sobre a inclusão dos estudos e estes não entraram em um consenso, foi considerada a opinião de um terceiro revisor (R3). Na segunda fase, quando foram lidos os artigos na íntegra, novamente foi solicitada a opinião de um terceiro revisor (R3), quando os revisores R1 e R2 discordaram e não chegaram a um acordo sobre a inclusão final dos artigos.

Resultados

A busca resultou em 17 publicações na base de dados BVS e 46 publicações na base de dados MEDLINE/PubMed, totalizando 63 publicações. Foram excluídos os resumos repetidos dentro da própria base de dados, bem como os repetidos em ambas as bases. Após a leitura dos títulos e resumos com aplicação dos critérios de inclusão, permaneceram 20 artigos que foram lidos na íntegra. Após leitura e análise final dos manuscritos, mantiveram-se apenas 5 artigos na seleção final (Figura 1).

Figura 1 Fluxograma de seleção de artigos que enfocam o acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes, 2017. 

Com o propósito de sistematizar os dados destes artigos, foi utilizado um instrumento de coleta denominado de quadro sinóptico, adaptado de Garuzi et al.10, contemplando: título do estudo, nome dos autores, ano de publicação, periódico e base de dados de indexação, idioma, país de origem, objetivos, método empregado e os principais resultados e conclusões referentes ao acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes (Quadro 1).

Quadro 1 Quadro sinóptico, apresentando a síntese dos principais dados referentes às publicações incluídas, que enfocam o acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes, 2017. 

