versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.22 no.8 Rio de Janeiro ago. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017228.23502015
Nas últimas décadas, tem-se observado, em nível mundial, mudança nos padrões alimentares, caracterizada pelo aumento no consumo de alimentos de alta densidade energética e redução na ingestão de frutas e hortaliças1. Em consequência, novos métodos que envolvem um sistema de escores têm sido testados com o intuito de avaliar a qualidade da dieta e, assim, fazer inferências sobre a relação entre alimentação e estado nutricional2.
Em 1995, o United States Department of Agriculture (USDA) desenvolveu o Health Eating Index (HEI), cuja terminologia em português é Índice de Alimentação Saudável (IAS), para verificar adequação da dieta segundo o Guia Alimentar norte-americano3. O HEI foi inicialmente composto por 10 itens, sendo cinco destes pertencentes ao Guia da Pirâmide Alimentar: frutas, vegetais, grãos, leite e carne; quatro nutrientes (gorduras totais, gordura saturada, colesterol e sódio) para consumo moderado; e o décimo item – variedade – referente à diversidade e composição da dieta. Cada componente apresenta pontuação de 0 a 10, totalizando 100 pontos. Estipulou-se que dieta com pontuação acima de 80 seria classificada como “boa”; de 51-80 como “necessita de melhoria” e menor que 51 como “ruim”4,5.
Após sua criação, o HEI foi duas vezes atualizado, objetivando adequação às mudanças relativas ao Guia Alimentar. Em 2005, o HEI foi reformulado (HEI-2005), baseado no guia alimentar MyPyramid, sendo composto por 12 itens: frutas totais; frutas inteiras (sucos não são contabilizados); vegetais totais; vegetais e legumes verde-escuros e alaranjados; grãos totais; grãos integrais; leite e derivados; carne, ovos e leguminosas; gordura total; gordura saturada; sódio e calorias advindas de gordura sólida, álcool e açúcar de adição. Os itens alimentares desmembrados são pontuados de 0 a 5 (primeiros seis itens), os não desmembrados e os de nutrientes de 0 a 10 (itens sete a onze), e o último item pontua de 0 a 203.
Posteriormente, em 2010, o HEI-2005 é atualizado (HEI-2010), com adição de alimentos marinhos (peixes e crustáceos) na alimentação e ao controle no consumo de grãos refinados segundo recomendações do guia alimentar norte americano6. O HEI-2010 mantém os princípios da adequação referente aos grupos alimentares, e da moderação em relação aos grupos de nutrientes do HEI-2005. Dentre os 12 componentes, seis possuem pontuação máxima de 5 pontos (frutas totais, frutas inteiras, vegetais totais, verdes e leguminosas, alimentos ricos em proteínas e frutos do mar/proteína vegetal); os componentes grãos totais, leite e derivados, ácidos graxos, grãos refinados e sódio apresentam escore de até 10 pontos; e calorias vazias, provenientes de gorduras sólidas, álcool e açúcar de adição de até 20 pontos7.
Devido às diferenças nos hábitos alimentares em diferentes regiões, é recomendado que instrumentos que avaliam a qualidade da dieta sejam adaptados ao grupo de estudo, a fim de se aproximar ao máximo da realidade de cada local4,8-10. Por conseguinte, o HEI foi transposto para a população brasileira, em 2004, sendo denominado de Índice de Qualidade da Dieta11 e atualizado por Previdelli et al.12 segundo Guia Alimentar proposto para População Brasileira, sendo nomeado de Índice de Qualidade da Dieta – Revisado (IQD-R). Entretanto, outros autores brasileiros13-15 preferiram nomear o HEI como Índice de Alimentação Saudável adaptado (IASad).
Assim, esta revisão sistemática tem o objetivo de analisar metodologias de estudos brasileiros que utilizam índices para avaliação da qualidade da dieta.
Realizou-se busca sistemática em bases eletrônicas de dados (Lilacs, Medline, SciELO, Scopus), sem fazer restrição ao ano de publicação dos artigos. Os termos de pesquisa utilizados foram qualidade da dieta, índice de alimentação saudável, índice de qualidade da dieta e seus respectivos termos em inglês. Optou-se pela utilização destes termos uma vez que no Brasil alguns autores utilizam o índice de qualidade da dieta como sinônimo do índice de alimentação saudável.
