versão On-line ISSN 1678-4464
Cad. Saúde Pública vol.34 no.1 Rio de Janeiro 2018 Epub 05-Fev-2018
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00175016
The objective of the study was to assess the association between serum zinc level and cardiometabolic factors in prepubertal Brazilian children. This was a cross-sectional study in a representative sample of schoolchildren 8 to 9 years of age in public and private urban schools in Viçosa, Minas Gerais State, Brazil. Body composition was assessed with dual-energy x-ray absorptiometry. The study measured serum glucose, insulin, total cholesterol, high and low density lipoprotein cholesterol, triglycerides, apolipoproteins A (Apo A) and B, uric acid, leptin, homocysteine, ultrasenstive C-reactive protein, and serum zinc. Arterial pressure was measured with automatic inflation equipment. Zinc deficiency was observed in 1.3% of the children. Girls showed the worst cardiometabolic profile, with higher prevalence of increased android fat, triglycerides, insulin resistance, leptin, zinc, and Apo A. In the first tertile of serum zinc concentration, prevalence of insulin resistance was 96% higher (PR = 1.96; 95%CI: 1.04-3.66) and hypercholesterolemia was 23% lower (PR = 0.77; 95%CI: 0.61-0.96) than in the reference category (grouped 2nd and 3rd tertiles of serum zinc concentration). Despite the low prevalence of zinc deficiency, insulin resistance was more prevalent in children in the lowest third of serum zinc concentration. It is important to prevent cardiometabolic alterations in childhood, especially insulin resistance, with an emphasis on serum zinc level.
Key words: Adiposity; Hypercholesterolemia; Insulin Resistance; Zinc; Child
El objetivo fue evaluar la asociación entre la concentración sérica de zinc y los factores cardiometabólicos en niñas pre-púberes brasileñas. Se trata de un estudio transversal con una muestra representativa de escolares en la franja de edad de 8 y 9 años, matriculadas en escuelas urbanas públicas y privadas en Viçosa, Minas Gerais, Brasil. La composición corporal se evaluó por la técnica de absorciometría de rayos-x de doble energía. Se evaluaron las concentraciones séricas de glucosa, insulina, colesterol total, lipoproteínas de alta y de baja densidad de colesterol, triglicéridos, apolipoproteínas A (Apo A) y B, ácido úrico, leptina, homocisteína, proteína C reactiva-ultrasensible y zinc sérico. La presión arterial se midió mediante un equipo de insuflación automática. La deficiencia de zinc se observó en un 1,3% de los niños. Las niñas presentaron el peor perfil cardiometabólico, con mayores prevalencias de valores aumentados para la obesidad androide, triglicéridos, resistencia a la insulina, leptina, zinc y Apo A. En el primer tercio de concentración sérica de zinc, la prevalencia de resistencia a la insulina fue un 96% mayor (RP = 1,96; IC95%: 1,04-3,66) y la de hipercolesterolemia fue un 23% menor (RP = 0,77; IC95%: 0,61-0,96), en relación con la categoría de referencia (2º y 3º tercios de concentración sérica de zinc agrupado). A pesar de la baja prevalencia de la deficiencia de zinc, la resistencia a la insulina fue más prevalente entre niñas localizadas en el menor tercio de la concentración sérica de zinc. Es importante la prevención de las alteraciones cardiometabólicas durante la infancia, principalmente de la resistencia a la insulina, con énfasis en la evaluación sérica del zinc.
Palabras-clave: Adiposidad; Hipercolesterolemia; Resistencia a la Insulina; Zinc; Niño
O zinco é um micronutriente essencial ao metabolismo e está presente em quase todas as funções relacionadas ao corpo humano, sendo cofator de mais de 300 enzimas 1. Um estado nutricional de zinco adequado é fundamental para a estrutura óssea, a regulação da função genética e a estabilidade de membranas celulares envolvidas no crescimento e desenvolvimento neurocomportamental na infância 1.
Dados revelam que entre os anos de 1992 e 2001, o risco global da deficiência de zinco, segundo o risco de inadequação dietética e de baixa estatura em crianças menores de cinco anos, caiu de 22 para 16% devido ao aumento da oferta de alimentos em nível mundial 2. Em termos de vulnerabilidade biológica ou social, as crianças são consideradas um grupo de risco para essa deficiência 3. No Brasil, foram encontradas prevalências de 11,2% e 15% de deficiência de zinco sérico em crianças da Região Sudeste 4 e no Estado da Paraíba 5, respectivamente.
A rápida mudança do padrão alimentar e do estilo de vida nos países em desenvolvimento contribuiu para a insegurança alimentar e nutricional e desnutrição nos mesmos locais onde as doenças crônicas emergiram como uma grande epidemia. O excesso de peso infantil no Brasil tem aumentado de forma alarmante 6. Segundo Novaes et al. 7, no Município de Viçosa, Minas Gerais, quase metade das crianças (41,5%) apresentaram um ou mais fatores de risco cardiometabólicos, sendo o número destas aumentado significativamente com a prevalência do excesso de peso.
