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Avaliação da modulação autonômica cardíaca no processo de enchimento da bexiga em mulheres com incontinência urinária: perspectiva da fisioterapia

Avaliação da modulação autonômica cardíaca no processo de enchimento da bexiga em mulheres com incontinência urinária: perspectiva da fisioterapia

Autores:

Juliana Falcão Padilha,
Melissa Medeiros Braz,
Enio Júnior Seidel,
Giovana Zarpellon Mazo,
Jefferson Luiz Brum Marques,
Cláudia Mirian de Godoy Marques

ARTIGO ORIGINAL

Fisioterapia e Pesquisa

versão On-line ISSN 2316-9117

Fisioter. Pesqui. vol.24 no.4 São Paulo out./dez. 2017

http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/16196024042017

RESUMEN

Se comparó el comportamiento del sistema nervioso autónomo, a través de la variabilidad de la frecuencia cardíaca (VFC), durante las fases de llenado vesical de mujeres con y sin incontinencia urinaria (IU). Se aplicó el International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form, para autodiagnóstico de IU. Para el análisis de la VFC se utilizaron registros de electrocardiograma (ECG), considerándose 6 registros durante el llenado vesical. Para cuantificar la VFC se utilizaron los métodos: dominio del tiempo (milisegundos); frecuencia (Hertz) y medidas no lineales. A estos parámetros se aplicó la transformación logarítmica (Log). En la comparación de promedios de datos normales se utilizó la prueba t y para los datos no normales la prueba de Mann-Whitney. Participaron 64 mujeres (64.8±6.73 años), 33 con IU y 31 continentes. La variable logaritmo de la razón de los componentes LF y HF (LogLH/HF) ha sido significativamente mayor (p<0.05) en el grupo continente en todos los momentos del llenado vesical. La capacidad volumétrica vesical ha sido significativamente mayor en las mujeres continentes (p=0.0015). El análisis en el dominio de la frecuencia demostró reducción de la función simpática y aumento del parasimpático en las mujeres incontinentes. Las mujeres continentes presentaron mejor balance autonómico durante todo el proceso de llenado vesical, en comparación a las incontinentes. La reducción de la función simpática, así como el aumento de la función parasimpática en las incontinentes, pudo ser reportada para una disminución de la capacidad de relajación del detrusor y un aumento de las contracciones, aún en la fase de llenado vesical, ambos asociados a la IU.

Palabras clave Incontinencia Urinaria; Variabilidad de la Frecuencia Cardiaca; Sistema Nervioso Autónomo; Fisioterapia; Salud de la Mujer

INTRODUÇÃO

A incontinência urinária (IU) é uma das doenças crônicas mais comuns no sexo feminino, atualmente considerada uma doença social das mulheres em todas as faixas etárias1. Segundo a Sociedade Internacional de Continência, qualquer perda involuntária de urina é definida como IU, o que pode gerar um problema social e higiênico2. A IU é um tipo de disfunção do trato urinário inferior que pode acontecer quando há uma alteração no processo fisiológico da micção ou nas estruturas envolvidas no suporte e sustentação dos órgãos responsáveis pela micção3. O trato urinário inferior é inervado por um complexo integrado dos circuitos neuronais periféricos, envolvendo o sistema nervoso autônomo (SNA) simpático e parassimpático, e por neurônios do sistema nervoso somático. O SNA simpático estimula o fechamento do esfíncter da uretra, bem como o relaxamento do músculo detrusor durante o enchimento da bexiga. O SNA parassimpático é responsável pela contração do músculo detrusor, durante a micção, enquanto, simultaneamente, relaxa o esfíncter uretral4. Acredita-se que a alteração do SNA pode contribuir para uma disfunção miccional, pois o trato urinário inferior é regulado pelo SNA simpático e parassimpático. A análise da variabilidade da frequência cardíaca (VFC) permite a medição da função autonômica5 e, portanto, pode-se relacioná-la com a incontinência e a continência urinária. Alguns autores relatam que existe uma íntima relação entre a VFC e o processo de enchimento da bexiga6), (7. A VFC mostra ser uma ferramenta efetiva para a investigação da atividade autonômica durante o enchimento vesical. Dessa forma, a aplicabilidade da VFC no âmbito da Fisioterapia Uroginecológica é promissora, pois, a partir dessa avaliação, torna-se possível repensar condutas de tratamento que possam modular de forma mais efetiva o SNA, o que repercute em melhor sucesso de tratamento. Diante disso, o objetivo foi comparar o comportamento do SNA, por meio da VFC, durante as fases de enchimento da bexiga entre mulheres com e sem IU.

