versão On-line ISSN 1678-4464
Cad. Saúde Pública vol.33 no.1 Rio de Janeiro 2017 Epub 23-Jan-2017
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00107616
This study aimed to perform the cross-cultural adaptation and validation of the Patient-Reported Outcomes Measurement Information System (PROMIS) Global Health scale in the Portuguese language. The ten Global Health items were cross-culturally adapted by the method proposed in the Functional Assessment of Chronic Illness Therapy (FACIT). The instrument's final version in Portuguese was self-administered by 1,010 participants in Brazil. The scale's precision was verified by floor and ceiling effects analysis, reliability of internal consistency, and test-retest reliability. Exploratory and confirmatory factor analyses were used to assess the construct's validity and instrument's dimensionality. Calibration of the items used the Gradual Response Model proposed by Samejima. Four global items required adjustments after the pretest. Analysis of the psychometric properties showed that the Global Health scale has good reliability, with Cronbach's alpha of 0.83 and intra-class correlation of 0.89. Exploratory and confirmatory factor analyses showed good fit in the previously established two-dimensional model. The Global Physical Health and Global Mental Health scale showed good latent trait coverage according to the Gradual Response Model. The PROMIS Global Health items showed equivalence in Portuguese compared to the original version and satisfactory psychometric properties for application in clinical practice and research in the Brazilian population.
Keywords: Global Health; Quality of Life; Psychometrics; Validation Studies
El objetivo de este estudio fue realizar la adaptación transcultural de la escala de Salud Global del Patient-Reported Outcomes Measurement Information System (PROMIS) a la lengua portuguesa. Los diez ítems sobre Salud Global se adaptaron transculturalmente mediante el método propuesto por el Functional Assessment of Chronic Illness Therapy (FACIT). La versión final del instrumento en lengua portuguesa fue autoadministrada en 1.010 participantes en Brasil. La precisión de la escala fue verificada usándose el análisis de los efectos suelo y techo, confiabilidad de la consistencia interna y confiabilidad test-retest. Se utilizó el análisis factorial exploratorio y confirmatorio para la evaluación de la validez del constructo y dimensionalidad del instrumento. La calibración de los ítems se realizó mediante el Modelo de Respuesta Gradual, propuesto por Samejima. Cuatro ítems globales necesitaron ajustes tras la realización del pre-test. El análisis de las propiedades psicométricas demostró que la escala de Salud Global tiene una buena confiabilidad, con el coeficiente alfa Cronbach de 0,83 y el coeficiente de correlación intraclase de 0,89. Los análisis factoriales exploratorio y confirmatorio revelaron un buen ajuste al modelo previamente establecido de dos dimensiones. Las escalas de Salud Física Global y Salud Mental Global presentaron una buena cobertura del trazo latente, de acuerdo con el Modelo de Respuesta Gradual. Los ítems Salud Global del PROMIS adaptados a la lengua portuguesa presentaron equivalencia, respecto a la versión original y propiedades psicométricas satisfactorias para la aplicación dirigida a la población brasileña en la práctica clínica y en investigaciones.
Palabras-clave: Salud Global; Calidad de Vida; Psicometría; Estudios de Validación
Saúde é um "estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade" 1 (p. 100). As medidas de saúde global são usadas para avaliar a perspectiva do próprio paciente acerca de diversos aspectos da sua saúde, ao contrário das avaliações específicas de funções, sintomas ou doenças 2.
A aplicação das medidas de resultados relatados pelo paciente, que incorporam a perspectiva do próprio indivíduo acerca de sua saúde e tratamento, tem ganho relevância na prática clínica e em pesquisa, complementando as avaliações objetivas tradicionais 3), (4), (5.
