versão impressa ISSN 1414-462Xversão On-line ISSN 2358-291X
Cad. saúde colet. vol.27 no.2 Rio de Janeiro abr./jun. 2019 Epub 27-Jun-2019
http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x201900020289
The main recommendation for the control of rabies in humans is the prophylactic vaccination.
Considering the endemicity of rabies in Brazil and the direction of control actions, it was aimed to characterize the temporal trend of post-exposure human anti-rabies in Ceará from 2007 to 2015.
The study is ecological with a temporal trend and analytical. The data of the anti-rabies data sheets were organized into spreadsheets and the annual prevalence coefficients were calculated.
There were 231,694 rabies treatments, with prevalence coefficients increasing from 2007 to 2011 (35.09 per 10,000 inhabitants, APC = 13.5, p <0.001) and apex in 2015 (40.35 per 10,000 inhabitants, APC = 5, 5, p = 0.005). There was an increase in the age group of 20 to 59 years old (APC = 14.0, p <0.001), and urban residents (APC = 7.0, p <0.001). The canine species showed an increasing trend from 2007 to 2011 (APC = 14.3, p <0.001). Of the notifications, 95.8% presented inadequate behaviors, with an increase in the prevalence coefficients from 2007 to 2011 (APC = 13.6, p <0.001).
Inadequate prophylactic behaviors occurred more than 2007 to 2011. The temporal analysis, with an increasing trend in the analyzed period, should be used as a continuous component of the rabies surveillance actions in Ceará, for adequate and safe assistance to the patients who are victims of animal aggression.
Keywords: post-exposure prophylaxis; rabies; temporal distribution; prevalence
A raiva é uma antropozoonose transmitida ao homem pela inoculação do vírus rábico presente na saliva e em secreções de mamíferos infectados, principalmente por meio da mordedura1. Esta enfermidade acomete o Sistema Nervoso Central (SNC), tem como principal característica uma encefalomielite viral aguda de caráter progressivo2 de alta letalidade e representa um problema de saúde pública em todo o mundo3.
Estima-se que mais de 60 mil pessoas morrem devido à raiva no mundo a cada ano, enquanto aproximadamente 15 milhões de pessoas são submetidas à profilaxia antirrábica pós-exposição4.
Pesquisas sobre a situação epidemiológica da raiva nas Américas revelaram que o número de casos novos em humanos reduziu de 319, no ano de 1982, para 35 no ano de 2003, assim como os casos caninos, com 6.716 notificações em 1993 e 1.311 em 2002, mostrando um decréscimo significativo no número de casos humanos e caninos5.
No entanto, mais de 425 mil pessoas procuraram atendimento médico entre os anos de 1990 e 2009 no Brasil, por terem sido expostas ou por se julgarem expostas ao vírus da raiva, e 64,0% delas receberam esquema de profilaxia pós-exposição6. No período de 2009 a 2013, foram registradas quase 3 milhões de notificações de atendimento antirrábico no Brasil, sendo as regiões Sudeste e Nordeste responsáveis por 98,8% dessas notificações1.
Em virtude do elevado número de casos de raiva humana transmitidos principalmente por cães nas décadas de 1950 e 1960, estados e municípios do Brasil desenvolveram atividades e regulamentações direcionadas ao controle dessa zoonose, incluindo campanhas periódicas de vacinação antirrábica em cães e gatos3.
No Ceará, o último caso de raiva humana aconteceu em um agricultor agredido por morcego hematófago, que evoluiu para óbito em novembro de 2016, no município de Iracema, localizado na região centro-leste do estado (latitude: -5.80, longitude: -38.30), distando 285 km da capital Fortaleza7.
A principal recomendação para controle da raiva em humanos é a vacinação profilática em casos de exposição a animais doentes ou suspeitos de doença. O tratamento antirrábico pós-exposição consiste em condutas que vão da simples lavagem do local da agressão, com água e sabão (sem tratamento medicamentoso), até o tratamento completo, com soro e vacina8.
