versão impressa ISSN 1414-462Xversão On-line ISSN 2358-291X
Cad. saúde colet. vol.26 no.2 Rio de Janeiro abr./jun. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x201800020048
Drug use among adolescents is on the rise, and the habit has been taking root at an increasingly early age.
Investigate the correlation between use of licit and illicit drugs, sex, and socioeconomic conditions among 12-year-old adolescents.
Cross sectional study conducted with a representative sample of adolescents enrolled in public and private schools in the urban area of Diamantina, Minas Gerais state, Brazil. Data were collected through self-administered questionnaires. Consumption of drugs was investigated using the Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test (ASSIST) instrument. School type, family income, and maternal education were used to investigate socioeconomic condition. Associations were tested using the Pearson’s chi-square and Fisher's exact tests (p < 0.05).
The following drug consumption prevalence values were found: alcohol, 45.6% (260/588); marijuana, 1.5% (9/588), cocaine, 0.3% (2/588); inhalants, 1.7% (10/588). The male gender was statistically associated with consumption of marijuana (p = 0.018) and alcohol (p = 0.012), but not with use of inhalants (p = 0.536). No statistically significant correlation was observed between consumption of licit and illicit drugs and the socioeconomic indicators adopted. Alcohol consumption was associated with use of marijuana (p = 0.013) [OR:9.814 (1.220 to 78.984)].
Alcohol consumption and use of marijuana were statistically associated with the male gender, but not with socioeconomic indicators.
Keywords: adolescents; illicit drugs; cannabis; alcohol; socioeconomic factors
A Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza a adolescência como a fase da vida que vai dos 10 aos 19 anos de idade 1 . Esse período é marcado por uma alta vulnerabilidade no qual os jovens estão sujeitos às experiências com substâncias psicoativas, especialmente o tabaco 2 , o álcool 3 e a maconha 4,5 .
O fenômeno da utilização de substâncias psicoativas tem suscitado preocupação, considerando-se que o seu uso provoca uma multiplicidade de danos não somente aos usuários, mas também aos seus familiares e à sociedade. A questão relacionada ao uso indevido de drogas é alvo de debates e de questionamentos nos diversos segmentos da sociedade e em vários países 6-9 .
O uso de substâncias ilícitas pode incorrer em violência ou acidentes 10 , que podem culminar em traumatismos 4 ou em morte prematura 10 . Assim, não é surpreendente que a adolescência seja uma fase de comportamentos de risco em decorrência da sua fragilidade emocional, vulnerabilidade e predisposição a ser influenciada por pares 11 .
Adolescência é também caracterizada pelos esforços em reafirmar sua independência, utilizando mecanismos que englobam a rejeição de valores sociais, religiosos e familiares 10-12 . Outros transtornos encontrados são distúrbios físicos e psicológicos, baixo desempenho escolar, dependência na vida adulta, morte prematura por overdose e contaminação por HIV/Aids 13,14 .
O uso de drogas lícitas e ilícitas é uma preocupação crescente em vários países, sendo o álcool e a maconha as drogas mais consumidas em todo o mundo. Na Alemanha, a maconha é utilizada por aproximadamente 4,5% dos adultos 15 .
A literatura fornece resultados contraditórios sobre a relação do uso de drogas e a situação socioeconômica. Existem estudos que associam positivamente o uso de drogas por adolescentes a uma condição socioeconômica mais alta 16 ; outros estudos, a um nível socioeconômico baixo 5,17 ; e ainda há estudos que não encontram essa associação 18 .
A OMS salienta a importância de coletar, analisar e divulgar dados sobre uso de substâncias psicoativas entre adolescentes, o que é imprescindível para nortear as políticas de saúde pública e facilitar o planejamento, a implantação e a avaliação das intervenções para reduzir os encargos relacionados ao uso destas. Salienta ainda a escassez de dados sobre prevalência e fatores de risco entre os países de média e baixa renda, incentivando a realização de pesquisas com adolescentes 19 .