Estudos sugerem haver relação entre a concentração sérica de zinco e mecanismos anabólicos e catabólicos da obesidade, embora esta associação não esteja bem elucidada em crianças. A maioria das pesquisas avaliou o papel do zinco no crescimento e desenvolvimento, diarreias e afecções respiratórias, sendo importante ressaltar que a avaliação do estado nutricional deste nutriente é dificultada pela ausência de padronização dos métodos utilizados, bem como a interpretação dos seus resultados 8.
O zinco está relacionado ao metabolismo de hormônios envolvidos na fisiopatologia da obesidade, como a insulina 9, e também exerce várias funções no metabolismo energético atuando como componente de enzimas essenciais para o metabolismo de carboidratos, lipídios e proteínas, com funções estruturais e catalíticas, sendo essencial para a formação de tecidos e ativação de receptores hormonais 10.
Há evidências de que crianças e adolescentes obesos apresentaram menor concentração sérica de zinco e esta esteve inversamente associada à resistência à insulina 11. Como o zinco é um antioxidante, sua concentração sérica diminuída em crianças obesas pode levar ao aumento da peroxidação lipídica, gerando aumento das concentrações de colesterol total (CT), triglicerídeos (TG) e da lipoproteína de baixa densidade (LDL-c) 12. Entretanto, uma relação direta entre as concentrações séricas de zinco e colesterol total e frações já foi demonstrada em crianças mexicanas 13.
A relação entre as alterações na composição corporal e a concentração sérica de zinco tem sido investigada em crianças 14, devido ao papel que este mineral exerce tanto no aumento da gordura corporal, com um efeito adicional à insulina na lipogênese que ocorre nos adipócitos 15, quanto na sua diminuição devido ao efeito da zinco-α-2 glicoproteína (ZAG), uma adipocina que induz a mobilização de lipídios no tecido adiposo. Esses e outros mecanismos estão ligados principalmente a um metabolismo complexo do zinco, envolvendo diversas enzimas e rotas metabólicas, que precisam ser melhor investigadas. Além disso, é importante ressaltar que baixas concentrações séricas de zinco estiveram associadas ao estado inflamatório, com o aumento dos marcadores da resposta de fase aguda e de células de defesa do sistema imunológico, diretamente ligadas ao perfil trombogênico 16, sendo relevante investigá-los também em crianças.
Apesar do interesse científico na investigação do zinco como importante regulador metabólico, a maioria dos trabalhos que investigou a sua associação com alterações metabólicas foi realizada com adultos. Diante da escassez de estudos com crianças e considerando a infância um período estratégico para a promoção de hábitos saudáveis e prevenção de obesidade e comorbidades associadas, este estudo objetivou avaliar a associação entre a concentração sérica de zinco e os fatores cardiometabólicos em crianças pré-púberes brasileiras.
Trata-se de um estudo transversal com amostra representativa de escolares na faixa etária de 8 e 9 anos, matriculados em escolas urbanas públicas e privadas em Viçosa. O município conta com 24 escolas na zona urbana que contempla a faixa etária do estudo e está localizado na Zona da Mata Mineira, a 227km da capital Belo Horizonte, com estimativa de 76.147 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico de 2010. http://www.ibge.gov.br/home/populacao/censo2010/default.shtm, acessado em Mai/2016). Foi realizado um estudo piloto em uma das escolas, com a finalidade de testar o questionário semiestruturado e o inquérito alimentar com crianças de mesma faixa etária.
Para o cálculo amostral foi utilizado o programa estatístico Epi Info versão 7 (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, Estados Unidos), considerando-se o número total de crianças de 8 e 9 anos matriculadas nas escolas urbanas no ano de 2015 (n = 1.464), uma prevalência de 50% para múltiplos desfechos, erro aceitável de 4,5%, nível de 95% de confiança e acréscimo de 10% para a cobertura de perdas, totalizando 394 crianças a serem estudadas.
Foi realizado o processo de amostragem casual estratificada dos escolares, em que o número de crianças a ser amostrado em cada escola foi referente à ponderação por escola em função do seu porte. Posteriormente, foi realizado o sorteio utilizando-se tabela de números aleatórios, até completar o número de alunos necessários por escola. Ao final da coleta de dados, a pesquisa apresentou 5% de perdas devido a não realização de todas as etapas do estudo por algumas crianças. A amostra final foi constituída por 378 escolares. Após o aceite do convite realizado aos pais e responsáveis para participarem do trabalho, iniciou-se a coleta de dados na Divisão de Saúde da Universidade Federal de Viçosa (UFV).
Foram considerados como critérios de não inclusão as crianças com alguma alteração de saúde ou em uso de medicamentos que pudessem interferir no seu metabolismo e estado nutricional, além de utilização de suplementos de zinco no decorrer da pesquisa ou nos últimos três meses.
A participação voluntária das crianças no estudo foi autorizada após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos pais ou responsáveis. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFV (protocolo nº 778.653).
Foi realizada avaliação antropométrica das crianças com aferição do peso e altura, por meio de balança digital eletrônica Tanita, modelo BC 553 (Arlington Heights, Estados Unidos), com capacidade de 150 quilos e sensibilidade de 100 gramas, e estadiômetro vertical portátil (Alturexata, Belo Horizonte, Brasil) com extensão de 2 metros e graduado em milímetros, respectivamente. Essas medidas foram utilizadas para o cálculo do índice de massa corporal (IMC) das crianças. A classificação do estado nutricional foi realizada segundo o IMC/idade pelo software WHO Anthro Plus (Organização Mundial da Saúde; http://www.who.int/growthref/tools/en), sendo considerado excesso de peso os valores > escore‐z +1 17.
