versão impressa ISSN 2359-4802versão On-line ISSN 2359-5647
Int. J. Cardiovasc. Sci. vol.31 no.3 Rio de Janeiro maio/jun. 2018
http://dx.doi.org/10.5935/2359-4802.20180017
As doenças cerebrovasculares têm sido classificadas entre as de maior impacto em termos de morbimortalidade.1 Dentre os principais fatores de risco cardiovascular, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) representa o agravo de maior relevância, fazendo-se necessárias ações de saúde visando minimizar os fatores de impacto que são determinantes na saúde da população.2
A prevalência global de hipertensão arterial foi de 22%, em 2014, em adultos com idade igual ou superior a 18 anos.3 A HAS é caracterizada pela elevação dos níveis pressóricos para ≥ 140 e/ou 90 mmHg, na qual a condição clínica pode ser causada por vários motivos, podendo ser agravada por outros fatores de risco como dislipidemia, obesidade abdominal, intolerância à glicose, diabetes mellito (DM), além de fatores modificáveis, determinantes socioeconômicos e acesso inadequado aos cuidados de saúde.3,4
Diversos estudos apontam para a influência de aspectos étnicos no surgimento de doenças hipertensivas.5 Não raro, existe dificuldade de se dissociar o papel representado por um grupo étnico, de fatores socioeconômicos, simultaneamente atuantes.6 No Brasil as taxas de mortalidade cerebrovascular apresentaram-se maiores em negros, seguidos por pardos e brancos.7
Cerca de 32,6% de adultos e mais de 60% de idosos têm hipertensão arterial no Brasil, o que contribui direta ou indiretamente para 50% das mortes por doença cardiovascular (DCV).4 Em países de baixa e média renda, onde o tratamento e controle são menores do que em países desenvolvidos, estima-se em cerca de 80% a prevalência de doenças associadas à hipertensão.8 O impacto dessa enfermidade se reflete em altos custos para o Sistema Único de Saúde (SUS). Estima-se um gasto anual de US$ 398,9 milhões, ou seja, cerca de 1,43% dos gastos totais do SUS.9
O objetivo dessa pesquisa é estimar o impacto da hipertensão arterial no território brasileiro em um período de cinco anos. Para tal, são analisadas tendências da taxa de mortalidade associada a doenças hipertensivas no Brasil, entre 2010 e 2014, estratificando-se de acordo com cor da pele e faixa etária, tanto para os estados quanto para as regiões.
Estudo epidemiológico realizado a partir de dados agregados, obtidos em estratos populacionais, e associado à análise espacial.
Os dados de organização do território brasileiro, incluindo coordenadas, em formato "shapefile", e a estimativa da população dos anos estudados foram coletados no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE.10,11
As informações epidemiológicas acerca da mortalidade associada à hipertensão arterial foram obtidas mediante consulta ao banco de dados do Ministério da Saúde, DATASUS.12 Esses dados representam notificações oriundas do Sistema de Informação sobre Mortalidade.13 Os óbitos foram filtrados pela categoria I.10 do Código Internacional das Doenças (CID-10). Em seguida, os dados agregados foram obtidos por ano, estado do país, sexo, faixa etária e cor da pele.
A seleção do período de análise, entre 2010 e 2014, ocorreu devido aos seguintes motivos. Primeiramente, devido ao fato de considerarmos que análises mais recentes apresentem maior fidedignidade na coleta de dados, em decorrência de progressiva melhora no processo de informatização com avanços da tecnologia. Em segundo lugar, por retratar, potencialmente, o cenário de transição resultante da introdução da losartana, um fármaco anti-hipertensivo de boa eficácia, que passou a ser distribuído gratuitamente no "Programa Farmácia Popular" a partir de 2010, vindo a tornar-se em 2014 o medicamento com maior demanda de consumo em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive no interior do país.14,15
Entretanto, deve-se considerar que o efeito desse programa pode ocorrer de forma desigual entre as regiões, o que influenciaria potencialmente a análise. Por fim, o término do período, o ano de 2014, decorreu do fato de ser a data mais recente disponibilizada no DATASUS para a obtenção de estatísticas vitais em todo o território brasileiro.