Diante disso, o Patient-Reported Outcomes Measurement Information System (PROMIS), uma iniciativa do National Institutes of Health (NIH), dos Estados Unidos, revolucionou a área de medidas de resultados relatados pelo paciente ao fornecer bancos de itens precisos e válidos, de vários domínios da saúde, calibrados pela Teoria de Resposta ao Item (TRI) e destinados à avaliação do impacto de diversas doenças crônicas na qualidade de vida dos indivíduos 6), (7.
Dentre os instrumentos do PROMIS, a escala de Saúde Global destaca-se por possibilitar coletar percepções gerais de saúde física, mental e social, com poucos itens e em tempo reduzido, em relação às medidas tradicionais 8), (9. Esse instrumento tem grande aplicabilidade, destina-se a uma variedade de doenças crônicas e é preditivo de eventos futuros importantes, tais como a utilização dos serviços de assistência à saúde e mortalidade 2.
A escala de Saúde Global do PROMIS em sua versão original apresenta propriedades psicométricas adequadas, com valores de confiabilidade de 0,81 para a escala específica de Saúde Física Global e de 0,86 para a escala específica de Saúde Mental Global, que juntos requerem cerca de dois minutos para serem preenchidos pelo próprio indivíduo 8.
Os itens originais do PROMIS foram desenvolvidos em inglês, o que inviabiliza o seu uso em países de outras línguas. Desse modo, a literatura recomenda o processo de tradução e adaptação transcultural desses itens, por meio de métodos rigorosos e amplamente utilizados, além da verificação da confiabilidade e validade para a sua utilização em outras culturas ou países 10), (11), (12), (13), (14. Após esses procedimentos, o instrumento pode ser utilizado em ensaios clínicos, estudos multicêntricos e na prática clínica de profissionais da saúde.
A escala de Saúde Global do PROMIS já foi traduzida para diversos idiomas como espanhol, holandês, francês, alemão, italiano e chinês 15. Assim, o objetivo deste estudo foi realizar a adaptação transcultural da escala de Saúde Global do PROMIS para a língua portuguesa.
Estudo transversal de adaptação transcultural da escala de Saúde Global do PROMIS para a língua portuguesa, realizado após autorização da PROMIS Health Organization (PHO).
O short form Saúde Global do PROMIS é composto por 10 itens que avaliam aspectos de saúde física, mental e social, além de um item para a classificação da saúde geral, sendo administrado no formato papel e caneta ou por via eletrônica 2. Esse instrumento é composto por duas escalas específicas, Saúde Física Global e Saúde Mental Global, cada uma composta por quatro itens. A escala de Saúde Física Global inclui itens de saúde física (Global 03), função física (Global 06), intensidade da dor (Global 07) e fadiga (Global 08). E a escala de Saúde Mental Global é constituída pelos itens de qualidade de vida (Global 02), saúde mental (Global 04), satisfação com atividades sociais e relacionamentos (Global 05) e problemas emocionais (Global 10). Dois itens, saúde geral (Global 01) e papéis sociais (Global 09), não são utilizados para a pontuação das escalas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global. As categorias de respostas são escalas do tipo Likert de 5 pontos, exceto o item Global 07 que é avaliado por uma escala de 0 a 10, na qual o 0 significa ausência de dor e 10, presença da pior dor imaginável. Os itens globais 07, 08 e 10 tratam de conceitos negativos como, dor, fadiga e problemas emocionais, respectivamente, sendo necessária a recodificação dos seus escores para que altas pontuações reflitam melhor a saúde global. O escore desse instrumento varia de 10 a 50, sendo que quanto maior a pontuação, melhor a saúde global do respondente 8.
Além desse instrumento, foi utilizado o World Health Organization Quality of Life Instruments-brief version (WHOQOL-BREF), que avalia a qualidade de vida e é validado para a população brasileira 16), (17. É constituído por 26 questões, utiliza uma escala de resposta do tipo Likert de 5 pontos e foi usado a fim de verificar o grau de correlação de seus domínios físico e psicológico com as escalas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global do PROMIS.