Incluiu-se nesta revisão artigos originais, nacionais, que avaliassem a qualidade da dieta pelo Healthy Eating Index (HEI), proposto nos Estados Unidos por Kenneddy et al.4 ou suas versões revisadas3,7,9,10. Artigos de revisão, dissertações, teses, capítulos e livros não foram incluídos. Não foram impostos limites para o idioma da publicação, idade ou gênero da unidade de estudo.
Após pesquisa dos descritores nas bases de dados descritas, realizou-se revisão e seleção dos estudos, avaliando primeiramente os títulos e os resumos e, posteriormente, os artigos na íntegra. Com o intuito de identificar estudos de potencial relevância, não identificados na busca eletrônica e ainda não incluídos na revisão sistemática, revisou-se busca reversa nas referências dos estudos selecionados.
Identificou-se inicialmente 301 pesquisas, sendo excluídas 256 por serem realizados fora do Brasil, repetidas e por não avaliarem a qualidade da dieta pelos instrumentos de interesse neste estudo. Após as etapas de seleção, 45 artigos foram incluídos nesta revisão por contemplarem os critérios de inclusão (Figura 1).
Ressalta-se que a leitura dos artigos, em todas as etapas de seleção, foi realizada em pares, seguindo as recomendações PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis), com o intuito de garantir que o protocolo de revisão e os critérios de inclusão e exclusão fossem seguidos16.
Os artigos selecionados (n = 45) foram publicados no período de 2004 a 2015. Destes, 60% (n = 27) analisaram a qualidade da dieta por instrumento denominado índice de alimentação saudável (IAS) e o restante por índice de qualidade da dieta (IQD). Dos artigos que nomearam como IAS, 16 (59,3%) mencionaram adaptação no índice. Dos que denominaram de IQD, 55,6% (n = 10) utilizaram índice adaptado, 38,9% (n = 7) revisado e 5,5% (n = 1) ajustado para energia. Ressalta-se que 24 (66,7%) autores dos artigos selecionados relataram que o instrumento utilizado era originado do HEI, enquanto os demais informaram uso ou adaptação do índice a partir de outro instrumento de qualidade da dieta brasileiro, originado a partir do HEI (Quadro 1). No Quadro 1 estão descritos os estudos brasileiros que avaliaram a qualidade da dieta e as respectivas metodologias utilizadas.
Quadro 1 Descrição da metodologia utilizada na avaliação da qualidade da dieta, em estudos brasileiros.
Referência | Unidade amostral | Índice utilizado | Metodologia de avaliação da qualidade da dieta | |
---|---|---|---|---|
Itens do índice | Pontuação | |||
Fisberg et al.11 | 50 idosos, adultos, adolescentes e crianças | IQD adaptado4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta11 |
Barbosa et al.20 | 20 crianças de creche filantrópica | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Domene et al.31 | 94 crianças residentes em bolsões de pobreza | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Fisberg et al.37 | 3454 adultos | IAS adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Godoy et al.32 | 437 adolescentes | IQD adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Sampaio et al.21 | 35 pré-escolares (2 a 3 anos) | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Duran et al.45 | 56 adultos HIV positivos | IAS adaptado19 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Gomes et al.33 | 295 mulheres (20 a 50 anos) | IAS adaptado5 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Morimoto et al.56 | 425 adultos e 639 idosos | IQD adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Mota et al.13 | 502 indivíduos | IAS adaptado4 | 12 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 120; classificação da qualidade da dieta13 |
Santos et al.14 | 67 diabéticos tipo 2 | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Andrade et al.34 | 1584 indivíduos de 12 a 20 anos | IAS adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Jaime et al.22 | 737 adultos | IQD ajustado4 | 10 itens | Cada um dos componentes é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100 |
Portero-McLellan et al.50 | 448 adultos (35 a 85 anos) | IAS adaptado13 | 12 itens | Cada um dos componentes é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 120 |
Previdelli et al.38 | 202 trabalhadores de uma fábrica de cosméticos | IAS adaptado19 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Tardivo et al.46 | 173 mulheres pós-menopausa | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Vitolo et al.23 | 345 pré-escolares (3 a 4 anos) | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Felippe et al.15 | 100 adultos e idosos expostos ou não a reeducação alimentar | IAS adaptado13 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 120; classificação da qualidade da dieta13 |
