Print version ISSN 0103-2100On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.31 no.4 São Paulo July/Aug. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800057
Evaluar la percepción de los profesionales sobre la cultura de seguridad del paciente en la atención primaria a la salud.
Investigación Cuantitativa, transversal, descriptiva del tipo survey, utilizando el cuestionario “Encuesta sobre Cultura de Seguridad del Paciente de Atención Primaria”, el cual evalúa 12 dimensiones de la cultura de seguridad del paciente. Se consideraron positivas las puntuaciones superiores o igual al 75%.
Las dimensiones de “intercambio de información con otras instituciones” (79%), “trabajo en equipo” (79%), “monitoreo de la atención al paciente” (80%), “ seguridad del paciente y problemas de calidad” (83 (%) fueron consideradas positivas para la cultura de seguridad del paciente, mientras que el “soporte del liderazgo” (47%) se demostró como área débil. Hubo una diferencia significativa en la comparación de las variables tiempo de servicio y categoría profesional con el promedio de los porcentajes de respuestas positivas.
Los resultados mostraron que los profesionales de Atención Primaria a la Salud tuvieron una percepción positiva sobre las dimensiones de la cultura de seguridad del paciente, y solo el “ apoyo del liderazgo” se consideró como zona frágil.
Palabras-clave: Seguridad del paciente; Cultura organizacional; Calidad de la atención de salud; Atención primaria de salud; Enfermería
A segurança do paciente, definida como a redução do risco de danos desnecessários para um mínimo aceitável nos cuidados em saúde, é reconhecida como dimensão fundamental para a qualidade em saúde.(1)
Considera-se a Atenção Primária à Saúde (APS) componente-chave para a Rede de Atenção à Saúde, a qual propõe ações e serviços de saúde de diferentes densidades tecnológicas a fim de garantir a integralidade do cuidado, por meio de sistemas de apoio técnico, logístico e de gestão.(2)
Pode-se pensar que a APS, por não estar ligada diretamente aos procedimentos de alta tecnologia, é um ambiente protegido e seguro. Porém, sabe-se que Eventos Adversos (EAs), definidos como incidentes que resultam em algum dano para o paciente, ocorrem neste setting de saúde. Ainda há muitas lacunas do conhecimento referentes a essa temática e dificuldade de mensuração dos tipos de incidentes ocorridos. Os estudos são ainda incipientes neste campo, apesar da maior visibilidade do tema no Brasil, após a iniciativa da criação do Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP).(3,4)
Enfatiza-se este cenário, a partir de estudo realizado no Brasil, em uma unidade de Estratégia Saúde da Família (ESF), que avaliou a ocorrência de incidentes no paciente em relação ao tipo gravidade e aos fatores contribuintes para essa ocorrência. Concluiu que, embora a APS atenda aos pacientes com menor complexidade técnica, 82% dos incidentes ocasionaram dano ao paciente, sendo muitos deles com gravidade muito alta – dano permanente (25%) ou óbito (7%).(3)
Compreende-se que é necessário investir no reconhecimento da cultura de segurança do paciente, pois assim é possível examinar o quanto as percepções, comportamentos e competências de indivíduos e grupos influenciam os resultados de segurança do paciente e a qualidade do cuidado.(5)
Sendo assim, entende-se que avaliar a cultura de segurança do paciente na APS é um passo importante para a melhoria na qualidade e na segurança do cuidado, considerando a abrangência que este cenário tem na rede de atenção à saúde. O objetivo deste estudo, portanto, é avaliar a percepção dos profissionais sobre a cultura de segurança do paciente no ambiente da APS, pois acredita-se que essa avaliação possa apontar novas diretrizes para o fortalecimento da segurança do paciente neste cenário de atenção à saúde.
Trata-se de pesquisa quantitativa, transversal, descritiva do tipo survey realizada na APS, em um município com população estimada em 298.701 habitantes, no interior do Estado de São Paulo.
A rede de APS do município é composta por 32 Centros de Saúde da Família (CSF), sendo 17 dessas unidades mistas, ou seja, atendem como Unidade Básica de Saúde (UBS) e como Estratégia Saúde da Família (ESF).
Dos 564 profissionais que desempenham funções assistenciais nestes CSF, 106 foram excluídos por estarem em férias e/ou licença para tratamento da saúde ou maternidade, no período de coleta de dados (de dezembro de 2016 a março de 2017). Foram convidados, portanto, 458 profissionais, sendo que 240 aceitaram participar do referido processo. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos (Parecer nº 1.818.070), e a resolução 466/12 foi respeitada integralmente.
