versão impressa ISSN 0101-2800versão On-line ISSN 2175-8239
J. Bras. Nefrol., ahead of print Epub 01-Jun-2020
http://dx.doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2019-0205
A doença renal crônica (DRC) constitui um problema global de saúde pública, que causa impacto negativo na expectativa e na qualidade de vida do indivíduo com diagnóstico da doença.1,2 No Brasil, cerca de 133 mil pessoas realizam terapia renal substitutiva (TRS), mais do que o dobro do que havia no início do século passado.3 As últimas estimativas nacionais das taxas de prevalência e de incidência da DRC em pacientes sob tratamento dialítico foram de 610 e 194 pacientes por milhão da população, respectivamente.3
Entre os principais fatores de risco para a DRC estão o diabetes mellitus (DM) e a hipertensão arterial sistêmica (HAS), responsáveis por dois terços dos casos da doença. Essa população, constituída predominantemente por idosos, apresenta diversas comorbidades, cuja abordagem envolve o uso contínuo de múltiplos medicamentos.1,4,5 Em concordância, dados do nosso serviço ambulatorial de atendimento a pacientes com DRC, mostraram a utilização de polifarmácia em 66,5% dos pacientes em tratamento conservador, em média seis medicamentos por paciente, sobretudo de classes terapêuticas com ação nos sistemas cardiovascular e metabólico.6
Importante ressaltar que a polifarmácia, aliada ao comprometimento renal, a qual influencia a metabolização e a excreção de fármacos, expõe essa população a problemas relacionados a medicamentos (PRMs).6,7,8
Em linhas gerais, PRM é definido como um problema de saúde relacionado à farmacoterapia, que interfere ou pode interferir nos resultados terapêuticos e na qualidade de vida do usuário,9 e pode ser originado durante o processo de prescrição, dispensação ou administração do medicamento.10
Em populações de risco, como indivíduos com insuficiência cardíaca congestiva, DM e HAS, os PRMs estão associados a reações adversas e a erros de prescrição.11,12 Já em pacientes com DRC, especificamente, há comprovação da alta prevalência de PRMs em todos os estágios da doença,7,13 sendo os mais comuns o uso de medicamentos contraindicados ou em doses inadequadas, que podem interferir de modo negativo na função renal,14 e interações medicamentosas.6 A taxa de mortalidade associada ao uso inadequado de medicamentos é 40% maior em pacientes com taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) < 60 mL/min/1,73m2 em comparação a pacientes sem DRC.15
Diante desse contexto, a detecção precoce dos PRMs nessa população poderá contribuir para a prevenção de complicações e redução de custos com cuidados em saúde por meio de melhoria na sobrevida, redução da progressão da doença e redução na morbidade cardiovascular.16,17
Recentemente, no Canadá, foi desenvolvido o instrumento Pharmacotherapy Assessment in Chronic Renal Disease (PAIR), com a finalidade de avaliar a farmacoterapia na DRC. O PAIR permite prevenir, detectar e gerir os PRMs em indivíduos com DRC em tratamento conservador. Além disso, esse é o primeiro e único instrumento desenvolvido para farmacêuticos que atuam em nefrologia que permite a identificação e o manejo de PRMs de forma rápida e sistemática com foco na segurança da medicação.10 Por essa razão, essa ferramenta de suporte clínico tem sido utilizada como referência por diversos autores, a fim de orientar, padronizar e otimizar a conduta desses profissionais.18,19,20,21,22
Devido ao fato de não haver no Brasil nenhum instrumento disponível para orientar a avaliação da farmacoterapia, especificamente na população de pacientes com DRC, nosso grupo realizou como fase inicial a tradução e adaptação transcultural do PAIR (Quadro 1).23
Quadro 1 Instrumento PAIR (Pharmacotherapy Assessment in Chronic Renal Disease) - versão traduzida e adaptada em português23
Avaliação da farmacoterapia na doença renal crônica |
---|
Uso inadequado (dose inapropriada ou medicamento contraindicado) |
1. O paciente está recebendo um medicamento contraindicado, um anti-inflamatório não esteroidal. |
2. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de gabapentina: |
TFG 30-59 mL/min: dose máxima de 1400 mg/dia, via oral; |
TFG 15-29 mL/min: dose máxima de 700 mg/dia, via oral; |
TFG 10-14 mL/min: dose máxima de 300 mg/dia, via oral; |
TFG < 10 mL/min: dose máxima de 150 mg/dia, via oral. |
3. O paciente está recebendo um medicamento contraindicado, meperidina. |
4. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de pregabalina. |
TFG 30-59 mL/min: dose máxima de 300 mg/dia, via oral; |
TFG 15-29 mL/min: dose máxima de 150 mg/dia, via oral; |
TFG < 15 mL/min: dose máxima de 75 mg/dia, via oral. |
5. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de um antiviral (aciclovir, valaciclovir, fanciclovir), de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
6. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de cefalosporina, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
7. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de inibidor da neuraminidase (oseltamivir, por exemplo), de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
8. O paciente está recebendo nitrofurantoína, a qual é contraindicada na doença renal (TFG < 60 mL/min). |
9. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de penicilina, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
10. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de uma quinolona, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
11. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de uma sulfonamida, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
12. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de uma tetraciclina, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
13. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de um triazólico (fluconazol, por exemplo), de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
14. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de um betabloqueador, de acordo com as tabelas de ajuste de dose para doença renal. |
15. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de nanocristais de fenofibrato. |
TFG 20-50 mL/min: dose máxima inicial de 48 mg/dia, via oral. |
16. O paciente apresenta uma TFG < 25 mL/min e está recebendo um medicamento contraindicado, acarbose. |
17. O paciente apresenta uma TFG < 30 mL/min e está tomando um medicamento contraindicado, metformina. |
18. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de ranitidina. |
TFG < 50 mL/min: dose máxima de 150 mg/dia, via oral. |
Se necessário, pode ser aumentada para 150 mg/dia, duas vezes ao dia, se a TFG estiver entre 30 e 50 mL/min. |
19. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de alopurinol. |
TFG 41-60 mL/min: dose máxima de 150 mg/dia, via oral, uma vez ao dia; |
TFG 21-40 mL/min: dose máxima de 100 mg/dia, via oral, uma vez ao dia; |
TFG 10-20 mL/min: dose máxima de 100 mg/dia, via oral, em dias alternados; |
TFG < 10 mL/min: dose máxima de 100 mg/dia, via oral, a cada três dias. |
20. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de colchicina, como tratamento profilático para gota: |
TFG < 50 mL/min: tratamento crônico não recomendado. |
O paciente está recebendo uma dose muito elevada de colchicina para um tratamento agudo: |
TFG 35-50 mL/min: dose máxima de 0,6 mg/dia; |
TFG < 35 mL/min: dose máxima de 0,3 mg, via oral, uma vez ao dia, ou 0,6 mg, via oral, em dias alternados. |
21. O paciente com uma TFG < 30 mL/min está tomando um medicamento contraindicado, um bifosfonato (alendronato, etidronato, risedronato). |
22. O paciente está recebendo uma dose muito elevada de vareniclina. |
TFG 10-30 mL/min: dose máxima de 0,5 mg, via oral, duas vezes ao dia; |
TFG < 10 mL/min: dose máxima de 0,5 mg, via oral, uma vez ao dia. |
Pressão arterial inadequada |
23. O paciente precisa de tratamento medicamentoso, pois a sua pressão sanguínea está > 130/80 mmHg, mas ele não está recebendo-o. |
24. O paciente está recebendo uma dose muito baixa do seu anti-hipertensivo, e, por conseguinte, a sua pressão sanguínea está > 130/80 mmHg. |
Hipoglicemia secundária à sulfonilureia |
25. O paciente está desenvolvendo uma reação adversa (hipoglicemia) após tomar seu medicamento hipoglicemiante oral (sulfonilureia de segunda geração: glibenclamida). |
Interação e medicamento tomado inadequadamente |
26. O paciente está desenvolvendo uma interação medicamentosa entre carbonato de cálcio e um antibiótico (tetraciclina ou fluoroquinolona, exceto moxifloxacino). |
27. O paciente está desenvolvendo uma interação medicamentosa entre cálcio e ferro tomados concomitantemente, por via oral. |
28. O paciente não está tomando o seu quelante de fósforo (carbonato de cálcio, acetato de cálcio, sevelâmer ou lantânio) apropriadamente. |
29. O paciente está desenvolvendo uma interação medicamentosa entre o seu quelante de fósforo (carbonato de cálcio, acetato de cálcio, sevelâmer ou lantânio e levotiroxina). |
30. O paciente está desenvolvendo uma interação medicamentosa entre sevelâmer ou lantânio, e ciprofloxacino. |
31. O paciente não está tomando a sua vitamina D (calcitriol ou alfacalcidol) apropriadamente. |
32. O paciente não está tomando o seu poliestirenossulfonato de cálcio apropriadamente. |
33. O paciente necessita ser encaminhado para tratamento ou acompanhamento da cessação do tabagismo, mas não o tem recebido. |
Problemas relacionados com medicamento isento de prescrição médica ou produto natural de saúde |
34. O paciente está tomando medicamento contraindicado para doença renal crônica, um antiácido contendo cálcio, magnésio, alumínio e/ou sódio. |
35. O paciente está desenvolvendo uma reação adversa (hipertensão) a pseudoefedrina ou a fenilefrina. |
36. O paciente está tomando um laxante contraindicado para o rim. |
37. O paciente está recebendo um medicamento contraindicado para paciente com doença renal, uma multivitamina enriquecida com vitamina A. |
38. O paciente com doença renal crônica está recebendo uma dose muito elevada de um suplemento de ácido ascórbico (vitamina C) > 250 mg/dia. |
39. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado na doença renal, um suplemento de alho. |
40. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado para pacientes transplantados com doença renal, equinácea. |
41. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado na doença renal, ginkgo biloba. |
42. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado para pacientes transplantados, unha de gato. |
43. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado na doença renal, erva-de-são-joão. |
44. O paciente está recebendo um produto natural contraindicado na doença renal, raiz de alcaçuz. |
*Abreviações: TFG: taxa de filtração glomerular; PRM: problema relacionado com o medicamento.