O perímetro da cintura (PC) foi aferido no ponto médio entre a crista ilíaca e a última costela, por uma fita métrica flexível e inelástica com extensão de 1,5 metro e graduada em centímetros e subdividida em milímetros. A adiposidade abdominal foi classificada segundo os pontos de corte propostos por Barbosa Filho et al. 18. Com base nos valores da cintura e estatura, calculou-se a relação cintura/estatura (RCE) sendo os valores maiores que 0,5 classificados como risco cardiometabólico aumentado 19.
A composição corporal das crianças foi avaliada por absortometria de raios-x de dupla energia (dual energy x-ray absorptiometry - DEXA), seguindo protocolo específico (roupas leves, sem brinco, pulseira ou qualquer adorno de metal), sendo analisada a adiposidade central pelo percentual de gordura androide (%GAN) e a adiposidade total pelo percentual de gordura corporal (%GC). O excesso de gordura corporal foi classificado segundo os pontos de corte propostos por Lohman 20.
Para a realização dos exames bioquímicos, amostras de sangue foram coletadas após 12 horas de jejum por bioquímicos tecnicamente capacitados e analisadas no Laboratório de Análises Clínicas da Divisão de Saúde da UFV. As amostras foram colhidas por punção venosa na região antecubital, para a mensuração de glicose, insulina, colesterol total e frações, triglicerídeos, apolipoproteínas A e B, ácido úrico, leptina, homocisteína, proteína C reativa-ultrassensível (PCR-US) e zinco sérico.
A glicemia de jejum foi determinada pelo método enzimático-colorimétrico, sem desproteinização (BioClin, Belo Horizonte, Brasil), e a insulina de jejum foi analisada no soro utilizando-se os sistemas de imunoensaio Access. Considerou-se como glicemia de jejum alterada quando as concentrações séricas foram ≥ 100mg/dL 21. O CT, LDL-c e lipoproteína de alta densidade (HDL-c) foram dosados pelo teste enzimático colorimétrico (BioClin) e analisados no aparelho BS-200 (BioClin), e os TG pelo método enzimático colorimétrico com fator clareante de lipídeos (BioClin), sendo o perfil lipídico classificado de acordo com a I Diretriz de Prevenção da Aterosclerose na Infância e na Adolescência da Sociedade Brasileira de Cardiologia 22.
As concentrações séricas de glicemia e insulina de jejum foram utilizadas para o cálculo do modelo de avaliação da homeostase da insulina - resistência à insulina (HOMA-IR), por meio da fórmula: glicemia de jejum (mmol/mL) x insulinemia de jejum (μU/mL)/22,5 23. Considerou-se resistência à insulina quando os valores de HOMA-IR ≥ foram superiores ao percentil 90 da amostra.
As apolipoproteínas A e B foram determinadas pela nefelometria cinética (Beckman Coulter, Rio de Janeiro, Brasil), a homocisteína pelo método da quimioluminescência e a leptina pelo método de enzimaimunoensaio em laboratórios terceirizados. O ácido úrico foi determinado pelo método enzimático colorimétrico e a PCR-US pelo método imunoturbidimétrico, utilizando-se o kit BioClin, analisado no aparelho BS-200 (BioClin).
As concentrações séricas de apoliproteínas A e B, leptina, homocisteína, ácido úrico e PCR-US foram classificadas como elevadas quando superiores ao percentil 90 da amostra, uma vez que não existem pontos de corte destes parâmetros para esta faixa etária. Foram avaliadas as relações apolipoproteína B/apolipoproteína A (Apo B/Apo A), CT/HDL-c e TG/HDL-c.
Para a dosagem do zinco no soro foi realizada a técnica de espectrofotometria de absorção atômica. Considerou-se deficiência de zinco quando as concentrações séricas foram inferiores a 65µg/dL 24.
A pressão arterial foi aferida com a criança sentada, três vezes, com intervalos de 5 minutos, sendo considerada a média dos valores para a classificação. Foi utilizado equipamento de insuflação automática Omron (HEM 907, Vernon Hills, Estados Unidos) validado por El Assaad et al.25. A classificação da pressão arterial foi realizada de acordo com o sexo, idade e percentil de estatura, segundo a VI Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial26, sendo considerada pressão arterial elevada os valores igual ou superiores ao percentil 95.
Por meio de questionário, foram investigadas as condições socioeconômicas e demográficas, incluindo idade, sexo, escolaridade materna e renda familiar per capita. A prática de atividade física foi avaliada segundo o tempo diário em que a criança realiza atividades mais intensas como correr, pular, caminhar, entre outros, sendo considerado adequado um tempo igual ou superior a 2 horas por dia 27. Considerou-se comportamento sedentário quando o tempo de tela foi igual ou superior a 2 horas por dia, incluindo televisão, videogame, computador, celular e tablet28.
As análises estatísticas foram realizadas utilizando-se o software IBM SPSS versão 20.0 (IBM Corp., Armonk, Estados Unidos), adotando o nível de significância de 5%. As variáveis contínuas foram avaliadas quanto à normalidade pelo teste de Kolmogorov-Smirnov.