Título/Autores/Ano Publicação Periódico/Base de dados Idioma publicado/País Objetivo Método Principais resultados/Conclusões
Acesso à assistência odontológica no acompanhamento pré-natal, Santos Neto ET et al., 20126. Ciência & Saúde Coletiva/BVS/PubMed Português e Inglês/Brasil Avaliar o impacto da saúde bucal na qualidade de vida das gestantes e sua associação com uma assistência pré-natal e bucodentária adequadas no Sistema Único de Saúde (SUS), da Região Metropolitana da Grande Vitória, Espírito Santo, Brasil. Delineamento: estudo transversal.
Amostra: foram entrevistadas mulheres que frequentaram maternidades públicas conveniadas ao Sistema Único de Saúde na região metropolitana da Grande Vitória, Espírito Santo, Brasil.
A avaliação do impacto de saúde bucal foi dividida em níveis de atenção à saúde, educativo, preventivo e curativo. Desses, o preventivo e o curativo influenciaram no impacto da saúde bucal na qualidade de vida das mulheres, enquanto o nível educativo não esteve associado. Para 14,7% das entrevistadas a condição bucal influenciou impactando a qualidade de vida. Aproximadamente 20% das puérperas foram assistidas no nível preventivo durante a gravidez e quando verificado o nível preventivo e educativo o índice cai para 10%. Em torno de 17% das mulheres receberam algum tipo de assistência odontológica curativa na gravidez, mas apenas 7% receberam educativa, preventiva e curativa conjuntamente. Sendo assim, o acesso das mulheres à assistência odontológica, quando existente, parece funcionar como agente potencializador da qualidade de vida.
Oral health status during pregnancy: rural-urban comparisons of oral disease burden among antenatal women in Sri Lanka, Karunachandra NN et al., 201213. The Internacional Electronic Journal of Rural and Remote Health and Research/BVS/PubMed Inglês/Sri Lanka Verificar o estado de saúde bucal de gestantes moradoras da zona rural e urbana da Província Ocidental do Sri Lanka. Delineamento: estudo transversal.
Amostra: 459 gestantes da zona rural e 348 da zona urbana responderam a um questionário e foram submetidas ao exame clínico odontológico através do índice CPO-D (dentes cariados, perdidos e obturados) e exame periodontal.
A média de idade das gestantes foi de 35 anos. As gestantes da área rural tiveram uma maior experiência de dentes cariados e problemas periodontais do que as mulheres urbanas. A média do CPO-D na área rural foi de 5,4 enquanto na urbana foi de 3,69. Todas gestantes que realizavam o pré-natal eram encaminhadas para a clínica odontológica pública mais próxima para exames de saúde bucal e cuidados necessários. As mulheres moradoras da região urbana eram mais propensas a utilizar serviços odontológicos durante a gravidez e tinham menos percepções negativas sobre a segurança em receber atendimento do cirurgião dentista na gestação.
Indicadores de saúde bucal de gestantes vinculadas ao programa de pré-natal em duas unidades básicas de saúde em Porto Alegre/RS, Rosa PC et al., 200712. Arquivos em Odontologia/BVS Português/Brasil Avaliar as condições socioeconômicas, a intenção de amamentação, os cuidados com seus filhos, a autopercepção e as condições de saúde bucal de gestantes que realizaram o pré-natal de duas unidades básicas de saúde do município de Porto Alegre, no ano de 2006. Delineamento: estudo transversal.
Amostra: 63 gestantes. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas e avaliação de CPOD, bem como a necessidade de tratamento.
Observou-se que as participantes eram na sua maioria jovens, com idade média de 24 anos, sendo que 33% eram adolescentes. Constatou-se baixo nível socioeconômico e escolaridade. Quanto a intenção de amamentar todas as gestantes responderam que amamentariam seus bebês. A prevalência do uso de chupeta foi de 82,4% e 54,7% delas responderam que acrescentariam já no primeiro ano de vida substâncias com presença de açúcar na dieta das crianças. A média do CPO-D foi de 6 dentes. Entre as gestantes incluídas, 13% nunca foram ao dentista e 30,2% relataram ter sentido muita dor de dente nos últimos seis meses.
Perspectives of Maryland women regarding oral health during pregnancy and early childhood, Buerlein JK et al., 201115. Journal of Public Health Dentistry/PubMed Inglês/EUA Obter informações sobre o conhecimento, crenças e práticas em relação à saúde bucal durante a gravidez e sobre o cuidado do bebê. Delineamento: qualitativo.
Amostra: 34 mulheres entre 10 a 49 anos, que utilizam o Medicaid (sistema de saúde disponível nos EUA, que sofreu ampliações para pessoas de baixa renda).
As mulheres eram razoavelmente bem informadas sobre as práticas de saúde bucal para si e para seus filhos; no entanto, importantes mitos e equívocos eram comuns. A maioria das mulheres não recebia informações de saúde bucal para realização dos cuidados necessários durante sua gravidez e com seu bebê, independentemente da sua utilização ou não do Medicaid. Os grupos focais com mulheres de baixa renda forneceram informações e implicações ricas e profundas para futuras estratégias de comunicação para ajudar a prevenir doenças dentárias entre mulheres grávidas e seus bebês.
Medicaid Reforms In Oregon And Suboptimal Utilization Of Dental Care by Women of Childbearing Age Milgrom P et al., 201014. The Journal of the American Dental Association/PubMed Inglês/EUA Foram estudadas mulheres em idade fértil que frequentavam o Medicaid em Oregon (EUA), no período de 2000 a 2005, durante reformas para ampliar a cobertura de serviços odontológicos. Eles compararam as diferenças entre mulheres grávidas, não grávidas com filhos e não grávidas sem filhos em relação ao acesso aos serviços odontológicos. Delineamento: estudo de caso-controle.
Amostra: composta por 3 grupos: mulheres de 15 a 45 anos que estavam grávidas, adultas de 19 a 45 anos não grávidas com pelo menos 1 filho e não grávidas e sem filhos.
Os resultados mostraram que o uso de assistência odontológica, particularmente preventiva e restauradora, por gestantes e mães era baixo e tornava-se ainda mais baixo com o passar do tempo. Em 2005, o último ano estudado, as taxas de utilização de serviços odontológicos por mulheres grávidas de baixa renda e por mulheres com filhos dependentes foram apenas ligeiramente superiores às taxas de mulheres não grávidas sem filhos que tinham cobertura apenas para emergências dentárias.

Os artigos incluídos foram publicados nos últimos dez anos. Observou-se que todos eles são observacionais, quatro com delineamento transversal e um do tipo caso-controle. Quanto aos objetivos dessas pesquisas, em nenhuma delas o principal era analisar o acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes, apesar dos seus resultados apresentarem dados referentes a este desfecho (Quadro 1).

A leitura do corpus de análise permitiu a sistematização dos artigos em duas categorias empíricas consideradas complementares e diretamente relacionadas: número expressivo de gestantes que não realizam o pré-natal odontológico6,12,13; importância de medidas educativas que sinalizem para as gestantes a necessidade de receberem acompanhamento odontológico durante as consultas de pré-natal6,14,15 (Quadro 1).

