versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.24 no.1 Rio de Janeiro jan. 2019
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018241.20262016
The scope of this article was to analyze the evolution of knowledge about Toxocara sp. from a zoonotic point of view by means of scientific data published between the years 1996 and 2015 using epistemology as a tool. The epistemological analysis of the evolution of knowledge on the zoonotic aspect of Toxocara sp. in Brazil revealed that, in general, little new information was added which had, over the period studied, slow and discontinuous absorption, and was not incorporated in the social reality from the standpoint of public health.
Key words Human toxocariasis; Way of thinking; Visceral larva migrans
A Epistemologia é um conjunto de conhecimentos que tem por objetivo o conhecimento científico, visando explicar o seu condicionamento seja ele técnico, histórico, ou social e assim sistematizar as suas relações, esclarecendo os seus vínculos e avaliar os seus resultados e aplicações1,2.
As investigações epistemológicas podem desenvolver um melhor resultado em processos de elaboração de conhecimento podendo auxiliar no combate das parasitoses destacando as helmintoses. A busca de dados mais detalhados sobre o conhecimento teórico, histórico e técnico da parasitologia helmíntica pode ser baseada em dados investigativos no ambiente onde ela se desenvolve com o uso da epistemologia como ferramenta3,4.
A investigação e avaliação de acontecimentos já estabelecidos e sobre os quais são conservadas as opiniões e fazem parte da vida prática seriam apropriados para reflexões epistemológicas na área da biologia e da saúde5,6. Neste contexto, as helmintoses zoonóticas podem ser um objeto de estudo epistemológico (estilo de pensamento), possibilitando notar as modificações e/ou modernizações e assim proporcionando outras opiniões para efetuar ou elaborar estudos mais eficazes no diagnóstico, tratamento e prevenção das mesmas, que apesar de serem conhecidas e estudadas há bastante tempo são atualmente importantes para a Saúde Pública em muitos países, incluindo o Brasil7–9.
Um dos helmintos zoonóticos mais conhecidos é Toxocara sp. que compreende 21 espécies, tendo as espécies Toxocara canis e Toxocara cati como as mais implicadas na síndrome da Larva Migrans Visceral (LMV)9,10. O hospedeiro definitivo são animais domésticos, nos quais o parasito vive como adulto dentro do lúmen do intestino delgado11. A Larva Migrans Visceral foi descrita em 1952 como forma sistêmica grave, caracterizada por eosinofilia elevada, hepatoesplenomegalia, febre, dentre outras complicações e ainda observados12–14. São zoonoses parasitárias negligenciadas, causadas por ingestão de ovos de Toxocara canis e de Toxocara cati. Quando os ovos contendo larvas infectantes são ingeridos por seres humanos, as larvas tornam-se livres no intestino, mas não conseguem se desenvolver até a forma adulta. Ao invés disso, atravessam a parede intestinal e estabelecem-se nos tecidos, podendo invadir órgãos como o fígado, pulmões, olhos ou cérebro15.
O objetivo deste artigo foi analisar a evolução do conhecimento sobre Toxocara sp. em seu aspecto zoonótico por meio de dados científicos entre os anos de 1996 a 2015 utilizando a epistemologia como ferramenta.
Artigos e textos foram obtidos por meio das fontes de pesquisa científicas Pubmed, Medline, SciELO, Lilacs, textos publicados em sites relevantes como: Organização Mundial da Saúde (OMS), Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), Ministério da Saúde e bancos de dissertações e teses, registrados de 1996 a 2015. Como estratégia de busca foram utilizados os termos helmintoses, helmintoses zoonóticas, geohelmintos, Toxocara sp. e Larva migrans visceral, em inglês e português, incluindo-se apenas estudos realizados no Brasil cujo foco era Toxocara sp. e se reportavam ao seu caráter zoonótico. Foram excluídos estudos realizados fora do Brasil e aqueles em que estavam envolvidos protozoários.