Adoção da idade de 12 anos justificou-se no intuito de investigar a precocidade com que os adolescentes estão iniciando a utilização de tais substâncias, o que infere de um maior risco e gravidade de alcoolismo, dependência de maconha, comportamentos violentos e morte prematura 20,21 , bem como da escassez de estudos relacionados ao tema nessa idade 12 . Deve-se ressaltar que estudos dessa natureza auxiliariam no entendimento dos fatores relacionados aos comportamentos de risco, reduzindo ou mesmo prevenindo o uso de drogas por adolescentes.
A idade de 12 anos foi eleita com base na precocidade com que os jovens vêm experimentando as drogas lícitas e ilícitas 22 e as consequências que o uso precoce pode exercer na saúde. A importância em se detectar precocemente o uso de substâncias por adolescentes se dá na possibilidade de intervenções mais precoces e em idades específicas, abordando, principalmente, os comportamentos de risco e, por conseguinte, reduzindo ou prevenindo o seu uso por adolescentes e os possíveis comprometimentos que seu uso contínuo pode gerar na vida adulta. A maioria das pesquisas sobre o uso de drogas lícitas e ilícitas na juventude foi realizada em contextos específicos (por exemplo, estudantes universitários norte-americanos, adolescentes australianos etc.). Como os padrões de consumo/uso no Brasil na faixa etária estudada não estão ainda bem definidos na literatura, há uma necessidade urgente de entender os correlatos desse comportamento para impulsionar os esforços de prevenção.
Portanto, o objetivo deste estudo foi investigar a prevalência do uso de substâncias lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas (maconha, cocaína e inalantes) por adolescentes de 12 anos de idade inseridos no sistema educacional público e privado e sua associação com sexo e condição socioeconômica.
Estudo transversal de base populacional foi realizado na área urbana do município de Diamantina, Minas Gerais. O município contava com um total de 46.372 habitantes, de acordo com o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, e um índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,716 23 .
Para o cálculo amostral, utilizou-se da variabilidade populacional máxima (0,25), com nível de confiança de 95%, Z α/2 = 1,96, erro de estimação de 4% e d = 0,03. O tamanho da amostra mínima calculada foi de 546 adolescentes, acrescido de 15% para compensar possíveis perdas, totalizando, assim, 628 adolescentes. Para seleção da amostra, a listagem das escolas localizadas na zona urbana, bem como seus endereços e o número de alunos com 12 anos completos, matriculados em cada uma delas, foi obtida na Superintendência de Ensino do Estado de Minas Gerais. As escolas foram agrupadas de acordo com sua localização geográfica. A amostra estabelecida foi proporcionalmente distribuída, garantindo a participação de todas as escolas da rede pública e privada. O método de seleção sistemático foi adotado para participação dos escolares. Foi realizado previamente estudo-piloto e verificou-se que não seriam necessárias modificações na metodologia a ser empregada.
O instrumento ASSIST (Teste para Triagem do Envolvimento com Álcool, Cigarro e Outras Substâncias), já validado no Brasil, foi desenvolvido pela OMS com o intuito de possibilitar que profissionais de várias áreas da saúde identifiquem, além da dependência química, o uso de drogas ilícitas que não seja por vício, visando aos cuidados primários da saúde 24 . Traz como vantagem a abordagem de várias classes de substâncias psicoativas, além da frequência do uso e de já ter sido aplicado em outros estudos envolvendo adolescentes 18,25,26 . O ASSIST contém oito questões sobre o uso de nove classes de substâncias psicoativas (tabaco, álcool, maconha, cocaína, estimulantes, sedativos, inalantes, alucinógenos e opiáceos). O uso de drogas (a variável dependente do estudo) foi avaliado por meio da primeira pergunta do questionário ASSIST, abordando frequência de uso na vida, com opção de resposta sim ou não. A variável “uso na vida de drogas” não foi computado no escore geral do instrumento ASSIST, mas foi utilizada por ser uma informação que denuncia a vulnerabilidade social dos adolescentes em relação às drogas.