Para a indicação do tratamento adequado, são consideradas características como local, profundidade e extensão do ferimento gerado pela agressão. O animal envolvido no acidente também deve ser identificado, uma vez que cada espécie possui características epidemiológicas, susceptibilidade, sintomatologia e potencial de disseminação diferente para o vírus rábico6.
A instituição de profilaxia pós-exposição deve ser adequada mediante anamnese completa e criteriosa do caso, com anotação de todos os dados necessários na ficha do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), seguindo as Normas Técnicas de Profilaxia Antirrábica Humana para indicação correta do tratamento9. Os casos suspeitos de raiva humana devem ser notificados compulsória e imediatamente por meio da Ficha de Investigação da Raiva Humana10,11.
Os dados epidemiológicos são essenciais tanto para os médicos, na decisão do tratamento profilático pós-exposição a ser instituído, como para os veterinários, na observação clínica e adoção de medidas relativas ao animal agressor. A vigilância epidemiológica é, portanto, fundamental para o controle da raiva12.
Quanto ao perfil epidemiológico dos atendimentos antirrábicos no Ceará, de 2007 a 2015, a espécie agressora predominante foi a canina (70,0%) e o tipo predominante de tratamento foi a observação do animal agressor e vacina (49,9%)13.
Considerando-se a endemicidade da raiva no Brasil, a prevenção por meio da vacinação profilática de humanos e o direcionamento das ações efetivas para seu controle, buscou-se caracterizar a tendência temporal dos atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição no estado do Ceará, no período de 2007 a 2015.
Realizou-se um estudo ecológico de tendência temporal com abordagem exploratória, baseado em dados secundários do período de 1o janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2015, por meio de informações das fichas de investigação de atendimentos antirrábicos humanos registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do setor de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do estado do Ceará.
O estado do Ceará está situado na região Nordeste do Brasil, delimitado a norte pelo Oceano Atlântico, a oeste pelo estado do Piauí, a leste pelos estados do Rio Grande do Norte e Paraíba, e a sul pelo estado de Pernambuco. Tem uma população de quase 9 milhões de habitantes, e uma área de aproximadamente 149 mil km2, dividida em 184 municípios14.
Para possibilitar as análises de tendência, foram calculados coeficientes anuais de prevalência dos atendimentos, que foram considerados variáveis dependentes, sendo os anos do período de estudo as variáveis independentes, identificando-se o melhor ajuste entre os pontos.
Este indicador foi estratificado nas variáveis sociodemográficas: faixa etária (0 a 19 anos, 20 a 59 anos, acima de 60 anos); sexo (masculino, feminino) e zona de residência (urbana, rural e periurbana); estratificou-se, também, de acordo com características do animal agressor: espécie (canina, felina, quiróptera e outras espécies) e condição do animal (sadio, suspeito, raivoso, morto/desaparecido). Outro grupo de variáveis utilizadas para estratificação do indicador foi: apresentação do ferimento (único, múltiplo, sem ferimento); tipo de tratamento profilático indicado (observação, observação e vacina, vacina, soro e vacina, outros tratamentos: pré-exposição, dispensa do tratamento, esquema de reexposição); e conduta profilática adotada, classificada como inadequada.
As faixas etárias das pessoas foram divididas de acordo com os estágios de desenvolvimento humano, baseadas no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Organização Mundial da Saúde.
Considerando-se as Normas Técnicas de Profilaxia da Raiva Humana, do Ministério da Saúde do Brasil11, a conduta foi considerada inadequada quando não garantiu evitar o risco de contrair raiva, com uso impróprio de vacina/soro, ou quando o número de doses não foi compatível com os tratamentos oficiais, conforme as características da exposição; ou, ainda, quando os dados foram insuficientes: variáveis em branco/ignorado ou preenchidas em discordância com o protocolo15. A definição de conduta inadequada foi descrita com detalhes anteriormente16.
Os coeficientes de prevalência dos atendimentos antirrábicos humanos foram padronizados pelo método direto, tendo o censo demográfico do IBGE de 2010 como população padrão do Ceará. Para o cálculo dos coeficientes de prevalência de 2007 a 2015, utilizou-se como denominador a população residente de cada ano estimada pelo IBGE, proveniente do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde – DATASUS14.
