versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.27 no.4 São Paulo jul./ago. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152014160
As correções cirúrgicas da fissura labiopalatina são preconizadas no primeiro ano de vida, sendo elas a queiloplastia primária (cirurgia para correção do lábio) e palatoplastia primária (reconstrução do palato duro e/ou mole).
A cirurgia primária de palato pode ser realizadas por diversas técnicas cirúrgicas, sendo elegível a melhor para o tipo e a amplitude da fissura, buscando sempre a correção do ponto de vista anatômico e funcional. O insucesso cirúrgico pode ser pela técnica cirúrgica, pela habilidade do cirurgião e/ou pela amplitude da fissura palatina(1 , 2 ). A necessidade de intervenção física secundária geralmente ocorre para corrigir fístula palatina ou a disfunção do mecanismo velofaríngeo (MVF). A falha do MVF é denominada disfunção velofaríngea (DVF), que ocorre pela falta de tecido (insuficiência velofaríngea) ou pela falta de funcionalidade (incompetência velofaríngea)(3 , 4 ).
A idade ideal para a correção cirúrgica da fissura palatina ainda permanece controversa. A maioria dos estudos recentes advoga a favor da idade precoce, entre 6 e 18 meses, para favorecer a aquisição normal da fala e para prevenir a perda auditiva(5 , 6 ). Outros cirurgiões advogaram a favor de uma cirurgia em dois tempos para fissura de palato completa, na qual o fechamento do palato mole é realizado entre 3 e 8 meses, enquanto o palato duro é adiado até 15 meses a 15 anos de idade(7 , 8 ).
É por meio da palatoplastia primária que se previne a DVF em crianças com fissura palatina. Além da idade e da habilidade do cirurgião, a escolha da técnica cirúrgica é um dos fatores mais importantes. Esta deve proporcionar não somente o fechamento da parte anatômica da fissura, como também permitir alongamento e mobilidade suficientes do palato mole para que este interaja com as paredes faríngeas quando o fechamento velofaríngeo for requisitado para a fala(1 , 2 ).
Alguns estudos apontam que, mesmo após a correção do palato, pode ocorrer uma incidência de DVF que pode variar de 5 a 36%, mesmo quando o indivíduo é operado em condições consideradas ideais. Contudo, essa proporção pode aumentar consideravelmente quando o paciente é operado tardiamente, ou quando a escolha da técnica cirúrgica não considerou os aspectos inerentes à fala(3 , 9 , 10 ).
O reparo da fissura de palato foi primeiramente descrito por von Langenbeck (vL), em 1861, cuja técnica, que leva o seu nome, ressalta a importância da separação das cavidades oral e nasal, princípio utilizado na maioria das técnicas até hoje(6 , 11 , 12 ). Muitos autores salientam que a desvantagem dessa técnica é que ela não alonga o palato de forma suficiente para a reconstrução do MVF(6 , 13 ).
A técnica de Furlow (F) é uma palatoplastia usando a zetaplastia em espelho da mucosa oral e nasal, proporcionando maior alongamento do palato e restaurando a alça muscular(6 , 14 ). Um estudo prospectivo, do tipo clinical trial, comparou os resultados de fala e da função velofaríngea entre pacientes com fissura labiopalatina operados pelas técnicas de F e de vL e encontrou melhores resultados para os pacientes operados pela técnica de F(6). Outros estudos relatam resultados de fala superiores para os pacientes operados pela técnica de F ao serem comparados com outras técnicas cirúrgicas(15 - 17 ).
A avaliação do MVF é realizada por meio de uma avaliação perceptiva da fala(1). Entretanto, é muito comum que essa avaliação seja complementada com exames instrumentais, principalmente os de nasoendoscopia e de videofluoroscopia(4 , 18 ). A nasoendoscopia, especificamente, é um exame que possibilita a visualização direta das estruturas velofaríngeas e de seus movimentos durante a fala(4 , 9 ). Ela complementa a avaliação clínica e possibilita à equipe a definição da melhor conduta a ser tomada. Permite ainda a realização de medidas do deslocamento de cada estrutura velofaríngea, além de estimar, ainda que de modo subjetivo, o tamanho e o tipo do gap velofaríngeo (VF)(19 - 21 ).