Também foi utilizado um questionário sociodemográfico e clínico concebido para o estudo a fim de caracterizar os participantes quanto às variáveis idade, gênero, grau de escolaridade, estado civil, raça e presença de doença crônica.
A Figura 1 resume o processo de adaptação transcultural da escala de Saúde Global do PROMIS, que foi realizado em duas etapas principais: (1) tradução e avaliação da equivalência semântica, e (2) avaliação da equivalência de mensuração.
Utilizou-se o método sistemático, de múltiplos estágios, e abordagem universal propostos pelo Functional Assessment of Chronic Illness Therapy (FACIT) e requerido pela PHO 13. A versão original em inglês dos itens sobre Saúde Global do PROMIS foi traduzida, simultaneamente, para a língua portuguesa por dois tradutores bilíngues independentes, fluentes nas línguas inglesa e portuguesa, um nativo do Brasil e o outro em Portugal. Em seguida, um terceiro tradutor bilíngue, brasileiro nativo e fluente em inglês, fez a reconciliação das duas traduções iniciais. A versão reconciliada foi retrotraduzida por um tradutor nativo usuário do inglês norte-americano, fluente na língua portuguesa, e sem conhecimento da versão original do instrumento. A versão retrotraduzida foi enviada à FACITtrans, empresa de tradução e validação linguística, licenciada pelo FACIT, e ao centro de coordenação de traduções do PROMIS na Universidade de Northwestern (Estados Unidos), para revisão e comentários. Logo após, quatro revisores bilíngues independentes, três nativos no Brasil e um nativo em Portugal, analisaram todas as etapas anteriores e selecionaram a tradução mais adequada para cada item ou forneceram traduções alternativas. O FACITtrans, o centro de coordenação de traduções do PROMIS e um coordenador de linguagem do Brasil foram responsáveis pela reconciliação entre as traduções propostas pelos revisores nativos do Brasil e em Portugal e a aprovação da versão para a fase de pré-teste.
a) Participantes do pré-teste
A versão pré-teste foi administrada em uma amostra de conveniência de 10 participantes 18. Foram incluídos indivíduos com idades entre 18 e 60 anos, com doenças crônicas e em acompanhamento no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, localizado no Estado de Minas Gerais, Brasil. Esses participantes deveriam ter habilidades de escrita e leitura da língua portuguesa, verificadas pela aplicação de um item do instrumento selecionado de modo aleatório.
b) Pré-teste
O pré-teste foi realizado para identificar e corrigir possíveis problemas de tradução. Após o preenchimento do instrumento pelo próprio indivíduo, realizou-se uma entrevista retrospectiva de esclarecimento, para verificar se houve itens de difícil compreensão, irrelevantes ou ofensivos, e uma entrevista retrospectiva cognitiva, a fim de verificar a compreensão de cada item, por meio da técnica de sondagem verbal 19. O critério estabelecido para revisão e modificação da tradução foi compreensão dos itens por menos de 80% dos entrevistados ou sugestão de modificações por mais de 20% dos respondentes 20.
a) Participantes
A versão final em português do Brasil da escala de Saúde Global do PROMIS foi autoadministrada em uma amostra de conveniência de 1.010 participantes. Para garantir uma representação sociodemográfica e clínica heterogênea para calibração dos itens do instrumento, foram convidados a participar desta fase indivíduos com doenças crônicas ou saudáveis, com idades entre 18 e 60 anos, de ambos os sexos, distintas classificações étnico-raciais e níveis de escolaridade. Os indivíduos foram classificados como saudáveis ou com doença crônica por meio do autorrelato de doenças previamente existentes ou em acompanhamento. Os participantes deveriam ter habilidades de escrita e leitura da língua portuguesa, verificadas pela administração de um item do short form selecionado de modo aleatório, e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido. Os indivíduos foram abordados, consecutivamente, no ambulatório de diversas especialidades médicas do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia. O tamanho da amostra atende às recomendações para calibração dos itens pelo Modelo de Resposta Gradual proposto por Samejima 21, que exige cerca de 500 a 1.000 indivíduos 22), (23. Além da versão final em português do Brasil da escala de Saúde Global do PROMIS, os participantes preencheram um questionário sociodemográfico e clínico e o WHOQOL-BREF, versão para a língua portuguesa 16), (17.