A análise epistemológica foi realizada segundo Fleck5. Os artigos e textos foram organizados inicialmente em: revisão, artigo original, relato de casos, textos de sites, dissertação e tese, em seguida, separados nas classes: produções com ênfase na epidemiologia e produções com ênfase na educação em saúde. Em determinados casos, foi necessário utilizar alguns artigos não incluídos na análise (conforme os critérios de inclusão e exclusão acima definidos) para dar maior consistência à discussão.
A partir dos descritores foram encontrados 7.043 textos científicos, sendo pré-selecionados 669 referentes a helmintoses zoonóticas, dos quais 79 eram sobre helmintoses zoonóticas envolvendo animais de estimação e 48 destes se reportavam a Toxacara sp. e seu caráter zoonótico, sendo, então analisados.
Quanto ao tipo de texto científico, 93,68% (41/48) eram artigos originais, dois (2,53%) artigos de revisão, duas (2,53%) teses e uma dissertação (1,26%), todos textos relacionados com epidemiologia, não se encontrando nenhuma alusão à educação em saúde.
Os resultados alcançados pela análise epistemológica foram separados em tópicos.
Uma análise a partir deste ponto de vista requer inicialmente uma reflexão sobre os conceitos de Saúde Pública. A definição de Saúde Pública está em constante evolução ao observar a literatura científica, contudo, de acordo com Lechopier16 foi adotada uma definição possivelmente consensual, proposta pelo Conselho Nuffield de Bioética, em 2007, segundo a qual Saúde Pública corresponde à “ciência e a arte de prevenir a doença, prolongar a vida e promover a saúde por meio de esforços organizados da sociedade”. Revendo artigos anteriores à citação de 2015, conclui-se que esta definição foi postulada em 1988, apresentando-se como um resumo de uma versão proposta em 192017–19.
Muitas são as expressões aplicadas às doenças do ponto de vista de seu impacto na Saúde Pública: “doenças de interesse para a Saúde Pública”, “problema de Saúde Pública”, “doença de importância para a Saúde Pública”. A expressão “problema de Saúde Pública” parece ser a mais comumente aplicada e foi revisada por Costa e Victora20 em textos de medicina preventiva e Saúde Pública apresentada abaixo (Quadro 1).
Quadro 1 Critérios para definição de problema de saúde pública segundo Costa e Victora 20.
Autores | Critérios definidos para definir problema de saúde pública |
---|---|
Leavell (1976)37 | Natureza, Extensão, severidade e significância |
Clark e Macmahon, (1967)38 | |
Morley (1980)39 | Interesse da comunidade, prevalência, gravidade e possibilidade de controle. |
Fowler e Austoker (1997)40 | Impacto no indivíduo em termos de anos potenciais de vida perdidos, extensão de incapacidade, dor e desconforto, custo do tratamento, e impacto na família do indivíduo Impacto na sociedade – mortalidade, morbidade e custos do tratamento para a sociedade. |
Daly et al. (2002)41 | Prevalência da condição, impacto da condição no nível individual, seu impacto na sociedade (do ponto de vista econômico) e se a condição pode ser prevenida ou se existe um tratamento efetivo disponível. |
Costa e Victora20 acrescentam, ainda, o potencial epidêmico da enfermidade. Contudo consideram que, para ser enquadrada como problema para a Saúde Pública, não há necessidade de a enfermidade atender a todos os critérios listados, além de não se poder igualar o nível de importância das mesmas para a sociedade.
Com base nas definições acima, as reflexões epistemológicas sobre Toxocara sp. conduzem aos seguintes estilos de pensamento: importância para Saúde Pública, problema de Saúde Pública. Dos 48 textos científicos analisados 33,34% (16/48)21–36 referem-se a problema de Saúde Pública; 29,16% (14/48) enfatizam sua importância em Saúde Pública10,42–55, 37,50% (18/48) reportam-se simplesmente ao caráter zoonótico13,15,56–71, sem levar em consideração os estilos de pensamento anteriormente citados. Convém informar que todos os 48 textos científicos retratam o caráter zoonótico. Pode-se destacar, ainda, que Gallina et al.48 e Mata-Santos et al.15 mencionam a toxocaríase como doença subestimada.