Uma vez que a técnica de F preconiza uma maior extensão do véu palatino por meio do reposicionamento das fibras dos músculos do palato mole, este trabalho levanta a seguinte hipótese: será que os pacientes do estudo de Williams et al.(6), operados pela técnica de F e que permaneceram com insuficiência velofaríngea após a cirurgia, apresentam gap VF menor do que aqueles operados pela técnica de vL, que também permaneceram com insuficiência velofaríngea?
Este estudo teve como objetivo comparar os achados nasoendoscópicos relacionados ao gap VF entre pacientes com fissura labiopalatina operados do palato pela técnica de Furlow e aqueles operados pela de von Langenbeck.
Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo, sob o ofício nº 571.365 - 25/03/2014.
Os dados foram obtidos a partir de uma análise do banco de gravações dos exames de nasoendoscopia dos pacientes participantes do Projeto Flórida que apresentavam suspeita de DVF. Este projeto, realizado em parceria entre o Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo e o Centro Craniofacial da Universidade da Flórida (EUA), entre 1995 e 2006, foi um estudo prospectivo, randomizado financiado pelo National Institute of Health - NIH/NIDCR (R01-DE10437), que visou comparar os resultados de fala e da função velofaríngea entre pacientes com fissura labiopalatina unilateral operados do palato pelas técnicas de Furlow e von Langenbeck. Os resultados de fala e da função velofaríngea geraram um enorme banco de dados de protocolos clínicos e instrumentais, incluindo a nasoendoscopia. Os pacientes do Projeto Flórida encaminhados para a nasoendoscopia eram os com suspeita de DVF, que apresentavam escores acima de 02/10 no Teste de Emissão de Ar Nasal e/ou de 02/10 no Teste de Hipernasalidade(6).
As 187 gravações dos exames de nasoendoscopia do banco de dados do Projeto Florida foram visualizadas uma a uma e tabuladas em uma tabela do Microsoft(r)Excel. Para selecionar quais exames iriam compor a amostra deste estudo, somente foram selecionados os exames dos pacientes que:
• apresentassem insuficiência velofaríngea após a palatoplastia primária;
• não apresentassem fístula de palato;
• apresentassem a gravação da nasoendoscopia para avaliação da DVF durante a emissão da sequência silábica "papapa", com boa qualidade técnica de imagem e som, realizada entre as idades de 5 e 15 anos (média: 8 anos), antes de qualquer intervenção cirúrgica secundária para correção da insuficiência velofaríngea.
Aplicados os critérios de inclusão, a amostra do presente estudo foi então constituída de 70 gravações de nasoendoscopia realizadas entre 2002 e 2011, de 70 pacientes (uma por paciente), sendo 22 operados pela técnica de Furlow (13 meninos e 9 meninas) e 48 pela de von Langenbeck com veloplastia intravelar (30 meninos e 18 meninas), operados do palato entre 9 e 18 meses de idade.
Os exames de nasoendoscopia foram realizados por profissionais experientes da área médica e fonoaudiológica do Projeto Flórida, utilizando um nasoendoscópio flexível da marca Olympus, modelo ENF tipo P4. As amostras para análise foram editadas a partir das gravações dos exames selecionados. As imagens foram editadas no repouso e durante a emissão da sequência silábica "papapa", replicada quatro vezes para facilitar a análise.
Os achados nasoendoscópicos foram analisados utilizando-se uma adaptação dos protocolos propostos na literatura(20 , 21 ). Esses protocolos são modelos de medidas semiquantitativos que foram desenvolvidos com o objetivo de padronizar a obtenção de informações sobre o funcionamento do MVF por meio da nasoendoscopia. São baseados em medidas relativas, com a classificação do contraste entre a posição de repouso e a quantidade de deslocamento das estruturas faríngeas.