Previdelli et al.12 | 2298 adolescentes, adultos e idosos | IQD revisado | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Santos et al.24 | 30 mulheres com excesso de peso | IAS adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100 |
Silva et al.47 | 246 indivíduos com e sem síndrome metabólica | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Costa et al.39 | 169 mulheres praticantes de atividade física | IQD adaptado4,11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Louzada et al.40 | 288 idosos | IAS4 | 12 itens | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20; classificação da qualidade da dieta5 |
Assumpção et al.41 | 409 adolescentes de 12 a 19 anos da área urbana | IQD adaptado11,20 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; qualidade da dieta em quartis, sendo o primeiro quartil o de pior qualidade |
Carvalho et al.25 | 195 adultos e 291 idosos participantes da Pesquisa de Saúde | IQD brasileiro revisado12 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Melendez-Araújo et al.18 | 64 pacientes obesos no pré-operatório com intervenção nutricional | IAS adaptado para brasileiros13 | 12 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta13 |
Andrade et al.26 | 2375 indivíduos maiores de 12 anos, de Inquérito de Saúde | IQD revisado 12 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Gorgulho et al.51 | 834 adolescentes, adultos e idosos, de Inquérito de Saúde | IQD revisado12 | 12 itens | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Lima et al.35 | 747 beneficiários do Programa Bolsa Família | IQD adaptado4,11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Loureiro et al.17 | 195 adultos (20 a 50 anos) | IQD revisado4 | 11 itens | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Malta et al.27 | 73 idosos integrados ao Sistema Público de Saúde | IAS adaptado para brasileiros13 | 12 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 120; classificação da qualidade da dieta13 |
Rauber et al.36 | 345 crianças (3 a 4 anos) | IAS adaptado4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Tavares et al.28 | 75 nutrizes | IAS4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta13 |
Almeida et al.52 | 242 pré-escolares beneficiados do Programa Bolsa Família | IQD adaptado4,11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da dieta11 |
Assumpção et al.42 | 1509 incluídos em Inquérito de Saúde | IQD revisado12 | 12 itens | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Ceccato et al.55 | 190 mulheres com câncer de mama | IAS revisado12 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Closs et al.53 | 186 idosos assistidos por Serviço de Geriatria | IQD adaptado11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Monfort-Pires et al.43 | 204 indivíduos do programa de prevenção de diabetes mellitus 2 | IAS revisado12 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20 |
Piovesan et al.54 | 80 indivíduos com síndrome metabólica | IQD adaptado4,11 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100; classificação da dieta11 |
Rauber et al.29 | 671 crianças | IAS adaptado4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Rauber et al.30 | 652 crianças | IAS adaptado4 | 10 itens | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da qualidade da dieta5 |
Rodrigues et al.48 | 100 mulheres com síndrome do ovário policístico | IAS revisado12 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20; classificação da qualidade da dieta5 |
Ventura et al.49 | 215 mulheres pós menopousa | IAS adaptado11 | 10 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Cada componente é pontuado de 0 a 10, com IAS variando de 0 a 100; classificação da dieta11 |
Wendpap et al.44 | 1326 adolescentes (10 a 14 anos) | IQD revisado3,28 | 12 itens (ajuste por 1000 Kcal) | Componentes estratificados pontuados de 0 a 5, não estratificados de 0 a 10 e Gord_AA de 0 a 20; pontuação igual ou superior ao p75 indicativa de melhor qualidade da dieta |
Tanaka et al.19 | 88 adolescentes com HIV/Aids, de hospital pediátrico | IQD adaptado para brasileiros | 12 itens | Cada um dos componentes é pontuado de 0 a 10, com IQD variando de 0 a 100 |
IAS: índice de alimentação saudável; IQD: índice de qualidade da dieta; Gord_AA: gorduras sólidas, açúcar e álcool; VET: valor energético total. Classificação da qualidade da dieta: Bowman et al.5: < 51 pontos = inadequada, 51 a 80 pontos = necessita de melhorias, > 80 pontos = adequada; Fisberg et al.11: < 40 pontos = inadequada, 41 a 64 pontos = necessita de melhorias, > 65 pontos = adequada; Mota et al.13: < 71 pontos = inadequada, 71-100 pontos = necessita de melhorias, > 100 pontos = adequada.
