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Anxiety and clinical outcomes in coronary patients undergoing unplanned catheterization

Anxiety and clinical outcomes in coronary patients undergoing unplanned catheterization

Autores:

Letícia de Carvalho Batista,
Ana Lúcia Siqueira Costa Calache,
Rita de Cassia Gengo e Silva Butcher

ARTIGO ORIGINAL

Acta Paulista de Enfermagem

Print version ISSN 0103-2100On-line version ISSN 1982-0194

Acta paul. enferm. vol.31 no.6 São Paulo Nov./Dec. 2018

http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800082

Resumen

Objetivos

Describir el nivel de ansiedad rasgo y estado en pacientes con síndrome coronario agudo sometidos a cateterismo no programado, verificar la influencia de la ansiedad rasgo en la ansiedad estado antes y después del cateterismo, y verificar si la ansiedad (rasgo y estado) es predictiva de la ocurrencia de arritmias no fatales, de la gravedad de los pacientes medida por clasificación Killip e índice de comorbilidad de Charlson, y del tiempo de permanencia hospitalaria.

Métodos

Estudio observacional, correlacional y longitudinal. Fueron evaluados participantes con síndrome coronario agudo esperando cateterismo cardíaco no programado. En el encuentro inicial (Ti) fueron recolectados datos sociodemográficos y clínicos, aplicando inventarios de ansiedad rasgo y estado (IDATE) y de depresión de Beck. En el encuentro final (Tf), se aplicó IDATE-estado. Los participantes recibieron seguimiento hasta el alta o el deceso, respecto de la ocurrencia de arritmias no fatales y tiempo de permanencia hospitalaria.

Resultados

Fueron incluidos 100 participantes (62,2+11,4 años; 61% de sexo masculino). El puntaje de IDATE-rasgo fue 42,2±10,4, influyendo en el puntaje del IDATE-estado en Ti y Tf (p<0,005). El IDATE-estado disminuyó significativamente entre Ti y Tf (40,2±10,4 vs 37,2±11,02 respectivamente; p=0,002). No se observó asociación del IDATE-rasgo ni del IDATE-estado con los índices de gravedad, tiempo de permanencia hospitalaria u ocurrencia de arritmias (OR=1,099; IC%=0,913-1,115).

Conclusión

El nivel de ansiedad se redujo significativamente luego de realizarse el cateterismo, y no constituyó un predictor de resultados clínicos en el corto plazo.

Palabras-clave: Ansiedad; Cateterismo cardíaco/psicología; Síndrome coronario agudo/psicología; Enfermedad coronaria/psicología

Introdução

A Síndrome Coronariana Aguda (SCA) é um grupo de sintomas clínicos de isquemia do miocárdio, cujo espectro clínico inclui a angina instável (AI) e o infarto agudo do miocárdio (IAM) com e sem supradesnivelamento do segmento ST.(1) Trata-se da mais grave manifestação da doença arterial coronariana (DAC) que é reconhecida como a principal causa de morte em países desenvolvidos e emergentes, dentre os quais o Brasil.(2) O impacto dos fatores de risco clássicos na instalação e progressão da isquemia miocárdica é bem estabelecido.(1) No entanto, também é reconhecida a influência de fatores psicossociais na morbidade e mortalidade de pacientes com SCA.(3)

Depressão e ansiedade podem ocorrer em pacientes após um episódio de SCA. Embora os efeitos adversos da depressão em desfechos a curto e longo prazo têm sido bastante estudados, os efeitos da ansiedade ainda carecem de mais investigações.(3) A ansiedade é um estado emocional caracterizado por sentimentos de preocupação e apreensão. A literatura sugere que 20% a 30% dos pacientes experenciam níveis elevados de ansiedade após episódio de SCA; em metade deles o sintoma pode persistir por até um ano depois do evento coronariano.(3)

Há diferentes modelos teóricos disponíveis para análise da ansiedade. Na presente pesquisa, adotou-se o modelo de ansiedade de Spielberg, o qual dá origem a dois construtos na avaliação: traço e estado.(4) O traço se refere ao perfil ansioso, isto é, características individuais de personalidade mais ou menos estáveis com relação à propensão à ansiedade; o estado se refere a um estado emocional transitório, caracterizado por sentimentos desagradáveis de tensão e apreensão.(4)

Ansiedade traço e estado, têm sido observadas em diferentes condições clínicas, incluindo pacientes com SCA.(5) Ambos os constructos constituem-se em alvo de investigação na enfermagem com o propósito de reconhecer suas manifestações, fatores preditivos, bem como de testar intervenções.(6-8) Porém, a relação do nível de ansiedade com a gravidade da doença cardíaca não está estabelecida.(9)

