versão impressa ISSN 1677-5449versão On-line ISSN 1677-7301
J. vasc. bras. vol.16 no.3 Porto Alegre jul./set. 2017 Epub 12-Set-2017
http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.011816
A atividade física (AF) corresponde a qualquer movimento realizado pelo corpo em que há dispêndio energético. Trata-se de um hábito importante para a manutenção da saúde, prevenção de doenças, bem-estar e desenvolvimento psicomotor, apresentando relação com o balanço energético e o controle da massa corporal1,2. A ausência de AF, denominada “inatividade”, corresponde ao quarto fator indireto de risco global para mortalidade. Sua prevalência tem aumentado em todo o mundo, bem como suas implicações no incremento das doenças crônicas não transmissíveis, como as doenças cardiovasculares (DCV)3,4.
Além disso, atualmente, há necessidade de avaliar a exposição tanto a baixo nível de AF quanto aos comportamentos sedentários (CS). Isso é importante porque existem evidências sugerindo que a inatividade física e o sedentarismo são comportamentos independentes e têm diferentes efeitos sobre a saúde5. O último está associado ao uso de equipamentos eletrônicos (computador, televisão e/ou videogame) por tempo igual ou superior a 2 horas diárias, definido como “tempo de tela”6.
Embora estejam associados a um aumento da morbimortalidade por DCV, ambos representam fatores de risco modificáveis, e que são mais bem-sucedidos na prevenção dessas morbidades quando implementados em fases precoces do ciclo vital. A DCV tem um longo período de latência, porém o surgimento dos fatores de risco (alterações no metabolismo lipídico, hipertensão arterial, resistência insulínica, tabagismo, inatividade física e obesidade) é precoce7.
Durante a adolescência, observa-se que a presença de dois ou mais fatores de risco é suficiente para a predição de um evento cardiovascular nos próximos 10 anos. Isso porque tais fatores, quando unidos, elevam a extensão e a gravidade das lesões vasculares, prevalecendo na fase adulta8. Com base nessa perspectiva, foram criados escores de estratificação de risco cardiovascular (RCV) capazes de predizer a ocorrência futura de eventos cardíacos patológicos.
O escore Pathobiological Determinants of Atherosclerosis in Youth (PDAY) estratifica precocemente (indivíduos de 15 a 34 anos) o risco para doença aterosclerótica e estabelece como premissa que fatores de risco para DCV estão associados, décadas antes do desfecho cardiovascular, com ambas as fases (inicial e avançada) das lesões ateroscleróticas na carótida e na aorta abdominal durante a adolescência e início da vida adulta9-11.
A estratificação do risco é obtida pela soma dos valores atribuídos a fatores modificáveis – colesterol não HDL, colesterol HDL, tabagismo, pressão arterial, índice de massa corporal (IMC), glicemia de jejum (GJ) e hemoglobina glicosilada HBA1c – e não modificáveis avaliados (idade, sexo). Se o resultado obtido for superior a zero, ele deve ser plotado no gráfico da probabilidade estimada para lesões ateroscleróticas graves na carótida e na aorta abdominal, órgãos-alvo8,10.
Tal escore é normalizado de modo que o aumento de uma unidade é equivalente a uma alteração exponencial positiva nas chances de lesão. Outro ponto relevante corresponde à idade. Para cada aumento de 5 anos na idade, o mesmo valor de pontos é adicionado. Assim, valores atribuídos aos fatores de risco modificáveis são equivalentes a 11 anos8,10.
Diante do exposto, e considerando a relativa escassez de estudos que utilizam os critérios do PDAY para a estratificação do RCV em adolescentes, e ainda sendo relevante verificar a sua aplicação e associação simultânea com o padrão de AF e com a exposição ao CS, este estudo visa identificar a prevalência destes em adolescentes e a associação dessas variáveis com o RCV mensurado pelo escore PDAY.
