versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.21 no.11 Rio de Janeiro nov. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320152111.15562015
O avanço da medicina e da tecnologia tem ocasionado um prolongamento da vida do ser humano, e aliado à diminuição das taxas de fecundidade e mortalidade, um crescimento da população idosa brasileira. Apesar de este fenômeno supor um ganho da sociedade, também representa um importante desafio se os anos de vida adicionais não forem vividos em condições de saúde adequadas1.
A saúde é primordial para garantir independência, autonomia e, principalmente, uma continuidade e contribuição dos idosos à sociedade. Principalmente com o decorrer da idade, os problemas de saúde se tornam mais evidentes, tornando assim, na maioria das vezes, a percepção de saúde referida de forma negativa, interferindo desse modo no bem-estar relatado pelos idosos2.
A busca por uma percepção de saúde satisfatória está ligada com aspectos sociodemográficos, econômicos, culturais, psicológicos e ainda com a capacidade física. Entretanto, há uma discrepância na mensuração desta, em decorrência dos diferentes contextos em que a população está inserida. Um dos mecanismos de aferir esses aspectos é a autopercepção da saúde, a qual pode ser mensurada por avaliações feitas pelos próprios indivíduos e/ou morbidade referida.
Existem fortes evidências de que a saúde percebida é um excelente preditor da objetiva, ou seja, do número de doenças crônicas, grau de incapacidade funcional e depressão, que resulta em uma conjectura da mortalidade na população idosa3. Além disso, aspectos sociodemográficos como a idade, o sexo, o nível de escolaridade e a renda são alguns dos fatores associados à percepção de saúde encontrados na literatura2. Assim, os homens possuem uma capacidade maior de transformar doença física em sofrimento emocional, se comparado com as mulheres, enquanto que, no geral, as mulheres relatam sua saúde como ruim com mais recorrência que os homens4,5. Ainda, indivíduos que consideram sua saúde como ruim apresentam um risco aumentado de hospitalização, institucionalização e de mortalidade, comparando-se com aqueles que referem ter uma saúde excelente2,6,7.
Existem escassos estudos sobre a autoavaliação da saúde na América Latina, especialmente em idosos institucionalizados8. Contudo, é importante aprimorar o conhecimento sobre os aspectos envolvidos na autoavaliação da saúde, podendo então identificar áreas e/ou subgrupos mais vulneráveis de idosos, bem como contribuir à formulação de programas de promoção da saúde. Assim, o objetivo deste trabalho é verificar a autopercepção da saúde em idosos institucionalizados, e também os fatores associados à percepção ruim da saúde.
Trata-se de um estudo do tipo transversal, desenvolvido em 10 (71,4%) das 14 instituições de longa permanência para idosos (ILPI) cadastradas na Vigilância Sanitária (VISA) do município de Natal-RN (Brasil), das quais 5 são instituições privadas e 5 sem fins lucrativos (não constam ILPI de âmbito público). As outras 4 (28,6%) ILPI recusaram participar na pesquisa. A amostra foi coletada a partir dos cadastros atualizados de idosos de cada instituição, sendo incluídos no estudo todos os indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos que estavam presentes nas instituições durante o período de realização da pesquisa. Os idosos que não se encontravam na ILPI por internação hospitalar, bem como aqueles residentes em estado terminal ou sem capacidade cognitiva suficiente para responder questionários, foram excluídos do estudo.
Os dados foram coletados no período de outubro a dezembro de 2013 e foi realizado um estudo piloto em 25 idosos da primeira ILPI estudada. Os questionários foram aplicados por pesquisadores previamente treinados, que assistiram a reuniões dos membros da equipe. A autopercepção da saúde se avaliou mediante a pergunta “como o (a) senhor (a) consideraria seu estado de saúde atual? ”. A variável dependente do estudo foi dicotomizada: percepção boa (categorias “excelente” e “boa”) e ruim (categorias “regular”, “ruim” e “muito ruim”)4,9.
