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Análise da distribuição dos nascimentos com marcadores de gravidade em maternidades com unidade de terapia intensiva neonatal no Sistema Único de Saúde

Análise da distribuição dos nascimentos com marcadores de gravidade em maternidades com unidade de terapia intensiva neonatal no Sistema Único de Saúde

Autores:

Maria de Fatima dos Santos Costa,
Saint Clair Gomes Junior,
Cynthia Magluta

ARTIGO ORIGINAL

Cadernos Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1414-462Xversão On-line ISSN 2358-291X

Cad. saúde colet. vol.26 no.2 Rio de Janeiro abr./jun. 2018

http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x201800020419

Abstract

Bakcground

In Brazil, neonatal deaths are the main component of infant mortality, requiring information to support the reorganization of local systems and the planning of neonatal care.

Objective

Verify the potentiality of the Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos to describe the distribution of births with severity markers in maternities with neonatal intensive care unit in the Unified Health System.

Method

A Cross-sectional study was performed using birth records. Birth weight and Apgar score at 5 minutes were used to establish the severity markers. The maternities were classified according to offer neonatal intensive care unit.

Results

In Brazil, 55% of births and 38% of those occurred with markers of severity and in maternities without intensive care. Newborn infants with birth weight less than 1,500g showed higher percentage in maternities which have intensive therapy. It was observed a higher frequency of birth in intensive care in the Southeast and South regions.

Conclusion

The Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos, even though presenting problems in the register of important variables for the definition of severity criteria, showed potential to be used for research and local managers in the analysis of neonatal care.

Keywords:  newborn; intensive care neonatal; information systems

INTRODUÇÃO

O Brasil alcançou, antecipadamente, a meta do 4º Objetivo de Desenvolvimento do Milênio referente à redução em 2/3 da taxa de mortalidade infantil 1,2 . Entretanto, essa queda não ocorreu de forma homogênea nos diferentes estratos etários dessa população, pois os óbitos neonatais se tornaram o principal componente da mortalidade infantil, tendo a prematuridade (menos de 37 semanas de idade gestacional) como sua causa preponderante 3,4 .

Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que 15 milhões de nascimentos sejam prematuros, dos quais o Brasil é responsável por 9,2%, ocupando a décima posição no ranking mundial 5 . Silveira et al. 6 identificaram uma tendência crescente do nascimento prematuro em todas as regiões brasileiras e um cenário de aumento na demanda por leitos em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) 6 .

Visando atender a tal demanda, o Ministério da Saúde (MS) editou a Portaria nº 930, de 10 de maio de 2012 7 , que veio estabelecer os requisitos do cuidado intensivo neonatal no SUS, sua qualificação na organização do sistema local, ressaltando-se a necessidade do planejamento regional da atenção, com a finalidade de ampliar o acesso, além de, pela primeira vez, instituir um valor de pagamento ao leito em Unidade de Cuidado Intermediário Canguru (UCINCa) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) 7 .

A reorganização dos sistemas locais e o planejamento da oferta de cuidado intensivo neonatal demandam, entre outras necessidades, que os gestores tenham, à sua disposição, informações relativas às características da clientela e da infraestrutura local, de modo a embasar suas decisões. Parte dessas informações pode ser obtida a partir dos Sistemas de Informação em Saúde (SIS) do SUS, os quais, apesar de sua abrangência nacional, por vezes, apresentam limitações em relação à cobertura, à completitude, à consistência, à validade, à disponibilidade de características de cunho epidemiológico e a outros aspectos importantes que contribuem para a qualidade das informações 8,9 .

Diante da necessidade de gerar informações sobre a assistência neonatal e da disponibilidade de dados nos sistemas informatizados nacionais do SUS, o objetivo do presente artigo é o de analisar a distribuição dos nascimentos com marcadores de gravidade em maternidades com UTIN no SUS a partir dos dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) e do Sistema de Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (SCNES).

MÉTODO

Desenho

Trata-se de um estudo transversal, de cobertura nacional, com o objetivo de descrever a distribuição dos nascimentos segundo os marcadores de gravidade em maternidades com leitos de UTIN ofertados ao SUS.

Fontes de dados

Para descrever os nascimentos, foram utilizados os registros não identificados do SINASC do ano de 2013, para a obtenção de informação sobre nascimento, e do SCNES, na competência de dezembro de 2013, para a obtenção de informação sobre as maternidades com disponibilidade de leitos para o SUS. Essas bases de dados foram acessadas na página do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), e a vinculação dos dados foi realizada a partir do código de identificação do estabelecimento de saúde de ocorrência do nascimento.