Estudo transversal desenvolvido em escolas públicas estaduais de ensino médio da zona urbana municipal entre setembro de 2012 e junho de 2013. A população-alvo deste estudo foi constituída por 9.294 escolares com idade entre 15 e 19 anos matriculados em 264 turmas do ensino médio. O cálculo amostral considerou a estimativa de proporção de 50%, erro amostral de 5%, efeito do desenho (deff) de 1,5 (fator de correção para amostragem aleatória por conglomerado) e um acréscimo de 3% para eventuais perdas ou recusas, resultando na estimativa de 570 adolescentes.
A seleção de participantes ocorreu pela inexistência de situações, permanentes ou temporais, que prejudicassem a prática de AF ou comprometessem a realização dos procedimentos do estudo: gravidez; doença subjacente que cursasse com alteração do metabolismo dos lipídeos e/ou da glicemia, sendo incluídos 583 adolescentes. No entanto, sete desses recusaram-se a participar de alguma etapa do estudo, perfazendo, ao final, 576 adolescentes avaliados em 39 turmas de 18 escolas.
Para a coleta de dados, foi utilizado formulário para as variáveis socioeconômicas, demográficas e de estilo de vida. Para obtenção da massa corporal, foi utilizada balança digital Tanita® com capacidade para 150 kg e precisão de 0,1 kg. A estatura foi aferida através de estadiômetro portátil Tonelli® com precisão de 0,1 cm. A circunferência abdominal foi avaliada com fita métrica inelástica Cardiomed® com precisão de 0,1 cm no ponto médio entre a extremidade da última costela e a crista ilíaca, onde a fita métrica foi posicionada horizontalmente e mantida de tal forma que permanecesse na posição ao redor do abdômen sobre o nível da cicatriz umbilical, para que se procedesse à leitura da circunferência no milímetro mais próximo. Para aferição da pressão arterial foram utilizados aparelhos semiautomáticos OMRON–HEM 705CP®, seguindo as recomendações relatadas nas VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial12. A coleta sanguínea ocorreu sempre no período da manhã, após jejum prévio de 12 horas.
A idade foi avaliada em anos e o sexo como masculino/feminino. A cor foi categorizada em “branca” e “não branca”. A escolaridade materna foi verificada em anos completos e classificada em duas categorias: menor que 9 anos e 9 anos ou mais13. A classe econômica foi definida pelo escore construído pela soma da pontuação referente à posse e à quantidade de bens de consumo, empregada mensalista e grau de instrução do chefe de família e correspondente a uma determinada renda mensal familiar, definida pelos seguintes pisos: A1 = R$ 12.926,00; A2 = R$ 8.418,00; B1 = R$ 4.418,00; B2 = R$ 2.565,00; C1 = R$1.541,00; C2 = R$ 1.024,00; D = R$ 714,00; E = R$ 477,0014. A escolaridade materna foi verificada em anos completos e classificada em duas categorias: menor que 9 anos e 9 anos ou mais13.
O tabagismo foi classificado considerando-se duas categorias: fumante atual (pelo menos um cigarro/dia nos últimos 6 meses) e nunca fumou, uma vez que sua relação com alterações no metabolismo lipídico se dá apenas quando consumidas 11 unidades diárias15.
A prática de AF correspondeu à AF acumulada, combinando os tempos e as frequências com que foram realizadas atividades como: deslocamento para a escola (a pé ou de bicicleta), aulas de educação física na escola e outras atividades físicas extraescolares. Para a análise, os inativos e insuficientemente ativos I (até 149 minutos/semana) compuseram uma categoria, enquanto os insuficientemente ativos II (150 minutos ou mais/semana) e ativos (≥ 300 minutos/semana) constituíram a segunda. Foi considerado sedentário o adolescente que tivesse 2 ou mais horas/dia gastas no “tempo de tela”6.