Para cada indivíduo foram aferidas informações sobre condições sociodemográficas (idade, sexo, raça, escolaridade, estado civil, filhos, tipo de ILPI, tempo e motivo de institucionalização, ocupações no tempo livre, aposentadoria, administração do dinheiro, plano de saúde e relação do número de idosos por cuidador) e estado de saúde (doenças crônicas, uso diário de fármacos, consumo de tabaco e álcool, prática e nível de atividade física, exaustão, índice de massa corporal, perda de peso, presença de incontinência urinária e fecal, estado de mobilidade, capacidade funcional e cognitiva). As doenças analisadas foram: hipertensão arterial, diabetes, câncer, doença pulmonar, acidente cerebrovascular, demência (incluída a doença de Alzheimer), doença de Parkinson, osteoporoses, insuficiência renal, doença cardiovascular, doença reumática, doença mental, depressão, dislipidemia e outras não especificadas. Tais informações foram obtidas nos prontuários ou foram fornecidas por funcionários das instituições (assistentes sociais, técnicos de enfermagem ou cuidadores).
A capacidade cognitiva foi analisada mediante o Teste de Pfeiffer, que avalia a memória a longo e curto prazo, orientação, informação sobre feitos cotidianos e capacidade matemática. Tal instrumento permite a classificação do idoso em função mental intacta, declínio cognitivo leve, moderado ou severo, levando em consideração a escolaridade do avaliado10. Já a presença/ausência de incapacidade funcional, foi considerada quando o indivíduo apresentava dependência para uma ou mais atividades básicas da vida diária (ABVD) do Índice de Katz11.
O índice da massa corporal (IMC) foi calculado a partir da relação do peso (em Kg) e da altura (em metros) ao quadrado. As medidas de peso e estatura foram mensuradas conforme as técnicas recomendadas pela World Health Organization (1995). Para a tomada de peso foi utilizada balança eletrônica da marca Tanita®, com capacidade de 150 kg e precisão de 100g. A estatura total foi obtida conforme a média de duas mensurações, com um estadiômetro portátil do tipo Altura exata (precisão de 1 mm). Para a classificação dos valores de IMC foi considerado o estabelecido no protocolo do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional – SISVAN (2008) para idosos: baixo peso ( < 22 kg/m2), eutrófico ( ≥ 22 e < 27 kg/m2) e sobrepeso ( ≥ 27 kg/m2)12. A perda involuntária de peso foi avaliada mediante a pergunta “no último ano, o senhor (a) perdeu mais de 4,5 kg ou 5% do peso sem intenção (isto é, sem dieta ou regime)?”13. Em caso de dúvidas ou quando o idoso ignorasse tal informação, foram interrogados os nutricionistas da instituição.
Utilizou-se a versão curta do International Physical Activity Questionnaire (IPAQ) para avaliar o nível de atividade física dos indivíduos. Trata-se de um instrumento adaptado transculturalmente e validado para a população idosa brasileira, que leva em consideração o tempo despendido na última semana, com duração mínima de 10 minutos contínuos, em três atividades: caminhada, atividades de intensidade moderada e vigorosa. A soma dos gastos energéticos (MET-minutos/semana) foram multiplicados pelo peso do idoso e dividido por 60 quilogramas. Os menores quintis destes resultados, estratificados por gênero, foram identificados e utilizados como ponto de corte para classificar o baixo nível de atividade física14.
O trabalho faz parte do projeto de pesquisa ‘Envelhecimento humano e saúde: a realidade dos idosos institucionalizados da cidade do Natal/RN’, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). A mesma instituição aprovou uma emenda ao projeto original para acrescentar o estudo de outras variáveis e a realização do presente estudo. Além disso, foi obrigatório o preenchimento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelo idoso ou seu tutor legal e pelo seu cuidador direto.
Inicialmente, realizou-se uma análise comparativa entre os grupos incluído e excluído, mediante o teste qui-quadrado e t de Student, assim como uma apresentação dos dados através da estatística descritiva do grupo participante. Em seguida, através da estatística inferencial, realizou-se a análise bivariada através do teste qui-quadrado (ou teste exato de Fisher) e do teste qui-quadrado de tendência linear. Foi verificada a magnitude da associação através da razão de prevalência para cada uma das variáveis independentes em relação à variável dependente, a um nível de significância de 95%. As variáveis com valor de p menor que 0,225 foram analisadas mediante a regressão logística para a construção do modelo multivariado, mediante o método stepwise forward. A permanência da variável na análise múltipla deu-se através do teste da razão de verossimilhança (Likelihood Ratio Test), ausência de multicolinearidade, bem como sua capacidade de melhorar o modelo através do teste de Hosmer and Lemeshow. Fez-se a transformação de odds ratio a razão de prevalência segundo proposto por Miettinen e Cook15.
Do total de 350 residentes, 11 (3,1%) indivíduos recusaram responder o questionário, 1 (0,3%) era menor de 60 anos e foram excluídos 189 (54,0%) que não foram capazes de responder, 4 (1,1%) hospitalizados e 1 (0,3%) em fase terminal.