Os resultados foram apresentados por meio de distribuição de frequências e estimativa de medidas de tendência central e de dispersão, sendo avaliados a média e o desvio padrão para variáveis com distribuição normal e mediana e intervalo interquartílico (IIQ) para variáveis sem distribuição normal. Variáveis categóricas foram expressas em valores absolutos e frequência.
Foi utilizado o teste de qui-quadrado para comparar as proporções das variáveis antropométricas, de composição corporal, bioquímicas e clínicas de acordo com o sexo e, quando apropriado, o teste de qui-quadrado para a análise de tendência linear. Foram utilizadas as análises de ANOVA e de Kruskal Wallis para comparar as médias/medianas dos fatores cardiometabólicos segundo os terços de concentração sérica. Foi realizado o teste de Bonferroni, comparação post hoc, para identificar a diferença entre os grupos.
A regressão de Poisson com variância robusta foi realizada para avaliar a associação entre a concentração sérica de zinco (variável independente) e variáveis antropométricas, de composição corporal e bioquímicas (dependentes). O 2º e o 3º terços de zinco agrupados foram considerados categoria de referência, e o primeiro terço, a categoria de exposição. Foram estimados os valores de razão de prevalência (RP) e seus respectivos intervalos de 95% de confiança (IC95%). Os modelos foram ajustados por variáveis de confusão que classicamente se associam aos fatores de risco cardiometabólico na literatura 13,14, como sexo, renda familiar per capita, escolaridade materna, ingestão energética e atividade física, sendo também testadas outras associações. Foi utilizado o teste de Hosmer & Lemeshow para avaliar a qualidade dos modelos ajustados.
Avaliamos 378 crianças pré-púberes de 8 e 9 anos de idade, sendo 52,1% do sexo feminino. A média da concentração sérica de zinco foi 95,2µg/dL para ambos os sexos e a deficiência foi observada em 1,3% das crianças (n = 5). A Tabela 1 apresenta a caracterização da amostra estratificada por sexo. As meninas apresentaram o pior perfil cardiometabólico em relação aos meninos, com maiores prevalências de valores alterados para %GAN, triglicerídeos, resistência à insulina, leptina, zinco sérico e Apo A (p < 0,05). O valor do 1º tercil de concentração sérica de zinco foi de 88,5µg/dL, o 2º tercil foi 101,0µg/dL e o 3º tercil foi 162,7µg/dL. Não foram encontradas diferenças entre os valores médios/medianos das variáveis antropométricas, de composição corporal, bioquímicas e clínicas segundo os terços de concentração sérica de zinco (Tabela 2).
Tabela 1 Variáveis antropométricas, bioquímicas e clínicas de acordo com o sexo em crianças de 8 e 9 anos. Viçosa, Minas Gerais, Brasil, 2015.
Variáveis | Total | Meninos | Meninas | Valor de p |
---|---|---|---|---|
n (%) | n (%) | n (%) | ||
Excesso de peso | ||||
Não | 254 (67,2) | 125 (49,2) | 129 (50,8) | 0,459 |
Sim | 124 (32,8) | 56 (45,2) | 68 (54,8) | |
PC (cm) | ||||
< Percentil 90 | 266 (70,4) | 132 (49,6) | 134 (50,4) | 0,297 |
≥ Percentil 90 | 112 (29,6) | 49 (43,8) | 63 (56,2) | |
RCE | ||||
≤ 0,5 | 312 (82,5) | 154 (49,4) | 158 (50,6) | 0,212 |
≥0,5 | 66 (17,5) | 27 (40,9) | 39 (59,1) | |
%GC | ||||
Adequado | 218 (58,0) | 95 (50,0) | 95 (50,0) | 0,408 |