O estado nutricional foi classificado de acordo com o IMC, construído a partir da razão do peso (em quilogramas) pelo quadrado da estatura (em metros). Foi utilizado para classificação do estado nutricional, de acordo com o escore z do IMC, segundo a idade e sexo: baixo peso (-3 ≤ escore z < -2), eutrofia (-2 ≤ escore z < +1), sobrepeso (+ 1 ≤ escore z < +2), obesidade (+2 ≤ escore z < +3) e obesidade acentuada (escore z ≥ +3). Para os maiores de 18 anos, os pontos de corte do IMC (em kg/m2) foram: baixo peso (< 17,5), eutrofia (17,5 ≤ IMC < 25,0), sobrepeso (25,0 ≤ IMC < 30,0) e obesidade (≥ 30,0)16,17. A circunferência abdominal foi classificada como aumentada para valores iguais ou superiores ao percentil 9018, porém com limite mínimo de 88 cm para mulheres e de 102 cm para os homens, de acordo com o National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel III19.
A pressão arterial elevada foi caracterizada pelos valores de pressão arterial sistólica e/ou diastólica iguais ou superiores ao percentil 95 para idade, sexo e percentil de estatura, de acordo com as tabelas específicas. Além disso, os valores de pressão arterial sistólica e diastólica iguais ou superiores a 120 mmHg e/ou 80 mmHg, respectivamente, foram considerados elevados, independente do percentil 95, para os adolescentes com 17 anos ou menos, após determinação prévia dos percentis de estatura pelos gráficos de desenvolvimento. A partir desta idade, considerou-se elevada a pressão arterial sistólica ≥ 130 mmHg e/ou diastólica ≥ 85 mmHg, independentemente do percentil12.
Foram avaliadas as variáveis bioquímicas necessárias à construção do escore de RCV pelo PDAY e, portanto, foram utilizados os critérios de referência desse escore: GJ ≥ 126 mg/dL, HDL-c < 40 mg/dL e colesterol não HDL > 130 mg/dL20. O ponto de corte da hemoglobina glicada HBA1c foi ajustado para referência mais atualizada, respeitando a pontuação do escore (> 6,5%)21.
A estratificação de risco foi construída pelo somatório de pontos, assim atribuídos: idade = 0 (adolescentes), sexo (masculino = 0, feminino = -1), não HDL-colesterol (< 130 mg/dL = 0; ≥ 130 mg/dL = 2 a 8), HDL-colesterol (< 40 mg/dL = 1; 40 a 59 mg/dL = 0; ≥ 60 mg/dL = -1), tabagismo (não = 0; sim = 1), pressão arterial (normal = 0; alterada = 1), IMC (pontua apenas para homens, quando > 30 kg/m2 = 6), e hiperglicemia (GJ < 126 mg/dL e HbA1c < 6,5% = 0; GJ ≥ 126 mg/dL e HbA1c ≥6, 5% = 5). Sobre o cálculo e análise de resultados, os adolescentes foram classificados como de baixo risco quando o somatório totalizou entre 0 e 1; de risco intermediário, entre 1 e 4; e de alto risco, se maior ou igual a 521. Somatórios inferiores a zero foram considerados inadequados à estratificação do risco de lesão aterosclerótica22, uma vez que correspondem quantitativamente a perfis íntegros de sanidade e, por conseguinte, de baixo risco.
Os dados foram analisados no SPSS, 22.0. Foram utilizadas medidas descritivas, teste do qui-quadrado de Pearson, teste exato de Fisher (quando necessário) e regressão logística binomial para verificar a associação entre variáveis independentes e RCV. Adotou-se intervalo de confiança de 95%. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba (CAEE: 0077.0.133.000-12).
A amostra estudada foi de 576 escolares adolescentes de Campina Grande (PB), Brasil. Dentre os adolescentes avaliados, a média etária foi de 16,8 (±1,0) anos. A maioria era do sexo feminino (66,8%), não branco (78,7%), com menos de 9 anos de escolaridade materna (58,1%), e pertencentes às classes econômicas C, D e E (69,1%).