Ainda, estudos têm documentado os desfechos adversos da ansiedade na saúde cardiovascular de pacientes com SCA, a curto e longo prazos. Pesquisadores evidenciaram que após um episódio de SCA pacientes com ansiedade tiveram maior taxa e maior risco de desenvolver complicações intra-hospitalares em comparação com aqueles sem ansiedade.(10) Em outro estudo, demonstrou-se que o nível elevado de ansiedade aumentou o risco relativo de recorrência de evento cardíaco 12 meses após intervenção coronariana percutânea.(11)

São escassas as investigações disponíveis que tenham analisado a relação da ansiedade com desfechos de curto prazo em pacientes com SCA submetidos ao cateterismo não programado. Neste estudo o termo cateterismo não programado foi utilizado para designar genericamente as intervenções coronárias percutâneas que não haviam sido agendadas previamente à ida do paciente ao serviço de emergência. Acredita-se que, diante de uma situação ameaçadora à vida (SCA) e na iminência da realização de um exame invasivo não programado, a ansiedade traço determine o aumento da ansiedade estado, esteja relacionada com a gravidade da doença e influencie desfechos clínicos em curto prazo. Ademais, a experiência clínica demonstra que pacientes com SCA e submetidos ao cateterismo não programado experimentam estadias hospitalares de menor duração em comparação com aqueles submetidos à cirurgia, o que pode ser um desafio para o diagnóstico, o planejamento e a implementação de cuidados visando o manejo da ansiedade.

Isto posto, os objetivos deste estudo foram: descrever o nível de ansiedade traço e estado em pacientes com SCA, verificar se há influência do nível de ansiedade traço no nível de ansiedade estado antes e após o cateterismo e verificar se a ansiedade (traço e estado), é preditiva da ocorrência de arritmias não fatais, da gravidade dos pacientes medida pela classificação Killip e pelo índice de comorbidade de Charlson, e do tempo de permanência hospitalar.

Métodos

Estudo observacional, correlacional, longitudinal, realizado em hospital público de referência em cardiopneumologia. A coleta de dados foi realizada no período de julho a outubro de 2017.

O tamanho da amostra foi calculado em 99 participantes, considerando a prevalência de ansiedade de 50% em pacientes coronariopatas submetidos a procedimentos percutâneos, o número de cateterismos realizados no hospital campo de estudo em pacientes admitidos com SCA no pronto-socorro, e assumindo erro tipo I de 5%.

Foram incluídos no estudo participantes com 18 anos ou mais, com diagnóstico confirmado de AI e IAM sem supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST), submetidos ao cateterismo não programado e estáveis hemodinamicamente. Os participantes com IAM com supradesnivelamento do segmento ST não foram incluídos em função da brevidade com que eram encaminhados ao cateterismo, inviabilizando a coleta de dados. Foram excluídos aqueles com dor isquêmica no momento da coleta de dados; cuja conduta foi modificada após o planejamento inicial de realização do cateterismo; com diagnóstico documentado de ansiedade ou depressão e em uso de moduladores do humor.

Os participantes foram recrutados antes do cateterismo cardíaco. No encontro inicial (Ti) foram coletados dados sociodemográficos (idade, sexo e escolaridade) e clínicos (diagnóstico médico, fatores de risco cardiovascular, comorbidades e classificação Killip) por meio de consulta ao prontuário ou entrevista, e aplicados o inventário de ansiedade traço-estado (IDATE), o inventário de depressão de Beck e o índice de comorbidade de Charlson.(12-14) De seis a 12 horas após o cateterismo, acontecia o encontro final (Tf), no qual a pesquisadora principal aplicava o IDATE estado.

O inventário de ansiedade traço-estado (IDATE) é composto por duas escalas que foram traduzidas e validadas para o português do.(12) Cada constructo é avaliado por meio de 20 itens seguidos por uma escala Likert de 4 pontos. Para evitar vício de resposta, alguns itens são apresentados de maneira inversa e para o cálculo do escore devem ter as pontuações invertidas. O escore total varia de 20 a 80 para cada escala, sendo que quanto maior o escore maior o nível de ansiedade.