O presente estudo teve como objetivo validar o PAIR, avaliando a confiabilidade, a validade e a responsividade do instrumento, assim como a prevalência de PRMs em uma amostra de pacientes com DRC em tratamento conservador de um serviço ambulatorial de nefrologia local.
Trata-se de um estudo observacional longitudinal retrospectivo conduzido em clínica ambulatorial de nefrologia, na cidade de Juiz de Fora/MG, que faz parte de um centro de Atenção Secundária em Saúde, no qual indivíduos com alto risco cardiovascular, HAS, DM e DRC são atendidos por equipe multiprofissional, incluindo médicos de diversas especialidades, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, educadores físicos e farmacêuticos.
Foi analisado o banco de dados de prontuários médicos de 100 indivíduos com diagnóstico de DRC, em tratamento conservador, atendidos entre janeiro de 2016 e dezembro de 2017. Para a análise dos dados, foram incluídos pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, em acompanhamento no ambulatório por um período mínimo de 6 meses, com dados disponíveis em prontuário. O tamanho da amostra e a metodologia de validação do instrumento foram reproduzidos da pesquisa original em inglês.10
Para a seleção dos prontuários, foi gerado um relatório de atendimentos (lista de pacientes atendidos) entre os anos de 2016 e 2017 a partir do sistema eletrônico utilizado no ambulatório de nefrologia, onde constavam 4.308 registros. Desses registros, foram selecionados os pacientes que tiveram quatro consultas no ambulatório nesse período, a fim de captar aqueles com diagnóstico confirmado de DRC e em acompanhamento regular pela equipe de saúde, pois, para a análise, seriam necessários dados de duas consultas subsequentes do mesmo paciente, com intervalo mínimo de 6 meses. Os demais critérios de inclusão foram aplicados a essa lista e 196 pacientes satisfizeram a esses critérios. Foram analisados aleatoriamente 100 desses.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora, segundo parecer nº 915.924.
Foram estudadas as seguintes variáveis sociodemográficas, clínicas e laboratoriais: raça, sexo, idade, tabagismo, etilismo, escolaridade, peso, altura, índice de massa corporal (IMC) de acordo com a fórmula IMC = peso (kg)/altura2 (cm), etiologia e estágio da DRC, presença de comorbidades, classe e número total de medicamentos em uso, creatinina sérica (mg/dl) para estimativa da taxa de filtração glomerular, de acordo com a fórmula do Chronic Kidney Disease Epidemiology Collaboration (CKD-EPI).24
Os pontos de corte de IMC adotados foram os preconizados pela World Health Organization (WHO), ou seja, baixo peso (IMC < 18,5); eutrofia (IMC 18,5-24,99); sobrepeso (IMC 25-29,99) e obesidade (IMC ≥ 30,00).
O PAIR consiste numa lista de PRMs considerados clinicamente significativos para pacientes com DRC em tratamento conservador e que requeiram intervenção farmacêutica. Essa lista foi elaborada pelo método RAND/UCLA, desenvolvido por um grupo de pesquisadores da RAND Corporation e da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), que se baseia nas evidências científicas e na opinião concensual de um grupo de especialistas, realizada em várias fases, para o desenvolvimento de critérios de uso adequados na área da saúde.10,25
A lista adaptada para o Brasil é composta por 44 PRMs distribuídos em 5 categorias: 1. Uso inadequado (dose inapropriada ou medicamento contraindicado); 2. Pressão arterial inadequada (necessidade de tratamento medicamentoso ou dose baixa); 3. Hipoglicemia secundária à sulfonilureia; 4. Interação medicamentosa e situações em que o medicamento é tomado inadequadamente; 5. Problemas relacionados a medicamentos isentos de prescrição médica ou produtos naturais de saúde.23
O instrumento, nesse formato, funciona como um checklist, para que o farmacêutico possa avaliar a farmacoterapia desses indivíduos, identificar possíveis PRMs e intervir na sua resolução, sendo importante para otimizar os resultados clínicos esperados pelo médico. Essa avaliação pode ser feita utilizando dados fornecidos pelo próprio paciente, em consulta, e/ou por dados registrados em prontuários.10
Dois avaliadores farmacêuticos, independentes, com experiência de atendimento em ambulatório de nefrologia, aplicaram o instrumento PAIR consultando os prontuários incluídos no estudo, em dois momentos. Primeiramente, avaliaram a farmacoterapia referente à primeira consulta do paciente após confirmação do diagnóstico da DRC (período pré-intervenção). No segundo momento, avaliaram dados do mesmo paciente na consulta subsequente, ou seja, no seu retorno ao ambulatório após o período mínimo de 6 meses de acompanhamento (período pós-intervenção). Para este estudo, consideramos “intervenção” o acompanhamento especializado em serviço multiprofissional de DRC pré-dialítica.