Medidas de tendência central e dispersão foram utilizadas para a caracterização das variáveis sociodemográficas e clínicas dos pesquisados.
Verificada por meio da análise dos dados perdidos e dos efeitos piso e teto. Os dados perdidos referem-se à proporção de respondentes que não completaram pelo menos um item da escala. Já os efeitos piso e teto representam a proporção de participantes que obtiveram os menores e maiores escores, respectivamente, em cada item da escala. Neste estudo, uma taxa de resposta igual ou superior a 80% foi avaliada como aceitável, e os efeitos piso e teto foram considerados presentes quando excederam a 10% 24), (25.
Verificada usando-se o coeficiente alfa de Cronbach, sendo recomendado como padrão aceitável valores acima de 0,50 25. Para a análise da confiabilidade teste-reteste utilizou-se o coeficiente de correlação intraclasse (CCI), para o qual 100 participantes completaram a escala de Saúde Global após 14 dias da primeira aplicação. Em geral, valores de CCI acima de 0,75 são considerados adequados 26.
Os itens sobre Saúde Global do PROMIS, bem como suas escalas específicas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global, foram correlacionados com os domínios físico e psicológico do WHOQOL-BREF, versão para a língua portuguesa 16), (17. O coeficiente de correlação de Spearman foi utilizado para a avaliação dessa validade. Um nível de correlação menor que 0,29 é considerado fraco, de 0,30 a 0,49 moderado e acima de 0,50 forte 27.
A dimensionalidade consiste no número de fatores dominantes responsáveis por expressar o traço latente, ou seja, as características individuais não diretamente observáveis e avaliadas por meio das respostas aos itens do instrumento 28. Neste estudo foram realizadas a análise fatorial exploratória (AFE) e análise fatorial confirmatória (AFC) para verificar a dimensionalidade do short form Saúde Global do PROMIS versão para a língua portuguesa, que é um pressuposto importante dos modelos da TRI. A AFE foi realizada para identificar a estrutura fatorial desta versão do instrumento. O índice Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de esfericidade de Bartlett foram usados para determinar a fatorabilidade da matriz de correlação. A variância total explicada pelo primeiro fator de pelo menos 20% e autovalores acima de 1,0 foram os critérios utilizados para a determinação do número de dimensões 29. O instrumento original é composto por duas escalas específicas, Saúde Física Global e Saúde Mental Global, cada uma composta por quatro itens, sendo que os dois itens restantes (Global 01 e Global 09) são analisados separadamente 8. Realizou-se a AFC para verificar se o modelo de duas dimensões previamente estabelecido é ajustado aos dados 30. O método de estimação Diagonally Weighted Least Squares (DWLS) e os índices de ajustamento dos modelos Comparative Fit Index (CFI), Tucker-Lewis Index (TLI), Root Mean Square Error Aproximation (RMSEA) e Standardized Root Mean Squared Residual (SRMR) foram utilizados para esta análise. Valores de CFI > 0,95; TLI > 0,95; RMSEA < 0,06 e SRMR < 0,08 são recomendados como um bom ajuste do modelo 29), (30), (31), (32.