As análises das tendências dos indicadores foram realizadas por meio de modelos de regressão log-linear segmentada, utilizando-se o Joinpoint Regression Program versão 4.0.4 (US National Cancer Institute, Bethesda, MD, EUA), fornecido pelo Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, com acesso gratuito (http://surveillance.cancer.gov/joinpoint/). Este programa estima a variação anual percentual (Annual Percent Change – APC) de uma regressão linear segmentada (joinpoint regression) e identifica pontos de inflexão. Cada ponto de inflexão reflete as alterações no incremento ou no declínio dos coeficientes de prevalência dos atendimentos antirrábicos. Para escolha dos modelos, foram considerados os pontos de alteração da tendência que apresentaram nível de significância estatística inferior a 5%.
Essa análise permite o ajuste de dados de uma série a partir do menor número possível de joinpoints (zero, ou seja, uma reta sem pontos de inflexão) e testa se a inclusão de um ou mais joinpoints (até três) no modelo se tornava estatisticamente significativa. Assim, esse método testa se vários segmentos de reta explicam melhor uma tendência no tempo do que uma reta única, indicando que cada joinpoint representa uma mudança na queda ou no aumento da tendência17.
A significância estatística foi testada por meio do modelo de Poisson com o teste de permutação de Monte Carlo, que escolhe o melhor segmento para cada modelo.
O estudo foi submetido à Plataforma Brasil, com apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará, sob CAAE nº 64830316.0.0000.5054. O estudo foi baseado em dados secundários acessíveis ao público e sem identificação dos indivíduos.
No período de 2007 a 2015, foram registrados 231.694 atendimentos antirrábicos humanos no estado do Ceará, apresentando média de 29.702 ao ano. Observou-se que os coeficientes de prevalência de atendimentos tiveram um crescimento significativo e quase constante no intervalo temporal de 2007 a 2011 (35,09 atendimentos por 10.000 habitantes; APC=13,5; IC95%: 9,6 a 17,4; p<0,001). A partir de 2011, notou-se uma segunda elevação significativo, tendo ápice em 2015, com 35.928 notificações (40,35 atendimentos por 10.000 habitantes; APC=5,5; IC95%: 2,7 a 8,3; p=0,005) (Figura 1).
Figura 1 Coeficientes de prevalência de atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição por ano, Ceará, 2007-2015
As características demográficas predominantes foram: faixa etária de 20 a 59 anos (104.221; 45,0%), sexo masculino (123.636; 53,4%) e residência na zona urbana (149.698; 70,0%) (Tabela 1).
Tabela 1 Análise de tendência temporal dos atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição segundo características sociodemográficas, Ceará, 2007-2015 (N=231.694)
Variável | APC*1 | IC95%** | p valor | APC* 2 | IC95%** | p valor | Gráficos |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Sexo (n) | |||||||
Masculino (123.636) | 2007-2012 | 2012-2015 |
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||||
11,6 | 3,0 a 20,9 | 0,019 | 3,2 | -12,4 a 21,7 | 0,619 | ||
Feminino (108.043) | 2007-2012 | 2012-2015 |
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||||
14,3 | 11,1 a 17,6 | <0,001 | 6,0 | 3,7 a 8,4 | 0,002 | ||
Faixa etária (anos) | |||||||
0 a 19 (87.527) | 2007-2015 |
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|||||
8,6 | 5,5 a 11,8 | <0,001 | - | - | - | ||
20 a 59 (104.221) | 2007-2011 | 2011-2015 |
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||||
14,0 | 10,0 a 18,1 | <0,001 | 6,1 | 3,3 a 9,1 | 0,004 | ||
60 e mais (35.408) | 2007-2015 |
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|||||
8,7 | 5,7 a 11,7 | <0,001 | - | - | - | ||
Zona de residência | |||||||
Urbana (149.698) | 2007-2015 |
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|||||
7,0 | 1,2 a 9,7 | <0,001 | - | - | - | ||
Rural (62.142) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
-4,7 | -6,3 a -3,0 | 0,002 | - | - | - | ||
Periurbana (2.106) | 2007-2012 | 2012-2015 |
![]() |
||||
6,9 | -5,3 a 20,7 | 0,199 | -16,0 | -37,0 a 12,5 | 0,173 |
*APC: Average Percentual Change – Variação Percentual Média;
**IC95%: Intervalo de Confiança de 95%
Houve uma tendência de aumento com significância estatística dos 20 aos 59 anos de idade, apresentando inflexão no ano de 2011 (APC=14,0; IC95%: 10,0 a 18,1; p<0,001). Embora o sexo masculino tenha apresentado uma frequência maior de atendimentos antirrábicos (123.636; 53,4%), foi possível identificar que o sexo feminino teve uma tendência crescente com significância estatística e maiores APCs nos períodos de 2007 a 2011 (APC=14,3; IC95%: 11,1 a 17,6; p<0,001) e de 2011 a 2015 (APC=6,0; IC95%: 3,7 a 8,4; p=0,002) (Tabela 1).
