versão impressa ISSN 0101-2800versão On-line ISSN 2175-8239
J. Bras. Nefrol., ahead of print Epub 27-Abr-2020
http://dx.doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2019-0210
A prevalência de doença renal terminal (DRT) vem crescendo em todo o mundo.1 Pacientes em hemodiálise sofrem com elevadas taxas de mortalidade, com cerca de 50% das fatalidades atreladas a doenças cardiovasculares.2 Vários estudos indicam que a presença de acidose metabólica esteja associada a elevação da mortalidade.3,4,5,6 Hemodiálise convencional pode não ser suficiente para adequadamente controlar a acidose em pacientes com DRT7,8 e intervenções complementares, como a suplementação oral de bicarbonato, podem ser necessárias.
O Brasil tem o terceiro maior número de pacientes em diálise do mundo, com 126.593 indivíduos em 2017.9 Não há clareza a respeito do panorama da acidose metabólica na hemodiálise no Brasil, principalmente porque uma portaria do Ministério da Saúde de 1996 eliminou a obrigatoriedade de se determinar os níveis de bicarbonato por exame laboratorial dos pacientes em hemodiálise.10
O presente estudo teve como objetivo estabelecer a prevalência de acidose metabólica na população atendida em quatro centros de hemodiálise localizados na região metropolitana do Rio de Janeiro e analisar os fatores associados a baixos níveis de bicarbonato, incluindo dados demográficos, comorbidades e características do tratamento dialítico.
O presente estudo transversal analisou a prevalência de acidose metabólica em pacientes adultos em hemodiálise regular atendidos na cidade de Niterói e arredores no estado do Rio de Janeiro. Os dados foram colhidos de janeiro a abril de 2017. A amostra de conveniência foi composta por pacientes de quatro centros que concordaram em participar do estudo. Foram excluídos indivíduos menores de 18 anos, em hemodiálise por menos de três meses ou com sorologia positiva para hepatite ou HIV. O Comitê de Ética da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense aprovou o estudo sob o número CAAE 57822316900005243. Todos os pacientes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi realizado em conformidade com os princípios da Declaração de Helsinque.
Os centros de diálise foram numerados de 1 a 4. Nas unidades 1, 2 e 3, as sessões de diálise foram realizadas com máquinas de hemodiálise 4008S (Fresenius Medical Care, Schweinfurt, Alemanha). O centro 4 utilizou máquinas de hemodiálise Diamax ou Surdial (ambas fabricadas pela Nipro Co., Osaka, Japão). Os centros 1 e 2 utilizaram dialisadores de polissulfona de alto fluxo (HF-80S, Fresenius Medical Care, Bad Homburg, Alemanha); no centro 3 foram utilizados dialisadores de Poliamix de alto fluxo (Polyflux 2.1®, Gambro, Bad Homburg, Alemanha); e no centro 4, dialisadores de baixo fluxo (Hemoflow F10 HPS, Fresenius Medical Care, Bad Homburg, Alemanha). Em todos os centros, os dialisadores foram reprocessados com ácido peracético como solução esterilizante por meio de um sistema automatizado por no máximo 20 vezes, em conformidade com a regulamentação brasileira para terapia renal substitutiva. A Fresenius Medical Care (Jaguariúna - SP, Brasil) fabricou todos os concentrados para diálise utilizados. As características do tratamento dialítico de cada centro estão listadas na Tabela 1.