METODOLOGIA

Tratou-se de uma pesquisa do tipo observacional, de caráter transversal, com abordagem quantitativa8. Obteve aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos da Udesc, sob registro CAAE nº 25361013.2.0000.0118. A seleção da amostra foi realizada de maneira intencional, por conveniência8, composta de mulheres residentes nos municípios de Florianópolis (SC) e Santa Maria (RS). Foram incluídas mulheres com idades entre 50 e 80 anos, que estavam no período da menopausa ou pós-menopausa e que apresentassem IU autorreferida. Foram excluídas mulheres que relataram: cardiopatias; comprometimento neurológico e/ou patologias que interferissem na compreensão das tarefas propostas; ter tido acidente vascular encefálico; estar em tratamento medicamentoso para IU de urgência (IUU); e as que não aceitaram fazer a avaliação do enchimento da bexiga.

Assim, com a finalidade de traçar o perfil uroginecológico das participantes, aplicou-se uma ficha de anamnese adaptada9), (10. A avaliação das disfunções miccionais foi realizada pelo instrumento International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form (ICIQ-SF) (11, sendo que a pontuação zero caracterizou-se como continente. Para a coleta referente à VFC, foi realizado um eletrocardiograma (ECG) de 8 minutos de duração. O ECG foi obtido por intermédio de um monitor cardíaco e digitalizado com um conversor analógico-digital, sendo o sinal resultante filtrado digitalmente (faixa de 5 a 30Hz), a fim de reduzir a detecção errônea do complexo QRS e intervalos RR. Para esta avaliação, posicionou-se a participante em decúbito dorsal e solicitou-se que esta permanecesse em repouso durante o registro do ECG. Três eletrodos descartáveis foram colocados no tórax, um sobre o espaço subclavicular direito (terminal negativo); outro, sobre o 8º espaço intercostal esquerdo (terminal positivo), e no 9º espaço intercostal direito (terminal de referência).

Os sinais de ECG foram processados digitalmente para a análise da VFC, de acordo com Heck et al. (12, utilizando-se um software personalizado construído e desenvolvido no Matlab (MathWorks - Natick, Massachusetts, Estados Unidos). Os métodos utilizados para quantificar a VFC foram: domínio de tempo; domínio de frequência e medidas não lineares (Índice Cardiossimpático e Índice Cardiovagal). As medidas da VFC foram calculadas de acordo com as recomendações da Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology13.

Na análise do domínio de tempo empregaram-se índices extraídos diretamente das variações temporais dos intervalos RR em milissegundos. O sinal de variabilidade (intervalos RR) foi detectado por um processo de diferenciação e selecionado pelo valor da média dos intervalos RR, e 2 vezes o valor do desvio-padrão. Já na análise no domínio da frequência foi utilizada a análise espectral, sendo o método empregado para o cálculo da Densidade Espectral de Potência, a Fast Fourier Transform. Para o método não linear, foram utilizados dois parâmetros importantes para caracterizar as flutuações não lineares no sinal da VFC: logaritmo do Índice Cardiovagal (LogCVI) e do Índice Cardiossimpático (LogCSI), os quais indicaram as funções vagal e simpática de forma separada.