As medidas de interesse foram realizadas por três fonoaudiólogas experientes, a seguir denominadas juízas. Para que as juízas tivessem uma referência ao analisar os aspectos do protocolo, foi desenvolvido um manual (no Microsoft(r) Power Point) ilustrado com orientações sobre cada aspecto analisado, com gravações e/ou imagens de exames que poderiam ser encontradas nas amostras. As juízas poderiam assistir ao manual quantas vezes julgassem necessário, até que tivessem segurança para responder ao aspecto analisado no momento através do consenso, sendo o julgamento realizado a partir do trecho de fala que representasse o maior deslocamento das estruturas a serem analisadas. A seguir, tem-se a descrição de cada aspecto avaliado:
• • movimento do véu palatino: as juízas deveriam observar presença ou ausência de movimento do véu palatino;
• deslocamento máximo do véu palatino: as juízas deveriam estimar a medida, em porcentagem, do deslocamento máximo do véu palatino, considerando que este em repouso tem o valor fixado em 0%, a parede posterior da faringe em repouso, valor fixado em 100% e o centro do MVF em repouso, valor fixado em 50%. De acordo com o protocolo, o deslocamento máximo do véu palatino poderia se enquadrar em quatro medidas: 0-25%; 26-50%; 51-75%; 76-100% (Figura 1);
Figura 1. Esquema de referência dos deslocamentos do véu palatino em quatro quadrantes. A: 0-25%; B: 26-50%; C: 51-75%; D: 76-100%
• movimento da parede posterior da faringe: as juízas deveriam identificar presença ou ausência de movimento da parede posterior da faringe;
• deslocamento máximo da parede posterior da faringe: as juízas deveriam estimar a medida, em porcentagem, do deslocamento máximo da parede posterior em relação ao véu palatino, considerando que a parede em repouso tem valor de referência fixado em 0% e que o véu palatino em repouso tem valor de referência fixado em 100%. Assim, de acordo com o protocolo, o deslocamento máximo da parede posterior poderia se enquadrar em quatro medidas: 0-25%, 26-50%, 51-75% e 76-100% (Figura 2);
Figura 2. Esquema de referência dos deslocamentos da parede posterior da faringe em quatro quadrantes. A: 0-25%; B: 26-50%; C: 51-75%; D: 76-100%
• movimento das paredes laterais da faringe: as juízas deveriam identificar presença e ausência de movimento das paredes laterais direita e esquerda;
• deslocamento máximo das paredes laterais da faringe: as juízas deveriam estimar a medida, em porcentagem, do deslocamento máximo das paredes laterais direita e esquerda, uma em relação à outra, considerando que a parede em repouso tem valor de referência fixado em 0% e que a outra, valor de referência fixado em 100%. Assim, de acordo com o protocolo, o deslocamento máximo das paredes direita e esquerda poderiam se enquadrar em quatro medidas: 0-25%, 26-50%, 51-75% e 76-100% (Figura 3);
Figura 3. Esquema de referência dos deslocamentos da parede lateral da faringe direita em quatro quadrantes. A: 0-25%; B: 26-50%; C: 51-75%; D: 76-100%. Na parede esquerda, as medidas inverteriam
• prega de Passavant: as juízas deveriam julgar se havia ou não presença da prega de Passavant;
• tamanho do gap VF: as juízas deveriam quantificar o tamanho do gap VF de acordo com as medidas de referência, ou seja, quantificar o espaço que restou do movimento máximo das estruturas velofaríngeas e não o quanto as estruturas por ventura tivessem se movimentado. Para isso, deveriam contrastar a imagem em repouso com a imagem das estruturas em maior deslocamento. Quando não houvesse movimento das estruturas velofaríngeas (onde a imagem em repouso é igual à imagem em maior deslocamento), deveriam quantificar o tamanho do gap em 100%. As medidas de referência adotadas para esse item foram subdivididas em uma escala de seis pontos adaptada(20 , 21 ): 0%: fechamento VF, 10%: gap VF com borbulha de ar, 25%: gap VF pequeno, 50%: gap VF médio, 75%: gap VF grande, 100%: gap VF muito grande (Figura 4);
Figura 4. Esquema de referência de como foi mensurado o tamanho do gap velofaríngeo, sendo que 0% = fechamento velofaríngeo; 10% = gap velofaríngeo com borbulha de ar; 25% = gap velofaríngeo pequeno; 50% = gap velofaríngeo médio; 75% = gap velofaríngeo grande; 100% = gap velofaríngeo muito grande
• tipo de gap VF: as juízas deveriam classificar o tipo de gap VF, observando o comportamento de todas as estruturas, de acordo com a seguinte classificação(19):
• sagital: neste padrão, ocorre o predomínio de movimentação das paredes laterais da faringe quando comparadas às demais estruturas velofaríngeas;
• coronal ou transverso: ocorre o predomínio de movimentação do véu palatino (para cima e para trás), quando comparado às demais estruturas;
• circular: neste padrão, ocorre a participação "homogênea" do véu palatino e das paredes laterais da faringe;
• circular com prega de Passavant: ocorre o padrão circular com a formação da prega de Passavant na parede posterior da faringe.