Em relação à classificação da dieta, 69,9% (n = 31) dos estudos classificaram a qualidade, sendo que a maioria (67,7%) utilizou a classificação proposta por Bowman et al.5.
Dos estudos avaliados, 62,2% (n = 28) utilizaram 10 itens para avaliação da qualidade da dieta, como proposto por Kenneddy et al.4 no HEI original. Destaca-se que no estudo de Loureiro et al.17, foram avaliados 11 itens, sendo o cereal integral excluído em função do inquérito dietético utilizado. Os demais estudos (n = 16) utilizaram 12 itens, como sugerido nas versões revisadas do índice.
Ao analisar os desfechos dos estudos e a pontuação do índice, observou-se que dois (4,4%) não encontraram18,19, 15 (33,3%) não analisaram11-14,20-30; e 28 (62,2%) encontraram, sendo que 7 avaliaram a relação do índice com fatores socioeconômicos e demográficos e itens alimentares17,31-36; 8 com fatores socioeconômicos e saúde37-44; 5 relacionaram com desfechos de saúde45-49; 4 com nutrientes50-53; 2 com algum tipo de intervenção15,54; um com nutrientes e itens alimentares55; e um com fatores socioeconômicos e demográficos56.
Os métodos de consumo alimentar utilizados na avaliação da qualidade da dieta também foram avaliados. Em relação ao inquérito dietético, 36 estudos (80%) utilizaram o recordatório de 24 horas; três o questionário de frequência alimentar (QFA); um a história alimentar; e cinco empregaram mais de um inquérito alimentar. No estudo de Barbosa et al.20, foram utilizados história alimentar, pesagem direta de alimentos e registro alimentar; Domene et al.31 utilizaram pesagem direta de alimentos e recordatório de 24 horas; Sampaio et al.21 utilizaram história alimentar, registro alimentar e pesagem direta de alimentos; Tavares et al.28 avaliaram o consumo por um recordatório de 24 horas e questionário de frequência alimentar e Piovezan et al.54 utilizaram um recordatório de 24 horas complementado por dois registros alimentares.
De acordo com o instrumento utilizado para definição de porções, 21 (46,7%) estudos utilizam apenas instrumentos nacionais, cinco (11,1%) somente internacionais, cinco (11,1%) definiram as porções utilizando a combinação de instrumentos utilizados no Brasil e internacionalmente. Verificou-se que 14 (31,1%) artigos não mencionaram o instrumento utilizado.
Os instrumentos utilizados para cálculo de nutrientes não foram mencionados em seis (13,3%) estudos; 17 (37,8%) pesquisadores citaram apenas o software utilizado, sem apontar qual foi a tabela de composição de alimentos escolhida; 12 (26,7%) utilizaram a combinação de tabelas nacionais e internacionais; 8 (17,8%) adotaram apenas instrumentos nacionais na avaliação da composição nutricional e dois (4,4%) apenas instrumentos internacionais.
Em relação ao desmembramento das preparações, 60% dos estudos (n = 27) não mencionaram; 40% (n = 18) referiram que fizeram, mas apenas cinco destes citaram o instrumento utilizado para desmembramento das receitas20,27,32,35,55.