Tabela 1 Parâmetros do tratamento dialítico
Todos | Centros de Diálise | ||||
---|---|---|---|---|---|
1 | 2 | 3 | 4 | ||
% de pacientes SUS | 50,5 | 0 | 0 | 68 | 93 |
Horas de diálise/semana, h | 12,3 ± 2,0a | 13,2 ± 2,4 | 12,5 ± 2,8 | 12,1 ± 1,6* | 11,8 ± 0,9* |
% de pacientes com > 12h sessões/semana | 16,0 | 36,8 | 21,4* | 7,0*Φ | 4,3*Φ |
Número de sessões/semana | 3,3 ± 0,7 | 3,9 ± 0,9 | 3,8 ± 0,9* | 3,1 ± 0,4*Φ | 3,0 ± 0,2*Φ |
% de pacientes com > 4 sessões/semana | 10,2 | 21,1 | 29,8 | 1,6*Φ | 0*Φ |
Kt/V standard | 2,22 (1,15-4,21) |
2,52 (1,71-3,77) |
2,43 (1,15-4,21) |
2,19 (1,55-3,55)*Φ |
2,13 (1,42-2,94)*Φ |
Número de usos do dialisador na coleta de dados | 12,6 ± 5,3 | 11,1 ± 6,1 | 12,3 ± 5,2 | 12,2 ± 5,4 | 14,0 ± 4,6*δ |
Fluxo sanguíneo, mL/min | 400 (250 - 500)b | 400 (250 - 500) | 400 (250 - 500) | 400 (300 - 450) | 350 (250 - 450) |
Fluxo de dialisato, mL/min | 500 | 500 | 500 | 500 | 500 |
Composição do dialisato após diluição | |||||
Cálcio (2,5/3,0/3,5 mEq/L), % | 2,6/97,1/0,3 | 0/100/0 | 0/100/0 | 1,6/98,4/0 | 7/ 92,8/0,2 |
Acetato 4,0 mEq/L, % | 100 | 100 | 100 | 100 | 100 |
HCO3- (31,4/32,4 mEq/L), % | (66,7/33,3) | 100/0 | 100/0 | 0/100 | 100/0 |
SUS: Sistema Único de Saúde;
aMédia ± DP.;
bMediana (IIQ);
*p < 0,05 vs. Centro 1;
Φp < 0,05 vs. Centro 2;
δp < 0,05 vs. Centro 3 (diferenças identificadas por teste do qui-quadrado ou ANOVA complementados por teste de Tukey quando adequado).
Para gasometria, amostras de 2 mL foram colhidas em seringas heparinizadas (Sistema de Coleta de Sangue S-Monovette, SARSTEDT AG & Co. KG, Nümbrecht, Alemanha) antes da sessão de diálise do meio de semana. As amostras foram colhidas a partir da agulha utilizada para puncionar o membro arterial da fístula arteriovenosa ou diretamente do cateter intravenoso central após desprezar o volume correspondente à capacidade de priming do dispositivo. Após a coleta, as seringas foram armazenadas em gelo e transportadas para o laboratório em no máximo uma hora.
Colhemos todos os dados clínicos e de exames laboratoriais de rotina constantes dos prontuários dos pacientes. Os valores de pressão arterial foram considerados como a média das medidas pré-diálise das três últimas sessões de diálise anteriores ao início do estudo. Os dados dos exames laboratoriais de rotina foram extraídos dos prontuários dos pacientes e calculados como a média dos três últimos valores disponíveis para cada paciente. Albumina sérica foi medida pelo método do verde de bromocresol. A fórmula usada para calcular o Kt/V standard está disponível online (http://www.hdcn.com/calcf/ley.htm). O cálculo considera o valor da taxa de redução de ureia.11 Os valores dos parâmetros ácido-base foram todos derivados da gasometria realizada como procedimento de estudo específico (ABL5, Radiometer Medical A/S, Dinamarca).
Variáveis contínuas foram relatadas como média ± DP ou mediana e intervalo interquartílico, conforme o caso. Variáveis categóricas foram relatadas em termos de frequências. As amostras foram testadas para normalidade pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. As diferenças entre os centros foram testadas pelo teste do qui-quadrado e ANOVA unidirecional ou seu equivalente não paramétrico (ANOVA de Kruskal Wallis) complementados pelo teste de Tukey. As associações foram testadas em um modelo de regressão logística usando o método “Enter”, no qual as variáveis preditivas foram selecionadas por razões clínicas. Valores de p < 0,05 foram considerados significativos. As análises estatísticas foram realizadas no programa SPSS versão 18.0 para Windows (IBM, Chicago, IL, EUA).