A calibração dos itens sobre Saúde Global do PROMIS versão para a língua portuguesa foi realizada por meio do Modelo de Resposta Gradual proposto por Samejima 21 para cada escala, Saúde Física Global e Saúde Mental Global, separadamente, por se tratar de um instrumento multidimensional. Esse modelo da TRI permite estimar os parâmetros de dificuldade e discriminação do item, por meio do método de máxima verossimilhança marginal. Os parâmetros de dificuldade (b1, b2, b3, b4) correspondem ao valor do traço latente para o qual a probabilidade de responder a um determinado item é de 50%, e posicionam os itens ao longo do continuum do construto. Já o parâmetro de discriminação (a) possibilita diferenciar os respondentes com níveis próximos do traço latente que está sendo aferido 29. Valores do parâmetro de discriminação de 0,01 a 0,34 são considerados muito baixos; de 0,35 a 0,64 baixos; de 0,65 a 1,34 moderados; de 1,35 a 1,69 altos; e acima de 1,70 muito altos 33.
Os softwares SPSS 17.0 (SPSS Inc., Chicago, Estados Unidos), LISREL 8.8 (Linear Structural Relationships. Jöreskog K, Sörbom D. Scientific Software International, Lincolnwood, Estados Unidos) e Multilog versão 7 (Scientific Software Inc., Chicago, Estados Unidos) foram utilizados para as análises estatísticas. O nível de significância estatística estabelecido foi de p < 0,05.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Uberlândia (CEP-UFU), sob o protocolo 443/10 e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Em relação ao processo de tradução, as discrepâncias mais frequentes entre os tradutores do Brasil e de Portugal foram quanto à inclusão do pronome pessoal de tratamento "você" em nove de dez itens, o uso do artigo definido antes do pronome possessivo, a inclusão da palavra "grau" nos itens globais 05, 07 e 08 e o uso da ênclise na tradução do item Global 10. A principal divergência entre os tradutores do Brasil e de Portugal está relacionada com a tradução de duas categorias de respostas, "regular" e "ruim", que não foram consideradas adequadas para Portugal. A equipe do FACITtrans, o centro de coordenação de traduções do PROMIS na Universidade de Northwestern e o coordenador de linguagem no Brasil foram responsáveis por resolver a maior parte das divergências, na tentativa de propiciar a harmonização entre a língua portuguesa do Brasil e de Portugal. Quaisquer diferenças irreconciliáveis restantes serão abordadas quando a versão de língua portuguesa da escala de Saúde Global for testada em Portugal.
Participaram do pré-teste 10 sujeitos com idade média de 35,6 anos ± 11,8, 50% eram do sexo feminino, 50% brancos e 30% tinham menos que o ensino médio de escolaridade. Todos os pesquisados consideraram os itens relevantes, não ofensivos, de fácil entendimento e compreenderam as opções de respostas. Nenhum participante sugeriu modificações no instrumento. Os itens globais 05, 07, 08 e 09 necessitaram de ajustes após a realização do pré-teste. Esses itens foram novamente testados em uma amostra de cinco pacientes com doenças crônicas, a fim de verificar a compreensão dos mesmos após as modificações realizadas na tradução 18. Esses quatro itens foram compreendidos por todos os participantes, garantindo equivalência conceitual e semântica com a versão original. Na Tabela 1 são apresentados todos os itens do instrumento em suas versões pré-teste e final, sendo explicadas as razões dos ajustes necessários nos quatro itens globais citados. A versão final da escala de Saúde Global do PROMIS para a língua portuguesa deve ser requisitada no Health Measures (http://www.healthmeasures.net) e na PHO.
Participaram desta fase do estudo 1.010 sujeitos, sendo 511 indivíduos saudáveis (50,6%) e 499 com doenças crônicas (49,4%), com idade média de 36,3 anos, 50,1% eram do sexo masculino, 43,5% tinham entre 12 e 15 anos de escolaridade, 70,6% eram casados e 69,5% com classificação étnico-racial branca (Tabela 2). As doenças crônicas mais prevalentes autorrelatadas pelos participantes foram hipertensão (31,3%), comprometimentos de coluna (19,9%), diabetes (11,3%) e enxaqueca (8,8%).
Não houve dados perdidos e efeito piso. Já o efeito teto foi observado em oito itens na amostra total da validação, em todos os itens no grupo de indivíduos saudáveis e em quatro itens no grupo de indivíduos doentes (Tabela 3).