Dentre as mulheres, 79,5% (n = 299) consideraram-se não brancas, 56,6% tinham escolaridade materna superior a 9 anos, e 71.7% pertenciam às classes econômicas C, D e E. Da mesma forma, os homens identificaram-se, na maioria, como não brancos (77,1%) e pertenciam às classes C, D e E (63,9%). Nenhum adolescente foi classificado como pertencente à classe A1, e não foi observada diferença estatisticamente significante entre os sexos (Tabela 1).
Tabela 1 Distribuição dos adolescentes de acordo com as características socioeconômicas e demográficas, segundo o sexo. Campina Grande, PB, Brasil (2012-2013).
Variável | Masculino | Feminino | RP | p | IC 95% | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||||
Cor da pele (n = 563)* | 0,968 | 0,512 | 0,881-1,063 | ||||
Branca | 43 | 23,0 | 77 | 20,5 | |||
Não-branca | 144 | 77,0 | 299 | 79,5 | |||
Total | 187 | 100 | 376 | 100 | |||
Escolaridade materna (n = 568)* | 0,832 | 0,312 | 0,583-1,188 | ||||
≤ 9 anos | 116 | 61,1 | 214 | 56,6 | |||
> 9 anos | 74 | 38,9 | 164 | 43,4 | |||
Total | 190 | 100 | 378 | 100 | |||
Classe econômica | 0,891 | 0,068 | 0,787-1,008 | ||||
E a C1 | 122 | 63,9 | 276 | 71,7 | |||
B2 a A2 | 69 | 36,1 | 109 | 28,3 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 |
n = frequência absoluta; RP: razão de prevalência; p-valor: erro α de 5%; IC95%: intervalo de confiança de 95%;
*A variabilidade do n deve-se aos estudantes que não quiseram ou não souberam responder às questões.
Verificou-se que ser do sexo masculino favorece a prática de atividade física igual ou superior a 150 minutos semanais - razão de prevalência (RP): 0,484; intervalo de confiança de 95% (IC95%): 0,340-0,688. Quanto ao sedentarismo e ao tabagismo, como fatores de RCV15, não se verificaram diferenças entre os sexos (Tabela 2).
Tabela 2 Distribuição dos adolescentes quanto ao estilo de vida, segundo o sexo. Campina Grande, PB, Brasil (2012-2013).
Variável | Masculino | Feminino | RP | p | IC95% | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||||
Prática de atividade física | 0,484 | < 0,01 | 0,340-0,688 | ||||
0 a 149 minutos/semana | 31 | 16,2 | 129 | 33,5 | |||
≥ 150 minutos/semana | 160 | 83,8 | 256 | 66,5 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Sedentarismo | 0,945 | 0,239 | 0,859-1,040 | ||||
Não | 47 | 24,6 | 78 | 20,3 | |||
Sim | 144 | 75,4 | 307 | 79,7 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Tabagismo (n = 575)* | 1,675 | 0,584† | 0,518-5,420 | ||||
Não | 186 | 97,4 | 378 | 98,4 | |||
Sim | 5 | 2,6 | 6 | 1,6 | |||
Total | 191 | 100 | 384 | 100 |
n = frequência absoluta; RP: razão de prevalência; p-valor: erro α de 5%; IC95%: intervalo de confiança de 95%;
*A variabilidade do n deve-se a um estudante que não quis ou não soube responder à questão;
†Teste exato de Fisher.
A maioria das mulheres apresentou não HDL-colesterol (81,3%) e HDL colesterol (66,8%) dentro dos valores desejáveis. Ser do sexo masculino aumenta em quase duas vezes o risco de ter HDL-c alterado (RP: 1,748; IC95%: 1,452-2,105) e em três vezes a pressão arterial aumentada (RP: 3,001; IC95%: 2,145-4,198).