Aumentado | 158 (42,0) | 86 (45,7) | 102 (54,3) | |
%GAN | ||||
1º e 2º terços | 255 (67,5) | 135 (52,9) | 120 (47,1) | 0,005 * |
3º terço | 123 (32,5) | 46 (37,4) | 77 (62,6) | |
Zinco sérico (µg/dL) | ||||
1º terço | 125 (33,4) | 50 (40,0) | 75 (60,0) | 0,019 * |
2º terço | 125 (33,4) | 62 (49,6) | 63 (50,4) | |
3º terço | 124 (33,2) | 68 (54,8) | 56 (45,2) | |
CT (mg/dL) | ||||
< 150 | 183 (48,7) | 88 (48,1) | 95 (51,9) | 0,985 |
≥ 150 | 193 (51,3) | 93 (48,2) | 100 (51,8) | |
HDL-c (mg/dL) | ||||
≥ 45 | 264 (70,2) | 134 (50,8) | 130 (49,2) | 0,119 |
< 45 | 112 (29,8) | 47 (42,0) | 65 (58,0) | |
LDL-c (mg/dL) | ||||
< 100 | 272 (72,3) | 132 (48,5) | 140 (51,5) | 0,680 |
≥ 100 | 104 (27,7) | 48 (46,2) | 56 (53,8 ) | |
TG (mg/dL) | ||||
< 100 | 309 (82,2) | 156 (50,5) | 153 (49,5) | 0,050 * |
≥ 100 | 67 (17,8) | 25 (37,3) | 42 (62,7) | |
CT/HDL-c | ||||
< Percentil 90 | 334 (88,6) | 166 (49,7) | 168 (50,3) | 0,067 |
≥ Percentil 90 | 43 (11,4) | 15 (34,9) | 28 (65,1) | |
TG/HDL-c | ||||
< Percentil 90 | 339 (88,9) | 166 (49,0) | 173 (51,0) | 0,267 |
≥ Percentil 90 | 38 (10,1) | 15 (39,5) | 23 (60,5) | |
Apo A (mg/dL) | ||||
≥ Percentil 90 | 36 (9,6) | 24 (66,7) | 12 (33,3) | 0,018 * |
< Percentil 90 | 340 (90,4) | 156 (45,9) | 184 (54,1) | |
Apo B (mg/dL) | ||||
< Percentil 90 | 247 (65,3) | 110 (44,5) | 137 (55,5) | 0,012 |
≥ Percentil 90 | 31 (8,2) | 11 (35,5) | 20 (64,5) | |
Apo B/Apo A | ||||
< Percentil 90 | 247 (89,8) | 111 (44,9) | 136 (55,1) | 0,351 |
≥ Percentil 90 | 28 (10,2) | 10 (35,7) | 18 (64,3) | |
Glicose (mg/dL) | ||||
< 100 | 368 (97,9) | 177 (48,1) | 191 (51,9) | 0,915 |
≥ 100 | 8 (2,1) | 4 (50,0) | 4 (50,0) | |
HOMA-IR | ||||
< Percentil 90 | 337 (90,1) | 168 (49,9) | 169 (50,1) | 0,020 * |
≥ Percentil 90 | 37 (9,9) | 11 (29,7) | 26 (70,3) | |
Ácido úrico (mg/dL) | ||||
< Percentil 90 | 335 (89,1) | 163 (48,7) | 172 (51,3) | 0,565 |
≥ Percentil 90 | 41 (10,9) | 18 (43,9) | 23 (56,1) | |
Leptina (ng/mL) | ||||
< Percentil 90 | 342 (90,5) | 172 (50,3) | 170 (49,7) | 0,004 * |
≥ Percentil 90 | 36 (9,5) | 9 (25,0) | 27 (75,0) | |
Homocisteína (µmol/L) | ||||
< Percentil 90 | 249 (90,2) | 110 (44,2) | 139 (55,8) | 0,733 |
≥ Percentil 90 | 27 (9,8) | 11 (40,7) | 16 (59,3) | |
PCR-US (mg/dL) | ||||
< Percentil 90 | 328 (89,6) | 153 (46,8) | 174 (53,2) | 0,495 |
≥ Percentil 90 | 38 (10,4) | 20 (52,6) | 18 (47,4) | |
PA (mmHg) | ||||
< Percentil 90 | 352 (93,4) | 173 (49,1) | 179 (50,9) | 0,097 |
≥ Percentil 90 | 25 (6,6) | 8 (32,0) | 17 (68,0) |
%GC: percentual de gordura corporal; %GAN: gordura corporal androide; Apo A: apolipoproteína A; Apo B: apolipoproteína B; CT: colesterol total; HDL-c: lipoproteína de alta densidade de colesterol; HOMA-IR: modelo de avaliação da homeostase - resistência à insulina; LDL-c: lipoproteína de baixa densidade de colesterol; PA: pressão arterial; PC: perímetro da cintura; PCR-US: proteína C reativa-ultrassensível; RCE: relação cintura/estatura; TG: triglicerídeos.
Nota: utilizado teste do qui-quadrado de Pearson.
* Significância estatística (p < 0,05).
Tabela 2 Variáveis antropométricas, bioquímicas e clínicas de acordo com o tercil de concentração sérica de zinco em crianças de 8 e 9 anos. Viçosa, Minas Gerais, Brasil, 2015.