Quanto à questão de a toxocaríase ser um problema de Saúde Pública não se observou evolução do conhecimento, o que pode ter ocorrido, talvez, devido a não haver uma definição consensual para o termo “problema de Saúde Pública”, sendo, então a expressão utilizada pelo autor para dar maior ênfase ao seu tema de estudo como verificado por Costa e Victora20.
Com relação à evolução do conhecimento sobre a importância de Toxocara sp. para a Saúde Pública também não foi acrescentada nenhuma nova informação no decorrer dos anos nos artigos estudados, permanecendo sua relevância relacionada ao fato de causar a Larva migrans visceral em humanos, os danos provocados à saúde humana e animal, além da contaminação do solo como potencial fonte de infecção humana.
Embora tanto o termo “importância para a Saúde Pública” quanto “problema de Saúde Pública” tenham sido aplicados para as enfermidades causadas por Toxocara sp., quando se consideram os critérios citados por Costa e Victora20, chega-se a conclusão de que Toxocara sp. não se constitui, realmente, um problema de Saúde Pública diante dos objetivos dos trabalhos pesquisados. Por outro lado, a questão de ser importante para a Saúde Pública, pode ser aventada, mesmo que em pequena proporção, levando-se em consideração o impacto clínico sobre o indivíduo acometido.
Toxocara sp. é conhecido como agente etiológico da Larva migrans visceral desde 195213. A partir de então vem sendo alvo de inúmeras pesquisas, reunindo aspectos que incluem: ser a causa da síndrome da Larva migrans visceral que afeta a saúde dos seres humanos causando lesões, às vezes, irreparáveis11,34,72–74; causar doença nos animais domésticos11; ser uma zoonose; contaminar o solo11,15,24,50,57,59,74.
A disseminação do conhecimento científico dos eventos sobre as enfermidades causadas por Toxocara sp. são encontrados nos artigos mais antigos como Beaver et al.12 e também nos atuais como Stalliviere et al.29 e Onuma et al.54.
Apesar de todos estes fatores expressivos, as síndromes e doenças causadas pelo Toxocara sp. no homem são subdiagnosticadas o que favorece a negligenciação de sua prevalência e incidência atuais15,49,52.
Estudos demonstram a prevalência sorológica da toxocaríase no Brasil variando de 2,2 a 54,8%10,22,24,32,34,50,51,57,59,64,65,72,73,75,76. As diferenças entre as taxas verificadas nos artigos citados pode ser justificada pela faixa etária dos indivíduos incluídos no estudo. Destacam-se maiores taxas de prevalência entre crianças34,51 pelo maior contato com cães, hábitos de geofagia e onicofagia34
Dentro do período analisado no presente estudo, apenas um artigo foi encontrado, detectando taxa anual de incidência de 17,9% para infecção por Toxocara sp. em moradores da periferia de Campinas – SP74. A ausência de dados sobre a taxa de incidência para Toxocara sp. tanto no País como em outras regiões deve-se ao fato de que quase todas as investigações de campo são concebidas como estudos transversais, considerando-se apenas um momento da história natural da infecção74.
A contaminação do solo por ovos de Toxocara sp. vem sendo referenciada desde 198477, e prossegue até anos mais recentes, como 2014, sem alterações no conhecimento já obtido27,28,33,42,51,54,57,78–81 e sinaliza para uma maior atenção com os animais domésticos em áreas públicas e apontam animais errantes como possíveis auxiliares na permanência e disseminação deste helminto34,42,51,54.