A zona urbana, além de concentrar maior frequência de atendimentos antirrábicos humanos, apresentou tendência crescente com significância estatística no período de 2007 a 2015 (APC=7,0; IC95%: 1,2 a 9,7; p<0,001). Neste mesmo intervalo temporal, a zona rural apresentou uma queda significativa sem inflexão (APC=-4,7; IC95%: -6,3 a -3,0; p=0,002) (Tabela 1).
A espécie canina foi a mais frequentemente relacionada às agressões dos atendimentos antirrábicos humanos no Ceará (162.243; 70,0%), apresentando crescimentos com significância estatística nos períodos de 2007 a 2011 (APC=14,3; IC95%: 10,0 a 18,7; p<0,001) e de 2011 a 2015 (APC=3,3; IC95%: 0,2 a 6,4; p=0,042). Outras espécies, como primatas não humanos, raposas e herbívoros domésticos, também apresentaram uma alta variação percentual média de 2007 a 2015 (APC=11,8; IC95%: 6,1 a 17,7; p<0,001) (Tabela 2).
Tabela 2 Análise de tendência temporal dos atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição segundo espécie do animal agressor e tipo de ferimento, Ceará, 2007-2015 (N=231.694)
Indicador/ variável | APC*1 | IC95%** | p valor | APC* 2 | IC95%** | p valor | Gráficos |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Espécie do animal agressor | |||||||
Canina (162.243) | 2007-2011 | 2011-2015 |
![]() |
||||
14,3 | 10,0 a 18,7 | <0,001 | 3,3 | 0,2 a 6,4 | 0,042 | ||
Felina (54.922) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
10,7 | 6,4 a 15,2 | <0,001 | - | - | - | ||
Quiróptera (1.131) | 2007-2012 | 2012-2015 |
![]() |
||||
10,3 | 6,1 a 25,2 | 0,009 | -8,9 | -27,2 a 13,9 | 0,310 | ||
Outras espécies (13.305)*** | 2007-2015 |
![]() |
|||||
11,8 | 6,1 a 17,7 | <0,001 | - | - | - | ||
Condição do animal | |||||||
Sadio (8.190) | 2007-2013 | 2013-2015 |
![]() |
||||
11,3 | 4,5 a 14,9 | 0,006 | -5,1 | -32,4 a 33,2 | 0,692 | ||
Suspeito (1.391) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
8,9 | 8,1 a 16,8 | <0,001 | - | - | - | ||
Raivoso (20) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
-1,2 | -3,5 a 1,1 | 0,260 | - | - | - | ||
Morto/ Desaparecido (32) | 2007-2015 |
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|||||
6,8 | 3,0 a 10,7 | 0,003 | - | - | - | ||
Ferimento | |||||||
Único (129.788) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
-1,8 | -3,3 a -0,3 | 0,027 | - | - | - | ||
Múltiplo (78.338) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
-2,3 | -5,4 a 1,0 | 0,144 | - | - | - | ||
Sem ferimento (1.249) | 2007-2015 |
![]() |
|||||
7,3 | 3,6 a 8,6 | 0,003 | - | - | - |
*APC: Average Percentual Change – Variação Percentual Média;
**IC95%: Intervalo de Confiança de 95%;
***Outras espécies: Primatas não humanos; raposas; herbívoros domésticos
O animal na condição clínica sadia apresentou a maior frequência de atendimentos antirrábicos (8.190; 85,0%) e uma leve tendência de crescimento significativo no intervalo de 2007 a 2013 (APC=11,3; IC95%: 4,5 a 14,9; p=0,006). De 2013 a 2015, mostrou uma queda não significante (APC=-5,1; IC95%: -32,4 a 33,2; p=0,692) (Tabela 2).