As variáveis selecionadas foram ano, sexo, faixa etária, cor da pele, estado do país, região e número de ocorrência de óbitos. Por tratar-se de enfermidade crônica, as faixas etárias selecionadas para contagem de óbitos associados à hipertensão arterial foram: 50-59 anos; 60-69 anos; 70-79 anos e 80 ou mais anos. Essa contagem foi computada para os vinte e seis estados nacionais e para o Distrito Federal. A variável cor da pele retrata fundamentalmente a cor da pele e traços étnicos, conforme consta na declaração de óbito, sendo classificada em "branca", "amarela", "parda", "negra", "indígena" ou "ignorado".
As variáveis categóricas foram apresentadas em número absoluto e porcentagem. As variáveis numéricas foram apresentadas em média e erro padrão. Modelos de regressão para dados contáveis (Poisson e binomial negativo) em estudos longitudinais foram empregados em estimativas de predição de mortalidade. Devido à presença de superdispersão, preferiu-se a regressão binomial negativa. A estimativa de "tamanho do efeito" foi ajustada para sexo, faixa etária, cor da pele, região e ano, e apresentada sob a forma de razão de taxa de incidência ou IRR ("incidence rate ratio") e intervalos de confiança a 95%.
Com intuito de minimizar distorções decorrentes de diferenças espaciais e temporais entre populações, os modelos de efeitos aleatórios incluíram dados da população anual estimada de cada estado como fator "exposição", isto é, tendo esse coeficiente sido restringido, produzindo IRR igual a 1 e erro padrão virtualmente zero, ajustando-se o cálculo para os demais coeficientes. Para a seleção do modelo com melhor adequação preditiva, empregou-se o critério de informação de Akaike (AIC). Na análise espacial, empregou-se o comando "spmap" para a elaboração de mapas coropléticos, contendo os estados brasileiros e o Distrito Federal, e representando a distribuição em quintis da taxa de mortalidade associada à hipertensão arterial. Considerou-se como critério de significância estatística um valor de p bicaudal < 0,05. Os cálculos estatísticos e a análise espacial foram realizados em Stata, versão 14,2 (College Station, Texas, USA).
Por se tratarem de dados públicos, e não haver elementos de identificação dos indivíduos estudados, não houve necessidade de emprego de termo de consentimento livre e esclarecido.
O aumento progressivo da idade se associou à elevação da média de óbitos relacionada a doenças hipertensivas, entre os anos de 2010 e 2014. Nas faixas etárias entre 50-59 anos, 60-69 anos, 70-79 anos e 80 ou mais anos, a média e desvio padrão da taxa de mortalidade foram, respectivamente: 15,11% (35,35); 24,14% (55,34); 35,07% (81,03) e 57,87% (139,08).
Na representação gráfica (figura 1) de modelo de regressão binomial estendido para dados longitudinais, ajustado para as faixas etárias, observa-se maior razão de taxa de incidência nas regiões sudeste e nordeste, se comparadas com as regiões sul, norte e centro-oeste.
Figura 1 Representação gráfica do modelo de regressão binomial estendido para dados longitudinais, com razão de taxa de incidência ajustada para faixa etária e de acordo com as regiões do Brasil, no período de 2010 a 2014.
De acordo com as estimativas populacionais do IBGE para cada ano e estado do país,11 calculou-se, por 10.000 habitantes, a taxa global de mortalidade associada a doenças hipertensivas entre 2010 e 2014, que variou entre as regiões: norte (1,25); nordeste (2,69); centro-oeste (2,06); sudeste (2,48) e sul (2,04). Na tabela 1, são apresentados os valores por ano e região.
Tabela 1 Taxa anual de mortalidade associada a doenças hipertensivas no Brasil, ajustada para 10.000 habitantes (média e erro padrão), entre 2010 a 2014
Ano | Norte | Nordeste | Centro-Oeste | Sudeste | Sul | |||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Óbitos | EP | Óbitos | EP | Óbitos | EP | Óbitos | EP | Óbitos | EP | |
2010 | 1,12 | 0,02 | 2,67 | 0,02 | 2,02 | 0,04 | 2,52 | 0,05 | 1,96 | 0,02 |
2011 | 1,38 | 0,02 | 2,77 | 0,02 | 2,11 | 0,05 | 2,57 | 0,05 | 2,12 | 0,02 |
2012 | 1,31 | 0,02 | 2,02 | 0,02 | 2,09 | 0,04 | 2,52 | 0,04 | 2,02 | 0,02 |
2013 | 1,17 | 0,03 | 2,77 | 0,03 | 2,09 | 0,04 | 2,41 | 0,04 | 2,06 | 0,02 |
2014 | 1,26 | 0,01 | 2,56 | 0,02 | 2,03 | 0,04 | 2,39 | 0,03 | 2,06 | 0,02 |
EP: erro padrão.