A qualidade da dieta tem sido avaliada, em estudos brasileiros, por diferentes metodologias que, embora originadas do mesmo instrumento, o Healthy Eating Index–HEI, apresentam inclusive nomenclaturas distintas. Alguns pesquisadores têm nomeado o instrumento de Índice de Alimentação Saudável (IAS), que é a tradução do HEI13-15,18-21,23,24,27-31,33,34,36-38,40,42,45-47,50,52-54. Já em outros estudos, o referido instrumento é denominado Índice de Qualidade da Dieta (IQD)11,12,17,22,25,26,32,35,39,41,43,44,48,49,51,55,56. Observou-se que alguns autores nomeiam o instrumento de índice de qualidade da dieta quando publicados em periódicos nacionais e de Healthy Eating Index (tradução de índice de alimentação saudável) quando internacionais, reforçando a falta de padronização de nomenclaturas do índice. A nomeação dos índices originados do HEI, em outros países, tem seguido a original, sendo, na maioria dos estudos, apresentada na língua inglesa.
Vale ressaltar que o IQD conhecido internacionalmente não se origina do HEI e apresenta características diferenciadas como avaliação da ingestão de cálcio e não do componente alimentar leite e derivados; considera a ingestão de proteína e não de alimentos proteicos; avalia a ingestão de frutas e hortaliças em um único item, assim como a de cereais e leguminosas; não considera a ingestão de álcool e atribui maior pontuação à uma dieta de pior qualidade57-60.
Outra importante consideração é que o IQD- revisado foi proposto por Haines et al.58, mantendo características diferentes do HEI como proporcionalidade entre os grupos alimentares, avaliação da ingestão de micronutrientes específicos (cálcio e ferro) e não do componente alimentar leite e derivados e alimentos proteicos59,60.
Assim sendo, nomear o instrumento de qualidade da dieta, adaptado a partir do HEI, de IQD ou IQD-revisado não é apropriado uma vez que estes instrumentos apresentam itens e recomendações distintos.
Em relação aos itens presentes nos instrumentos de qualidade da dieta desta revisão, observou-se que embora a maioria tenha utilizado dez, como proposto na versão original4, muitos autores fizeram adaptações dos mesmos: 1) item cereais denominado de cereais, pães e raízes; cereais, pães, raízes e tubérculos; grãos ou somente cereais, sendo em alguns estudos estratificado em cereais totais e cereais integrais como sugerido9; 2) item carnes denominado de carnes e ovos; carnes, ovos e leguminosas; carnes e feijões; ou somente carnes; 3) item vegetais denominado de verduras, hortaliças, e verduras e legumes, sendo em alguns estudos estratificado em vegetais totais e vegetais verde escuros e alaranjados como sugerido9; 4) inclusão do item feijões ou leguminosas em 21 dos estudos avaliados, ressaltando a importância deste grupo de alimentos na dieta dos brasileiros; 5) substituição do item sódio por fibras dietéticas45; 6) utilização de apenas alguns itens específicos nas análise17,25. As diferentes denominações dos itens, sem especificação clara dos alimentos incluídos em cada componente do índice, dificultam a comparação dos resultados.
Ressalta-se que os índices mais atuais3,7 recomendam a utilização de 12 itens alimentares para avaliação da qualidade da dieta. A utilização de índices com mais itens alimentares são capazes de refletir o padrão alimentar de forma mais completa61.
O instrumento utilizado para avaliação da qualidade da dieta, na maioria dos trabalhos, foi o HEI proposto por Kennedy et al.4, inclusive nos trabalhos publicados após a revisão do instrumento em 2005 e 2010. Nenhum artigo utilizou o HEI-2010 na avaliação da qualidade da dieta. Ressalta-se que a utilização de instrumentos atualizados é importante, uma vez que a revisão do HEI permitiu a inclusão de itens como cereais integrais; desmembramento de vegetais; separação dos tipos de gordura; ênfase às calorias provenientes de gorduras sólidas, álcool e açúcar; avaliação da qualidade da dieta de indivíduos maiores de dois anos, gestantes e lactantes; além de estabelecer um ajuste da densidade energética por 1000 Kcal para os componentes alimentares e sódio, caracterizando a qualidade da dieta10. Segundo Dixon8, os índices revisados apresentam associações mais fortes entre a qualidade da dieta e a situação de saúde investigada que as versões mais antigas, justificando assim a utilização dos mesmos em detrimentos do original.