Variáveis | Zinco sérico (µg/dL) | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
1º tercil | 2º tercil | 3º tercil | ||||
Média ou mediana | DP ou IIQ | Média ou mediana | DP ou IIQ | Média ou mediana | DP ou IIQ | |
Altura (cm) * | 135,7 | 130,5-141,2 | 134,9 | 130,8-141,0 | 135,0 | 129,3-140,0 |
IMC (kg/m2) * | 16,7 | 15,0-19,8 | 16,6 | 15,1-19,4 | 16,2 | 15,1-18,8 |
PC (cm) * | 57,5 | 53,1-67,0 | 58,1 | 53,2-66,6 | 57,0 | 54,0-65,0 |
RCE * | 0,4 | 0,4-0,5 | 0,4 | 0,4-0,5 | 0,4 | 0,4-0,5 |
%GC * | 24,0 | 15,0-34,7 | 23,0 | 17,5-32,9 | 22,5 | 15,0-31,7 |
%GAN * | 17,0 | 7,0-27,0 | 16,0 | 8,1-26,0 | 14,0 | 6,0-27,2 |
CT (mg/dL) * | 145,0 | 130,0-170,0 | 153,0 | 130,0-173,0 | 155,0 | 140,0-169,0 |
LDL-c (mg/dL) ** | 85,0 | 72,0-103,0 | 86,0 | 67,0-105,0 | 84,0 | 73,0-99,0 |
HDL-C (mg/dL) * | 47,0 | 42,0-55,0 | 48,0 | 44,0-59,0 | 51,0 | 42,0-58,0 |
CT/HDL * | 3,1 | 2,8-3,5 | 3,1 | 2,7-3,5 | 2,9 | 2,6-3,5 |
TG/HDL * | 1,7 | 1,0-2,0 | 1,4 | 1,1-1,9 | 1,4 | 1,0-2,1 |
TG (mg/dL) * | 74,0 | 54,0-90,0 | 68,0 | 56,0-92,0 | 73,0 | 57,0-94,0 |
Apo A (mg/dL) ** | 128,6 | 21,1 | 130,0 | 21,8 | 132,7 | 22,1 |
Apo B (md/dL) ** | 79,6 | 18,5 | 81,6 | 23,0 | 83,6 | 23,6 |
Apo B/Apo A * | 0,6 | 0,5-0,7 | 0,6 | 0,5-0,7 | 0,6 | 0,5-0,8 |
Glicose (mg/dL) * | 84,0 | 81,0-90,0 | 84,0 | 80,0-88,0 | 85,0 | 80,0-91,0 |
Insulina (µUI/mL) * | 4,7 | 3,4-7,0 | 4,8 | 3,4-7,1 | 4,0 | 3,0-6,0 |
HOMA-IR * | 0,9 | 0,7-1,5 | 1,0 | 0,6-1,5 | 0,8 | 0,6-1,3 |
Ácido úrico (mg/dL) * | 3,3 | 2,7-3,7 | 3,2 | 2,7-3,9 | 3.2 | 2,6-3,7 |
Leptina (ng/mL) * | 2,0 | 0,2-7,6 | 2,9 | 1,0-11,0 | 2,5 | 0,5-8,6 |
Homocisteína (µmol/L) * | 5,2 | 4,3-6,6 | 5,2 | 4,0-6,2 | 5,2 | 4,1-6,9 |
PCR-US (mg/dL) * | 0,0 | 0,0-0,9 | 0,0 | 0,0-0,6 | 0,0 | 0,0-0,8 |
PAS (mmHg) ** | 102,2 | 8,4 | 103,5 | 9,2 | 102,3 | 8,7 |
PAD (mmHg) ** | 59,7 | 6,3 | 61,3 | 7,2 | 60,8 | 6,6 |
%GAN: percentual de gordura corporal androide; %GC: porcentual de gordura corporal; Apo A: apolipoproteína A; Apo B: apolipoproteína B; Apo B/Apo A: relação apolipoproteína B/apolipoproteína A; CT: colesterol total; CT/HDL: relação colesterol total/lipoproteína de alta densidade; DP: desvio padrão; HDL: lipoproteína de alta densidade; HDL-c: lipoproteína de alta densidade de colesterol; HOMA-IR: modelo de avaliação da homeostase - resistência à insulina; IIQ: intervalo interquartil; IMC: índice de massa corporal; LDL: lipoproteína de baixa densidade; LDL-c: lipoproteína de baixa densidade de colesterol; PAD: pressão arterial diastólica; PAS: pressão arterial sistólica; PC: perímetro da cintura; PCR-US: proteína C reativa ultrassensível; RCE: relação cintura/estatura; TG: triglicerídeos; TG/HDL: relação triglicerídeos/lipoproteína de alta densidade.
* Variáveis não paramétricas (mediana e intervalo interquartil). Teste de Kruskal Wallis;
** Variáveis paramétricas (média e desvio padrão). Teste ANOVA.
Após o ajuste pelos modelos de regressão de Poisson, observou-se que a prevalência de resistência à insulina foi 96% maior (RP = 1,96; IC95%: 1,04-3,66) e a prevalência de hipercolesterolemia foi 23% menor (RP = 0,77; IC95%: 0,61-0,96) no 1º terço de concentração sérica de zinco em relação aos 2º e 3º terços de concentração sérica de zinco agrupados (Tabela 3).
Tabela 3 Razões de prevalência (RP) bruta e ajustada da concentração sérica de zinco segundo as alterações cardiometabólicas em crianças de 8 e 9 anos. Viçosa, Minas Gerais, Brasil, 2015.