A renda familiar, a escolaridade materna e o tipo de escola foram os indicadores socioeconômicos. A renda familiar baseou-se na soma dos rendimentos recebidos por todas as pessoas economicamente ativas residentes com o adolescente, dividido pelo salário mínimo vigente, dicotomizada pela mediana em valor < 3 e ≥ 3 salários mínimos. O número de anos estudados pela mãe foi outro fator investigado. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), a média de idade de estudo da população brasileira foi de 7,4 anos 23 , sendo, portanto, o ponto de corte de 8 anos escolhido para avaliar a escolaridade materna e também por coincidir com o término do ensino fundamental. A condição socioeconômica foi respondida pelos pais/responsáveis.
Os estudantes receberam os questionários codificados. A aplicação dos questionários foi realizada em sala de aula sem a presença do professor, e o pesquisador leu em voz alta os itens para que todos respondessem simultaneamente, de modo também a resguardar de preconceitos os que não possuíam proficiência na leitura 24 . O sigilo e a privacidade foram garantidos.
A análise dos dados foi feita com o programa SPSS Statistical Package for the Social Sciences (SPSS for Windows, version 19.0, SPSS Inc, Chicago, IL, USA). Realizou-se a análise descritiva para a caracterização da amostra. Análise univariada foi utilizada para verificar a associação entre o consumo de drogas lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas (maconha, cocaína, inalantes) e as variáveis independentes, adotando o teste do Qui-quadrado de Pearson e o teste Exato de Fisher (p < 0,05).
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (COEP-317/11). As autorizações da Superintendência Regional de Ensino e das escolas participantes foram devidamente obtidas, e os termos de anuência e de consentimento livre e esclarecido também foram assinados pelos participantes e seus pais/responsáveis. A confidencialidade quanto à identificação foi garantida a todos os sujeitos da pesquisa.
A amostra final do estudo constou de 588 adolescentes, com perda de 6,36% (n = 40). A amostra foi constituída de 48,6% (n = 286) escolares do sexo masculino, 7,8% (n = 46) frequentavam escola particular, 24,6% pertenciam à família com renda familiar > 3 salários mínimos (n = 145) e 63,9% (n = 376) eram filhos de mães que possuíam > 8 anos de estudo.
Quanto à prevalência do uso de substâncias psicoativas, 7,1% (n = 42) dos escolares usaram derivados do tabaco, 46,8% (n = 275), bebidas alcoólicas, 1,5% (n = 9), maconha, 0,7% (n = 4), cocaína, 1,7% (n = 10), inalantes, e 0,2% (n = 1), alucinógenos.
A Tabela 1 caracteriza a amostra segundo o sexo e o consumo de substâncias ilícitas. O relato do uso de substâncias psicoativas pelos adolescentes apresentou associação estatística com o sexo masculino para todas as substâncias investigadas. Adolescentes do sexo masculino tiveram 1,52 vez mais chance de pertencerem ao grupo que consumiu bebidas alcoólicas (IC 95% 1,097-2,104) e 8,66 vezes mais chances de pertencerem ao grupo que relatou uso de maconha (IC 95% 1,076-69,698). Porém, não foi observada associação estatisticamente significativa entre o consumo de drogas ilícitas e a condição socioeconômica em nenhum dos indicadores ( Tabela 2 ).