A escala de Saúde Global do PROMIS, versão para a língua portuguesa, e suas escalas específicas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global apresentaram coeficientes alfa de Cronbach de 0,83, 0,63 e 0,65, respectivamente. O CCI foi de 0,89 (p = 0,00; IC95%: 0,86-0,92).
O teste de Kolmogorov-Smirnov indicou ausência de normalidade na distribuição da amostra (p < 0,01), portanto, utilizou-se o coeficiente de correlação de Spearman para a avaliação desta validade. A correlação entre a escala de Saúde Global do PROMIS e os domínios físico e psicológico do WHOQOL-BREF foi significativa, de moderada a forte (p < 0,01; rho = 0,478 e 0,571, respectivamente). A escala de Saúde Física Global apresentou uma correlação moderada com o domínio físico do WHOQOL-BREF (rho = 0,461) e a escala de Saúde Mental Global apresentou uma correlação forte com o domínio psicológico deste instrumento (rho = 0,542).
Os valores obtidos do índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,863) e do teste de esfericidade de Bartlett (χ² = 3.730,97; p < 0,000) revelaram uma correlação significativa entre os itens, confirmando a adequação da aplicação da AFE. A análise dos componentes principais com a presença de dois fatores, Saúde Física Global e Saúde Mental Global, explicou 56,96% da variância total, sendo que 43,10% foram explicadas pelo primeiro fator.
A AFC revelou um bom ajuste ao modelo previamente estabelecido de duas dimensões, já que produziu os seguintes índices de ajustamento, com valores muito próximos aos recomendados pela literatura 29), (30), (31), (32: CFI = 0,95; TLI = 0,95; RMSEA = 0,13 (IC90% = 0,12-0,14); e SRMR = 0,08. A correlação entre os dois fatores foi de 0,96 (p < 0,001).
A Tabela 4 resume os parâmetros dos itens, discriminação e dificuldade, estimados para as escalas específicas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global do PROMIS por meio do Modelo de Resposta Gradual proposto por Samejima (21. Na escala de Saúde Física Global, os valores do parâmetro de discriminação foram considerados de moderados a altos (1,06 a 1,44) e o item mais discriminativo foi o Global 07. Já na escala de Saúde Mental Global, os valores do parâmetro de discriminação foram de baixo a muito alto (0,57 a 3,06) e o item mais discriminativo foi o Global 04. O parâmetro de dificuldade do item variou de -4,80 a 2,30 na escala de Saúde Física Global e de -7,58 a 2,03 na escala de Saúde Mental Global.
No presente estudo, foi descrito o processo de tradução e adaptação transcultural da escala de Saúde Global do PROMIS para a língua portuguesa, atendendo ao rigor metodológico preconizado na literatura internacional 12), (13. Além disso, apresentou-se evidências que sustentam a adequação das propriedades psicométricas desta versão do instrumento para a população brasileira, conforme recomendado por seus desenvolvedores 29.
A versão final da escala de Saúde Global do PROMIS para a língua portuguesa, semelhante à de outros estudos de tradução 34), (35), (36), (37, apresentou equivalência conceitual, semântica, cultural, operacional e de mensuração em relação aos itens originais no inglês.
Os resultados observados no presente estudo indicaram confiabilidade, validade e calibração dos itens pela TRI adequadas, assim como a versão original deste instrumento 8. A escala de Saúde Global tem sido amplamente utilizada em diferentes contextos 38), (39), (40), (41), (42), (43, já que apresenta boas propriedades psicométricas e tempo reduzido para o preenchimento em relação às medidas tradicionais 44.