Em uma análise comparativa entre o grupo de indivíduos que não foram incluídos no estudo e aqueles que formaram parte da amostra selecionada, não houve diferenças estatisticamente significativas nas variáveis sociodemográficas, exceto que o grupo respondente possuía menor idade (p < 0,001): 79,4 anos (DP: 8,2) versus 82,8 anos (DP: 9,4). Quanto ao estado de saúde, observou-se que o grupo participante apresentou menor proporção de restrição de mobilidade (p < 0,001), sedentarismo (p < 0,001), dependência funcional (p < 0,001), incontinência urinária e fecal (p < 0,001) e de doenças neurológicas e psiquiátricas como o acidente vasculocerebral (p = 0,001), demência (p < 0,001) e doenças mentais (p = 0,011). No entanto, no grupo participante foi maior a frequência de hipertensão arterial (p < 0,001), diabetes (p = 0,011), câncer (p = 0,046), osteoporose (p = 0,013), doença reumática (p = 0,001), depressão (p = 0,022) e dislipidemia (p < 0,001). Quanto às variáveis quantitativas, os participantes tomavam maior número de medicamentos, 5,5 (DP: 3,1) versus 4,0 (DP: 2,6), possuíam maior número total de doenças crônicas, 2,7 (DP: 1,5) versus 2,2 (DP: 1,4), e apresentavam um maior IMC, 25,4 (DP: 6,7) versus 19,5 (DP: 6,8), sendo essas diferenças estatisticamente significativas (p ≤ 0,001) no teste t de Student. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto à ocorrência de quedas.
Sendo assim, a amostra total foi composta por 144 idosos, a maioria do sexo feminino (79,2%) e com média de idade de 79,4 (DP: 8,2). A maior parte dos residentes pertencia a instituições sem fins lucrativos (64,6%), era aposentada (91,7%) e não possuía plano de saúde (58,3%). Verificou-se que 80 (55,6%) idosos tinham filhos e o número médio de filhos foi de 1,9 (DP: 2,4). O tempo médio de residência foi de 57,3 meses (DP: 62,8) e existiam 7,1 residentes por cuidador (DP: 4,3) nas instituições. A maioria (97,2%) fazia uso de medicação, e o número médio de fármacos por idoso foi de 5,5 (DP: 3,1).
No que diz respeito ao estilo de vida, apenas 7 (4,9%) faziam uso de álcool, 13 (9,0%) eram fumantes, 37 (25,7%) ex-fumantes e 94 (65,3%) sedentários. Do total, 77 (53,5%) idosos tinham algum tipo de ocupação no tempo livre: 30 (20,8%) realizavam passeios, 25 (17,4%) atividades artesanais, 14 (9,7%) espirituais, 8 (5,6%) domésticas e 7 (4,9%) jogos. Além disso, 31 indivíduos (21,5%) realizavam outros tipos de atividades, entre as quais se incluía a terapia ocupacional.
Um total de 136 (94,4%) eram portadores de doenças crônicas. Especificamente, 92 (63,9%) hipertensão arterial, 47 (32,6%) diabetes, 34 (23,6%) dislipidemia, 29 (20,1%) doença mental, 28 (19,4%) demência (incluída a doença de Alzheimer), 23 (16,0%) osteoporose, 21 (14,6%) depressão, 18 (12,5%) doença cardiovascular, 17 (11,8%) doença reumática, 13 (9,0%) acidente vasculocerebral, 10 (6,9%) doença de Parkinson, 10 (6,9%) câncer, 9 (6,3%) doença pulmonar e 7 (4,9%) insuficiência renal. Foi verificado que 10 (6,9%) sofreram quedas durante os 30 dias prévios à avaliação, e 59 (41,0%) e 23 (16,0%) incontinência urinária e fecal, respectivamente.
Como mostra a Tabela 1, 36,8% dos indivíduos apresentava restrição do estado de mobilidade e 53,5% incapacidade funcional para uma ou mais atividades básicas da vida diária. A frequência de incapacidade cognitiva, segundo a escala de Pfeiffer, foi de 79,9%.
Tabela 1 Distribuição de frequência de variáveis sociodemográficas e de saúde dos idosos institucionalizados. Natal, RN, Brasil, 2015.
NA: não aplicável.