A infecção humana por meio da ingestão de alimentos contaminados com ovos embrionados22 deve-se a maus hábitos de higiene como a manipulação de alimentos com as mãos sujas22,34 após contato com animal parasitado ou solo contaminado22,34,82. Embora os textos citados refiram-se a alimentos sem citar a natureza dos mesmos, a contaminação de hortaliças por ovos de Toxocara sp. é citada em diferentes estudos81–83. A contaminação de carne crua ou mau passada é reportada por Andrade22 e Santarém et al.32, não havendo relatos desta via de infecção em estudos brasileiros.
A infecção por alimentos contaminados constitui-se em informação acrescentada ao longo dos anos de estudo, portanto mais recente que a contaminação do solo, especialmente a carne crua ou mau passada. Andrade22 expõe que certos hábitos culturais também podem representar fator de risco para infecção por Toxocara sp., entre estes o hábito de comer carnes e vísceras cruas observado em certas populações. Nesta reflexão epistemológica demonstra-se claramente que o conhecimento é vinculado e depende de fatores socioculturais, exercendo influências sobre a realidade social5,6. Assim. estudos realizados em nosso meio não incluem esta linha de investigação pelo fato de o consumo de carne e vísceras cruas não serem hábitos comuns em nossa sociedade.
Após a ingestão dos ovos larvados e eclosão, no intestino delgado as larvas ganham a circulação pela via hepática migrando para os diferentes órgãos, induzindo alterações da diversas naturezas, como aumento considerável de eosinófilos, aumento das globulinas séricas com altos títulos de IgG e IgM, hepatomegalia, hepatoesplenomegalia, nódulos nos órgãos e derrame pleural, nódulos pulmonares ou hepáticos e pneumonia10,12,13,31,75, aumento da IgE total, alta susceptibilidade a asma, leucocitose e anemia14,25,61, hemorragia, necrose e inflamação eosinofilica11,35. Há relatos de pleocitose e mielite, alterações neurológicas que podem estar relacionadas com vasculite cerebral, e convulsões10,14,32.
Muitas das infecções de Toxocara sp. são assintomáticas12,22,34 contudo pode ocorrer a Toxocaríase sistêmica que possui uma variabilidade de sintomas e sinais clínicos tais como febre, tosse, sintomas gripais, fadiga, problemas gastrintestinais, enxaqueca, dor abdominal, dor articular, dor de cabeça, alterações respiratórias, chiado persistente, erupções cutâneas, pápulas eritematosas e urticária10,12,22,24,75,76.
Andrade22 já chamava a atenção para o fato de a toxocaríase em humanos apresentar variantes clínicas apesar de o termo toxocaríase ser, com muita frequência, utilizado na literatura como sinônimo de Larva migrans visceral (expressão clínica mais conhecida da toxocaríase) devido à destacada importância de T. canis na epidemiologia desta síndrome. Em sua revisão, o autor faz referência à Toxocaríase ocular para qual consta citação de 1953 e toxocaríase oculta relatada em 1987.
No presente estudo, a maioria dos textos pesquisados referem-se à toxocaríase utilizando o termo Larva migrans visceral, mesmo os mais recentes13,51. No entanto, tem-se um histórico bastante claro da classificação da toxocaríase humana11 baseada em artigos estrangeiros: Toxocaríase assintomática, Toxocaríase oculta, Larva migrans visceral, Larva migrans ocular e Larva migrans neurológica.
Assim, observa-se que a divulgação de novas informações sobre formas clínicas da toxocaríase humana no Brasil não acompanhou suficientemente a literatura científica, pois termos novos relacionados à classificação clínica não foram incorporados aos artigos publicados no Brasil pela maioria dos autores.
A despeito da situação acima colocada, pela visão epistemológica, o conhecimento científico sobre sinais clínicos da toxocaríase evoluiu a partir de ideias iniciais, surgidas no passado, relativas a este assunto, as quais foram pouco a pouco modificadas e sofrendo reinterpretações de acordo com o pensamento em evidência, mas continuaram existindo, apesar das modificações5,6
As síndromes de toxocaríase humana são de difícil diagnóstico pois, em geral, além do fato de serem confundidas com outras enfermidades, as lesões patológicas são muitas vezes não relacionadas com a doença10,13,22,32.