Considerando-se que ansiedade e depressão muitas vezes se sobrepõem, optou-se pela avaliação do escore de depressão por meio do inventário de depressão de Beck (BDI). A escala, traduzida e validada para o português composta de 21 itens que são classificados em uma escala tipo Likert de 4 pontos. O escore total varia de 0 a 63 pontos.(13)

A gravidade clínica foi avaliada por meio do índice de comorbidade de Charlson (CCI) e da classificação Killip.(14,15) O CCI avalia a gravidade segundo o peso atribuído a comorbidades. É composto por 19 condições clínicas, onde para cada uma é atribuída uma pontuação que varia de um a seis. Quanto maior o escore total, maior é a gravidade.(14) A classificação Killip avalia a gravidade do paciente após provável IAM, com base em dados provenientes do exame físico indicativos de disfunção cardíaca. Os pacientes podem ser classificados em Killip I (sem congestão pulmonar), Killip II (estertores pulmonares, estase jugular ou terceira bulha), Killip III (edema pulmonar) e Killip IV (choque cardiogênico).(15)

Os participantes avaliados em Tf foram monitorados, por meio de seus registros em prontuário, até a alta hospitalar ou óbito para acompanhamento dos seguintes desfechos: arritmias não fatais e tempo de permanência hospitalar.

Para análise das variáveis contínuas foram calculados média e desvio-padrão. As variáveis categóricas foram analisadas por meio do cálculo das frequências absoluta e relativa. Para a comparação de médias utilizou-se teste T pareado. A influência do escore do IDATE-traço na modificação do escore do IDATE-estado antes e depois do cateterismo e as associações entre o escore do IDATE-traço com o escore do IDATE-estado em Ti e Tf e entre o escore do IDATE-traço/estado com CCI e com tempo de permanência hospitalar foi determinada por modelo de regressão linear. O ajuste do modelo foi verificado por meio do R2. Por sua vez, modelos de regressão logística foram utilizados para determinar a associação entre o escore do IDATE-traço/estado com a classificação Killip e arritmia. A capacidade preditiva desses modelos foi verificada por meio da área sob a curva ROC (Receiver Operating Characteristic Curve). O nível de significância adotado foi de 5%.

O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética das instituições proponente (processo número 2.087.449) e coparticipante (processo número 2.126.485).

Resultados

Foram incluídos no estudo 116 participantes, dos quais 16 foram excluídos por mudança de conduta após o planejamento inicial de realização do cateterismo, recebimento de alta hospitalar antes do Tf, diagnóstico de ansiedade ou depressão e uso de moduladores do humor. Permaneceram na amostra final 100 participantes, acompanhados desde a admissão no serviço de emergência até a saída do hospital (alta ou óbito), com idade média de 62,2±11,4 anos, e 61% eram do sexo masculino; 60% casados e 39% tinham ensino fundamental incompleto; 47% tinham diagnóstico de IAMSST; e 54% fizeram angioplastia. Verificou-se que 53% relataram ser sedentários e 22% tabagistas; 43% tinham sobrepeso ou obesidade; 53% tinham diagnóstico prévio de angina instável; 82%, hipertensão; 41%, diabetes; 40%, dislipidemia; 8%, insuficiência cardíaca; e 6%, acidente vascular encefálico; 18% tinham sido submetidos previamente à angioplastia e 24% à cirurgia.

Com relação à gravidade, o CCI foi 2,1±1,7, e 12,8% dos participantes com IAMSST foram classificados como Killip II; 10% apresentaram arritmias não fatais. O tempo médio de internação foi 6,4±7,3 dias. O escore médio do BDI foi 12,8±9,2.

O escore médio do IDATE-traço em Ti foi 42,2±10,4. O escore do IDATE-estado antes do cateterismo foi significativamente maior do que após (40,2±10,4 vs 37,2±11,2, respectivamente, p=0,002).

Houve associação entre o escore do IDATE-traço com o escore do IDATE-estado em ambos os momentos de medida. Em Ti, o escore do IDATE-estado aumentou 0,406 (IC95% 0,222–0,589, p<0,001) a cada ponto do IDATE-traço; em Tf, o escore do IDATE-estado aumentou 0,357 (IC95% 0,155–0,559, p=0,001) a cada ponto do IDATE-traço. No entanto, o escore do IDATE-traço não influenciou a diferença no escore do IDATE-estado antes e depois do cateterismo (p=0,602).

Quanto aos desfechos de interesse, na análise univariada, o CCI apresentou correlação significativa com o escore do IDATE-traço (r=0,329, p=0,001), mas não com o escore do IDATE-estado (r=0,109, p=0,282). Por sua vez, não houve associação entre a classificação Killip com os escores de ansiedade traço (p=0,742) ou estado (p=0,550), nem correlação entre o tempo de permanência hospitalar com tais escores (r=-0,017, p=0,870 e r=0,061, p=0,547, respectivamente). Não se observou associação entre a ocorrência de arritmias com os escores de ansiedade traço (p=0,960) ou estado (p=0,250), mas o modelo de regressão (Tabela 1) evidencia a relação entre a ocorrência de arritmias não fatais e escore de depressão, influenciada pela ansiedade-estado.