Foram usadas para esta avaliação as informações registradas nos prontuários referentes ao: atendimento da equipe multiprofissional (médico, enfermeiro, assistente social, farmacêutico e outros); relato do paciente sobre medicamentos em uso, incluindo aqueles isentos de prescrição, bem como produtos naturais e prescrições médicas de outros serviços sem relação com o ambulatório do estudo, e resultados de exames laboratoriais.
Ambos os avaliadores receberam material impresso com as devidas orientações técnicas, além de instruções específicas para a coleta de dados e o preenchimento do PAIR.
O resultado da prevalência foi determinado pela contagem de PRMs identificados pelos dois avaliadores farmacêuticos por meio da aplicação do PAIR em 100 pacientes incluídos no estudo, na pré-intervenção. Utilizou-se consenso, em caso de discordância.
A confiabilidade do instrumento é determinada pela capacidade de reproduzir um resultado de forma consistente no tempo e no espaço, ou a partir de observadores diferentes.26
A confiabilidade entre avaliadores foi determinada pela comparação de duas avaliações independentes, dos 100 prontuários incluídos no estudo, no período de pré-intervenção. Utilizamos também a confiabilidade teste-reteste intra-avaliador, que foi determinada através da aplicação do PAIR novamente, dois meses depois da primeira avaliação, numa amostra aleatória de 30 prontuários de pacientes com DRC, usando os mesmos dados da pré-intervenção.
A validade refere-se à capacidade de um instrumento medir exatamente o que se propõe a medir. Dizemos que a validade é conceitual quando retrata um julgamento subjetivo sobre a cobertura conceitual de um instrumento a respeito de determinado constructo.27
Para atingir esse objetivo, um médico especialista em nefrologia avaliou uma amostra aleatória de 30 prontuários de pacientes com DRC na pré-intervenção, com vistas à detecção de PRMs clinicamente significativos, a partir do seu julgamento clínico implícito, sem o auxílio do instrumento PAIR.
Os dados obtidos foram comparados àqueles obtidos pelo farmacêutico, na mesma amostra, porém utilizando o PAIR, a fim de verificar se o instrumento conseguiu realmente detectar PRMs, que foram considerados clinicamente significativos pelo especialista em nefrologia.
Para avaliar a responsividade, ou seja, a capacidade do instrumento para detectar mudanças clinicamente importantes ao longo do tempo,28 o número total de PRMs identificados pelo farmacêutico, utilizando o PAIR, foi computado no período pré-intervenção e pós-intervenção, assim como a diferença entre o número detectado em cada período.
O status de cada PRM identificado na pré-intervenção foi avaliado na pós-intervenção, para cada paciente, recebendo a seguinte classificação: PRM persistente ou PRM resolvido (devido a uma mudança na farmacoterapia, resultados de exames laboratoriais ou aderência ao tratamento). Os PRMs que apareceram no decorrer do acompanhamento também foram considerados na análise como PRMs novos.
A análise descritiva dos dados foi feita utilizando-se as frequências, no caso das variáveis categóricas; e médias e desvios-padrão, no caso de variáveis quantitativas.
Considerando que os pacientes podem apresentar mais de um PRM, a prevalência foi determinada pela proporção de pacientes apresentando-se com, pelo menos, um PRM. O total de todos os PRMs identificados também foi contabilizado. Para analisar a associação entre as variáveis “número de PRMs/paciente”, “número de medicamentos” e “TFG estimada”, foram utilizados o coeficiente de correlação de Pearson e o coeficiente de correlação de Spearman.
Para os PRMs identificados por meio do PAIR, a confiabilidade entre avaliadores, e por um desses no reteste, foi estimada pelo coeficiente kappa de Cohen (κ), que descreve o grau de concordância entre as respostas. Para efeito de interpretação do κ, utilizaram-se os critérios sugeridos por Landis & Kock (1977), que consideram que, quanto mais próximo de 1 for seu valor, maior é o indicativo de que existe uma concordância.29
Para avaliar a validade conceitual, o número médio de PRMs por paciente, identificados pelo farmacêutico com o PAIR, foi comparado com o número médio de PRMs identificados pelo julgamento clínico do médico nefrologista, utilizando teste t de Student.