As características gerais dos pacientes incluídos são exibidas na Tabela 2. Foram incluídos 384 pacientes com idade média de 58,1 ± 15,8 anos; 54,5% eram homens e 63,0% eram não brancos. O IMC médio foi de 26,0 ± 5,2 kg/m2 e 24,6 ± 5,0 kg/m2 para homens e mulheres, respectivamente. Trinta por cento dos pacientes tinham diabetes e 48% apresentavam hipertensão. Quase 88% usavam fístula arteriovenosa nativa como acesso vascular para hemodiálise. A pressão arterial sistólica média pré-diálise foi 147 ± 20 mmHg e a diastólica 78 ± 13 mmHg. O tempo médio em diálise foi 58 ± 55 meses; 28% eram fumantes. Os dados laboratoriais dos participantes são exibidos na Tabela 3. A média de CO2 total (tCO2) foi 22,7 ± 3,0 mEq/L; 40,3% dos pacientes apresentaram níveis < 22 mEq/L. As taxas de prevalência das faixas de tCO2 definidas para a amostra e em cada centro de diálise são exibidas na Tabela 4.
Tabela 2 Características dos pacientes (n = 384)
Sexo masculino, n (%) | 210 (54,5) |
---|---|
Idade, anos (média ± DP) | 58,1 ± 15,8 |
Cor da pele (branca/não-branca), % | 37/63 |
Índice de massa corporal, Kg/m2 (M/F), (média ± DP) | 26,0 ± 5,2/24,6 ± 5,0 |
Doença renal primária, n (%) | |
Diabetes mellitus | 116 (30,2) |
Hipertensão | 186 (48,4) |
Glomerulopatia crônica | 14 (3,6) |
Doença renal policística do adulto | 16 (4,2) |
Outras/indeterminado | 52 (13,6) |
Acesso vascular, n (%) | |
Fístula arteriovenosa nativa | 340 (88,3) |
Enxerto arteriovenoso | 11 (2,9) |
Catéter tunelizado | 29 (7,5) |
Catéter não-tunelizado | 5 (1,3) |
PAS/PAD pré-HD, mmHga, (média±DP) | 147 ± 20/78 ± 13 |
Tempo em diálise, meses, (média±DP) | 57,9 ± 54,7 |
Tabagismo atual, n (%) | 108 (28,1) |
PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica.
aDados referentes às médias das medições de cada paciente antes da sessão de diálise no dia da coleta.
Tabela 3 Características dos pacientes - parâmetros laboratoriais séricos
Albuminaa, g/dL | 4,1 ± 0,4b |
---|---|
Cálcioa, mg/dL | 9,2 ± 0,6 |
Fósforoa, mg/dL | 5,1 ± 1,2 |
Hemoglobinaa, g/dL | 11,3 ± 3,1 |
PTHia, pg/mL | 236 (100 - 526)c |
tCO2, mEq/L | 22,7 ± 3,0 |
aDados referentes às medições de rotina calculadas como média dos três últimos resultados disponíveis nos prontuários dos pacientes;
bMédia±DP.;
cMediana (IIQ); PTHi: paratormônio intacto.
Tabela 4 Faixas de CO2 total pré-diálise (tCO2) na sessão de diálise de meio de semana na amostra estudada
Faixas de tCO2 em mEq/L, n (%) | Todos | Centros de Diálise | |||
---|---|---|---|---|---|
1 | 2 | 3 | 4 | ||
< 18 | 25 (6,5) | 1 (1,8) | 1 (1,2) | 7 (5,5) | 16 (13,9) |
18 - < 20 | 52 (13,5) | 3 (5,3) | 9 (10,7) | 16 (12,5) | 24 (20,9) |
20 - < 22 | 78 (20,3) | 6 (10,5) | 8 (9,5) | 34 (26,6) | 31 (27,0) |
22 - < 24 | 96 (24,7) | 20 (35,1) | 17 (20,2) | 27 (21,1) | 31 (27,0) |
24 - < 26 | 79 (20,6) | 16 (28,1) | 28 (33,3) | 24 (18,8) | 11 (9,6) |
26 - < 28 | 43 (11,2) | 10 (17,5) | 16 (19,0) | 15 (11,7) | 2 (1,7) |
28 - < 30 | 10 (2,6) | 1 (1,8) | 4 (4,8) | 5 (3,9) | - |
≥ 30 | 1 (0,3) | - | 1 (1,2) | - | - |
Todos | 384 (100) | 57 (100) | 84 (100) | 128 (100) | 115 (100) |
A Tabela 5 exibe o modelo de regressão logística cuja variável dependente era valor de tCO2 < 22 mEq/L. Idade mais elevada e Kt/V standard mais elevada apresentaram associação com risco reduzido para valores de tCO2 < 22 mEq/L; o número de utilizações do dialisador no dia da gasometria e o uso de dialisadores de membrana de baixo fluxo foram associados a risco aumentado de baixo tCO2.