Discussão

Este trabalho teve como proposição verificar como se dá o acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes, assunto de grande relevância, tendo em vista as consequências da não realização do pré-natal odontológico para o binômio mãe-bebê16,17, bem como a forte influência que a mãe terá sobre seu filho, em relação à transmissão de hábitos de saúde bucal18. Entretanto, chamou a atenção a escassez de pesquisas sobre o tema, nesta população específica. Devido ao forte caráter complementar e relação direta das categorias empíricas, que emergiram da leitura dos artigos incluídos nesta revisão integrativa, optou-se pela construção de uma discussão ampliada, contemplando ambos os eixos temáticos de forma interligada.

Os estudos avaliados verificaram que poucas gestantes realizam o pré-natal odontológico, como relatam pesquisadores, ao avaliar em mulheres grávidas nas maternidades públicas e conveniadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) na região metropolitana da Grande Vitória, Espírito Santo, Brasil, onde aproximadamente 20% das gestantes foram assistidas na gravidez a nível odontológico preventivo, e a nível curativo, os procedimentos mais realizados foram consultas de urgência6, quando a paciente já sente dor, fato que poderia ser evitado com o acompanhamento odontológico contínuo.

Observou-se que na saúde materna que engloba a saúde da criança, da mulher e o planejamento familiar, o cuidado pré-natal é um elemento chave. Para eles, mulheres grávidas devem receber cuidados de saúde no sistema público, podendo ser encaminhadas para a clínica odontológica mais próxima para realização de exames bucais e tratamentos necessários, independente de status socioeconômico e localização geográfica. As sessões de educação sobre saúde bucal devem objetivar sensibilizar as mulheres para a importância desta durante a gravidez e os cuidados com a saúde bucal do bebê13. Por todo o contexto que envolve a gestação, normalmente, é uma fase em que a mulher está mais disposta a receber novos conhecimentos que proporcionem melhorias à sua vida e à de seu bebê19,20.

Um dos motivos para a baixa procura pelo acompanhamento de um cirurgião dentista durante o período gestacional deve-se às crenças e mitos de que o tratamento odontológico possa ser prejudicial ao bebê. Independente da região, estudos concordam que a expectativa da dor física e a insegurança são determinantes na opção pela não realização do pré-natal odontológico6,21. Ao entrevistar 170 gestantes, pesquisadores verificaram que 89% relataram medo do tratamento dentário, 53% tinham medo de perder o bebê decorrente de uma hemorragia genital provocada pelo tratamento odontológico e 32,6% acreditavam que estes tratamentos causassem danos ao bebê. Ainda foi observado que 22,4% das entrevistadas não procuram o dentista pelos seguintes motivos: “grávida não pode ir ao dentista”, “o médico obstetra não autorizou”, “o cirurgião dentista recusou-se a atender”. Assim, nota-se que mesmo necessitando de tratamento odontológico, devido às crenças e a desinformação a respeito da importância dos cuidados em saúde bucal, as gestantes muitas vezes evitam o tratamento nesse período9.

Outro motivo pelos quais as gestantes não realizam o atendimento odontológico é o fato de que muitos cirurgiões dentistas não têm segurança para atendê-las e acabam protelando o tratamento odontológico para depois do nascimento do bebê, sendo que na maioria das vezes o problema pode ser resolvido durante a gestação22. É sabido que desde que o profissional tenha conhecimento sobre os cuidados que deve ter no acompanhamento odontológico à gestante, incluindo posição desta durante o atendimento, tipos de anestésicos que são recomendados, indicação de exames radiográficos e medicação, não haverá problemas para o binômio mãe-bebê21-23.

Em estudo realizado nos Estados Unidos, mais de 80% dos cursos de formação em odontologia dedicam apenas duas horas sobre os desfechos desfavoráveis na gestação relacionados à condição periodontal da gestante em seus currículos, o que certamente gera insegurança aos profissionais da área24. O resultado de um programa de atenção às gestantes, no Brasil, relatou que acadêmicos de odontologia, mesmo sendo preparados previamente, possuem dificuldades quanto à administração medicamentosa, realização de procedimentos clínicos invasivos e conhecimento sobre cuidados com o bebê21. Assim, observa-se escasso o conhecimento dos profissionais de odontologia na área, que acabam por reproduzir crenças do senso comum, acarretando insegurança e medo nas gestantes que protelam a consulta odontológica1.