A classificação do estado nutricional registrou apenas dois adolescentes com baixo peso (0,4%), sendo a maioria eutrófica (62,8%), 44,1% com sobrepeso e 7,3% obesos (dados não tabulados). Para fins de análise, o estado nutricional foi reagrupado: baixo peso e eutrofia passaram a formar uma categoria (63,2%), e sobrepeso e obesidade, outra (36,8%). Quanto à circunferência abdominal, 3,3% da amostra apresentaram alteração. O perfil glicídico, para a maioria dos adolescentes, estava dentro da normalidade (Tabela 3).
Tabela 3 Distribuição dos adolescentes quanto aos fatores de risco cardiovasculares constituintes do escore PDAY, segundo o sexo. Campina Grande, PB, Brasil (2012-2013).
Variáveis | Masculino | Feminino | RP | p | IC95% | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||||
Colesterol não-HDL (mg/dL) | 0,699 | 0,098 | 0,459-1,065 | ||||
Alterado ≥ 130 | 25 | 13,1 | 72 | 18,7 | |||
Desejável < 130 | 166 | 86,9 | 313 | 81,3 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Colesterol HDL (mg/dL) | 1,748 | < 0,01 | 1,452-2,105 | ||||
Alterado < 40 | 111 | 58,1 | 128 | 33,6 | |||
Desejável ≥ 40 | 80 | 41,9 | 257 | 66,8 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Pressão arterial (mmHg) | 3,001 | < 0,01 | 2,145-4,198 | ||||
Alterado | 67 | 35.1 | 45 | 11.7 | |||
Normal | 124 | 64.9 | 340 | 88.3 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Estado nutricional (escore z) | 1,028 | 0,906 | 0,652-1,620 | ||||
Sobrepeso/obeso | 34 | 17,8 | 67 | 17,4 | |||
Baixo peso/eutrófico | 157 | 82,2 | 318 | 82,6 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Circunferência abdominal (cm) | 0,928 | 0,882 | 0,347-2,481 | ||||
Alterado | 6 | 3,1 | 13 | 3,4 | |||
Normal | 185 | 96,9 | 372 | 96,6 | |||
Total | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Glicemia de jejum (mg/dL) | - | - | - | ||||
Alterada | - | - | 1 | - | |||
Normal | 191 | 100 | 385 | 100 | |||
Total | 191 | 100 | 386 | 100 | |||
Hemoglobina glicosilada (%) | - | 0,718* | - | ||||
Alterado | 1 | 0,5 | 1 | 0 | |||
Normal | 189 | 99,5 | 385 | 100 | |||
Total | 190 | 100 | 386 | 100 |
n = frequência absoluta; RP: razão de prevalência; p-valor: erro α de 5%; IC95%: intervalo de confiança de 95%;
*Teste exato de Fisher.
De acordo com o escore global de RCV (PDAY), registraram-se baixo RCV para 57,8% da amostra, risco intermediário para 31,8%, e alto risco para 10,4%. Para fins de análise, o escore foi reagrupado: alto risco e risco intermediário (42,2%) formaram uma categoria, e baixo risco (57,8%), a outra. Os adolescentes do sexo masculino foram maioria quando considerados os escores alto e intermediário (76,7%), já o escore PDAY baixo prevaleceu entre as mulheres (71,9%). Verificou-se que o sexo e a circunferência abdominal representam fatores de risco para o escore PDAY intermediário e alto, ao passo que a prática de AF igual ou superior a 150 minutos semanais representou um fator de proteção (Tabela 4).
Tabela 4 Análise bivariada dos fatores socioeconômicos, demográficos, de estilo de vida e clínicos, segundo o escore de risco PDAY. Campina Grande, PB, Brasil (2012-2013).