É possível observar no mapa do Brasil, de forma clara, as regiões com maiores taxas de mortalidade associadas às doenças hipertensivas no ano de 2014, evidenciando também as regiões de menores taxas (figura 2).
Figura 2 Mapa coroplético do Brasil, referente a óbitos por 10.000 habitantes associados a doenças hipertensivas, no ano de 2014.
A análise feita por estados demonstrou que o Rio de Janeiro teve a maior média, sendo 3,66% de óbitos associados a doenças hipertensivas no ano de 2010, diminuindo progressivamente até o ano de 2014, com média de 3,02%, nesse mesmo ano. Em contrapartida, nos anos 2011, 2012, 2013 e 2014, o Piauí obteve a maior média de óbito com relação aos demais estados, sendo 3,80%, 3,58%, 3,87% e 3,61%, respectivamente (tabela 2). As maiores taxas de óbito ocorreram em estados da região sudeste e nordeste brasileiro.
Tabela 2 Média de óbitos associados a doenças hipertensivas por 10.000 habitantes, por estado do Brasil, entre 2010 e 2014
Estado | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 |
---|---|---|---|---|---|
Acre | 1,20 | 1,63 | 1,62 | 1,39 | 1,39 |
Alagoas | 2,64 | 2,81 | 2,87 | 2,98 | 2,64 |
Amapá | 0,61 | 1,02 | 0,80 | 0,71 | 0,95 |
Amazonas | 1,00 | 0,98 | 0,99 | 1,06 | 1,02 |
Bahia | 2,27 | 2,24 | 2,33 | 2,35 | 2,33 |
Ceará | 2,60 | 2,85 | 2,48 | 2,66 | 2,49 |
Distrito Federal | 1,13 | 1,30 | 0,99 | 1,10 | 1,08 |
Espírito Santo | 2,32 | 2,62 | 2,64 | 2,42 | 2,55 |
Goiás | 1,43 | 1,52 | 1,77 | 1,69 | 1,81 |
Maranhão | 2,00 | 2,13 | 1,97 | 2,11 | 2,07 |
Mato Grosso | 2,22 | 2,13 | 1,97 | 2,11 | 2,07 |
Mato Grosso do Sul | 2,39 | 2,68 | 2,74 | 2,83 | 2,52 |
Minas Gerais | 2,26 | 2,36 | 2,40 | 2,29 | 2,29 |
Pará | 1,05 | 1,21 | 1,27 | 1,27 | 1,30 |
Paraíba | 3,10 | 3,26 | 3,26 | 3,23 | 2,88 |
Paraná | 2,26 | 2,47 | 2,26 | 2,35 | 2,36 |
Pernambuco | 2,41 | 2,44 | 2,29 | 2,18 | 2,13 |
Piauí | 3,51 | 3,80 | 3,58 | 3,87 | 3,61 |
Rio de Janeiro | 3,66 | 3,52 | 3,37 | 3,23 | 3,02 |
Rio Grande do Norte | 2,22 | 2,54 | 2,34 | 2,56 | 2,44 |
Rio Grande do Sul | 1,80 | 1,96 | 1,99 | 1,93 | 1,91 |
Roraima | 1,07 | 1,65 | 1,62 | 1,54 | 1,29 |
Santa Catarina | 1,81 | 1,92 | 1,81 | 1,89 | 1,92 |
São Paulo | 1,82 | 1,79 | 1,69 | 1,70 | 1,69 |
Sergipe | 3,31 | 2,88 | 3,12 | 3,02 | 2,49 |
Tocantins | 2,91 | 3,01 | 2,74 | 2,72 | 2,84 |
Rondônia | 1,79 | 1,78 | 1,71 | 1,67 | 1,63 |
No período de 2010 a 2014, o Distrito Federal apresentou taxas de mortalidade semelhantes ao estado de Goiás, com exceção do ano 2012, quando obteve uma das menores taxas de mortalidade no país.
Um modelo preditivo da taxa de óbitos foi estimado (tabela 3). Não houve diferença de mortalidade associada ao sexo, quando ajustada para os demais preditores. No que se refere à faixa etária, quanto maior a idade, ocorre uma maior chance de óbitos associados à hipertensão arterial sistêmica. A cor da pele, tomando-se "brancos" como referência, indicou maior associação de doenças hipertensivas com óbitos em "pardos", e menor em "pretos", "amarelos", "indígenas" e nos casos em que essa variável foi desconhecida. Ressalte-se que o número total de "indígenas" e "amarelos", somados aos de cor ignorada, foi inferior a 6%. Os "pretos" representaram menos de 12% do grupo de "pardos", "brancos" e "pretos", tendo uma destacada maioria entre os "brancos".