Também, observou-se por meio da literatura científica encontrada, que o acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes podem estar relacionados às questões referentes ao local de moradia13, pois embora programas assistenciais para populações vulneráveis sejam criados, muitas vezes eles não alcançam os resultados almejados13. Como a maioria das pesquisas6,12,13 são realizadas com gestantes que frequentam os serviços públicos de saúde, não foi possível aferir diferenças com o serviço privado.

Durante a gestação a mulher encontra-se mais suscetível e determinada a adquirir novos conhecimentos e modificar alguns hábitos que possam intervir na saúde e desenvolvimento do bebê. Assim, as gestantes tornam-se um grupo estratégico para a educação em saúde, sendo essencial que essas orientações sejam realizadas de maneira multidisciplinar e que vise garantir a introdução de hábitos saudáveis desde o início da gestação25-27. Portanto, este é um período apropriado para desmistificar apreensões e crenças sobre o tratamento odontológico28.

Os profissionais da área médica, principalmente ginecologistas e obstetras, têm fundamental participação na orientação à gestante em realizar o pré-natal odontológico. Cerca de 78% das gestantes atendidas no consultório particular ou através de convênios e 50% das atendidas no SUS relataram não terem recebido orientação pelo ginecologista sobre saúde bucal22. Em estudo pregresso verificou-se que apenas 5% das gestantes receberam alguma informação sobre saúde bucal durante o pré-natal28. Em outra pesquisa foi observado que o conhecimento sobre os cuidados odontológicos, repassado às gestantes no Programa de Saúde da Família (PSF), atual Estratégia de Saúde da Família (ESF), pelos profissionais de saúde, foi baixo para a maioria dos itens de promoção e prevenção da saúde bucal29.

O ideal é que a mulher seja encaminhada ao cirurgião dentista tão logo descubra a gravidez25. Inclusive é uma recomendação do Ministério da Saúde, sendo que consta na Caderneta da Gestante que esta pode e deve fazer tratamento odontológico durante a gestação30.

A cárie dentária12,31 e as doenças gengivais e periodontais32 têm alta prevalência entre gestantes, apresentando mecanismos biológicos que podem afetar a gestação, sendo consideradas fatores de risco para a pré-eclâmpsia, para o nascimento de bebês prematuros e com baixo peso33. Dados esses que reforçam a importância da gestante consultar o cirurgião dentista para a prevenção e tratamento dessas doenças. Outro fator importante é que a manutenção da saúde bucal da gestante traz bons hábitos de saúde oral para o futuro bebê1,34 e uma melhora na qualidade de vida da mulher durante o período gestacional27,35.

Conforme as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS)36, as mulheres no período gestacional são prioridade nos serviços de saúde, sendo consideradas um grupo alvo para a aplicação de programas de educação em saúde bucal34. No entanto, conforme o exposto, essa população ainda encontra-se, muitas vezes, desprovida de cuidado.

Entre os artigos selecionados nesta revisão integrativa, observou-se que a maior parte deles não teve como objetivo principal avaliar o acesso e utilização dos serviços odontológicos por gestantes, mas sim avaliar outros desfechos relacionados à saúde bucal da gestante, sendo este considerado um desfecho secundário. Quase todos os trabalhos se tratavam de estudos transversais, não permitindo o estabelecimento da relação de causa-efeito, além disso, se basearam em informações relatadas pelas participantes das pesquisas, assim pode haver um viés relacionado à fidedignidade dos relatos. Portanto, estas limitações devem ser consideradas na interpretação dos seus resultados. Sugere-se que sejam realizadas outras pesquisas, voltadas especificamente para este tema, com metodologia apropriada, para que seus resultados possam subsidiar medidas de saúde pública voltadas para os cuidados com a saúde bucal na gestação.

Considerações finais

Existem poucos estudos sobre o acesso e utilização de serviços odontológicos por gestantes. Estes demonstram baixa adesão ao pré-natal odontológico e que os principais fatores observados como complicadores do acesso e utilização desses serviços foram relacionados aos aspectos socioeconômicos, culturais e educacionais.

Apesar do progresso do conhecimento científico-tecnológico e da evolução da área odontológica, na tentativa de aprimorar a qualidade de vida do ser humano, a saúde bucal de gestantes ainda necessita de atenção. Por meio da literatura disponível, foi verificada a importância de medidas educativas que sinalizem para as gestantes, a necessidade de receberem acompanhamento odontológico durante as consultas de pré-natal e sua segurança, contribuindo para o bem-estar do binômio mãe-bebê.

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