Embora o ferimento único tenha apresentado frequência maior de atendimentos antirrábicos (129.788; 60,2%), durante o período de 2007 a 2015 só houve um leve incremento significante dos coeficientes de prevalência nos casos sem ferimento (APC=7,3; IC95%: 3,6 a 8,6; p=0,003) (Tabela 2).
Os tratamentos predominantes foram: observação juntamente com vacina (111.987 notificações; 49,9%) e somente vacina (64.100; 28,6%). Entretanto, apenas o segundo mostrou crescimento estatisticamente significante durante o período do presente estudo (APC=9,4; IC95%: 4,3 a 14,8; p<0,001). O tratamento com soro e vacina apresentou crescimento significativo no intervalo de 2007 a 2012 (APC=9,0; IC95%: 6,0 a 12,0; p=0,007) e declínio não significativo a partir de 2012 (APC=-11,9; IC95%: -21,8 a -0,8; p=0,061). Para os outros tipos de tratamento (pré-exposição; dispensa do tratamento; esquema de reexposição), observou-se tendência de declínio, sem inflexões (APC=-19,6; IC95%: -25,6 a -13,2; p<0,001) (Tabela 3).
Tabela 3 Análise de tendência temporal dos atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição segundo tratamento indicado e classificação da conduta, Ceará, 2007 - 2015 (N=231.694)
Indicador/ variável | APC*1 | IC95%** | p valor | APC* 2 | IC95%** | p valor | Gráficos |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Tratamento indicado | |||||||
Observação (14.438) | 2007-2010 | 2010-2015 |
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||||
3,8 | -14,0 a 25,1 | 0,614 | -18,3 | -27,0 a -8,6 | 0,008 | ||
Observação + vacina (111.987) | 2007-2015 |
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|||||
-1,2 | -2,5 a 0,1 | 0,066 | - | - | - | ||
Vacina (64.100) | 2007-2015 |
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|||||
9,4 | 4,3 a 14,8 | <0,001 | - | - | - | ||
Soro + vacina (26.288) | 2007-2012 | 2012-2015 |
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||||
9,0 | 6,0 a 12,0 | 0,007 | -11,9 | -21,8 a -0,8 | 0,061 | ||
Outros tratamentos (7.483)*** | 2007-2015 |
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|||||
-19,6 | -25,6 a -13,2 | <0,001 | - | - | - | ||
Classificação da conduta | |||||||
Conduta inadequada (222.036) | 2007-2011 | 2011-2015 |
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||||
13,6 | 9,4 a 18,1 | <0,001 | 5,4 | 2,4 a 8,6 | 0,008 |
*APC: Average Percentual Change – Variação Percentual Média;
**IC95%: Intervalo de Confiança de 95%;
***Outros tratamentos: Pré-exposição; dispensa do tratamento; esquema de reexposição
Foram notificados 222.036 (95,83%) atendimentos antirrábicos pós-exposição com condutas inadequadas no período de 2007 a 2015, porém com maior variação percentual média nos coeficientes de prevalência dos atendimentos antirrábicos humanos de 2007 a 2011 (APC=13,6; IC 95%: 9,4 a 18,1; p<0,001) (Tabela 3).