Para análise estatística, foram comparados os resultados obtidos para cada aspecto avaliado entre os pacientes operados pela técnica de F e aqueles operados pela de vL, utilizando-se o teste estatístico de Fisher para movimento do véu palatino e das paredes laterais, deslocamento máximo do véu palatino e da parede posterior e tipo do gap VF. O teste do χ2 foi aplicado para movimento da parede posterior da faringe, deslocamento máximo das paredes laterais da faringe e prega de Passavant. Já para o tamanho do gap VF, foi aplicado o teste de Mann-Whitney. Para esses testes, foi considerado como estatisticamente significante os resultados que obtiveram p<0,05.
A presença de movimento do véu palatino foi observada para todos (100%) os pacientes operados pela técnica de F e para 46 (96%) operados pela de vL. A diferença entre esses resultados não foi significativa (teste de Fisher, p=1,000). O deslocamento máximo do véu palatino entre 0-25% ocorreu para sete (32%) pacientes operados pela técnica de F e 11 (23%) operados pela de vL; entre 26-50% para quatro (18%) de F e três (6%) de vL; entre 51-75% para três (14%) de F e sete (15%) de vL e entre 76-100% para oito (36%) de F e 27 (56%) de vL. A comparação entre os resultados não foi estatisticamente significante (teste de Fisher, p=0,282).
O movimento da parede posterior da faringe foi observado para dez (45%) pacientes operados pela técnica de F e para 19 (39%) operados pela de vL. A diferença entre os resultados não foi significativa (Teste do χ2 , p=0,840). O deslocamento máximo da parede posterior da faringe entre 0-25% ocorreu para 19 (86%) pacientes operados pela técnica de F e para 42 (87%) operados de vL; entre 26-50% ocorreu para três (14%) de F e para seis (13%) de vL. Não houve deslocamento acima de 50% em ambas as técnicas de palatoplastia primária para nenhum paciente. Os resultados entre as comparações não foram estatisticamente significantes (Teste de Fisher, p=1,000).
O movimento das paredes faríngeas direita e esquerda ocorreu para todos os pacientes operados pela técnica de F. Contudo, para os operados pela técnica de vL, o movimento da parede faríngea direita ocorreu para 45 (94%) e da parede faríngea esquerda ocorreu para 43 (93%). Os resultados entre as comparações não foram estatisticamente significantes (teste de Fisher, parede direta, p=0,547; parede esquerda, p=0,546). O deslocamento máximo da parede faríngea direita e esquerda não foi estatisticamente significante (teste do χ2, p=0,925; p=0,468 - Tabela 1).