Para tal, utilizou-se a aplicação do questionário “Pesquisa sobre Cultura de Segurança do Paciente para Atenção Primária”,(6) versão brasileira do Medical Office Survey on Patient Safety Culture, criado pela Agency for Healthcare Research and Quality. O uso do instrumento adaptado e validado para o Brasil(6) foi autorizado pelas autoras.
A abordagem aos profissionais foi realizada, em sua maioria, em grupo, exceto aos que estavam em atendimento no momento, convidados posteriormente de forma individual. Isso possibilitou a extensão do convite ao maior número de pessoas e mínima interferência na rotina do serviço. A entrega do questionário e do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ocorreu em data acordada com a equipe.
O instrumento é composto por 52 itens, com opções de resposta por meio de escala tipo Likert que permite avaliar doze dimensões da cultura de segurança do paciente: comunicação aberta, comunicação sobre o erro, troca de informações com outras instituições, padronização dos processos, aprendizagem organizacional, percepção geral de segurança do paciente e qualidade, suporte da liderança para segurança do paciente, acompanhamento do cuidado, segurança do paciente e problemas de qualidade, treinamento da equipe, tabalho em equipe e pressão e ritmo de trabalho.(6)
Os dados foram organizados e armazenados em planilhas do programa Microsoft Excel®. Para o tratamento e a análise, foi utilizado o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0.
Para análise descritiva dos dados, foi calculada a frequência de resposta para cada item e a média para cada dimensão. Seguindo a recomendação do instrumento original,(7) estas foram classificadas como fortes, quando 75% ou mais dos participantes responderam concordo totalmente/concordo ou frequentemente/sempre para as perguntas formuladas positivamente; e discordo totalmente/discordo ou nunca/raramente para as perguntas formuladas negativamente. Foram classificadas como fracas, quando 50% ou mais dos sujeitos responderam negativamente, optando por discordo totalmente/discordo ou nunca/raramente para perguntas formuladas positivamente, ou usando concordo totalmente/concordo, sempre/ frequentemente para perguntas formuladas negativamente.(7)
Para testar a confiabilidade das respostas, foi calculado o alfa de Cronbach para cada dimensão e para o instrumento como um todo. Os resultados iguais ou superiores a 0,7 foram considerados satisfatórios.(8)
Realizou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov, que indicou ausência de normalidade dos dados. Desta forma, utilizou-se o Teste de Kruskal-Wallis para avaliação da comparação das médias das porcentagens de respostas positivas referentes às variáveis “categoria profissional” e “tempo de serviço”. Para o teste estatístico foi adotado o nível de significância de 5% (p ≤ 0,05).
Houve adesão de 52% (240) dos profissionais composto por: médico (18), enfermeiro (14), odontólogo (6), assistente social (2), psicólogo (2), farmacêutico (4), fisioterapeuta (1), fonoaudiólogo (1), gerente (15), equipe administrativa (20), Agente Comunitário de Saúde (ACS) (83), auxiliar de enfermagem (9), auxiliar de farmácia (6) e auxiliar de saúde bucal (1).
Quanto ao tempo de serviço na unidade, houve variação dos resultados sendo que 87 profissionais trabalham de dois meses a menos de três anos; 80, de três a menos de 11 anos e 41, há 11 anos ou mais; apenas 3, há menos de 2 meses e 21 não responderam. Desses, 158 (76%) possuem carga horária de trabalho de 33 a 40 horas semanais.
Com relação à confiabilidade das respostas, o valor geral do Coeficiente Alfa de Cronbach obtido foi de 0,93. Sendo assim, excluíram-se as dimensões: “comunicação aberta” (α=-0,17), “comunicação sobre o erro” (α=0,48), “padronização dos processos” (0,55), “treinamento da equipe” (α=0,56) e “pressão e ritmo de trabalho” (α=0,59).
As dimensões analisadas estão representadas na tabela 1 que indica aqueles que obtiveram o coeficiente alfa de Cronbach satisfatório por percentual da percepção positiva.