Tabela 1 Associação entre o consumo de drogas lícitas e ilícitas por adolescentes de 12 anos de idade e o sexo, em Diamantina/MG
Tabaco | |||||
---|---|---|---|---|---|
Variável independente |
Não n (%) |
Sim n (%) |
Total n (%) |
p-valor | OR IC 95% |
Sexo | |||||
Feminino | 288 (95,4) | 14 (4,6) | 302 (100) | 0,015 * | 2,233 (1,150-4,333) |
Masculino | 158 (90,2) | 28 (9,8) | 286 (100) | ||
Álcool | |||||
Sexo | |||||
Feminino | 176 (58,3) | 126 (41,7) | 302 (100) | 0,012 * | 1,519 (1,097-2,104) |
Masculino | 137 (47,9) | 149 (52,1) | 286 (100) | ||
Maconha | |||||
Sexo | |||||
Feminino | 301 (99,7) | 1 (0,3) | 302 (100) | 0,018 ** | 8,662 (1,076-69,698) |
Masculino | 278 (97,2) | 8 (2,8) | 286 (100) | ||
Inalantes | |||||
Sexo | |||||
Feminino | 298 (98,7) | 4 (1,3) | 302 (100) | 0,536 ** | 1,596 (0,446-5,717) |
Masculino | 280 (97,9) | 6 (2,1) | 286 (100) |
*Teste do Qui-quadrado de Pearson;
** Teste Exato de Fisher; OR = Odds Ratio; IC = Intervalo de Confiança
Tabela 2 Associação entre o consumo de drogas lícitas e ilícitas por adolescentes de 12 anos de idade e a condição socioeconômica, em Diamantina/MG
Tabaco | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|
Variável independente |
Não n (%) |
Sim n (%) |
Total n (%) |
p-valor | OR IC 95% | |
Renda familiar | ||||||
< 3 salários | 408 (92,3) | 34 (7,7) | 442 (100) | 0,378 * | 0,701 (0,317-1,55) | |
≥ 3 salários | 137 (94,5) | 8 (5,5) | 145 (100) | |||
Escolaridade materna | ||||||
> 8 anos | 349 (92,8) | 27 (7,2) | 376 (100) | 0,986 * | 0,994 (0,516-1,914) | |
< 8 anos | 195 (92,9) | 15 (7,1) | 210 (100) | |||
Tipo de escola | ||||||
Particular | 44 (95,7) | 2 (4,3) | 46 (100) | 0,763 ** | 1,753 (0,410-7,497) | |
Pública | 502 (92,6) | 40 (7,4) | 542 (100) | |||
Álcool | ||||||
Renda familiar | ||||||
< 3 salários | 243 (55,0) | 199 (45,0) | 442 (100) | 0,122 * | 1,345 (0,924-1,959) | |
≥ 3 salários | 69 (47,6) | 76 (52,4) | 145 (100) | |||
Escolaridade materna | ||||||
> 8 anos | 203 (54,0) | 173 (46,0) | 376 (100) | 0,708 * | 1,067 (0,761-1,496) | |
< 8 anos | 110 (52,4) | 100 (47,6) | 210 (100) | |||
Tipo de escola | ||||||
Particular | 29 (63,0) | 17 (37,0) | 46 (100) | 0,165 ** | 1,550 (0,832-2,886) | |
Pública | 284 (52,4) | 258 (47,6) | 542 (100) | |||
Maconha | ||||||
Renda familiar | ||||||
< 3 salários | 434 (98,2) | 8 (1,8) | 442 (100) | 0,341 ** | 0,377 (0,047-3,038) | |
≥ 3 salários | 144 (99,3) | 1 (0,7) | 145 (100) | |||
Escolaridade materna | ||||||
> 8 anos | 371 (98,7) | 5 (1,3) | 376 (100) | 0,587 ** | 1,441 (0,383-5,625) | |
< 8 anos | 206 (98,1) | 4 (1,9) | 210 (100) | |||
Tipo de escola | ||||||
Particular | 46 (100) | 0 (0) | 46 (100) | 1,000 ** | 1,017 (1,006-1,028) | |
Pública | 533 (98,3) | 9 (1,7) | 542 (100) | |||
Inalantes | ||||||
Renda familiar | ||||||
< 3 salários | 434 (98,2) | 8 (1,8) | 442 (100) | 1,00 ** | 0,759 (0,159-3,614) | |
≥ 3 salários | 143 (98,6) | 2 (1,4) | 145 (100) | |||
Escolaridade materna | ||||||
> 8 anos | 370 (98,4) | 6 (1,6) | 376 (100) | 0,751 ** | 1,197 (0,334-4,292) | |
< 8 anos | 206 (98,1) | 4 (1,9) | 210 (100) | |||
Tipo de escola | ||||||
Particular | 46 (100) | 1 (0) | 46 (100) | 0,353 ** | 1,019 (1,007-1,031) | |
Pública | 532 (98,2) | 10 (1,8) | 542 (100) |
*Teste do Qui-quadrado de Pearson;