Tabela 1 Modelo de regressão das variáveis preditivas da ocorrência de arritmias não fatais em pacientes com síndrome coronariana aguda submetidos ao cateterismo 

Variáveis Odds ratio Erro padrão Wald Intervalo de confiança de 95% p-value
Arritmia
IDATE-estado 0,930 0,047 2,370 0,848-1,020 0,124
Idade 0,999 0,033 0,001 0,937-1,065 0,979
Sexo masculino 5,340 0,969 2,990 0,800-35656 0,084
Escolaridade 0,917 0,195 0,196 0,626-1,344 0,658
Tabagismo 0,370 1,143 0,756 0,039-3,477 0,385
Sedentarismo 0,918 0,788 0,012 0,196-4,306 0,914
Sobrepeso/Obesidade 1,156 0,779 0,035 0,251-5,319 0,852
Escore do BDI 1,095 0,046 3,870 1,000-1,199 0,049
Escore do CCI 0,746 0,291 1,012 0,422-1,320 0,314
Constante 0,382 2,810 1,117 0,382

BDI - Inventário de depressão de Beck; CCI - Índice de comorbidade de Charlson

AUC - Área sob a curva; IC - Intervalo de confiança de 95%

Na tabela 1, verifica-se que o escore do IDATE-estado não foi um preditor da ocorrência de arritmias não fatais. A capacidade preditiva do modelo está demonstrada na figura 1.

Figura 1 Capacidade preditiva do modelo de regressão das variáveis preditivas da ocorrência de arritmias não fatais em pacientes com síndrome coronariana aguada submetidos ao cateterismo não programado 

Os escores de ansiedade traço e estado não foram preditores da gravidade clínica dos participantes, medida pela classificação Killip (OR=0,904; IC95%=0,747-1,095; AUC=0,814 e OR=0,994; IC95%=0,889-1,112; AUC=0,799, respectivamente). Também não foram preditores do tempo de permanência hospitalar (B=0,115; IC95%=-0,123-0,284; R2=0,090 e B=-0,025; IC95%=-0,165-0,130; R2=0,095) em modelos de regressão corrigidos para variáveis confundidoras (idade, sexo masculino, escolaridade, fatores de risco, escore do BDI e do CCI).

Discussão

A ansiedade tem sido associada com o início e progressão de doenças cardiovasculares, bem como com desfechos cardiovasculares adversos, incluindo mortalidade.(16) Este estudo analisou a relação dos escores de ansiedade, avaliados pelo IDATE-traço e IDATE-estado, com desfechos em curto prazo nos pacientes com SCA submetidos ao cateterismo não programado. Os resultados deste estudo podem contribuir para melhorar a compreensão da influência deste fenômeno, mediada por fatores intervenientes (idade, sexo, escolaridade, fatores de risco cardiovascular, comorbidades e depressão) na saúde desses pacientes.

O perfil sociodemográfico dos participantes deste estudo, os fatores de risco apresentados, bem como suas comorbidades são semelhante ao observado na literatura.(16,17) O nível de ansiedade estado foi significativamente maior antes do cateterismo do que após. Isso era esperado, pois o nível de ansiedade estado aumenta frente situações de ameaça e tende a diminuir quando a ameaça é controlada ou não exite mais. A diminuição do nível de ansiedade após procedimento invasivo também foi verificada em estudo longitudinal que avaliou a ansiedade em pacientes submetidos a tratamento coronariano percutâneo eletivo em diferentes fases (um dia antes do procedimento e um dia, um mês, três meses, seis meses e um anos após o procedimento).(18)

No entanto, o nível habitual (traço) de ansiedade não influenciou a diferença no nível de ansiedade estado antes e após o cateterismo. Uma hipótese para explicar tal observação, é a influência de fatores contextuais, por exemplo, a permanência em um ambiente estranho como a sala de emergência, ou individuais para além do perfil ansioso, como a compreensão sobre a finalidade do cateterismo, tenham determinado a resposta de diminuição da ansiedade estado.