Critérios de elegibilidade

Foram selecionados no SINASC todos os registros de nascimento em casos de gravidez única e sem indicação de anomalia congênita e que apresentavam os locais de nascença (considerados neste trabalho como maternidades) com oferta de leitos ao SUS na competência de dezembro de 2013 no SCNES.

Foram excluídos os registros de nascimento com valores ignorados ou não preenchidos para as variáveis peso de nascimento e escore de Apgar no 5º minuto, uma vez que essas informações são necessárias para a definição do marcador de gravidade. Por fim, foram excluídos todos os registros cujo peso de nascimento se encontrava fora dos valores da curva de referência para sexo e idade gestacional segundo a curva brasileira de referência de crescimento pós-natal e recém-nascidos prematuros e a termo 10 .

Variáveis selecionadas

Foram selecionadas do SINASC as seguintes variáveis: número da Declaração de Nascido Vivo (DNV); código do estabelecimento; tipo do estabelecimento; município de nascimento; idade gestacional (em intervalos de semanas de gestação); valor do escore Apgar no 5º minuto (variando de 0 a 10); peso ao nascer (em gramas); sexo (masculino/feminino); tipo de parto (vaginal/cesárea).

O CNES forneceu variáveis relativas à identificação da maternidade (código do estabelecimento), à classificação (hospital/outro estabelecimento de saúde), ao município de localização e à quantidade de leitos complementares para o cuidado neonatal (UTIN sim ou não) habilitados para o SUS. O município de localização das maternidades foi utilizado para definição das regiões de nascimento (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste). Foi considerado como presença de UTIN a oferta de pelo menos dois leitos de UTIN II ou III ao SUS na competência de dezembro de 2013. Esse valor foi definido a partir dos parâmetros apresentados pela Portaria nº 930/GM/MS, de 2012, que definiu as diretrizes e os objetivos para a organização da atenção integral e humanizada ao recém-nascido grave ou potencialmente grave e os critérios de classificação e habilitação de leitos de unidade neonatal no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) 7 .

Marcadores de gravidade

A classificação dos marcadores de gravidade foi estabelecida a partir do peso de nascimento e do escore de Apgar do 5º minuto, conforme recomendações da American Academy of Pediatrics (AAP) para o risco de mortalidade e a necessidade de cuidado em UTIN 11-13 ( Quadro 1 ).

Quadro 1 Classificação do recém-nascido segundo os marcadores de gravidade neonatal  

Marcador de gravidade Classificação
Peso ao nascer Apgar 5º m
< 1500 g < 7 A - Muito baixo peso e asfixia
< 1500 g ≥ 7 B - Muito baixo peso
1500 A 1749 < 7 C - Baixo peso e asfixia
1500 A 1749 ≥ 7 D - Baixo peso
1750 A 2499 < 7 E - Baixo peso moderado e asfixia
1750 A 2499 ≥ 7 F - Baixo peso moderado
≥ 2500 g < 7 G - Asfixia
≥ 2500 g ≥ 7 H - Sem marcador de gravidade

Análise estatística

Os nascimentos foram descritos segundo o marcador de gravidade, a maternidade e a região de ocorrência do nascimento a partir das frequências absolutas e relativas. O IBM SPSS, versão 22, foi utilizado para criação da base de dados e realização das análises estatísticas.

Questões éticas

Este trabalho foi dispensado de avaliação ética de acordo com parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Instituto Fernandes Figueira, por se tratar de estudo que utiliza banco de dados não identificados e de acesso público.

RESULTADOS

No ano de 2013, foram identificados no SINASC 2.904.027 registros de nascidos vivos, dos quais 857.002 (29,5%) foram excluídos por apresentarem: dados ignorados ou não preenchidos (332.848); valores inconsistentes para peso ao nascer/idade gestacional/sexo (56.452); ocorrência de nascimento em domicílio (6.083); maternidade não identificada/inativa/sem leitos habilitados para o SUS base do SCNES na competência 12/2013 (461.619). Os registros incluídos (2.047.025) corresponderam a 70,5% dos registros de nascidos vivos no SINASC para o ano de 2013 ( Tabela 1 ).