** Teste Exato de Fisher; OR = Odds Ratio; IC = Intervalo de Confiança
Segundo a OMS 1 , o álcool é a substância psicoativa mais consumida no mundo e é a droga de escolha entre crianças e adolescentes. Apesar da proibição da venda de bebidas alcoólicas a menores de idade, bem como do seu consumo por esse grupo etário (Lei nº 9.294, 15 de julho de 1996), o consumo de álcool entre os jovens no Brasil continua a ser uma prática comum. A prevalência do uso de álcool na vida foi alta no presente estudo (45,6%). Prevalência semelhante utilizando a mesma metodologia foi reportada em outro estudo brasileiro, porém se faz necessário salientar a idade superior dos participantes 26 . Também a Pesquisa Nacional sobre o Consumo de Drogas Psicotrópicas, que envolveu estudantes do ensino fundamental e médio, observou uma prevalência de 41,2% de consumo de bebida alcoólica 27 . Levantamentos internacionais relatam taxas de prevalência de consumo de bebidas alcoólicas variando entre 3,9 e 51,6% 13 . A sociedade tem adotado atitudes paradoxais diante do tema: por um lado, condena o uso de álcool pelos jovens, mas, por outro, é permissiva ao estímulo do consumo por meio da propaganda publicitária 28 . Abbey 21 reforça ainda que, por ser o álcool fartamente propagandeado e de fácil acesso, isso se reflete em seu consumo precoce e disseminado. Estudos têm reportado a associação positiva entre a idade de primeiro consumo e abuso ou dependência na adolescência e a tendência a aumentar na idade adulta, enfatizado a importância de se avaliarem os padrões de consumo o mais precocemente entre os adolescentes 29,30 . Um estudo de coorte com adolescentes entre 13-17 anos atendidos no hospital da Alemanha por embriaguez e novamente abordados em período de seis meses avaliaram violência, uso de maconha, consumo de álcool, problemas escolares, depressão e comportamento suicida. Foi observado um risco significativamente maior entre estar embriagado e usar maconha, beber em “binge”, ser expulso da escola e ter comportamento delinquente, com destaque para prisão, participar de gangues e praticar atos violentos 27 . Os resultados reportados na população alemã mostram a necessidade de investigações em jovens para conhecer os fatores de risco para experimentação de substâncias e adoção de medidas que previnam ou adiem o contato com as drogas.
A maconha é a droga ilícita mais consumida em todo do mundo 15 . Um estudo reporta que quase 4,5% de todos os adultos a consomem a cada ano na Alemanha. Cerca de 9% de todos os consumidores de maconha se tornam dependentes em algum momento de suas vidas 24 . Essa taxa sobe para 17% naqueles que começaram a usar maconha na adolescência. Vários estudos também demonstraram uma ligação entre a precocidade e regularidade do uso da maconha e o estímulo do uso de outras drogas ilegais ou álcool 29 , o gateway, ou seja, a noção de que o uso de maconha leve ao uso de outras substâncias. Neste estudo, a prevalência de consumo de maconha foi de 1,5%, um valor elevado considerando a idade dos adolescentes participantes (12 anos).
Várias condições sistêmicas podem advir do consumo de maconha: a idade, a dose, a frequência e a situação de uso, a modalidade do usuário e a disposição individual. Esses fatores predispõem a consequências, como ataques de pânico, sintomas psicóticos, déficit de atenção, incapacidade de concentração e comprometimento motor 30 . O consumo precoce de maconha na adolescência ainda está associado ao desenvolvimento de dependência da substância. Em recente revisão sistemática da literatura, os autores ressaltaram a necessidade de mais investigações para elucidar as relações entre o uso de maconha e os potenciais danos físico e mental associados à locomoção, à aprendizagem e à memória 31 .