Tabela 1 Percepção positiva associadas aos itens das dimensões da cultura de segurança do paciente
Itens por dimensão da cultura de segurança do paciente | Percepção positiva n(%) |
---|---|
1. Trabalho em equipe (α=0,670) | |
C1: Quando alguém está muito ocupado, outros colegas ajudam | 191(80) |
C2: Há uma boa relação entre os médicos e demais profissionais | 205(86) |
C5: Tratamos uns aos outros com respeito | 188(79) |
C13: Valorizamos o trabalho em equipe no cuidado aos pacientes | 161(71) |
2. Acompanhamento do cuidado (α=0,754) | |
D3: Os pacientes são avisados quando precisam agendar uma consulta de rotina | 208(90) |
D5: Registramos a maneira como os pacientes crônicos seguem o tratamento | 160(76) |
D6: O serviço faz acompanhamento quando não recebe um relatório de outro | 123(65) |
D9: Acompanhamos os pacientes que precisam de monitoramento | 200(89) |
3. Suporte da liderança (α=0,712) | |
E1R: Não estão investindo recursos suficientes para melhorar a qualidade | 52(26) |
E2R: Eles ignoram erros que se repetem no cuidado aos pacientes | 113(58) |
E3: Eles dão prioridade à melhoria dos processos de atendimento aos pacientes | 119(59) |
E4R: Decisões são baseadas no que é melhor para o serviço não para o paciente | 89(46) |
4. Aprendizagem organizacional (α=0,702) | |
F1: Quando há um problema avaliamos se é necessário fazer alguma mudança | 179(86) |
F5: O serviço é eficiente em modificar processos e prevenir mesmos problemas | 130(63) |
F7: Após realizarmos mudanças, avaliamos se funcionam | 145(72) |
5. Percepção geral da segurança do paciente e qualidade do serviço (α=0,724) | |
F2: Nossos processos de trabalho são adequados para prevenir erros | 146(70) |
F3R: Acontecem erros com mais frequência do que deveriam | 137(68) |
F4R: É apenas por acaso que não cometemos mais erros | 148(74) |
F6R: A quantidade de atividades é mais importante do que a qualidade | 131(67) |
6. Problemas de segurança do paciente e qualidade (α=0,842) | |
A1: Um paciente não conseguiu consulta em até 48h para um problema sério | 148(77) |
A2: No atendimento de um paciente foi utilizado o prontuário de outro | 173(89) |
A3: O prontuário de um paciente não estava disponível quando necessário | 167(82) |
A4: Informações de um paciente foram arquivadas no prontuário errado | 167(90) |
A5: Um equipamento necessário ao atendimento não funcionou adequadamente | 152(82) |
A6: O paciente retornou à unidade para esclarecer/corrigir a prescrição | 154(72) |
A7: Os medicamentos utilizados pelo paciente não foram revisados na consulta | 123(90) |
A8: Os exames laboratoriais/imagem não foram realizados quando necessário | 131(82) |
A9: Os resultados de exames laboratoriais não estavam disponíveis | 147(78) |
A10: Um resultado anormal de um exame não foi avaliado em tempo hábil | 132(90) |
7. Troca de informações com outras instituições (α=0,901) | |
B1: Problemas com centros de Imagem/laboratório da rede | 165(78) |
B2: Problemas com outros serviços de saúde da rede de atenção | 169(76) |
B3: Problemas com farmácias | 170(79) |
B4: Problemas com hospitais | 134(82) |
(%) - percentual
O percentual da média geral de respostas positivas das dimensões que obtiveram o coeficiente alfa de Cronbach satisfatório constam na tabela 2.
Tabela 2 Dimensão da cultura de segurança do paciente associada ao percentual da média geral de respostas positivas
Dimensões | Média geral de respostas positivas (%) |
---|---|
Segurança do paciente e problemas de qualidade | 83* |
Acompanhamento do cuidado do paciente | 80* |
Trabalho em equipe | 79* |
Troca de informações com outras instituições | 79* |
Aprendizagem organizacional | 74 |
Percepção geral de segurança do paciente e qualidade | 70 |
Suporte da liderança | 47† |
*Dimensão forte para a cultura de segurança do paciente; †Dimensão fraca
Para a variável “tempo de serviço” apresentaram diferença significativa “aprendizagem organizacional” e “suporte da liderança”, onde quanto menor o tempo de serviço maior a percepção positiva (Tabela 3). Quanto à categoria profissional, o médico foi o que mais apresentou percepção positiva nas dimensões “segurança do paciente e problemas de qualidade” e “trabalho em equipe” (Tabela 3).