Tabela 5 Modelo de regressão logística multivariada para testar associações entre variáveis e CO2 total < 22mEq/L
Variáveis preditivas | OR | IC 95% | p valor |
---|---|---|---|
Idade (décadas) | 0,83 | 0,72-0,98 | 0,025 |
Sexo masculino | 0,90 | 0,55-1,48 | 0,686 |
Diabetes mellitus | 0,64 | 0,35-1,11 | 0,111 |
Índice de massa corporal (Kg/m2) | 1,00 | 0,95-1,05 | 0,924 |
Hemoglobina (g/dL) | 1,03 | 0,97-1,11 | 0,315 |
Fluxo sanguíneo (mL/min) | 0,99 | 0,95-1,05 | 0,919 |
Número de usos do dialisador | 1,19 | 1,13-1,25 | < 0,001 |
Uso de dialisador de membrana de baixo fluxo | 2,41 | 1,32-4,40 | 0,004 |
Horas de hemodiálise/semana | 1,08 | 0,93-1,26 | 0,277 |
Kt/V | 0,24 | 0,11-0,55 | 0,001 |
OR: razão de chances, IC: intervalo de confiança.
Pacientes em hemodiálise apresentam elevada taxa de mortalidade.2 Vários estudos indicam a existência de uma relação entre acidose metabólica e mortalidade.3,4,5,6,12 O objetivo do presente estudo foi determinar a prevalência de acidose metabólica em pacientes em hemodiálise e analisar os fatores associados a níveis baixos de bicarbonato em uma população atendida em quatro centros localizados na região metropolitana do Rio de Janeiro.
Cinquenta por cento dos participantes do presente estudo recebiam tratamento por meio do Sistema Único de Saúde, percentual notadamente menor do que a média nacional (82%).9 Esse aspecto pode ter afetado a prescrição de diálise: por exemplo, o percentual de pacientes com mais de quatro sessões semanais de diálise em nosso estudo (10,2%) foi bastante superior à média nacional (2,4%).9 Talvez como reflexo da heterogeneidade relativa à fonte de financiamento do tratamento, os centros 1 e 2 (que atendiam exclusivamente pacientes com seguro saúde particular) apresentaram proporção maior de pacientes com mais de quatro sessões semanais de diálise e valores médios mais elevados de Kt/V. A concentração de cálcio no dialisato mais comum foi de 3,0 mEq/L. Em relação ao nível de bicarbonato no dialisato, apenas o centro 3 utilizou a concentração de 32,4 mEq/L; os demais empregavam a concentração de 31,4 mEq/L. No Censo Brasileiro de Diálise de 2018 (dados ainda não publicados), a mediana nacional de concentração de bicarbonato no dialisato foi de 32 mEq/L, número muito próximo aos utilizados nos centros estudados. Em um estudo multinacional abrangente, os níveis de bicarbonato no dialisato foram agrupados em valores ≤ 32 mEq/L, 33-37 mEq/L e ≥ 38 mEq/L, identificados com as frequências de 15%, 60% e 25%, respectivamente.4 De acordo com essa classificação, os dados do presente estudo (como na grande maioria dos centros brasileiros) estão situados na faixa baixa da concentração de bicarbonato no dialisato usada em todo o mundo.
O presente estudo incluiu 384 pacientes com perfil demográfico comparável ao descrito no último Censo Brasileiro de Diálise.9 A julgar pelos valores médios de Kt/V standard e índice de massa corporal e pelos níveis séricos médios de albumina, cálcio, fósforo, PTHi e hemoglobina, os participantes receberam, em média, tratamento dialítico dentro de padrões adequados.13 A média de tCO2 sérico pré-diálise na sessão de meio de semana de nossa amostra (22,7 mEq/L) foi muito semelhante aos dados globais relatados em dois estudos (21,9 mEq/L3 e 22,9 mEq/L4).