Embora o diagnóstico presuntivo se baseie em um conjunto de dados clínicos, laboratoriais e epidemiológicos22,65, a falta de diagnóstico laboratorial e sintomas específicos faz com que o diagnóstico da toxocaríase humana seja raramente realizado, levando-a a ser considerada uma doença negligenciada nos serviços de saúde13,22,51,57,75.
O diagnóstico direto da infecção humana é uma tarefa difícil, por não haver desenvolvimento do parasito até a maturidade no organismo humano. Porém pode ser realizado por meio de biópsia para detectar a presença da larva nos tecidos11,23. Este procedimento raramente é recomendado por expor o paciente a riscos além de o exame negativo não constituir resultado conclusivo10,22. Portanto os métodos indiretos por detecção de elevados níveis de anticorpos anti-T. canis em fluidos biológicos tornaram-se os meios de diagnósticos mais adequados22,84. O diagnóstico sorológico é realizado pelo teste imunoenzimático (ELISA) no qual são utilizados produtos antigênicos obtidos de cultura de larvas de T. canis - antígenos excretores-secretores (TES). Este método é amplamente usado nos inquéritos sorológicos em diferentes estudos no Brasil25,35,48,51,52,58,60,66,74,77,85, considerado de boa acurácia, possui limitação de ter reação cruzada com outros parasitos em países onde a infecção é prevalente. Como alternativa para minimizar esta desvantagem, normalmente, o soro é adsorvido com extratos de Ascaris suum antes dos testes para evitar a reação cruzada principalmente com Ascaris lumbricoides10,47,52,74,77,85.
Alguns kits para diagnóstico sorológico são comercialmente disponíveis, mas raramente utilizados no Brasil devido ao alto custo51 e, além disso, tem uso limitado em países tropicais por não determinarem prévia adsorção do soro com antígenos de parasitos que tenham reação cruzada com T. canis65.
A imaginologia por meio da ressonância magnética pode ser especialmente útil no caso de Toxocaríase neurológica devido à inespecificidade dos sinais clínicos65. Cita-se também a ultrassonografia e tomografia computadorizada10. Não há relatos do seu uso no Brasil.
Técnicas moleculares como a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) não se encontram na literatura ora pesquisada, porém são citadas como futuras ferramentas para diagnóstico e prevenção33, podendo detectar DNA do parasito em tecidos66.
Quando diagnosticadas as síndromes, o tratamento varia de acordo com o conjunto de achados clínicos ou laboratoriais. Casos assintomáticos não entram nesse contexto10,14,22,33.
Andrade22 propõe uma conduta relacionada à droga (tratamento anti-helmíntico visando debelar a infecção) e, uma conduta, ligada ao esquema de tratamento (tratamento sintomático objetivando reverter os sinais e sintomas). Deve-se consider a relação risco - benefício entre o potencial tóxico da droga e o efeito terapêutico esperado para a reversão do quadro clínico22,74.
Embora não exista um esquema de tratamento comprovadamente eficaz48, indicam-se, nos casos de Larva migrans visceral, drogas com propriedades larvicidas, como dietilcarbamazina, albendazol, mebendazol, levamisol, ivermectina, fenbendazol e oxfendazol, destacando-se o tiabendazol pela ação inibidora da migração tecídual das larvas10,14,22,33,48.
A conduta para casos de Larva migrans ocular deve avaliar a acuidade visual, gravidade da inflamação e reversibilidade da lesão ocular. O tratamento com anti-helmínticos é secundário, sendo utilizado no início da infecção e associado com a terapia de esteroides anti-inflamatórios14,22. O tratamento com dietilcabamazina e tiabendazol não é unanimemente aceito devido à possibilidade de morte das larvas e com isso aumento da reação inflamatória14.