Do total da amostra, 10 (6,9%) consideraram o estado de saúde como excelente, 43 (29,9%) como bom, 56 (38,9%) regular, 23 (16,0%) ruim e 12 (8,3%) muito ruim. A prevalência de percepção negativa da saúde foi de 63,19% (IC 95%: 55,07-70,63). Na Tabela 2 consta a análise bivariada entre a percepção ruim da própria saúde e as variáveis independentes que obtiveram valor de p menor que 0,225 e não foram incluídas no modelo múltiplo.
Tabela 2 Análise bivariada entre a autopercepção negativa da saúde e as variáveis independentes em idosos institucionalizados da cidade do Natal/RN. Natal, RN, Brasil, 2015.
Nota: contém as variáveis idade e aquelas com valor de p menor que 0,225 que não foram incluídas no modelo final. * Teste qui-quadrado; † Teste Exato de Fisher; ‡ Teste qui-quadrado de tendência linear. Fonte: própria.
Por fim, a Tabela 3 mostra o modelo final, com valor do teste de Hosmer-Lemeshow de 0,920. Mediante a análise multivariada, foi verificado que a autopercepção negativa da saúde em idosos institucionalizados esteve associada à perda involuntária de peso durante o último ano (p = 0,001), doença reumática (p = 0,023) e ILPI sem fins lucrativos (p = 0,033), controlado por sexo (p = 0,216).
A análise descritiva deste trabalho mostra que aproximadamente 63% dos indivíduos analisados consideraram sua saúde como ruim. Como esperado, esta proporção é maior à encontrada em idosos brasileiros não institucionalizados, que varia entre 11 e 40%3,9,16,17, mas também superior à identificada em outros estudos realizados em idosos institucionalizados7,18,19. No único trabalho encontrado na literatura nacional, verificou-se que aproximadamente 51% dos residentes de ILPI de Pelotas (RS) avaliaram a própria saúde como ruim7. Já estudos internacionais também reportam taxas inferiores. Em uma pesquisa em idosos institucionalizados da China foi reportada uma prevalência de 53%18, enquanto que em uma amostra representativa de residentes de instituições em Madri (Espanha) essa proporção foi de 45%19.
Quanto ao critério metodológico para avaliar a percepção da saúde, diversos estudos têm dicotomizado essa variável, considerando a categoria regular/razoável e ruim2,4,7-9,17 ou regular, ruim e muito ruim18, como realizado neste trabalho. Já outros autores incluíram a categoria regular junto às categorias boa, muito boa/excelente3. Neste estudo decidiu-se incluir a categoria regular na consideração da percepção negativa da saúde, opção mais comum na literatura, devido ainda a que a distribuição do dado facilitou a análise inferencial.
No que diz respeito às causas da elevada prevalência da percepção negativa da saúde encontrada neste estudo, caberia pensar nos dois componentes da autoavaliação da saúde. Primeiramente, essa é, em parte, consequência de aspectos mais subjetivos, representação das dimensões sociais e emocionais da saúde e o bem-estar, o qual por sua vez pode ter sido influenciado pela elevada frequência de sintomas depressivos desta amostra18,19. Por outro lado, a avaliação negativa da saúde pode ter uma relação direta com indicadores objetivos, aspecto já fundamentado na literatura científica18. Dentre eles, devem ser levados em consideração os determinantes sociodemográficos da saúde. Nesse sentido, dois estudos identificaram maior relato de percepção negativa da saúde na população da Região Nordeste, achado atribuído às piores condições de saúde e assistência9,20. Além disso, os idosos institucionalizados da cidade do Natal são caracterizados, em modo geral, pelo alto grau de incapacidade e enfraquecimento da saúde, embora os indivíduos com maior declínio cognitivo tivessem sido excluídos deste estudo21.
Quanto aos fatores associados à percepção ruim da saúde, no presente trabalho os fatores sociodemográficos, como a idade e o sexo, não estiveram associados ao desfecho, como observado em estudo realizado na Espanha19. A análise múltipla mostrou que a avaliação negativa da saúde esteve independentemente associada a certas variáveis relacionadas ao estado de saúde, como são a perda de peso durante o último ano e a presença de doença reumática, assim como a uma variável relacionada à instituição (ILPI sem fins lucrativos).