Tabela 3 Respostas positivas de cada dimensão da cultura de segurança do paciente
Variáveis | Aprendizagem organizacional n(%) | Suporte da liderança n(%) | Segurança do paciente n(%) | Trabalho em equipe n(%) |
---|---|---|---|---|
1. Tempo de serviço | ||||
Menos de 2 meses | 2(100) | 2(87) | 120(50) | 221(92) |
2 meses a 3 anos | 87(84) | 87(59) | 163(68) | 194(81) |
3 a 11 anos | 166(69) | 144(60) | 151(63) | 187(78) |
11 anos ou mais | 199(83) | 108(45) | 168(70) | 202(84) |
Valor de p* | 0,031 | 0,033 | 0,535 | 0,643 |
2. Categoria profissional | ||||
Médico | 18(85) | 18(61) | 17(80) | 18(100) |
Equipe de Enfermagem | 38(78) | 37(47) | 49(72) | 49(81) |
Gerente | 15(80) | 1(75) | 14(74) | 15(72) |
Equipe Administrativa | 14(78) | 11(66) | 16(56) | 18(71) |
ACS† | 64(80) | 65(60) | 79(68) | 81(77) |
Outros | 15(76) | 11(59) | 22 (48) | 23(84) |
Valor de p* | 0,831 | 0,169 | 0,008 | 0,001 |
*Teste de Kruskal-Wallis; †ACS - Agente Comunitário de Saúde; Outros – odontólogo, assistente social, psicólogo, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, auxiliar de enfermagem, auxiliar de farmácia, auxiliar de saúde bucal
Criar uma cultura positiva que promova a segurança do paciente é um dos principais desafios enfrentados pelas organizações de saúde.(5) Para isso, destaca-se a importância da participação de toda a equipe de saúde para a promoção de uma cultura de segurança positiva.
Considerando a falta de tradição, no Brasil, em avaliação da cultura de segurança, particularmente na APS, pode-se considerar satisfatória a taxa de respostas obtida de 52%. Outro ponto favorável foi a participação de 15 diferentes categorias profissionais, assegurando que a avaliação da cultura de segurança fosse ampla. Neste sentido, afirma-se a importância do envolvimento de todos, pois a cultura de uma organização influencia o estilo de gestão adotado e, consequentemente, determina mudanças organizacionais.(9)
Devido à escassez de publicações referentes ao tema, no Brasil, as comparações desta investigação foram baseadas em publicações internacionais. Embora o formato da APS seja muito diverso no mundo, foi utilizado um instrumento padronizado, permitindo que aspectos semelhantes fossem comparados, reforçando a importância do uso dos instrumentos validados para a realidade brasileira.
Assim como este, estudo realizado na Turquia fez a comparação entre a variável “categoria profissional” e as respostas positivas, mostrando que o profissional médico apresenta maior percepção positiva para as dimensões “comunicação aberta” (p<0,01) e “comunicação sobre o erro” (p<0,01).(10) Paralelamente a isto, investigação iraniana mostrou que o gerente foi o que apresentou os escores mais elevados para todas as dimensões (p<0,001).(11)
Em contrapartida, estudo brasileiro não encontrou diferença entre categorias: técnicos de enfermagem, enfermeiros e ACS, quanto às atitudes de segurança.(12)
Quanto à comparação das dimensões referentes ao tempo de serviço, diferente deste, estudo iraniano não encontrou relação entre as mesmas.(11)
Por sua vez, estudo espanhol que avaliou os residentes de medicina familiar e comunitária encontrou que os residentes do primeiro ano apresentaram os escores positivos mais elevados para as dimensões “troca de informações com outras instituições” (p=0,007), “comunicação aberta” (p=0,01), “treinamento de pessoal” (p=0,009) e “percepções gerais sobre segurança do paciente e a qualidade” (p=0,02).(13)
Sobre a baixa confiabilidade das respostas para as dimensões “comunicação aberta”, “comunicação sobre o erro”, “padronização dos processos”, “treinamento da equipe” e “pressão e ritmo de trabalho”, cabe destacar o fato de que todas essas dimensões se inter-relacionam e estão ligadas às questões de comunicação, educação e processo de trabalho, sugerindo possíveis fragilidades nesses aspectos do ambiente de trabalho.