A responsividade, foi calculada por meio da alteração média do número de PRMs identificados entre os períodos avaliados, sendo utilizado o teste t de Student para a comparação dos 2 períodos.
O nível de significância adotado foi de 5%, sendo considerado estatisticamente significante p < 0,05, utilizando o software Statistical Package for the Social Sciences versão 17.0 para o sistema operacional Windows (SPSS Inc., IBM, USA) e o programa MedCalc versão 19.0.7 (MedCalc Software, Mariakerke, Bélgica).
Dentre os 100 pacientes que foram elegíveis para o estudo, houve predomínio de indivíduos do sexo feminino (55%), idosos (71%), com média de idade de 67 anos, com baixo nível de escolaridade - fundamental incompleto -(73%), nos estágios 3b (38%) e 4 (32%) da DRC, com sobrepeso e obesidade (77%), sendo o IMC médio de 30,4 ± 6,1. As comorbidades mais prevalentes foram a HAS (96%) e o DM (59%). A média de uso de medicamentos foi igual a 7,0 ± 2,7 por paciente, considerando o número de princípios ativos prescritos (Tabela 1).
Tabela 1 Distribuição dos pacientes com DRC incluídos no estudo, segundo suas características demográficas e clínicas. Juiz de Fora, 2018 (n = 100)
Características | Pacientes n = 100 (n/%) |
|
---|---|---|
N | % | |
Sexo | ||
Feminino | 55 | 55 |
Masculino | 45 | 45 |
Idade | ||
< ou igual 19 | 0 | 0 |
20 a 29 | 1 | 1 |
30 a 39 | 2 | 2 |
40 a 49 | 6 | 6 |
50 a 59 | 20 | 20 |
> ou igual a 60 | 71 | 71 |
Raça | ||
Branca | 52 | 52 |
Negra | 23 | 23 |
Parda | 25 | 25 |
Escolaridade | ||
Não sabe ler/escrever | 10 | 10 |
Alfabetizado | 4 | 4 |
Fundamental incompleto | 59 | 59 |
Fundamental completo | 13 | 13 |
Médio incompleto | 3 | 3 |
Médio completo | 7 | 7 |
Superior incompleto | 1 | 1 |
Superior completo | 3 | 3 |
Tabagismo | 10 | 10 |
Etilismo | 9 | 9 |
Número de medicamentos | ||
2 a 4 | 22 | 22 |
5 a 10 | 67 | 67 |
Mais de 11 | 11 | 11 |
Categoria da DRC | ||
1 | 1 | 1 |
2 | 6 | 6 |
3a | 17 | 17 |
3b | 38 | 38 |
4 | 32 | 32 |
5 | 6 | 6 |
IMC | ||
Baixo peso | 0 | 0 |
Eutrofia | 21 | 21 |
Sobrepeso | 29 | 29 |
Obesidade | 48 | 48 |
Sem dados | 2 | 2 |
Doença de base | ||
Nefropatia hipertensiva | 23 | 23 |
Nefropatia diabética | 23 | 23 |
Nefropatia por anti-inflamatórios não esteroides | 2 | 2 |
Indeterminada | 55 | 55 |
Comorbidades | ||
Diabetes mellitus | 59 | 59 |
Hipertensão arterial | 96 | 96 |
Infarto agudo do miocárdio | 9 | 9 |
Acidente vascular cerebral | 8 | 8 |
Comorbidades/paciente | ||
1 | 22 | 22 |
2 | 40 | 40 |
3 | 28 | 28 |
4 ou mais | 10 | 10 |
O tempo médio para aplicação do PAIR foi de 9,8 minutos por prontuário. Foram avaliadas 200 prescrições médicas, sendo 100 no período pré-intervenção e 100 no período pós-intervenção. Dessas prescrições, foram listados um total 1.483 medicamentos com 100 princípios ativos diferentes. A classe de medicamentos mais prescrita foi constituída de fármacos que atuam no sistema cardiovascular (848 - 57%), seguida de medicamentos com ação no trato alimentar e metabolismo (355 - 24%) e no sangue e órgãos hematopoiéticos (167 - 11%). Os medicamentos mais prescritos foram: losartana potássica (70,5%), sinvastatina (62,0%), furosemida (60,0%), ácido acetilsalicílico (53,0%), besilato de anlodipino (34,0%), omeprazol sódico (30,0%), insulina humana NPH (29,5%), cloridrato de metformina (29,5%), atenolol (27,0%), colecalciferol ou vitamina D (23,5%).