O presente estudo evidenciou um aumento estatisticamente significativo nos coeficientes de prevalência de condutas inadequadas dos tratamentos antirrábicos humanos pós-exposição no período de 2007 a 2011. Os altos percentuais na indicação profilática de fichas com condutas inadequadas e com animais passíveis de observação apontam a necessidade de reavaliação do programa de atendimento antirrábico no estado do Ceará, buscando maior qualificação dos serviços de vigilância em saúde no controle da doença, de forma que as condutas garantam segurança ao profissional e proteção ao paciente com adoção racional no uso de imunobiológicos, conforme protocolo do Ministério da Saúde.
Ademais, registraram-se maiores coeficientes de prevalência de atendimentos antirrábicos humanos pós-exposição nos anos de 2011 e 2015. A elevação no número de atendimentos antirrábicos humanos do Ceará foi semelhante à observada nos anos de 2009 a 2013 no Brasil, com notificação de aproximadamente 3 milhões de atendimentos antirrábicos humanos18.
Observou-se homogeneidade na distribuição dos casos segundo o sexo, mas com leve aumento no sexo feminino ao longo do tempo, e da mesma forma que em outros estudos similares houve predominância de atendimentos em indivíduos do sexo masculino1,5,13,19,20.
Os adultos entre 20 e 59 anos de idade foram os mais acometidos9,21, faixa etária também mais frequente em pesquisa realizada de 2010 a 2012 no estado de Pernambuco5. Devido ao cuidado com animais domésticos e movimentação por vias públicas, é possível que os adultos estejam mais suscetíveis a tais agressões em suas atividades diárias em casa, no lazer ou mesmo no trabalho.
A zona urbana concentrou a maior quantidade de atendimentos no período analisado. Fato preocupante pelo problema de saúde pública gerado, uma vez que o grande número de animais domésticos aumenta a possibilidade de agressão, além de gerar abandonos dos animais, descuido e possível transmissão de doenças22,23. Vale ressaltar, ainda, a possibilidade da subnotificação dos casos na população rural, já que o convívio cotidiano com os animais, fatores culturais e a dificuldade de acesso aos serviços de saúde por parte dos indivíduos podem limitar a notificação de casos de pessoas que se expõem às agressões24.
A espécie canina apresentou uma tendência temporal crescente de atendimentos antirrábicos humanos. Em séries históricas analisadas no agreste pernambucano, de 2010 a 20125, e no município de Caçapava do Sul, Rio Grande do Sul, de 2007 a 2013, também prevaleceu a espécie canina, tendo a maior prevalência de acidentes no ano de 2008, e a menor em 201225. Essas ocorrências de agressões caninas se repetem em outros estudos desenvolvidos, confirmando que a mordedura canina é motivo de grande preocupação devido à possibilidade de transmissão de zoonoses e desenvolvimento de infecções secundárias26.
A espécie canina é considerada a principal transmissora da raiva na maioria dos países em desenvolvimento. Embora a evidência demonstre que o controle da raiva canina por meio de programas de imunização em animais e a eliminação de cães errantes possam reduzir a prevalência em humanos, a exposição aos cães raivosos é ainda a causa de mais de 90% das exposições à raiva e de 99% dos óbitos pela doença em pessoas no mundo27.
As questões envolvendo acidentes com animais transmissores da raiva não podem ser ignoradas e merecem atenção especial pelo serviço de vigilância em saúde, a fim de diminuir a incidência desses acidentes. Nesse sentido, há estudos que destacam a importância das ações de educação em saúde, baseando-se no estímulo à posse responsável de animais6,9.
Neste trabalho, a maioria dos animais envolvidos foi considerada sadia, com crescimento nos coeficientes de incidência até o ano de 2013, fato também observado em 2017 no estado de Pernambuco26,28. Vale salientar a importância e a necessidade de avaliação da condição clínica do animal durante a anamnese do paciente agredido, para que a conduta profilática seja prescrita de maneira adequada, e para evitar a aplicação desnecessária de imunobiológicos, os quais podem of