Variáveis |
Risco cardiovascular intermediário e alto (n = 60) |
Risco cardiovascular baixo (n = 516) |
RP | p | IC95% | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||||
Sexo | 8,407 | < 0,01 | 4,485-15,758 | ||||
Masculino | 46 | 76,7 | 145 | 28,1 | |||
Feminino | 14 | 23,3 | 371 | 71,9 | |||
Total | 60 | 100 | 516 | 100 | |||
Cor da pele (n = 563)* | 1,337 | 0,424 | 0,655-2,728 | ||||
Não-branca | 48 | 82.8 | 395 | 78.2 | |||
Branca | 10 | 17.2 | 110 | 21.8 | |||
Total | 58 | 100 | 505 | 100 | |||
Escolaridade materna (n = 568)* | 0,783 | 0,385 | 0,450-1,362 | ||||
≤ 9 anos | 38 | 63,3 | 292 | 57,5 | |||
> 9 anos | 22 | 36,7 | 216 | 42,5 | |||
Classe econômica | 1,145 | 1,000 | 0,394-3,322 | ||||
E a C1 | 56 | 93,3 | 477 | 92,4 | |||
B2 a A2 | 4 | 6,7 | 39 | 7,6 | |||
Total | 60 | 100 | 516 | 100 | |||
Prática de atividade física | 0,448 | 0,042 | 0,241-0,988 | ||||
Inativo ou insuficientemente ativo I (0 a 149 min/semana) | 10 | 16,7 | 150 | 29,1 | |||
Insuficientemente ativo II e ativo (≥ 150 min/semana) | 50 | 83,3 | 366 | 70,9 | |||
Total | 60 | 100 | 516 | 100 | |||
Sedentarismo (horas/dia) | 1,122 | 0,736 | 0,576-2,183 | ||||
≥ 2 horas/dia | 48 | 80,0 | 403 | 78,1 | |||
< 2 horas/dia | 12 | 20,0 | 113 | 21,9 | |||
Total | 60 | 100 | 516 | 100 | |||
Circunferência abdominal (cm) | 11,267 | < 0,01 | 4,374-29,023 | ||||
Alterada | 10 | 16,7 | 9 | 1,7 | |||
Normal | 50 | 83,3 | 507 | 98,3 | |||
Total | 60 | 100 | 516 | 100 |
n = frequência absoluta; RP: razão de prevalência; p-valor: erro α de '5%; IC95%: intervalo de confiança de 95%;
*A variabilidade do n deve-se aos estudantes que não quiseram ou não souberam responder à questão.
Quando avaliada conjuntamente, a relação da AF com o RCV deixou de ser significante. Dessa forma, permaneceram no modelo final o sexo e a circunferência abdominal. Ser do sexo feminino e ter circunferência abdominal adequada implicam em uma menor probabilidade de apresentar RCV intermediário ou alto (Tabela 5).
Tabela 5 Análise de regressão logística do risco cardiovascular mensurado pelo escore PDAY e variáveis preditoras. Campina Grande, PB, Brasil (2012-2013).
Variável de saída | Variáveis preditoras | R2 | B(Coef) | p | IC95% | HL* |
---|---|---|---|---|---|---|
Risco cardiovascular (PDAY) | Sexo | 0,271 | 0,090 | < 0,01 | 0,044-0,183 | 0.939 |
Circunferência abdominal | 0,043 | < 0,01 | 0,014-0,136 |
R2 de Nagelkerke: ajuste; B(Coef): coeficiente beta; p-valor: erro α de 5%; IC95%: intervalo de confiança de 95%; *Teste de Hosmer e Lemeshow.
Este estudo retrata o padrão de AF, bem como o padrão de exposição ao CS, identificando suas prevalências nos escolares e estabelecendo a relação desses padrões com o RCV mensurado pelo escore PDAY. Foi observado que o tempo dispendido na prática de AF foi predominantemente (77,2%) superior a 150 minutos/semanais, sendo essa prática mais prevalente entre os homens (83,8%) e alterando-se segundo o sexo. Estudos recentes também atestaram que essa prática se apresenta menos prevalente no sexo feminino entre os adolescentes23-27, seguindo a tendência nacional6 e mundial4,28,29.