Quanto ao tratamento da toxocaríase humana em indivíduos soropositivos assintomáticos, de um lado considera-se não haver indicação formal do ponto de vista epidemiológico devido ao diagnóstico ser baseado na sorologia sem comprovação parasitológica, por outro, justifica-se o tratamento devido à existência de risco de complicações futuras em indivíduos soropositivos22,48.
As medidas de controle das enfermidades causadas pelo Toxocara sp. são em maioria de fácil reprodução, incluindo ações de simples execução podendo ser realizadas pelo indivíduo até algumas outras mais complexas em sua operacionalidade. Podem ser evidenciadas três grupos de ações:
–. As ações relacionadas aos animais de estimação que compreendem o controle da população canina, podendo ressaltar, para este grupo, os animais errantes e semi-domiciliados, o controle dos mesmos em áreas públicas e de lazer e o diagnóstico e tratamento10,14,15,33,35,48,49,54,61.
–. A descontaminação do solo, envolvendo a remoção das fezes, em áreas adjacentes ao domicílio e piso dos canis sem frestas e secos54. Novas alternativas vem sendo buscadas, como a utilização de métodos que inviabilizem os ovos infectantes presentes nas fezes a exemplo do controle biológico por meio do fungo Pochonia chamidosporia, avaliado in vitro67.
–. As atividades educativas direcionadas à população, com a participação das instituições governamentais que gerenciam programas de controle de doenças e seu entendimento sobre a necessidade de inclusão das medidas educativas em seu plano de intervenção junto às comunidades14,34,48,61,67. Citam-se a elaboração de futuros estudos e programas para a prevenção da infecção humana, orientação e conscientização dos profissionais de saúde, poderes públicos, educadores e clínicos veterinários sobre medidas educativas para reduzir os riscos de exposição a parasitos intestinais para seus clientes14,33,69. As pesquisas realizadas sobre prevenção da toxocaríase humana no Brasil mostram-se relativamente recentes, porém, delas se percebe que ainda há dificuldades no controle da doença. As formas de prevenção são indicadas, mas não são implementadas na prática. Não existem artigos que relatem a realização de intervenções para diminuir a prevalência da doença ou a realização de atividades de educação em saúde nos locais de ocorrência dos casos.
A análise epistemológica da evolução do conhecimento sobre o aspecto zoonótico de Toxocara sp. no Brasil demonstra que, de uma maneira geral, foram agregadas poucas novas informações as quais tiveram, ao longo do período estudado, absorção lenta, descontínua e não inseridas na realidade social do ponto de vista de Saúde Pública.
Não há uma definição clara da importância zoonótica de Toxocara sp. por não haver consenso sobre o termo “Problema de Saúde Pública” e pelo fato de as pesquisas realizadas sobre o toxocaríase humana não incluírem análises dos parâmetros apontados pela pesquisa científica como critérios para assim classificá-la.
Apesar da evolução do conhecimento sobre sinais clínicos do ponto de vista epistemológico, nota-se que este conhecimento não foi absorvido suficientemente, prevalecendo, ainda a utilização dos termos Larva migrans visceral e toxocaríase humana como sinônimos por muitos autores em detrimento de uma classificação clínica mais específica já existente.
Informações relacionadas ao diagnóstico apresentam novas opções metodológicas, as quais não são relatadas em trabalhos nacionais em relação ao seu uso na prática. Quanto ao tratamento e prevenção, o conhecimento existente vem sendo repassado ao longo dos anos sem profundas modificações.
Assim, as lacunas existentes sobre o conhecimento do tema precisam ser preenchidas de forma coerente pelos pesquisadores e adequadamente transferidas à comunidade científica, profissionais da área e poderes públicos para se estabelecer o diagnóstico de situação da Toxocaríase humana no Brasil visando a obtenção de propostas de intervenções mais favoráveis à saúde humana.