Tabela 1 Distribuição do total de registros de nascidos vivos, registros excluídos, motivos de exclusão e registros selecionados na base do SINASC 2013, segundo a região de ocorrência do nascimento  

Registros no SINASC 2013 Norte
n (%)
Nordeste
n (%)
Sudeste
n (%)
Sul
n (%)
Centro-Oeste
n (%)
Brasil
n (%)
Total de nascidos vivos 312.378 (100,0) 821.903 (100,0) 1.148.317 (100,0) 386.755 (100,0) 234.674 (100,0) 2.904.027 (100,0)
Total de registros excluídos por: 85.243 (27,3) 231.826 (28,2) 394.548 (34,4) 79.782 (20,6) 65.603 (28,0) 857.002 (29,5)
dados ignorados ou não preenchidos 45.057 (52,9) 142.488 (61,5) 98.799 (25,0) 24.259 (30,4) 22.245 (33,9) 332.848 (38,8)
valores inconsistentes para peso ao nascer/idade gestacional/sexo* 7.798 (9,1) 19.481 (8,4) 18.814 (4,8) 6.220 (7,8) 4.139 (6,3) 56.452 (6,6)
ocorrência de nascimento em domicílio 2.664 (3,1) 1.509 (0,7) 1.073 (0,3) 418 (0,5) 419 (0,6) 6.083 (0,7)
maternidade não identificada / inativa / sem leitos habilitados para o SUS base do SCNES na competência 12/2013 29.724 (34,9) 68.348 (29,5) 275.862 (69,9) 48.885 (61,3) 38.800 (59,1) 461.619 (53,9)
Total de registros selecionados 227.135 (72,7) 590.077 (71,8) 753.769 (65,6) 306.973 (79,4) 169.071 (72,0) 2.047.025 (70,5)

* Conforme a curva brasileira de referência de crescimento pós-natal e recém-nascidos prematuros e a termo 10

Os nascimentos prematuros (de 22 a 36 semanas) ocorreram em 10,4% dos registros. As maiores proporções de nascidos vivos com idade gestacional menor que 37 semanas foram observadas nas regiões Norte (11,2%), Nordeste (10,3%) e Sudeste (10,3%). No Brasil, a proporção de nascidos vivos com peso inferior a 2.500 g (baixo peso) foi de 6,8%, com as regiões Sudeste (7,4%) e Sul (6,8%) apresentando as proporções mais altas. As maiores prevalências de parto cesáreo se deram nas regiões Sul (58,5%), Centro-Oeste (55,5%) e Sudeste (51%) ( Tabela 2 ).

Tabela 2 Distribuição das características do nascimento conforme a região de ocorrência na base do SINASC 2013  

Características de nascimento Região de ocorrência do nascimento (n)
Norte
(227.135)
Nordeste
(590.077)
Sudeste
(753.769)
Sul
(306.973)
Centro-Oeste
(169.071)
Brasil
(2.047.025)
Idade gestacional (semanas)
22 - 27 0,2 0,3 0,4 0,3 0,3 0,3
28 - 31 0,6 0,6 0,8 0,7 0,6 0,7
32 - 36 10,4 9,6 9,2 8,7 9,0 9,3
37 - 41 83,2 84,0 86,6 87,7 86,6 85,6
42 e mais 5,6 5,5 3,1 2,6 3,4 4,0
Peso ao nascer (g)
< 1500 0,7 0,9 1,1 0,9 0,9 0,9
1500 a 1749 0,3 0,4 0,5 0,4 0,4 0,4
1750 a 2499 5,0 5,0 5,9 5,5 5,2 5,4
≥ 2500 94,0 93,7 92,6 93,2 93,5 93,2
Apgar no 5º minuto
< 7 1,0 1,2 0,9 0,9 0,9 1,0
≥ 7 99,0 98,8 99,1 99,1 99,1 99,0
Sexo
Masculino 51,4 51,3 51,3 51,2 51,3 51,3
Feminino 48,6 48,7 48,7 48,8 48,7 48,7
Tipo de parto
Vaginal 56,7 53,3 48,2 41,5 44,5 49,3
Cesáreo 43,3 46,7 51,8 58,5 55,5 50,7

Dos nascimentos com marcadores de gravidade, 38,4% ocorreram em maternidades sem a disponibilidade de leitos de UTIN ( Tabela 3 ). As regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste apresentaram os maiores valores, com destaque para o Norte com 50,1%, enquanto as regiões Sudeste e Sul tiveram os menores percentuais, respectivamente, 30,3% e 36,9%.

