versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.112 no.4 São Paulo abr. 2019 Epub 15-Abr-2019
https://doi.org/10.5935/abc.20190025
O mercúrio é um elemento químico ainda muito utilizado nos processos industriais e presente em diversos equipamentos utilizados diariamente pela população. Entretanto, o mercúrio pode ser extremamente tóxico para o nosso organismo e ser responsável pelo desenvolvimento de diversas doenças, tais como: cegueira, surdez, retardo mental, paralisia, câncer, disfunção renal, além de induzir alterações cardíacas.1,2
Estudos mostram que a exposição ao mercúrio pode causar alterações no sistema cardiovascular, como a hipertensão arterial sistêmica, disfunção coronariana, arritmia cardíaca e aumentar o risco de infarto do miocárdio.3,4 Em humanos, os níveis elevados de mercúrio no sangue, foram correlacionados com o aumento da pressão arterial sistólica e diastólica.5
A interferência do mercúrio também pode ser observada em diversas reações enzimáticas, de aminoácidos e de antioxidantes (N-acetil-L-cisteína, ácido alfa-lipóico, L-glutationa), gerando diminuição da defesa oxidante e aumento de radicais livres com consequente aumento do estresse oxidativo. É possível ainda que o mercúrio leve a disfunção mitocondrial, causando depleção da glutationa e aumento da peroxidação lipídica.6
O estudo de Vassallo et al.7 investigou se a exposição crônica ao mercúrio inorgânico aumenta a atividade da enzima conversora de angiotensina (ECA) e sua relação com o estresse oxidativo em vários órgãos e tecidos em ratos hipertensos e normotensos. Poucos estudos avaliaram efeitos crônicos de baixas doses de mercúrio inorgânico sobre a atividade da ECA em órgãos e tecidos de animais normotensos e hipertensos.
O modelo experimental utilizado pelo autor foi o rato espontaneamente hipertenso (SHR), que apresenta hipertensão semelhante a humana e vem sendo usado em diversos estudos para análises de alterações cardiovasculares e bioquímicas.7-9
A avaliação hemodinâmica, realizada no estudo de Vassallo et al.,7 apontou que a exposição crônica ao mercúrio elevou a pressão sanguínea nos animais hipertensos e pressão diastólica final do ventrículo esquerdo nos animais normotensos. A biometria dos animais evidencia que os ratos hipertensos apresentam menor peso corporal que os animais normotensos, dados semelhantes aos encontrados na literatura.9,10 As relações do cérebro e pulmões normalizados pelo peso corporal apresentam valores significativamente maiores nos animais hipertensos. A relação peso dos pulmões normalizado pelo peso corporal tem sido utilizada como marcador de insuficiência cardíaca.11 No entanto, a exposição ao mercúrio não causou alterações biométricas, exceto, as decorrentes do fator hipertensão.
Outro resultado interessante mostrado por Vassallo et al.,7 foi que a concentração de malondialdeído (MDA) nos animais normotensos, tratados com mercúrio, apresentou maiores valores no plasma e coração, e redução nos rins. Nos hipertensos, tratados com mercúrio, os valores de concentração de MDA estão aumentados no coração e aorta, e reduzidos nos pulmões, cérebro e rins.
A atividade da ECA nos animais Wistar, tratados com mercúrio, apresentou maiores valores no plasma e coração. Os animais hipertensos, tratados com mercúrio, apresentaram maiores valores somente no plasma, e reduzidos no coração, aorta, pulmões, cérebro e rins.
Portanto, a exposição ao mercúrio causou mudanças mais expressivas da atividade da ECA e de estresse oxidativo nos ratos SHR, apresentando alterações específicas em cada órgão avaliado e representa um fator de risco cardiovascular. O tratamento dos animais com mercúrio apresentou ao final do período experimental níveis semelhantes aos observados em humanos expostos ao metal.12
Todavia, algumas questões sobre as alterações na atividade da ECA e do estresse oxidativo causadas pela exposição ao mercúrio ainda não estão claras. É necessário que sejam feitos mais estudos para esclarecer, por exemplo, se a exposição ao mercúrio poderia inibir a atividade da ECA em situações em que já se encontra aumentada, ou se uma doença cardiovascular pré-existente seria agravada pela exposição ao mercúrio.