As variáveis analisadas por meio do registro do ECG no domínio do tempo foram o logaritmo do: Standard Deviation of NN Intervals (LogSDNN), que demonstrou a variabilidade global; Root Mean Square of Successive Differences (LogRMSSD), que representou a atividade parassimpática. Já as variáveis do domínio de frequência foram: Very Low Frequency (LogVLF); Low Frequency (LogLF), manifestação do simpático; High Frequency (LogHF), manifestação do parassimpático; Razão das componentes LF e HF (LogLF/HF) e alterações absolutas e relativas entre os componentes simpático e parassimpático. Realizaram-se 6 registros de ECG em 6 momentos diferentes do enchimento vesical, baseando-se na metodologia descrita por Ben-Dror et al. (14, procedendo-se da seguinte forma: 1º registro, após a voluntária ter esvaziado a bexiga. Logo após, deu-se início à ingestão de água a uma taxa de 150mL a cada 5 minutos. As voluntárias indicaram para a avaliadora o momento em que elas perceberam e sentiram o desejo de urinar, para que, assim, os próximos registros pudessem ser realizados. O 2º registro realizou-se na indicação das Primeiras Sensações de Enchimento da bexiga (PSE); o 3º Registro - Primeiro Desejo de Urinar (PDU); 4º Registro - Forte Desejo de Urinar (FDU); 5º Registro - Capacidade Vesical Máxima (CVM); e, por fim, o 6º Registro - após o esvaziamento vesical (Figura 1).

Figura 1 Fluxograma do enchimento vesical. PSE = Primeiras Sensações de Enchimento da bexiga; PDU = Primeiro Desejo de Urinar; FDU = Forte Desejo de Urinar; CVM = Capacidade Vesical Máxima 

Após o 5º Registro, a voluntária coletou a própria urina em um vasilhame para a verificação do volume (em mL) utilizando uma proveta graduada. Os dados foram analisados com o software R, versão 2.15.2. A normalidade dos dados foi testada utilizando-se o teste Shapiro-Wilk. Para a comparação de médias das variáveis da VFC e da anamnese, quando ocorreu a normalidade, teste t, e nos dados sem normalidade, utilizou-se o teste Mann-Whitney. Para a comparação entre as variáveis CVI e CSI intragrupo, utilizou-se o teste t pareado e o teste Wilcoxon, com nível de significância de 5%.

RESULTADOS

A amostra compôs-se de 64 mulheres, com média de idade 64,8±6,73, sendo 33 incontinentes, a partir do ICIQ-SF, e 31 continentes (pontuação zero no ICIQ-SF). Dentre as pacientes com IU, 14 referiram sintomas IU de esforço (IUE); 5, de IUU, e 14, de IU mista (IUM). Na Tabela 1 apresenta-se a caracterização dos grupos e as variáveis da ficha de anamnese.

Tabela 1 Comparação das médias das variáveis dos grupos continente e incontinente 

Variáveis Continentes Incontinentes valor p
Média (±DP) Média (±DP)
Idade (anos) 62,4 (±6,09) 67,1 (±6,67) 0,0038*
Peso (kg) 67,1 (±11,24) 69,3 (±12,32) 0,4630
Altura (m) 1,6 (±0,07) 1,4 (±0,05) 0,5932
Índice de Massa Corporal 27,5 (±3,85) 28,8 (±5,10) 0,2538
Quantas vezes urina por dia 6,6 (±3,28) 8 (±4,16) 0,1060
Quantidade de urina (mL) 530,7 (±196,29) 384,2 (±142,49) 0,0015*
Quantidade de água ingerida (mL) 1558,1 (±356,40) 1386,4 (±335,47) 0,0520

*Valores significativos p<0,05. Para variáveis com normalidade utilizou-se o teste t; sem normalidade, o teste Mann-Whitney. DP: desvio-padrão

Durante o procedimento, pôde-se observar que ambos os grupos beberam, aproximadamente, a mesma quantidade de água, não havendo diferença significativa entre a quantidade de líquido ingerida. Porém, o volume de urina coletado pelas mulheres incontinentes foi significativamente menor do que as continentes (p=0,001). Isso pode ser devido à hiperatividade parassimpática (Figura 2(B)) que o grupo IU apresentou, fazendo com que estas mulheres tivessem a capacidade de continência diminuída.