Tabela 3 Análise longitudinal com modelo binomial negativo, tendo como variável dependente o número de óbitos associados a doenças hipertensivas, e preditores "faixa etária", "sexo", "cor", "região" e "ano", ajustados para a população anual estimada para cada localidade, entre 2010 e 2014
Óbitos | IRR | IC a 95% | Valor de p | |
---|---|---|---|---|
Sexo | ||||
Feminino (referência) | - | - | - | - |
Masculino | 1,03 | 0,99 | 1,08 | 0,158 |
Faixa Etária | ||||
50 - 59 anos (referência) | - | - | - | - |
60 - 69 anos | 1,63 | 1,53 | 1,73 | < 0,0001 |
70 - 79 anos | 2,40 | 2,25 | 2,55 | < 0,0001 |
≥ 80 anos | 3,99 | 3,76 | 4,26 | < 0,0001 |
Cor | ||||
Branca (referência) | - | - | - | - |
Preta | 0,27 | 0,25 | 0,29 | < 0,0001 |
Parda | 1,28 | 1,20 | 1,36 | < 0,0001 |
Amarela | 0,01 | 0,00 | 0,01 | < 0,0001 |
Indígena | 0,01 | 0,01 | 0,01 | < 0,0001 |
Ignorado | 0,13 | 0,12 | 0,14 | < 0,0001 |
Região | ||||
Sudeste (referência) | - | - | - | - |
Norte | 0,43 | 0,40 | 0,47 | < 0,0001 |
Nordeste | 0,96 | 0,90 | 1,03 | 0,237 |
Centro-Oeste | 0,73 | 0,67 | 0,78 | < 0,0001 |
Sul | 0,61 | 0,57 | 0,67 | < 0,0001 |
Ano | ||||
2010 (referência) | - | - | - | - |
2011 | 1,06 | 0,99 | 1,14 | 0,112 |
2012 | 1,00 | 0,94 | 1,08 | 0,898 |
2013 | 0,96 | 0,90 | 1,03 | 0,267 |
2014 | 0,96 | 0,90 | 1,03 | 0,261 |
IRR: razão de taxa de incidência; IC: índice de confiança.
Por não se tratar de estudo étnico, porém levando-se em consideração que a cor de pele, como consta no atestado de óbito, tem sido considerada um dado relevante para a elaboração de políticas públicas de saúde, a inclusão desse preditor serviu menos para produzir inferências raciais do que para ajustar esse dado aos demais preditores e estabilizar algoritmos iterativos. Adicionalmente, observou-se que os modelos com inclusão da variável "cor da pele", se comparados a modelos com a exclusão desse preditor, além de apresentarem preditores com IRRs semelhantes, produziram convergência em menor tempo e valores de AIC mais baixos, indicando maior adequação do ponto de vista estatístico.
Tomando-se a região sudeste como referência, por ter um nível de desenvolvimento maior e as políticas públicas aplicadas há mais tempo, não houve diferença estatística quando comparada à região nordeste, apresentando as demais regiões uma razão da taxa de incidência inferior ao sudeste brasileiro.
O modelo preditivo demonstrou que não houve diferença estatisticamente significativa da razão da taxa de incidência de óbitos entre os anos, quando ajustada para os demais preditores. Igualmente, diferença de sexo não exerceu influência. Faixa etária elevada, cor parda e regiões sudeste e nordeste foram preditores de maior mortalidade no período estudado.
Foi realizado um estudo epidemiológico a partir de dados agregados, obtidos em estratos populacionais. Portanto, a fim de evitar-se a "falácia ecológica", não se pode estender a aplicabilidade dos resultados ao plano individual, ao do consultório clínico, mas apenas às esferas estadual, regional e nacional.
Por tratar-se de dados colhidos em órgãos públicos, os quais, por sua vez, decorreram da notificação constante nas declarações de óbito, o presente artigo não possui no seu delineamento elementos metodológicos capazes de testar a veracidade dos mesmos. Isso igualmente se aplica à questão dos itens selecionados nas declarações de óbito, que podem apresentar, em potencial, diferenças de acordo com preferências de cada estado ou região no que diz respeito a assinalar, com maior ou menor frequência, a hipertensão como causa relevante para o óbito.