Tabela 1. Distribuição dos números e porcentagens dos pacientes operados pelas técnicas de Furlow e von Langenbeck, de acordo com os valores do deslocamento máximo das paredes laterais da faringe
Deslocamento máximo das paredes laterais da faringe | Furlow n (%) |
von Langenbeck n (%) |
||
---|---|---|---|---|
LD | LE | LD | LE | |
0–25% | 16 (73) | 17 (77) | 37 (77) | 30 (65) |
26–50% | 6 (27) | 5 (23) | 11 (23) | 16 (35) |
51–75% | 0 (0) | 0 (0) | 0 (0) | 0 (0) |
76–100% | 0 (0) | 0 (0) | 0 (0) | 0 (0) |
Total | 22 (100) | 22 (100) | 48 (100) | 46 (100) |
Valor de p | p=0,925* | p=0,468* |
*Valores significantes (p<0,05) - teste do ?2 Legenda: LD = lado direito; LE = lado esquerdo
A presença da prega de Passavant foi observada em sete (32%) pacientes operados pela técnica de F e em 14 (30%) de vL. A comparação entre os resultados não foi estatisticamente significante (teste do χ2, p=0,955).
O tamanho do gap VF de 0% não ocorreu para nenhum paciente operado pela técnica de F e ocorreu em apenas dois (4%) dos operados de vL; de 10% para cinco (23%) pacientes de F e 16 (33%) de vL; de 25% para sete (32%) de F e sete (15%) de vL; de 50% para quatro (18%) de F e 12 (25%) de vL; de 75% para seis (27%) de F e dez (21%) de vL; de 100% para nenhum (0%) de F e um (2%) de vL. As diferenças entre as comparações dos resultados não foram estatisticamente significantes (teste de Mann-Whitney, p=0,531 - Tabela 2).
Tabela 2. Distribuição do número dos pacientes operados pelas técnicas de Furlow e von Langenbeck, de acordo com os valores obtidos quanto ao tamanho do gap velofaríngeo
Tamanho do gap velofaríngeo | Furlow n (%) |
von Langenbeck n (%) |
---|---|---|
0% | 0 (0) | 2 (4) |
10% | 5 (23) | 16 (33) |
25% | 7 (32) | 7 (15) |
50% | 4 (18) | 12 (25) |
75% | 6(27) | 10 (21) |
100% | 0 (0) | 1 (2) |
Total | 22 (100) | 48 (100) |
Valor de p | p=0,531* |
*Valores significantes (p<0,05) - teste de Mann-Whitney
O tipo de gap VF coronal ocorreu para oito (36%) pacientes de F e 20 (42%) de vL; o sagital ocorreu para dois (9%) de F e um (2%) de vL; o circular ocorreu para sete (32%) de F e 18 (37%) de vL e o circular com prega de Passavant ocorreu para cinco (23%) de F e nove (19%) de vL. A comparação entre os resultados não foi estatisticamente significante (teste de Fischer, p=0,557 - Tabela 3).
Tabela 3. Distribuição do número de pacientes operados pelas técnicas de Furlow e von Langenbeck, de acordo com o tipo de gap velofaríngeo
Tipo de gap velofaríngeo | Furlow n (%) |
von Langenbeck n (%) |
---|---|---|
Coronal | 8 (36) | 20 (42) |
Circular | 7 (32) | 18 (37) |
Circular com Passavant | 5 (23) | 9 (19) |
Sagital | 2 (9) | 1 (2) |
Total | 22 (100) | 48 (100) |
Valor de p | p=0,557* |
*Valores significantes (p<0,05) - teste de Mann-Whitney
Os resultados do presente estudo não confirmaram a hipótese de que os pacientes operados pela técnica de F que permaneceram com IVF após a palatoplastia primária pudessem apresentar gap VF menor do que os operados pela de vL que também permaneceram com IVF. Todas as comparações das estruturas velofaríngeas observadas não mostraram diferenças significativas.