Apesar de não influenciar no nível de redução da ansiedade estado, associação da ansiedade traço com a ansiedade estado antes e após o cateterismo sugere a relação entre o nível habitual de ansiedade e o nível de ansiedade de momento (estado), neste caso, influenciada pela realização de um procedimento invasivo e na vigência de um quadro de SCA. Esta associação também foi observada em outros estudos tanto em pacientes com cardiopatia quanto em outros grupos.(19-21)

Em relação aos desfechos de curto prazo analisados, não foi possível demonstrar que a ansiedade é um preditor da ocorrência de arritmias não fatais. Embora nossa hipótese inicial não tenha sido confirmada, há fundamentação fisiopatológica subjacente. A ansiedade está associada a alterações na variabilidade da frequência cardíaca, hiperatividade do sistema nervoso simpático e desrregulação autonômica.(22) Tais efeitos no sistema cardiovascular potencializam a ocorrência de arritmias e podem, inclusive, levar a maior mortalidade nesses pacientes.(22) Possivelmente, o tratamento farmacológico padrão de pacientes com SCA, que inclui o uso de antiarrítmicos possa ter influenciado na relação observada neste estudo entre ansiedade e arritmias.(23)

A gravidade dos participantes foi determinada pela classificação Killip e pelo CCI. Enquanto a primeira tem a finalidade de estimar a gravidade de pacientes após IAM e mostrou relevante desempenho prognóstico em seguimento de cinco anos em pacientes com SCA, o CCI considera o impacto de comorbidades crônicas na chance de sobrevida.(14,24,25)

Para alguns participantes deste estudo, a classificação Killip II pode sugerir mau prognóstico clínico, apesar de o CCI ter sido baixo.(26) Na literatura, verifica-se que a classificação Killip é um preditor independente de complicações intra-hospitalares em pacientes com SCA, cujo risco é cinco vezes maior naqueles com ansiedade.(10) Outro estudo que investigou população semelhante, encontrou valor semelhante do CCI.(27) De todo modo, sabe-se que o CCI é um indicador prognóstico adequado para avaliar o risco de mortalidade intra-hospitalar em pacientes com SCA após um ano do evento.(25)

Em conjunto, esses dados mostram o perfil de gravidade clínica dos participantes, seja baseado na ocorrência de complicações após o IAM ou pelo impacto decorrente das comorbidades. Diferentemente do esperado, ansiedade traço e estado não foram preditores da gravidade dos participantes avaliada pela classificação Killip, o que pode ser explicado pelo baixo número de participantes que apresentaram tal condição.

Considerando que a gravidade clínica após IAM pode ser expressa também pela ocorrência de outros eventos cardíacos ou pela taxa de mortalidade, sua relação com a ansiedade permanece não esclarecida. Em outro estudo, mostrou-se que sintomas de ansiedade não se associaram com a ocorrência de eventos cardíacos fatais e não fatais em seguimento de 10 anos.(28) No entanto, outros autores encontraram resultados diferentes no que tange à associação de desfechos em curto e longo prazos com a ansiedade.(10,11) Outras investigações são necessárias para avaliar a influência da ansiedade em desfechos a curto prazo em pacientes com SCA.

Não se observou associação tempo de permanência hospitalar com o nível de ansiedade. Tampouco, os escores de ansiedade traço e estado foram preditivos do tempo de permanência hospitalar. Não há consenso na literatura sobre a relação entre ansiedade e tempo de internação.(29,30) No entanto, é preciso chamar a atenção para o fato de que o tempo médio de permanência hospitalar para esse grupo de pacientes vem diminuindo ao longo dos últimos 20 anos.(31) Tal fato se coloca como um desafio para a proposição de estratégias que visem a redução dos níveis de ansiedades nesses pacientes.

Esse estudo tem limitações. A coleta de dados em um único centro e em serviço altamente especializado, assim como a não inclusão de pacientes com IAM com supradesnivelamento do segmento ST pode comprometer a generalização dos resultados. Além disso, coleta de dados clínicos a partir do prontuário do paciente depende da precisão e completude das informações documentadas. Apesar de o tempo entre a internação e a realização do cateterismo ter potencial influência nos níveis de ansiedade, este dado não foi analisado no presente estudo. Assim, sugere-se que outros estudos que avaliem a ansiedade em pacientes com SCA submetidos ao cateterismo não programado sejam realizados para viabilizar a maior compreensão do fenômeno, bem como sua associação com desfechos em curto prazo.

Conclusão

O nível de ansiedade de pacientes com SCA submetidos ao cateterismo não programado reduziu de forma significativa após a realização do procedimento. Ainda, embora o nível habitual de ansiedade (traço) esteja associado ao nível de ansiedade do momento (estado), a diferença no escore de ansiedade estado antes e depois do cateterismo não foi influenciada pelo nível de ansiedade traço. Os escores de ansiedade traço e estado não foram preditivos de desfechos a curto prazo (arritmia não fatal, gravidade clínica e tempo de permanência hospitalar).

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