O número de óbitos associados a doenças hipertensivas está relacionado com o aumento da idade, assim como pode ser observado nesse estudo. O impacto dessa enfermidade tende a acentuar-se, pois a população idosa aumenta a cada ano, representando atualmente 15% da população mundial. Projeções mundiais indicam que haverá um aumento dessa população, podendo dobrar esse valor e atingir aproximadamente 30% no ano de 2050. Isso exige atenção especial na elaboração de medidas preventivas e de controle das doenças hipertensivas.16
Em outro estudo, dessa vez de prevalência de hipertensão arterial, as regiões sudeste e sul do Brasil, se comparadas com as demais, obtiveram maiores taxas, 25% (95% CI: 23,8 - 26,1) e 25% (95% CI: 23,5 - 26,5), respectivamente.17 No presente estudo, porém, focalizou-se a taxa de mortalidade associada a doenças hipertensivas, e as regiões de maiores taxas foram nordeste e sudeste. Embora esse tópico esteja fora do escopo da presente pesquisa, especula-se que a discrepância entre maior prevalência e menor mortalidade na região sul poderia decorrer de questões relacionadas à aplicação mais intensa de estratégias terapêuticas, seja no cuidado assistencial, seja no fornecimento de fármacos.
Um fenômeno oposto, ocorreu em um estado nordestino. Esse estudo mostrou que o estado do Piauí apresentou, durante 4 anos consecutivos, a maior taxa de mortalidade associada a doenças hipertensivas. Entretanto, uma pesquisa realizada em idosos no ano de 2013, nesse mesmo estado, indicou uma prevalência de HAS em idosos igual a 40,2%, sendo abaixo do esperado em idosos, que é de 68% de prevalência na população acima de 60 anos.4,18 Novamente, em tom especulativo, mas de igual modo fora do escopo da presente pesquisa, esse achado poderia decorrer de obstáculos na assistência ou no acesso a medicamentos.
Essas considerações se destinam fundamentalmente a formular hipóteses a serem analisadas em estudos futuros.
As taxas de mortalidade associada a doenças hipertensivas foram maiores em pardos no Brasil, se comparadas a negros, algo que pode ter sido influenciado pela eventual subjetividade na identificação da cor da pele e devido ao predomínio da miscigenação no país.19 Ainda são poucos os estudos realizados na América Latina sobre maior prevalência de hipertensão arterial em negros, e grande parte das informações científicas envolvendo etnicidade provêm de estudos realizados nos Estados Unidos.20
São várias as limitações decorrentes desse tipo de estudo, que lida com dados agregados. Por exemplo, não se pode afastar a possibilidade de ter ocorrido, de um lado, aumento das notificações e, de outro, melhora do controle dos níveis pressóricos, algo que geraria uma aparente constância da enfermidade em análise de séries temporais. Porém, do ponto de vista metodológico, o delineamento da pesquisa buscou ajustar as análises para uma eventual influência de fatores temporais e geográficos na mesma região ou estado.
Deve-se igualmente ressaltar que foram utilizados os dados atualmente considerados os mais relevantes para a elaboração de políticas públicas, algo que se reflete no planejamento, execução e avaliação das ações de saúde no combate a enfermidades de maior impacto no Brasil.21 Nesse sentido, a implementação da Assistência Farmacêutica pelo Ministério da Saúde tem sido aventada como recurso de grande impacto para reduzir a mortalidade decorrente de doenças crônicas não transmissíveis, incluindo a hipertensão arterial.9
Não obstante, tomando-se como base as informações disponíveis em registros públicos de mortalidade associada a doenças hipertensivas, e submetendo esses dados a uma avaliação complexa, corroborada em diversos modelos analíticos, a ausência de redução significativa na taxa de mortalidade no período de cinco anos sugere a necessidade de ampliar o espectro farmacológico dos medicamentos de distribuição gratuita e intensificar os programas de assistência médica, entre outras medidas.
A taxa de mortalidade associada a doenças hipertensivas foi superior nos estados do sudeste e nordeste do Brasil, quando comparada aos demais estados. Essa taxa não apresentou alterações significativas entre os anos 2010 a 2014, quando analisada em relação ao mesmo estado e mesma região do Brasil. Outros preditores de maior taxa de mortalidade foram a cor parda e incremento da faixa etária. Políticas públicas de saúde, voltadas para o atendimento de hipertensos e prevenção de complicações, devem ser preferencialmente aplicadas nos estados com maiores taxas.