Tabela 3 Distribuição dos nascimentos conforme o marcador de gravidade, a região e a presença de leito de UTI Neonatal (UTIN) na maternidade de ocorrência do nascimento na base do SINASC 2013  

Marcador
de
gravidade
Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Leito de UTIN Leito de UTIN Leito de UTIN Leito de UTIN Leito de UTIN Leito de UTIN
Sim % Não % N Sim % Não % N Sim % Não % N Sim % Não % N Sim % Não % N Sim % Não % N
Sim 61,6 38,4 152.125 49,9 50,1 15.199 54,8 45,2 42.094 69,7 30,3 60.445 63,1 36,9 22.493 56,0 44,0 11.894
A 69,6 30,4 4.396 61,3 38,7 382 66,4 33,6 1.325 73,4 26,6 1.699 73,7 26,3 634 65,4 34,6 356
B 83,1 16,9 14.505 81,0 19,0 1.165 83,1 16,9 3.726 84,4 15,6 6.282 81,3 18,7 2.238 81,1 18,9 1.094
C 66,2 33,8 529 46,2 53,8 39 62,9 37,1 175 71,0 29,0 186 74,7 25,3 87 59,5 40,5 42
D 77,7 22,3 8.060 70,6 29,4 698 77,4 22,6 2.233 81,2 18,8 3.317 75,4 24,6 1.207 71,7 28,3 605
E 61,5 38,5 2.294 45,7 54,3 223 55,1 44,9 769 70,4 29,6 787 71,9 28,1 352 47,2 52,8 163
F 59,4 40,6 108.905 48,8 51,2 11.157 52,8 47,2 28.977 67,5 32,5 43.729 59,7 40,3 16.391 53,3 46,7 8.651
G 43,7 56,3 13.436 22,5 77,5 1.535 31,2 68,8 4.889 60,9 39,1 4.445 56,8 43,2 1 584 40,5 59,5 983
Não 43,4 56,6 1.894.900 32,5 67,5 211.936 30,4 69,6 547.983 56,1 43,9 693.324 47,4 52,6 284.480 39,8 60,2 157.177

A – muito baixo peso e asfixia; B – muito baixo peso; C – baixo peso e asfixia; D – baixo peso; E – baixo peso moderado e asfixia; F – baixo peso moderado; G - asfixia

No Brasil, os maiores percentuais de nascimentos em estabelecimentos sem leitos de UTIN, segundo os marcadores de gravidade, variaram de 30,4% (muito baixo peso e asfixia) a 56,3% (asfixia isolada). Na região Norte, os valores variaram de 38,7% (muito baixo peso e asfixia) a 77,5% (asfixia isolada), e na região Nordeste, de 33,6% (muito baixo peso e asfixia) a 68,8% (asfixia isolada) ( Tabela 3 ).

DISCUSSÃO

Este trabalho teve como motivação explorar a utilização de sistemas de informação oficiais como fonte para o planejamento e a reorganização da assistência neonatal no SUS. O trabalho alcançou o seu objetivo de analisar a potencialidade do SINASC para descrever o perfil dos nascidos vivos em maternidades com leitos de UTIN ofertados ao SUS, conforme a gravidade do nascimento.

O processo de construção da base de dados envolveu, além da etapa de vinculação dos dados do SINASC e do SCNES, uma série de exclusões, como valores ignorados ou de peso de nascimento não esperado para idade e sexo.

Analisando a distribuição dos registros excluídos, verificou-se que ela ocorreu de modo semelhante entre as regiões. Chamou a atenção, na região Sudeste, o percentual de 24% de exclusões de maternidades não identificadas/inativas/sem leitos habilitados para o SUS base do SCNES na competência de dezembro de 2013. Acredita-se que a principal justificativa para esse valor seja o fato de a região Sudeste concentrar um maior percentual de estabelecimentos de saúde não vinculados ao SUS.

A gravidade dos nascimentos foi classificada a partir de critérios que consideraram apenas o peso ao nascer e o escore de Apgar no 5º minuto, características descritas na literatura como importantes marcadores de morbimortalidade neonatal 12-14 . A idade gestacional (IG) também é um marcador da gravidade neonatal, porém não pode ser considerada em razão de essa variável estar disponibilizada no SINASC do ano de 2013 de modo agregado, o que impossibilita seu uso nas curvas de referência que consideram seus valores individuais 15 . No entanto, acredita-se que o resultado encontrado para a distribuição das internações por marcador de gravidade não venha sofrer alterações significativas com a inclusão da idade gestacional. Recomendações da American Academy of Pediatrics (AAP) e estudos sobre mortalidade neonatal reconhecem que, apesar da importância da IG, o peso de nascimento é, isoladamente, o principal indicador de mortalidade e de gravidade no período neonatal 11-14,16-18 .