Das outras dimensões avaliadas, o trabalho em equipe consiste na modalidade de trabalho coletivo que se contrapõe ao modo independente e isolado com que os profissionais de saúde usualmente executam seu trabalho.(14) É considerado essencial para o funcionamento adequado do processo de trabalho na APS, na qual o diálogo deve propiciar a aproximação entre os diferentes atores, tendo-se a clareza de que todo o conhecimento parcial só ganha significado quando compartilhado no coletivo.(15)
Neste estudo, a dimensão “trabalho em equipe” foi avaliada como forte para a cultura de segurança do paciente, atingindo a média de percentual de respostas positivas de 79%. Outras investigações, que avaliaram o trabalho em equipe dentro das unidades e entre as unidades, também obtiveram escores positivos elevados.(10,13,16) Estudo brasileiro das atitudes de segurança também identificou o trabalho em equipe como elemento forte para cultura de segurança do paciente.(12)
Estas pesquisas sugerem que o trabalho em equipe é reconhecido como um elemento forte para a cultura de segurança, na busca das mudanças e melhorias na qualidade da segurança do paciente.
Segundo a literatura,(17) há quatro modos de aprendizagem dentro das organizações: aprender com os outros, a partir dos erros, a partir dos dados obtidos e através das respostas inesperadas.
Aprender com os outros se dá através das experiências reveladas em conversas ou em publicações. Por sua vez, aprender a partir dos erros acontece na identificação e análise dos dos próprios erros. Já, aprender com o uso dos dados obtidos é aproveitar os resultados para fornecer feedback e conduzir o desempenho da organização. Por fim, aprender a partir das respostas inesperadas acontece quando há constante vigilância e prevenção aos acontecimentos. Desta maneira, atentando-se para os modos menos desenvolvidos de aprendizagem organizacional, é possível promover um progresso mais rápido na segurança do paciente.(17)
Apesar da percepção positiva da dimensão “aprendizagem organizacional”, quando o tema é a não culpabilidade pelo erro, estudos demonstram escores positivos baixos para resposta não punitiva ao erro, evidenciando fragilidade nesse aspecto.(10,13,16)
Embora a dimensão “comunicação sobre o erro” não tenha atingido confiabilidade satisfatória neste estudo, destaca-se o item “a equipe deste serviço acredita que os erros possam ser usados contra si”, pois 49% dos participantes concordaram com a afirmação, revelando que a cultura do medo está presente. Situação semelhante ocorreu em estudo sobre atitudes de segurança, em que a variável “erro” foi a que obteve menor relevância para os profissionais, mostrando a fragilidade deste aspecto.(12)
Desta forma, é possível identificar que o modo aprendizagem a partir do erro necessita de melhorias. É preciso conscientizar os profissionais que a ocorrência do erro e a culpa podem ser alternativas para transformá-lo em uma nova chance de discutir, melhorar o cuidado e prevenir que novos eventos relacionados à mesma causa aconteçam.(12)
A dimensão “acompanhamento do cuidado” deve ser compreendida como uma área de destaque para a APS. Em estudo de revisão conceitual sobre a longitudinalidade, as autoras afirmam que o acompanhamento do paciente, ao longo do tempo, por profissionais da equipe de APS é característica central deste nível assistencial.(18)
Na presente investigação, esta dimensão obteve escore de 80% de respostas positivas, sendo classificada como área forte para cultura de segurança. Resultado foi semelhante ao do estudo espanhol em que a taxa de respostas positivas foi de 71%.(13) Apenas um resultado diferente foi encontrado na cidade de Al-Mukala – Yemen, que identificou fragilidade nesta dimensão e concluiu que os pacientes não eram acompanhados/monitorizados, quando necessário.(19)
Fragilidades no acompanhamento/monitorização do paciente podem levar a buscas em outras unidades de saúde para atendimento de rotina e problemas de qualidade dos registros que dificultam o atendimento do vínculo longitudinal.(18)
Outra característica importante para garantir o bom funcionamento do cuidado na APS é a troca de informações entre instituições de forma completa, precisa e pontual. Esta foi considerada como uma área forte no presente estudo, porém em outros dois(13,16) foram classificadas como fragilidades, atingindo apenas 47% de respostas positivas.
Quanto às situações que afetam a segurança do paciente, 83% dos profissionais tiveram percepção positiva e acreditam que ocorrem poucos problemas relacionados ao acesso, identificação do paciente, prontuários, registros, equipamentos, medicamentos e diagnósticos.