Variáveis dependentes | Zinco sérico (µg/dL) | ||||
---|---|---|---|---|---|
1º terço (%) | 2º e 3º terços (%) | RP bruta (IC95%) | RP ajustada * (IC95%) | Valor de p | |
Excesso de peso [Escore Z do IMC/I > 1] | 34,4 | 20,8 | 1,15 (0,85-1,55) | 1,12 (0,83-1,52) | 0,446 |
%GC [Risco] | 52,8 | 32,3 | 1,09 (0,88-1,34) | 1,05 (0,85-1,29) | 0,664 |
%GAN [3º terço] | 31,2 | 19,2 | 1,37 (1,03-1,83) | 1,30 (0,98-1,72) | 0,074 |
PC (cm) [> Percentil 90] | 24,8 | 17,1 | 1,17 (1,85-1,61) | 1,14 (0,83-1,58) | 0,418 |
CT (mg/dL) [≥150] | 52,0 | 37,1 | 0,78 (0,62-0,98) | 0,77 (0,61-0,96) | 0,022 ** |
HDL-c (mg/dL) [< 45] | 26,4 | 18,4 | 1,23 (0,90-1,69) | 1,23 (0,89-1,69) | 0,213 |
LDL-c (mg/dL) [≥ 100] | 32,3 | 18,3 | 1,00 (0,70-1,42) | 0,98 (0,68-1,40) | 0,901 |
TG (mg/dL) [≥ 100] | 19,2 | 12,1 | 0,94 (0,59-1,51) | 0,90 (0,55-1,47) | 0,673 |
CT/HDL-c [≥ Percentil 90] | 14,5 | 6,4 | 1,50 (0,85-2,67) | 1,46 (0,81-2,63) | 0,209 |
TG/HDL-c [≥ Percentil 90] | 9,7 | 6,7 | 0,96 (0,50-1,85) | 0,94 (0,47-1,91) | 0,876 |
Apo B [≥ Percentil 90] | 6,4 | 6,1 | 0,65 (0,30-1,40) | 0,61 (0,28-1,34) | 0,219 |
Apo A [< Percentil 90] | 93,6 | 59,0 | 1,05 (0,99-1,12) | 1,04 (0,98-1,11) | 0,163 |
Apo B/Apo A [≥ Percentil 90] | 6,3 | 8,0 | 0,51 (0,21-1,22) | 0,48 (0,20-1,13) | 0,093 |
Insulina [≥ 15] | 2,4 | 1,6 | 1,00 (0,25-3,93) | 0,95 (0,19-4,68) | 0,953 |
HOMA-IR [≥ Percentil 90] | 15,3 | 5,9 | 2,11 (1,15-3,88) | 1,96 (1,04-3,66) | 0,035 ** |
%GAN: percentual de gordura corporal androide; %GC: percentual de gordura corporal; Apo A: apolipoproteína A; Apo B: apolipoproteína B; Apo B/Apo A: relação apolipoproteína B/apolipoproteína A; CT: colesterol total; Escore Z IMC/I: escore Z do índice de massa corporal para idade; HDL-c: lipoproteína de alta densidade de colesterol; HOMA-IR: modelo de avaliação da homeostase - resistência à insulina; IC95%: intervalo de 95% de confiança; LDL-c: lipoproteína de baixa densidade de colesterol; PC: perímetro da cintura; TG: triglicerídeos.
Nota: exposição - 1º terço da concentração sérica de zinco; referência - 2º e 3º terços agrupados da concentração sérica de zinco.
* Ajuste por atividade física, sexo, ingestão energética, escolaridade materna e renda per capita em Reais;
** Significância estatística (p < 0,05).
Observou-se uma baixa prevalência da deficiência de zinco sérico nas crianças, sendo que a prevalência de resistência à insulina foi 96% maior e da hipercolesterolemia foi 23% menor entre as crianças localizadas no 1º terço de concentração sérica de zinco, em relação àquelas localizadas nos 2º e 3º terços agrupados.
Por ter uma estreita relação com a regulação hormonal e melhorar a interação entre hormônios e seus receptores, o zinco é alvo de interesse em pesquisas 11,12. A associação inversa entre a resistência à insulina e o zinco sérico tem sido descrita por trabalhos realizados com crianças em diversos países 11,12,13. Sabe-se que esse mineral participa da cristalização da insulina, modula a transcrição do seu receptor, formando complexos e aumentando a ligação desse hormônio aos seus receptores. Porém, a concentração desse mineral não é alterada com a hiperglicemia induzida pela administração de glicose, sugerindo que não há uma mobilização de zinco dos tecidos pela hiperglicemia, ou seja, a redução da concentração deste mineral não reflete uma alteração metabólica em curto prazo 12.
A associação positiva entre a hipercolesterolemia e as concentrações séricas e plasmáticas de zinco foi também observada por Fan et al. 29 e Garcia et al. 13 em crianças e adolescentes obesos nos Estados Unidos e escolares no México, respectivamente. Evidências sugerem que a concentração de zinco pode atuar de forma indireta no aumento de colesterol sérico total com a zinco-α-2 glicoproteína (ZAG), uma proteína que induz a mobilização de lipídios no tecido adiposo, com aumento das concentrações séricas de triacilgliceróis e colesterol 30. Entretanto, os resultados são contraditórios na literatura. Em um estudo realizado por Azab et al. 12 no Egito, foi encontrada uma correlação negativa entre o zinco e o colesterol sérico em crianças pré-púberes obesas. Pesquisas também realizadas com crianças pré-púberes obesas iranianas 31 demonstraram uma redução do colesterol sérico de forma significante naquelas que foram suplementadas com zinco. A associação entre a hipercolesterolemia e o zinco sérico pode ser diferente em populações obesas com baixa expressão da ZAG ou com alterações em outros parâmetros bioquímicos, como altas concentrações de leptina e baixas de adiponectina 29. Mais estudos são necessários para comprovar a causalidade entre essas relações.