Observou-se que, independente da região, o percentual de nascimentos em maternidades com UTIN, entre os recém-nascidos com muito baixo peso, é superior a 80%. Esse resultado pode indicar que os nascimentos que demandam um cuidado neonatal especializado estão, em sua grande parte, ocorrendo em maternidades com leitos próprios para esse tipo de cuidado. No entanto, muito mais que isso, aponta a necessidade de ampliação dos esforços para garantir o acesso oportuno de cuidados neonatais aos 20% dos nascimentos ocorridos em maternidades sem UTIN habilitadas para o SUS. Com relação aos nascimentos sem marcador de gravidade, nada se pode afirmar quanto à adequação do seu local de nascimento, uma vez que estes, teoricamente, não demandariam leitos de UTIN, não competindo, assim, com os nascimentos com marcador de gravidade.

Este trabalho não se propunha investigar o acesso ao serviço nem a resolutividade dos nascimentos com marcadores de gravidade. Para esse tipo de avaliação, seria necessária a vinculação dos dados do SINASC com o Sistema de Informação Hospitalar (SIH) e o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), o que demandaria o acesso à identificação dos pacientes (por meio do nome do recém-nascido, da filiação, do endereço, da data de nascimento, dentre outros) e a utilização de técnicas de vinculação probabilistas, uma vez que esses bancos de dados não apresentam identificadores comuns que permitam a vinculação determinística 19-21 .

O SIM prevê o preenchimento do número da Declaração de Nascido Vivo (DNV), o que tornaria possível uma vinculação determinística com o SINASC. Entretanto, esse campo ainda apresenta baixa completude, não permitindo a recuperação de um volume considerável de registros e prejudicando a realização de análises, por exemplo, da sobrevida dos nascidos vivos com marcadores de gravidade segundo o tipo de estabelecimento. Diante desse cenário, a vinculação probabilística, apesar de mais complexa, ainda se apresenta como a melhor opção para estudos que pretendem analisar a mortalidade ou a resolutividade do cuidado neonatal 19,22 .

O SIH não prevê o preenchimento da DNV em seus bancos de dados, o que seria de grande importância, pois facilitaria a análise das condições de cuidado e de mortalidade para os menores de 1 ano.

A opção por utilizar os arquivos do SCNES, na competência dezembro de 2013, pode ser considerada uma limitação deste trabalho, uma vez que as informações sobre o tipo de leito e as respectivas quantidades existentes e contratadas pelo SUS são passíveis de alteração mensal, havendo, assim, a possibilidade de exclusão de maternidades que poderiam estar ativas nas demais competências. Outras possíveis opções metodológicas, por exemplo, trabalhar com valor médio ou mediano da série, também implicam decisões e limitações como a adotada neste trabalho.

A utilização de todas as competências do SCNES para identificação dos estabelecimentos ativos demandaria avaliar, para cada mês de nascimento, quais maternidades habilitaram leitos para o SUS na competência do nascimento. No entanto, acredita-se que o esforço computacional envolvido nessa operação não resultaria em um ganho expressivo de registros de nascimento. Observou-se que, de um modo geral, apenas 0,7% dos nascimentos ocorreu em estabelecimentos não identificados no SCNES na competência de dezembro de 2013.

Uma hipótese deste trabalho é que os recém-nascidos de risco demandariam cuidado em uma UTIN. Para avaliação dessa hipótese, seria necessário relacionar os registros de nascimento, classificados segundo os marcadores de gravidade, com a existência desse tipo de cuidado na maternidade de nascimento. Como dito, a base de dados utilizada não possibilita verificar se o recém-nascido foi efetivamente admitido em UTIN, assim como não permite obter informações sobre a assistência prestada. Para tanto, seria preciso vincular os dados do SINASC com o SIH, o que demandaria a utilização de técnicas probabilísticas como descrito anteriormente 20 . Dessa forma, a dificuldade de comprovação da hipótese também se configura em uma limitação do estudo.

O relacionamento do SINASC e do SCNES ampliou a possibilidade de análise dos nascimentos com marcadores de gravidade em maternidades com leitos de UTIN, permitindo verificar as variações regionais na distribuição desses nascimentos em maternidades com leitos de UTIN.

As bases de dados não identificadas do SINASC e do SCNES, mesmo com problemas no registro de variáveis importantes para a definição dos marcadores de gravidade, apresentaram potencial para serem utilizadas para a pesquisa e os gestores locais na análise do cuidado neonatal.

Ainda se percebe a necessidade da disponibilização de dados nos sistemas de informação nacionais que permitam a análise de adequação do cuidado neonatal ofertado segundo o grau de risco do recém-nascido.

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