Neste estudo, a ausência de dados perdidos e efeito piso indicou uma boa aceitabilidade desse instrumento para a população brasileira. A alta ocorrência do efeito teto no grupo de indivíduos saudáveis era esperada, uma vez que a maioria tem uma boa autopercepção do seu estado de saúde. A amostra de pessoas doentes pode explicar a ocorrência desse efeito nos itens de função física, dor, fadiga e problemas emocionais nesse grupo, visto que a coleta de dados foi realizada em ambulatórios de acompanhamento de doenças em estágios iniciais ou já bem controladas. O efeito teto também foi observado em todas as versões reduzidas do Banco de Itens Função Física do PROMIS em uma amostra diversa de pacientes com câncer 45. A administração do Banco de Itens Função Física do PROMIS em amostras de populações clínicas e gerais por meio do Teste Adaptativo Computadorizado reduz a ocorrência do efeito teto, uma vez que personaliza o instrumento para o nível de comprometimento do indivíduo, já que os itens serão selecionados de acordo com as respostas previamente dadas pelos sujeitos 46. No entanto, esse modo de administração não está disponível para a escala de Saúde Global que é multidimensional e já por si é um short form.
A escala de Saúde Global do PROMIS, versão para a língua portuguesa, revelou ser precisa e reprodutível através do tempo, o que foi confirmado pelos valores adequados de coeficiente alfa de Cronbach e coeficiente de correlação intraclasse, respectivamente 25), (26. Além disso, o instrumento demonstrou evidências de validade convergente, pois correlacionou-se em níveis de moderados a altos com os domínios físico e psicológico do WHOQOL-BREF, como era esperado, já que ambos, teoricamente, medem o mesmo construto. Os achados também sustentaram a estrutura de dois fatores do modelo previamente hipotetizado e semelhante à versão original do instrumento 8, o que confirma a multidimensionalidade da escala de Saúde Global do PROMIS, que é representada por duas escalas específicas, Saúde Física Global e Saúde Mental Global.
As análises de confiabilidade e validade têm sido recomendadas pelos pesquisadores do PROMIS como forma de verificar se o instrumento é preciso e realmente mede o conceito alvo pretendido, e se sua estrutura fatorial está adequadamente representada, o que demonstra sua dimensionalidade, ou seja, o número de construtos dominantes que compõem o instrumento de avaliação 29), (47.
A estimação dos parâmetros de dificuldade e discriminação dos itens, isto é, a calibração, é de fundamental importância, uma vez que possibilita posicionar os itens ao longo do continuum do traço latente e detectar diferenças entre os indivíduos avaliados. As escalas de Saúde Física Global e Saúde Mental Global apresentaram boa cobertura do traço latente subjacente. Além disso, ambas as escalas apresentaram itens com bons parâmetros de discriminação, o que possibilita diferenciar pessoas com distintos níveis do construto medido. Os itens menos discriminativos foram os que trataram de conceitos negativos, assim como na versão original do instrumento 8.
Uma limitação deste estudo foi o número elevado de efeito teto detectado, o que poderia ser melhor avaliado em pesquisas com uma amostra mais específica, composta por pessoas com doenças crônicas com diversos níveis de comprometimento, uma vez que neste estudo os indivíduos apresentavam em sua maioria hipertensão, comprometimentos de coluna, diabetes e enxaqueca. Ressalta-se também a necessidade do processo de adaptação cultural da escala de Saúde Global do PROMIS em outros países que tenham a língua portuguesa como a oficial, diante de algumas divergências irreconciliáveis entre os tradutores nativos do Brasil e de Portugal, a exemplo do ocorrido na tradução de alguns instrumentos do PROMIS para o holandês e o flamengo 37.
Os resultados encontrados demonstraram que esse instrumento é confiável e válido para aplicação no Brasil, e atende aos critérios de qualidade propostos para medidas de resultados relatados pelo paciente 48), (49.
A escala de Saúde Global do PROMIS versão para a língua portuguesa apresenta equivalência conceitual, semântica, cultural e operacional em relação aos itens originais, e propriedades psicométricas satisfatórias para a aplicação direcionada à população brasileira na prática clínica e em pesquisa.