Os resultados controversos encontrados na literatura podem variar de acordo com as diferentes prevalências de deficiência desse nutriente. Uma baixa prevalência (1,3%) da deficiência de zinco sérico foi encontrada nas crianças deste estudo, contrastando com outros trabalhos realizados com crianças mexicanas de 6 a 10 anos (24,9%) 13 e com crianças e adolescentes espanhóis de 8 a 13 anos (11,5%) 11. Essas diferentes prevalências da deficiência de zinco no México e na Espanha em relação à encontrada no presente estudo podem ser justificadas devido ao fato de que a concentração sanguínea de zinco foi mensurada na fração plasmática, o que dificulta a comparação. É importante destacar que a heterogeneidade das populações pode influenciar o estado nutricional de zinco, principalmente em relação ao nível socioeconômico, encontrando-se maiores prevalências de deficiência em crianças residentes em áreas rurais 3,13, uma vez que a deficiência de zinco está associada ao baixo poder aquisitivo, à menor disponibilidade de alimentos-fonte e às condições inadequadas de saneamento 32. Além disso, as diferentes faixas etárias incluídas nos estudos podem contribuir para esses achados inconsistentes, uma vez que a deficiência de zinco tende a ser mais prevalente em indivíduos de menor idade 3,4,32.
A prevalência mundial da deficiência de zinco é desconhecida, principalmente pela inexistência de indicadores simples para a estimativa do seu estado nutricional, bem como pela falta de consenso em determinar quais seriam os indicadores mais adequados, entre os já existentes 8. A avaliação do estado nutricional do zinco é bastante complexa, pois depende de uma série de interações biológicas, psicológicas e sociais. A seleção de uma metodologia adequada é importante por causa das variadas funções do zinco nos sistemas biológicos 8. Neste trabalho, a concentração sérica de zinco foi o método utilizado para estimar a prevalência da deficiência, pois reflete o seu consumo dietético e os efeitos da suplementação, bem como existem dados de referência preconizados para idade e sexo 8. Entretanto, encontra-se na literatura uma variação dos métodos empregados, como zinco capilar 3,4,32, zinco plasmático 13 e enzima dependente de zinco 3, o que dificulta a comparação entre os estudos.
Neste estudo, não foi encontrada associação entre as concentrações séricas de zinco e leptina, PCR-US, ácido úrico e homocisteína. A leptina é uma adipocina que está relacionada ao mecanismo de saciedade, e alguns trabalhos encontraram correlação inversa com a concentração sérica de zinco em adultos e crianças 12,33, devido ao papel do zinco como um mediador na produção de leptina no tecido adiposo subcutâneo 33 e ao efeito da ZAG nas concentrações de leptina. Sua baixa expressão em indivíduos obesos está associada à diminuição sérica de leptina, podendo desempenhar um papel importante na patogênese da obesidade 33. A ação anti-inflamatória do zinco pode ser um dos fatores que contribuem para a inibição da produção de citocinas pró-inflamatórias e diminuição da PCR 14. A maioria dos estudos que avaliam a relação entre marcadores inflamatórios e concentrações séricas de zinco em crianças está relacionada a doenças agudas infecciosas como diarreia e infecção respiratória. Apenas no estudo de Garcia et al. 13, a relação entre as concentrações séricas de vitaminas e minerais antioxidantes e PCR com alterações cardiometabólicas foi investigada e não houve associação entre zinco e PCR-US, tal como encontrado neste estudo. Em relação ao ácido úrico e à homocisteína não foram encontrados trabalhos que avaliaram tais relações em crianças.
Alguns pontos positivos deste estudo devem ser considerados. Este é um dos poucos trabalhos realizados em países em desenvolvimento que investigou a associação entre as concentrações séricas de zinco e os fatores cardiometabólicos na infância, sendo o primeiro estudo com amostra representativa de crianças. Como a obesidade e comorbidades associadas estão cada vez mais prevalentes na infância e o zinco é de fundamental importância para o crescimento e desenvolvimento infantil, esta é uma fase importante para avaliar se a menor concentração sérica de zinco contribui para o aumento das alterações cardiometabólicas na infância. Estudos epidemiológicos representativos do local geográfico são essenciais para subsidiar o desenvolvimento de políticas públicas de saúde adequadas à realidade da população infantil, visando à reformulação de ações de educação alimentar e nutricional e, consequentemente, à prevenção da obesidade e de comorbidades associadas. Ressalta-se que este é um estudo com amostra homogênea em relação à faixa etária, sendo constituída por crianças pré-púberes, o que contribui para a redução da influência da maturação sexual na composição corporal.
Contudo, este trabalho apresenta algumas limitações. Por se tratar de um estudo transversal, não é possível estabelecer uma relação de temporalidade entre as concentrações séricas de zinco e as alterações cardiometabólicas, uma vez que não se sabe a direção da causalidade, ou seja, se as baixas concentrações séricas de zinco causam as alterações cardiometabólicas ou vice-versa. Além disso, não foram avaliados outros micronutrientes que podem interferir no status de zinco, como ferro e cobre séricos.
Conclui-se que uma baixa deficiência de zinco foi encontrada nesta população, sendo importante destacar que a prevalência de resistência à insulina foi maior e da hipercolesterolemia foi menor no primeiro terço de concentração sérica de zinco, em relação ao 2º e 3º terços agrupados nas crianças. Esses resultados são importantes para a atuação eficaz dos profissionais de saúde na prevenção das alterações cardiometabólicas na infância, principalmente da resistência à insulina, com ênfase na avaliação sérica do zinco. Ensaios clínicos randomizados e estudos longitudinais são necessários para esclarecer as relações entre a concentração sérica de zinco e as alterações cardiometabólicas na infância.