No período pré-intervenção, foram identificados um total de 126 PRMs, com média de 1,26 ± 0,96 PRM por paciente. Somente 20% dos pacientes não apresentaram nenhum PRM. As categorias de PRMs mais prevalentes foram “interação e medicamento tomado inadequadamente” (34,1%), “uso inadequado por dose inapropriada ou medicamento contraindicado” (33,3%), “pressão arterial inadequada” (30,2%) (Tabela 2).
Tabela 2 Prevalência de PRMs baseada na avaliação da farmacoterapia consensual de 100 renais crônicos em tratamento conservador com o PAIR. Juiz de Fora, 2018 (n= 126 PRMs)
Problema relacionado com o medicamento | Frequência n (%) |
---|---|
Uso inadequado (dose inapropriada ou medicamento contraindicado) | 42 (33,3) |
Anti-inflamatório não esteroidal (PRM 1) | 16 |
Nitrofurantoína (PRM 8) | 2 |
Betabloqueador (PRM 14) | 2 |
Fenofibrato. (PRM 15) | 3 |
Metformina (PRM 17) | 7 |
Ranitidina (PRM 18) | 4 |
Alopurinol (PRM 19) | 6 |
Bifosfonato (alendronato, etidronato, risedronato) (PRM 21) | 2 |
Pressão arterial inadequada | 38 (30,2) |
Dose baixa do anti-hipertensivo (PRM 24) | 38 |
Hipoglicemia secundária à sulfonilureia | 1 (0,8) |
Hipoglicemia após tomar glibenclamida (PRM 25) | 1 |
Interação e medicamento tomado inadequadamente | 43 (34,1) |
Vitamina D (calcitriol ou alfacalcidol) (PRM 31) | 33 |
Sem tratamento ou acompanhamento da cessação do tabagismo (PRM 33) | 10 |
Problemas relacionados com medicamento isento de prescrição médica ou produto natural de saúde | 2 (1,6) |
Laxante contraindicado (PRM 36) | 2 |
Houve associação positiva entre o número de medicamentos e o número de PRMs identificados, tanto no período pré-intervenção (r = 0,221; p = 0,02), quanto no período pós-intervenção (r = 0,329; p = 0,001). Portanto, o número de PRMs foi maior naqueles pacientes com maior número de medicamentos.
Além disso, houve associação negativa entre o número de PRMs e a TFGe no período pós-intervenção (r = -0,228 p = 0,02), ou seja, o número de PRMs aumentou em pacientes com função renal diminuída, definida como TFGe menor que 30 mL/min/1,73m2 (Figura 1).
Considerando o total de PRMs detectados, o coeficiente κ entre avaliadores foi 0,45, valor indicativo de concordância moderada. Para detalhar essa análise, o coeficiente κ também foi calculado separadamente para os PRMs representativos das categorias de maior prevalência. Nessa avaliação, o valor de κ variou de 0,58 a 0,94 entre avaliadores, indicando níveis de concordância moderada a perfeita.
Para o teste-reteste, o valor de κ para a totalidade dos PRMs detectados na primeira e na segunda aplicação foi igual a 0,81. Quando foram avaliados os PRMs representativos das categorias de maior prevalência, o valor de κ variou de 0,79 a 1,00, indicativo de concordância substancial a perfeita (Tabela 3).
Tabela 3 Confiabilidade entre avaliadores e teste-reteste do instrumento PAIR
Problema relacionado com o medicamento | Confiabilidade entre avaliadores (n = 100) κ* |
Confiabilidade teste-reteste (n = 30) κ* |
---|---|---|
Uso inadequado (dose inapropriada ou medicamento contraindicado) | ||
Nitrofurantoína (PRM 8) | 0,662 | 1,000 |
Metformina (PRM 17) | 0,646 | 1,000 |
Alopurinol (PRM 19) | 0,790 | 1,000 |
Pressão arterial inadequada | ||
Dose baixa do anti-hipertensivo (PRM 24) | 0,723 | 0,856 |
Interação e medicamento tomado inadequadamente | ||
Vitamina D (calcitriol ou alfacalcidol) (PRM 31) | 0,580 | 0,791 |
Sem tratamento ou acompanhamento da cessação do tabagismo (PRM 33) | 0,942 | 1,000 |
*Coeficiente kappa de Cohen.
O médico nefrologista categorizou os PRMs para facilitar a identificação desses nos prontuários. Na avaliação desse profissional, foram considerados, especialmente, os critérios de necessidade de inclusão, suspensão ou ajuste de dose dos medicamentos, como PRMs clinicamente significativos.
Com base unicamente no julgamento clínico, o médico identificou uma média de 1,60 ± 1,24 PRM por paciente, comparado com 1,33 ± 0,76 PRM por paciente identificado pelos farmacêuticos com auxílio do PAIR, na mesma amostra (p = 0,07).