Em relação à classificação da qualidade da dieta considerando a pontuação total, esta não é mais recomendada após revisão do índice, uma vez que pode mascarar quais componentes alimentares ou de nutrientes precisa de melhorias em termos de qualidade8-10. Mesmo assim, observa-se nesta revisão que a maioria dos trabalhos publicados após esta recomendação ainda classifica a qualidade da dieta em ruim, adequada ou com necessidade de modificações, segundo critérios propostos por Bowman et al.5 e Mota et al.13. Ressalta-se que em dois artigos a qualidade da dieta não foi classificada seguindo pontos de corte estabelecidos e sim em quartis41 e percentis44. Esta avaliação alternativa é sugerida por Guenther et al.9 quando se deseja avaliar a pontuação total obtida pela população de estudo, para distinção dos extremos de pontuação e relação da qualidade da dieta com a doença em questão, sem classificá-la.
A avaliação dietética prévia à avaliação da qualidade da dieta também mostrou-se heterogênea, uma vez que os estudos utilizaram diferentes inquéritos (recordatório de 24 horas, pesagem direta de alimentos, registro alimentar e história alimentar), analisando valores únicos ou médias. Sabe-se que inquéritos alimentares apresentam vantagens e limitações que interferem na qualidade do dado dietético60. Outro ponto crucial na análise dietética é a utilização de tabelas de composição, softwares e instrumentos complementares que auxiliam na definição da porção consumida. Nesta revisão observou-se que alguns estudos não detalham sobre a utilização dos mesmos, sendo que em alguns sequer mencionaram qual instrumento utilizado.
Informações referentes à definição das porções e desmembramento das receitas são relevantes na avaliação da qualidade da dieta, mas não foram consideradas em alguns estudos. Em relação às porções, 31,1% dos trabalhos não mencionaram o instrumento utilizado para defini-las. É válido ressaltar que nem todos os pesquisadores utilizaram instrumentos brasileiros, fato que pode prejudicar esta avaliação já que diferentes nações apresentam hábitos alimentares distintos. A adoção de porções segundo o Guia Alimentar para a População Brasileira seria o mais adequado por considerar o consumo desta população em suas particularidades62.
Adaptações no instrumento para avaliação da qualidade da dieta são recomendadas para utilização em subpopulações específicas, principalmente em relação ao tamanho das porções e recomendações, visando contemplar as especificidades4,9,10,13.
A maioria das publicações selecionadas não mencionou o desmembramento das preparações. No entanto, para melhor classificação dos componentes do índice de alimentação saudável, recomenda-se desmembrar as preparações caseiras em seus respectivos ingredientes, segundo os guias alimentares20.
Estes índices de avaliação da dieta são instrumentos úteis para analisar as características alimentares e de nutrientes consumidos pelos indivíduos e populações, além de possibilitarem a relação entre qualidade da dieta e riscos de doenças. No entanto, a falta de padronização de metodologias dificulta a comparação entre os estudos e a avaliação da dieta global da população brasileira.
Nesta revisão, não foram incluídas dissertações e teses e optou-se pela utilização de quatro bases eletrônicas de dados, fatores estes que poderiam ser limitantes do estudo, tendo em vista a não contemplação de algum estudo de avaliação da qualidade da dieta. No entanto, para minimizar este viés, realizou-se busca reversa para incluir estudos publicados, não selecionados previamente.
Na maioria dos estudos avaliados não houve padronização das metodologias de avaliação de qualidade da dieta, inclusive quanto à denominação do índice utilizado. Estas diferenças de nomeação e metodologias dificultam a comparação entre os estudos de qualidade da dieta.
Assim, destaca-se o ineditismo deste trabalho ao abordar diferenças metodológicas quanto à utilização do índice, em estudos brasileiros, nas diferentes faixas etárias. Portanto, recomenda-se que os pesquisadores, ao investigarem a qualidade da dieta, analisem os instrumentos disponíveis na literatura científica, recorrendo sempre aos materiais originais e revisados antes de replicar metodologias.
A utilização dos instrumentos revisados deve ser priorizada, uma vez que apresentam vantagens em relação aos anteriores. A adaptação dos índices, segundo características de consumo da população é aconselhável, desde que os critérios metodológicos sejam seguidos e claramente descritos nos estudos.