Dentre esses fatores, a perda involuntária de peso foi o mais fortemente associado à autoavaliação negativa da saúde. Trata-se de uma variável que pode indicar o declínio do estado de saúde, e representa, classicamente, um dos indicadores próprios do fenótipo da fragilidade13. Em um estudo realizado em idosos institucionalizados dos EUA, foi encontrada associação estatisticamente significativa entre fragilidade e menor qualidade de vida. Devido à forte relação entre a percepção da própria saúde e a qualidade de vida, tem sido sugerido que esta poderia melhorar neste grupo populacional em aumento por meio de ações de luta contra o processo de fragilidade22.
Quanto às doenças crônicas, os idosos que as sofriam apresentaram maior proporção de autorrelato negativo da saúde. Alves e Rodrigues2, em um estudo transversal realizado em mais de 2.000 idosos do Município de São Paulo, encontraram uma forte associação entre a percepção da saúde e o número de morbidades. Ainda, outra pesquisa corroborou o mesmo achado em idosos institucionalizados, assim como ausência de associação com a idade e o sexo19. No entanto, no presente trabalho a autopercepção negativa da saúde não esteve associada de maneira estatisticamente significativa com a presença nem o número de doenças crônicas, em que a única patologia crônica que se manteve no modelo final foi a doença reumática.
Os pacientes portadores de patologias musculoesqueléticas frequentemente sofrem dor, restrição da mobilidade e limitação funcional, fatores que podem levar à piora da qualidade de vida e à autoavaliação ruim da saúde23. Além disso, um estudo mostrou o efeito negativo adicional da doença reumática à carga de morbidades, o qual afeta, por sua vez, a funcionalidade e a qualidade de vida24. Apesar disso, nesta amostra, a percepção ruim da própria saúde não esteve associada à dependência funcional para as ABVD, como foi reportado no estudo realizado na Espanha19.
Outro fator associado identificado no presente trabalho foi o tipo de instituição; nas ILPI sem fins lucrativos a proporção de residentes que consideraram sua saúde como ruim foi maior que nas privadas, e essa associação foi significativa no modelo final. Outros autores não encontraram diferenças estatisticamente significativas na percepção da saúde entre instituições públicas e privadas. No entanto, cabe levar em consideração que neste estudo não existiam ILPI filantrópicas, e que na Espanha o perfil de residente não é tão diferenciado segundo o tipo de instituição como é na realidade brasileira19.
No Brasil, a maioria das ILPI são de natureza filantrópica e as de caráter público representam menos de 7% do total; de fato, em Natal não existem ILPI públicas. Apesar da função híbrida sociossanitária destas residências coletivas, o frequente avançado declínio da saúde dos residentes faz com que os serviços médicos prevaleçam sobre a oferta de atividades de lazer e sociais, especialmente nas ILPI sem fins lucrativos25. Esse baixo estímulo à integração social, junto com fatores como a escassez de profissionais e a realidade do abandono social, mais característicos das instituições filantrópicas, poderia explicar a maior proporção de idosos que perceberam sua saúde como ruim nesse tipo de ILPI.
O presente trabalho apresenta algumas limitações que devem ser reconhecidas. Primeiramente, as doenças crônicas podem ter sido subregistradas, devido à escassez de profissionais de saúde e subsequentes pareceres diagnósticos realizados. No entanto, foi coletada a máxima quantidade possível de informação, consultando os prontuários e entrevistando os trabalhadores das instituições e os próprios idosos. Ainda, cabe pensar na possibilidade de ter acontecido erro de tipo II devido ao tamanho da amostra, que foi afetado pela elevada proporção de casos excluídos por incapacidade cognitiva para responder questionários.
Apesar disso, o presente estudo destaca pela representatividade da amostra, conseguida graças à participação da maioria das ILPI da cidade de Natal e ao baixo número de recusas dos residentes. Após a realização de uma profunda revisão de literatura, esta parece ser a primeira pesquisa que analisou os fatores associados à autopercepção da saúde em idosos institucionalizados do Brasil.
Pode ser concluído que mais de 60% dos idosos institucionalizados da cidade de Natal consideraram sua saúde como ruim, prevalência considerada alta se comparado com outros estudos nacionais e internacionais. O relato de percepção ruim da saúde esteve associado à perda de peso, doença reumática e ILPI sem fins lucrativos, indicando a importância dessas variáveis relacionadas ao estado de saúde e das características da institucionalização. É fundamental o desenvolvimento de ações de controle das doenças crônicas e da promoção da saúde com vistas à melhora da qualidade de vida deste grupo populacional. Considerando a lacuna de conhecimento existente na literatura científica, são necessários novos estudos que analisem a autoavaliação da saúde em idosos institucionalizados.