A avaliação médica resultou em 48 PRMs que exigem intervenção na prescrição, sendo os mais frequentes a necessidade de ajuste de dose e/ou associação de medicamentos anti-hipertensivos (32%) e necessidade de reposição da vitamina D (17%). Em comparação, a avaliação farmacêutica resultou em 40 PRMs, sendo concordante com a avaliação médica, pois os mais frequentes foram: PRM 24 “dose baixa do anti-hipertensivo” (28%) e PRM 31 “vitamina D tomada inadequadamente” (33%).
Vale ressaltar a observação de algumas diferenças entre a avaliação médica quando comparada com a avaliação do farmacêutico na identificação de alguns PRMs. O médico conseguiu identificar 9 PRMs que não constavam no PAIR, relativos a medicamentos como levotiroxina e varfarina. Por outro lado, não conseguiu identificar 11 PRMs relativos à necessidade de tratamento da cessação do tabagismo e ao uso inadequado de ranitidina.
O número médio de PRMs por paciente identificado pelo farmacêutico usando o PAIR foi de 1,26 ± 0,96 na pré-intervenção e 1,11 ± 1,02 na pós-intervenção (p = 0,17). Portanto, não foi possível detectar diferença no número de PRMs entre os períodos.
Em uma análise mais detalhada, do total de 126 PRMs identificados na pré-intervenção, 68 PRMs (54%) foram resolvidos e 58 PRMs (46%) persistiram e foram identificados novamente na consulta subsequente. Dessa forma, no período pós-intervenção, do total de 111 PRMs identificados, 58 PRMs foram os que persistiram e 53 PRMs surgiram no intervalo do acompanhamento.
A Figura 2 ilustra todos os PRMs que foram identificados durante o acompanhamento do paciente no ambulatório e a classificação que receberam ao serem reavaliados na segunda consulta. Nesse caso, merecem destaque os PRMs que foram persistentes (PRMs 1, 14, 15, 17, 18, 19, 24, 31, 33 e 36) uma vez que demonstram falha na intervenção.
Estudos sobre PRMs são escassos e não são uniformes quanto à metodologia empregada para identificação e classificação, particularmente em indivíduos com DRC sob tratamento conservador.7,8,30,31 O PAIR constitui uma ferramenta inovadora, apropriada para detecção sistemática e rápida de condições relacionadas à segurança e ao uso de medicações que requerem intervenção farmacêutica, direcionada tanto ao médico quanto ao paciente.10 Este instrumento foi recentemente traduzido e adaptado transculturalmente para o português brasileiro em nosso serviço.23
O presente estudo teve como objetivo validar a utilização do PAIR no Brasil. Os resultados obtidos mostraram tratar-se de um instrumento de fácil aplicação e que consumiu em média 9,8 minutos por prontuário de pacientes com DRC em tratamento conservador. Foram identificados, em média, 1,26 ± 0,96 PRM por paciente. As categorias mais prevalentes foram “interação e medicamento tomado inadequadamente” (34,1%), “uso inadequado por dose inapropriada ou medicamento contraindicado” (33,3%) e “pressão arterial inadequada” (30,2%).
Além disso, observou-se maior número de PRMs em pacientes com TFGe inferior a 30 mL/min/1,73m2. Esses dados são concordantes com a literatura, que mostra relação estreita entre redução da TFG e maior número de PRMs.7,8,14 Do mesmo modo, pacientes em uso polifarmácia, fato comum na DRC, apresentam maior risco de PRMs. Em estudo de Kovačević e cols. (2017), a utilização de 12 medicamentos foi associada a um risco de, no mínimo, 5 PRMs em idosos.32
Em relação à validação do PAIR, a confiabilidade encontrada foi considerada boa, com resultados indicativos de uma concordância moderada a perfeita entre os PRMs que foram identificados, tanto entre avaliadores quanto no teste-reteste por um mesmo avaliador. Esses resultados são semelhantes aos do estudo de validação da versão original do PAIR, que mostrou alta confiabilidade entre avaliadores, com coeficientes k variando de 0,80 a 1,00, e alta confiabilidade no teste-reteste, com coeficientes k variando de 0,74 a 1,00.10 Outros instrumentos de avaliação da farmacoterapia baseados em critérios específicos, como alguns desenhados para uso em idosos, o Screening Tool of Older Person’s Prescriptions (STOPP) e o Screening Tool to Alert doctors to Right Treatment (START), apresentaram valores de k entre avaliadores iguais a 0,75 e 0,68, respectivamente,33 semelhantes aos valores encontrados no presente estudo.