No total, 40,3% dos pacientes apresentaram níveis séricos de bicarbonato abaixo da recomendação do DOQI (22 mEq/L).14 Valores > 27 mEq/L e < 18mEq/L, associados a maior mortalidade e maior taxa de internação,3,8 foram identificados em 14,1% e 6,5% dos pacientes, respectivamente. Os resultados variaram entre os centros, com valor médio mais alto para tCO2 no centro 1 e mais baixo no centro 4. Discrepâncias na prescrição de diálise podem ter gerado tais diferenças. Por exemplo, o centro com tCO2 médio mais baixo foi o único em que todos os pacientes eram submetidos a três sessões semanais de diálise.
Foi desenvolvido um modelo de regressão logística com as seguintes variáveis para testar associações com tCO2 abaixo de 22 mEq/L: idade em décadas, sexo, diabetes, índice de massa corporal, hemoglobina, fluxo sanguíneo, número de usos do dialisador, uso de dialisadores de membrana de baixo fluxo, horas de diálise por semana e Kt/V standard. Quatro variáveis do modelo mostraram associações estatisticamente significativas com tCO2 sérico abaixo de 22 mEq/L: idade mais avançada e Kt/V standard mais elevado foram identificados como fatores de proteção, enquanto número maior de usos do dialisador e uso de dialisadores de membrana de baixo fluxo foram associados a risco aumentado.
Os impactos negativos da reutilização do dialisador e do uso de dialisador de membrana de baixo fluxo sobre o bicarbonato sérico, mesmo após extensos ajustes, foram surpreendentes e devem aguardar confirmação futura. A reutilização do dialisador parece não afetar a eficácia da diálise e é uma prática amplamente utilizada em países com recursos restritos.15,16 Além disso, embora alguns estudos tenham revelado que a mortalidade por todas as causas em pacientes submetidos a diálise de alto fluxo possa ser menor em comparação à hemodiálise de baixo fluxo,15,17 o assunto ainda é alvo de controvérsia.18
A associação entre idade e níveis mais elevados de bicarbonato já havia sido descrita3,18 e pode ser interpretada como consequência da menor geração de ácido no intervalo da diálise devido a sarcopenia e atividade física reduzida que pode afetar pacientes idosos em hemodiálise. Embora valores mais altos de Kt/V standard3,19 e duração das sessões de diálise18 tenham sido associados individualmente a níveis mais elevados de bicarbonato sérico, não foi possível encontrar estudos abordando o papel do Kt/V standard nesse sentido. Contudo, valores mais altos de Kt/V standard podem estar associados a valores mais elevados de bicarbonato sérico, dado que seu cálculo requer as duas últimas variáveis mencionadas (o próprio Kt/V e a frequência semanal de diálise).
O estudo apresenta algumas limitações, a principal das quais o fato de dispormos de uma amostra relativamente pequena e não representativa da população brasileira. Tais limitações restringem a generalização de nossos achados. Contudo, as informações geradas sobre esta importante e inexplorada questão no Brasil - a acidose metabólica na hemodiálise de manutenção - são de grande valia.
A média de tCO2 sérico pré-diálise nas sessões de meio de semana na amostra estudada foi de 22,7 mEq/L. A taxa de prevalência de bicarbonato sérico abaixo da recomendação do DOQI (22mEq/L ou superior) foi de 40,3%, com 6,5% apresentando bicarbonato sérico abaixo de 18 mEq/L. O número de usos do dialisador e o uso de dialisadores de membrana de baixo fluxo foram associados negativamente a níveis séricos de bicarbonato. Idade avançada e valores mais elevados de Kt/V apresentaram associação positiva com os níveis séricos de bicarbonato.
Nossos achados estão em conformidade com dados globais relatados em estudos anteriores, mas um estudo mais abrangente abordando dados nacionais se faz necessário para consubstanciar nossos achados.