A prevalência do uso de maconha se mostrou maior entre os adolescentes do sexo masculino, e essa diferença foi estatisticamente significante. Estudos realizados em diferentes contextos 4,5,9,32 corroboram os resultados aqui apresentados, porém tais comparações devem ser estabelecidas com cautela, em virtude das particularidades socioeconômicas, culturais e ambientais de cada população e região estudada 32,33 .
Os adolescentes estudados tiveram uma menor experiência de uso de tabaco em relação a outros estudos 12,24,32 , o que sugere que as práticas adotadas nacionalmente de esclarecimento e de prevenção a esse uso estejam sendo efetivas.
Inalantes são substâncias psicotrópicas com elevada prevalência de utilização na população. Essas substâncias são facilmente obtidas e de custo relativamente baixo, podendo causar dependência, danos cerebrais, problemas cardíacos, hepáticos, renais, sociais, violência e vandalismo 34 . A prevalência do uso de inalantes entre adolescentes na cidade de Belo Horizonte nas idades entre 14 e 17 anos foi de 7,9% e foi positivamente associada ao uso de maconha e ao consumo excessivo de álcool 18 . A literatura reporta que adolescentes que usaram inalantes tendem a utilizar drogas mais pesadas 34 , motivo para que intervenções preventivas sejam voltadas precocemente. No presente estudo, a prevalência de inalantes foi apenas de 1,7%, talvez explicada pela faixa etária estudada. Ainda assim, não se deve negligenciar o ambiente escolar onde o estudo foi realizado, pois se trata do local em que esses adolescentes teriam mais acesso a informações e, provavelmente, melhores condições de vida do que os evadidos do sistema educacional 35 .
O presente estudo não observou associação entre o consumo de drogas com a condição socioeconômica. Resultados contraditórios são reportados na literatura: em algumas populações, o maior consumo ocorreu entre os de maior renda 25 e, em outras, entre os menos favorecidos 36 , ou ainda não foi observada associação 26,37 . A grande discrepância nos resultados dos estudos avaliados poderia ser explicada pela falta de padronização em relação às metodologias utilizadas e à variabilidade de índices e de análises empregadas 38 .
O estudo em uma idade precoce da adolescência sugere que ações devam ser implantadas para prevenção do uso de drogas. Esses resultados dão suporte à recomendação da aplicação de medidas educativas e preventivas antes do início da adolescência pelos programas de prevenção. A OMS salienta que deveria ser definida uma idade mínima para comprar e consumir bebidas alcoólicas, o que poderia ser uma estratégia para reduzir o uso nocivo e impedir a experimentação de outras drogas 13 .
Os resultados do presente estudo sugerem que medidas de promoção e de controle sejam implantadas, visando, principalmente, aos fatores comportamentais, enfatizando aquelas que desestimulem o uso de substâncias ilícitas, sobretudo na adolescência, fase de intensa vulnerabilidade. Tal vulnerabilidade se deve às intensas transformações que ocorrem na fase de transição entre a infância e a vida adulta, marcada por instabilidade emocional, sendo um período crítico para o desenvolvimento de competências pessoais e interpessoais e para a aquisição de habilidades, na qual é consubstanciada à personalidade 7 .
Algumas limitações metodológicas neste estudo devem ser consideradas. Medo ou constrangimento em responder aos questionários quanto ao uso de drogas ilícitas pode ter ocorrido. Além disso, a abordagem não abrangeu os indivíduos que foram excluídos ou que se evadiram da escola; e mais, houve a impossibilidade de realização de análise estatística mais complexa com base no tamanho de casos presentes na amostra estudada. Por se tratar de um estudo transversal, uma relação de causalidade não pode ser determinada, sugerindo a necessidade de estudos longitudinais.
A prevalência do consumo de bebidas alcoólicas e de consumo de maconha foi elevada, considerando a idade investigada. Associação estatística foi observada entre o uso de drogas e o sexo masculino.