Especificamente nesse trabalho, os valores de kappa obtidos podem ser atribuídos ao desenho do estudo, e por terem sido utilizados dados de prontuários médicos eletrônicos para coleta de dados. Apesar de os prontuários investigados estarem completos, determinadas informações, subjetivas da prática clínica, estavam registradas em campos diferentes na página eletrônica, dada a variação de profissionais responsáveis pelo atendimento, fato que provavelmente gerou diferenças na coleta de dados entre os avaliadores. Dessa forma, observou-se a fragilidade do sistema eletrônico de atendimento utilizado no ambulatório em estudo, por tratar-se de um sistema interno, projetado especialmente para o serviço. Esse sistema, nos anos de 2016 e 2017, esteve em constante processo de mudança, com alterações em seu layout. Contudo, independentemente do valor geral de kappa calculado, as prevalências de cada PRM em separado, para cada avaliador, foram semelhantes em percentual e envolveram os mesmos pacientes.
No que concerne à validade conceitual, nossos resultados revelaram que o PAIR foi capaz de identificar PRMs clinicamente significativos em pacientes com DRC, usando como parâmetro para essa análise o julgamento clínico implícito de um nefrologista. Com base unicamente no julgamento clínico, o nefrologista identificou número de PRMs por paciente comparável ao número identificado pelo farmacêutico, com auxílio do instrumento PAIR na mesma amostra. As diferenças encontradas podem ser atribuídas à especificidade do instrumento, uma vez que o médico fez uma análise geral da condição de saúde do paciente voltada à sua melhora clínica e o farmacêutico realizou a busca de PRMs seguindo um checklist pré-determinado. Esse achado é similar à análise comparativa realizada por Desrochers e cols, na qual o especialista em nefrologia identificou, clinicamente, uma média de 3,9 (95% IC, 3.4-4.5) PRMs por paciente e o farmacêutico comunitário identificou, utilizando o instrumento PAIR, uma média de 2,5 (95% IC, 2.0-3.1) PRMs por paciente. Neste estudo, o PAIR permitiu gerenciar PRMs com impacto clínico importante no tratamento da DRC.10 Portanto, nossos dados mostram que o instrumento PAIR é adequado para o gerenciamento de PRMs clinicamente significativos em português brasileiro.
No que tange à responsividade, no entanto, nossos resultados não permitem sugerir que o PAIR seja responsivo à intervenção farmacêutica, uma vez que o número médio de PRMs por paciente permaneceu estável entre os períodos pré e pós-intervenção. Nesse intervalo, somente 54% dos PRMs foram resolvidos devido à otimização da prescrição médica. De fato, era esperado que no período pós-intervenção o número de PRMs diminuísse. Porém, este estudo foi retrospectivo e observacional, e, durante o período de acompanhamento no ambulatório, o paciente esteve submetido às intervenções de rotina, não sendo realizadas intervenções farmacêuticas que contemplassem especificamente os PRMs contidos no PAIR. Além disso, o intervalo entre os períodos foi curto para esse tipo de análise.
Essas mesmas razões foram alegadas pelos pesquisadores no estudo original realizado no Canadá, que também não observaram diferença na média de PRMs detectados com o instrumento PAIR no período de avaliação de seis meses. A média de PRMs permaneceu igual a 2,5 por paciente, sendo que somente 61% dos PRMs foram resolvidos no intervalo entre os períodos.10 Dessa forma, não foi possível avaliar responsividade do PAIR, devido à característica do protocolo, o que reforça a necessidade de realização de estudos prospectivos e multicêntricos.
Diante do exposto, é preciso considerar algumas limitações ao presente estudo. O PAIR possui características de checklist, ou seja, funciona como instrumento de segurança, pois é composto por um conjunto de condutas que devem ser lembradas e/ou seguidas, a fim de evitar e/ou detectar PRMs. Assim, a aplicabilidade do PAIR está relacionada com as características do serviço fornecido ao usuário, de um atendimento que contemple claramente essas condutas como protocolo institucional, para que os PRMs não sejam subestimados e para que as intervenções sejam efetivas. Além disso, na prática, pode surgir a necessidade de atualizar a lista de PRMs do PAIR, considerando o tempo em que foi desenvolvido, a dinâmica da indústria farmacêutica e da incorporação de novas tecnologias e evidências em saúde, que demandam alterações de diretrizes clínicas.
Contudo, as limitações descritas anteriormente não comprometem o uso do PAIR na população de pacientes com DRC em nosso país. Ao contrário, contribuem para que informações relativas à farmacoterapia dessa população não sejam negligenciadas, uma vez que este foi o primeiro estudo desenvolvido no Brasil com o intuito de validar um instrumento direcionado para a segurança da medicação na DRC.
O presente estudo demonstrou que o PAIR é de fácil aplicação, confiável, sendo validado o seu uso para o Brasil. Trata-se, portanto, de um instrumento adequado para a avaliação de PRMs clinicamente significativos na nossa população de pacientes com DRC.
A incorporação desse instrumento ao cuidado farmacêutico em serviços de nefrologia pode permitir a sistematização e a uniformização de dados, possibilitando, desse modo, a implementação de estratégias de prevenção e manejo dos PRMs frequentes nessa população.