Porém, oposto à percepção dos profissionais desta pesquisa, estudo brasileiro identificou que os tipos de incidentes mais comuns na APS foram associados aos erros de medicamentos e de diagnósticos.(20)
No que tange ao acesso, em estudo realizado em uma grande cidade no Estado de São Paulo, os usuários descrevem-no como algo burocrático e demorado, tanto para o agendamento, como para o atendimento no serviço, relacionando-o à falta de profissionais médicos e à alta rotatividade dos mesmos nas UBS.(21)
Outro estudo sobre a percepção dos profissionais de uma ESF com relação à qualidade dos serviços prestados, em uma cidade do Espirito Santo – Brasil, levantou que os referidos profissionais percebem que a atenção ofertada é feita de maneira positiva, contribuindo para o fortalecimento e humanização da APS.(22)
Neste aspecto, apesar dos estudos comparados serem conduzidos de maneiras diferentes, desperta-se a reflexão do quanto a percepção do usuário pode ser diferente da percepção do profissional de saúde, em relação à qualidade do serviço prestado, e o quanto isso pode influenciar a qualidade da segurança do paciente.
Diante disso, considera-se que os resultados positivos obtidos no presente estudo possam estar relacionados aos baixos índices de reportagem de eventos. Estudos que perguntaram a frequência de relatório de eventos identificaram que apenas 12% a 32% dos profissionais mencionaram que os erros foram relatados.(10,11,16)
Como estratégias para sanar a lacuna referente ao conhecimento, visto o medo de punição e comunicação informal que ocasionam subnotificações dos EA, encontram-se a comunicação e a prática educativa, que melhoram a interação entre líderes e profissionais,(23) corroborando com os achados do presente trabalho, cuja dimensão “suporte da liderança” para a cultura segurança do paciente foi considerada crítica. Necessita-se então de melhorias com urgência, uma vez que apenas 47% dos participantes tiveram percepção positiva a respeito do tema.
A liderança na APS é tida como competência fundamental para o desenvolvimento das mudanças, considerando seu potencial para direcionar o processo de trabalho em equipe. Além disso, observou-se que, na atual realidade, há principalmente atuação dos enfermeiros como supervisores, assumindo esta posição.(24) Fato semelhante ao município estudado, onde maior parte dos coordenadores das unidade eram enfermeiros.
Relacionando-se cultura organizacional, comportamento da liderança e satisfação com o emprego, há significante correlação positiva entre esses elementos, sugerindo que a boa interação entre as lideranças e os profissionais contribui para o estímulo em favor do alcance dos objetivos definidos pela instituição.(25)
Desta forma, o resultado encontrado neste estudo revela a fragilidade do suporte da liderança para a cultura de segurança do paciente, o que pode levar à reflexão de que isto pode influenciar atitudes e comportamentos relacionadas ao assunto, demonstrando a importância que os líderes têm em identificar os aspectos apontados e implementar ações, visando à segurança do paciente.
Diante do exposto, cabe salientar a relevância de envolver todos os profissionais no processo de melhoria da segurança do paciente. Ações eficazes, baseadas em atitudes, precisam ser desenvolvidas, em que a atitude e a cultura dos profissionais de saúde da linha de frente devem induzir a mudanças comportamentais desejáveis para melhorar a segurança do paciente.(26)
Quanto às limitações do estudo, entende-se que foi utilizada apenas a percepção do profissional envolvido, não incorporando outros aspectos como análise de registros, observações da prática profissional, percepção do usuário, entre outros. Também devido ao compartilhamento do espaço físico entre UBS e USF, não foi possível comparar os dados entre estes serviços. Somado a isso, devido à incipiência de pesquisas desta natureza na APS, considera-se que as respostas podem ter sido realizadas mediante pouca reflexão sobre o tema.
Os resultados mostraram que os profissionais da APS tiveram percepções positivas quanto às dimensões da cultura de segurança do paciente e qualidade do serviço. Porém, revelou-se que a dimensão “suporte da liderança” necessita de melhorias, para que aspectos referentes à cultura de segurança do paciente ocorram de modo efetivo, baseando-se em práticas educativas e não punitivas. A fim de identificar as percepções dos profissionais sobre a cultura do paciente, é importante apontar que, ao se observarem as diferentes categorias presentes nesses serviços de saúde, a equipe médica teve maior percepção positiva para as dimensões “percepção geral da segurança do paciente” e “trabalho em equipe” e que quanto menor o tempo de serviço maior a percepção positiva para “aprendizagem organizacional” e “suporte da liderança”. Com isso, salienta-se que, embora incipiente, a avaliação da percepção dos profissionais acerca da cultura de segurança do paciente na APS faz-se necessária, a fim de que os serviços possam identificar domínios e variáveis que necessitem de atenção, mediante um diagnóstico situacional individualizado, a fim de que estratégias possam ser traçadas para efetivação destes componentes nesta rede de cuidado.