Ao interpretar esses achados, é importante considerar que a reorganização da musculatura do palato, conforme conduzido em ambas as técnicas estudadas, pode ter tido um impacto semelhante no tamanho do gap. A técnica de F, por exemplo, é uma técnica que alonga o palato mole através de duas zetoplastias em espelho, envolvendo retalhos orais e nasais (espelhados entre os planos) com transposição dos retalhos, o que proporciona retroposição muscular(2 , 6 , 12 ). Já a técnica de vL com veloplastia intravelar requer a liberação e a dissecação minuciosa da musculatura, permitindo a posteriorização do feixe muscular(6 , 11 , 22 ). Ou seja, ambas as técnicas envolvem liberação e posteriorização das fibras musculares e, apesar de os procedimentos para manipulação das fibras musculares serem distintos entre as técnicas, o resultado em termos de gap VF pode ser parecido, como foi observado no presente estudo.
As fibras do palatofaríngeo em pacientes com fissura palatina acompanham o músculo levantador do véu palatino(23). As fibras horizontais desse músculo podem produzir uma ação esfinctérica, medializando as paredes laterais para estreitar a nasofaringe e ajudar no fechamento VF(24). Alguns autores sugerem que o palatofaríngeo funciona como um músculo "hidrostático", que contrai a porção posterior do véu palatino, moldando a forma da parede posterior da faringe e resultando em um melhor selamento VF(25 , 26 ). Portanto, as técnicas realizadas no presente estudo podem influenciar o movimento das paredes da faringe, pois ambas realizam o reposicionamento do músculo palatofaríngeo visando à sua competência funcional e anatômica.
A habilidade do cirurgião, ao conduzir a técnica cirúrgica, já foi apontada como um fator importante no resultado do tratamento da fissura labiopalatina(6 - 11 ). Os cirurgiões da equipe do presente estudo já usavam o procedimento de vL como técnica na rotina cirúrgica para a correção primária da fissura labiopalatina e foram treinados para executar o procedimento de F nos indivíduos estudados. Apesar da maior habilidade com a técnica de rotina (vL) do que foram no procedimento inovador (F), a diferença esperada de maior alongamento do véu palatino e, portanto, de menor gap com o procedimento inovador, não foi observada.
A presença da tonsila faríngea esperada em falantes na faixa etária entre os 9 e 13 anos de idade(27) pode ter sido uma variável com impacto nos achados, uma vez que os exames estudados foram obtidos em pacientes entre 5 e 15 anos (média: 8 anos). A literatura refere fechamento velofaríngeo com toque na tonsila(28 , 29 ). Assumiu-se, no entanto, que a presença da tonsila em diferentes fases de involução foi igualmente distribuída entre as duas populações estudadas. Ou seja, se houve participação da tonsila no fechamento velofaríngeo, essa participação ocorreu igualmente para o procedimento de F e de vL.
O funcionamento velofaríngeo é afetado pela intensidade vocal e pelos diferentes níveis de pressão intraoral e subglótica que podem ser usados pelos falantes durante a produção de fala(1 , 4 , 12 ). O presente estudo não envolveu a realização da avaliação perceptivo-auditiva das amostras de fala obtidas durante o exame de nasoendoscopia. Sugere-se que essa limitação deve ser mais bem controlada em futuros estudos, uma vez que o uso de articulação compensatória e a presença de hipernasalidade e escape de ar nasal podem interferir no movimento das estruturas velofaríngeas(1 , 12 ).
Para o presente estudo, o estímulo selecionado foi a emissão da sequência "papapa", pois era o estímulo de fala mais frequente no banco de dados, proporcionando um maior número de gravações para compor a amostra. Apesar de o conteúdo fonético da amostra de fala ter sido controlado, o ideal seria a inclusão de amostras de fala mais representativas da fala encadeada (foneticamente balanceadas)(20 , 30 ).
Apesar de o grupo estudado ter apresentado mais exames de nasoendoscopia com IVF de pacientes operados pela técnica de vL do que os operados pela de F, as características dos gaps entre os grupos foram semelhantes. O número da amostra não pode ser controlado, pois a proposta do presente estudo foi estudar todos os exames com IVF do banco de dados.
A técnica cirúrgica utilizada na palatoplastia primária não foi relevante para determinar diferença no tamanho do gap velofaríngeo para os pacientes que permaneceram com IVF.