A influência do sexo sobre a prática de AF tem sido objeto de diversos estudos4,23,24,27 que afirmam que o sexo feminino é menos ativo se considerados: os menores níveis de escolaridade dos genitores, refletindo a ausência de apoio e incentivo a essa prática; o menor patamar socioeconômico, resultando em menor acesso a atividades de maior gasto energético; além da preferência feminina por atividades individuais e leves26. Contudo, estudo brasileiro que analisou a prevalência de insuficiente prática de AF entre adolescentes não observou diferença entre os sexos30.
Ao verificar a relação da AF com o RCV, constatou-se que aquela mostra associação quando avaliada isoladamente, embora perca a significância no modelo de regressão ao ser tratada junto com o sexo e a circunferência abdominal. Outros estudos que analisaram tal relação4,29 também afirmam que os benefícios atrelados à AF promovem proteção contra fatores de risco cardiometabólicos (dislipidemia, resistência insulínica, hipertensão).
Quanto ao CS, sua prevalência na amostra foi de 78.3%, predominando entre as mulheres (79,7%). Ao contrário dos nossos achados, estudo pernambucano23 mostrou que, embora mais sedentários, os homens também foram mais ativos, de forma que o CS não influenciou o nível de AF masculina. Por outro lado, uma amostra estudada também em Pernambuco evidenciou que o CS influencia negativamente a prática de AF, em especial a feminina26.
Ao explorar a relação entre CS e RCV, constatou-se a inexistência de relação estatística entre as variáveis. Tal achado se contrapõe ao do estudo AFINOS, que calculou separadamente o CS9, no qual o elevado tempo de TV acarretou a presença de moléculas de adesão, de marcadores de processos ateroscleróticos, e de instabilidade de placas ateroscleróticas. Esses achados foram reiterados em estudo de revisão10. Sendo assim, é provável que a ausência de relação observada se deva à questão de o tempo de tela ter sido avaliado na íntegra.
Ademais, quanto aos fatores de RCV segundo o sexo, identificou-se que os níveis séricos de colesterol HDL e a pressão arterial estavam inadequados predominantemente nos homens; enquanto que o sexo, a prática de AF e a adiposidade abdominal foram associados ao RCV. Em estudo desenvolvido por Ribas & Silva, o sexo masculino (mais ativo) apresentou menor probabilidade de desenvolver hipertensão arterial sistêmica, ao passo que o feminino (mais inativo e sedentário) não apresentou risco de dislipidemia. Isso se deve aos hormônios sexuais femininos atuarem como fator de proteção ao RCV8.
Na análise de regressão, apenas o sexo e a adiposidade abdominal permaneceram como fatores que implicam uma menor probabilidade de apresentar RCV intermediário ou alto. Esse fato ratifica a descoberta de Shah et al.11, que também trabalharam com o escore PDAY, atestando que o sexo feminino teve menor RCV e esteve associado a uma menor adiposidade abdominal. Além disso, esta representa fator preditivo independente de RCV31, sendo objeto de estudo de revisão que confirmou a atuação da gordura ectópica na liberação de adipocitinas, lipotoxinas e glicotoxinas que acarretam disfunções cardiovasculares8.
O presente estudo apresenta a importante característica de ser de base populacional, utilizando instrumentos confiáveis, e ser o pioneiro na análise do RCV mensurado pelo escore PDAY em adolescentes brasileiros. Como limitação, por se tratar de um estudo transversal, não permite estabelecer relação causal entre as variáveis estudadas e o escore de risco PDAY – deixando essa pergunta para que novos estudos possam ser desenvolvidos, visando a prevenção precoce das DCVs.