Figura 2 Comparação entre LogCVI e LogCSI durante o processo de enchimento da bexiga para cada grupo. (A) Grupo Continente; (B) Grupo Incontinente. Valores expressos em média e desvio-padrão 

A Tabela 2 evidenciou os valores médios da VFC pela análise do domínio de tempo, de frequência e de análise não linear para os 6 estágios do processo de enchimento da bexiga para os grupos continente e incontinente. Para a relação LogLF/HF, que refletiu as alterações entre os componentes simpático e parassimpático, caracterizando o balanço simpato-vagal, em todos os momentos do enchimento, o grupo continente apresentou valores significativamente maiores em relação ao grupo IU. O grupo continente apontou maiores valores médios para LogSDNN (representa a variabilidade global), exceto no FDU. Contudo, somente no 6º Registro essa comparação foi estatisticamente significativa. Esses resultados demonstraram que, no geral, o grupo continente apresentou melhor balanço autonômico durante o enchimento vesical.

Tabela 2 Comparação das médias dos parâmetros da VFC na sequência dos registros do enchimento vesical. Grupo Continente (GC) e Grupo Incontinente (GI) 

Variáveis 1º Registro PSE PDU
GC GI valor p GC GI valor p GC GI valor p
LogSDNN 1,348 1,337 0,7268 1,408 1,345 0,1524 1,428 1,382 0,0560
LogRMSSD 1,166 1,228 0,8719 1,295 1,285 0,3825 1,322 1,331 0,3645
LogCVI 0,389 0,392 0,7268 0,421 0,402 0,1948 0,428 0,416 0,1175
LogCSI 0,449 0,355 0,0419* 0,371 0,301 0,0456* 0,361 0,291 0,0684
LogVLF 1,998 1,853 0,2452 2,104 1,788 0,0012* 2,060 1,889 0,0607
LogLF 1,678 1,508 0,1696 1,839 1,538 0,0054* 1,775 1,603 0,0338*
LogHF 1,600 1,759 0,7068 1,876 1,840 0,3899 1,944 1,948 0,3540
LogLH/HF 0,078 -0,251 0,0008* -0,036 -0,310 0,0194* -0,170 -0,345 0,0394*
FDU CVM 6º Registro
GC GI valor p GC GI valor p GC GI valor p
LogSDNN 1,402 1,447 0,9144 1,420 1,409 0,2506 1,426 1,371 0,0401*
LogRMSSD 1,327 1,405 0,7117 1,333 1,370 0,9037 1,369 1,339 0,1662
LogCVI 0,424 0,440 0,8141 0,429 0,430 0,4437 0,434 0,417 0,0489*
LogCSI 0,325 0,277 0,1690 0,336 0,274 0,0897 0,298 0,269 0,4291
LogVLF 2,014 2,019 0,9578 1,999 1,951 0,5556 2,064 1,817 0,0315*
LogLF 1,804 1,716 0,2018 1,776 1,677 0,2775 1,737 1,528 0,0303*
LogHF 1,936 2,075 0,7167 1,923 2,032 0,4398 1,986 1,953 0,1812
LogLH/HF -0,131 -0,359 0,001* -0,148 -0,355 0,0202* -0,249 -0,424 0,0431*

*Valores significativos p<0,05; para variáveis normais utilizou-se teste t; sem normalidade, teste Mann-Whitney. LogSDNN: logaritmo Standard Deviation of NN Intervals; LogRMSSD: logaritmo Root Mean Square of Successive Differences; LogCVI: logaritmo do Índice Cardiovagal; LogCSI: logaritmo do Índice Cardiossimpático; LogVLF: logaritmo Very Low Frequency; LogLF: logaritmo Low Frequency; LogHF: logaritmo High Frequency; LogLF/HF: logaritmo da Razão das componentes LF e HF

Na análise não linear, a variável LogCSI, embora sem significância para alguns momentos, apresentou nas mulheres continentes maiores valores médios em todo o processo de enchimento da bexiga. Portanto, observou-se que houve uma tendência do SNA simpático ser menos ativado em mulheres incontinentes. A Figura 2 ilustra os resultados do comportamento do SNA durante o enchimento da bexiga, intragrupos (continente e incontinente) para as variáveis LogCSI e LogCVI. Na figura 2(A), grupo continente, observa-se que o SNA simpático teve uma tendência a decrescer, conforme o aumento do SNA parassimpático. O enchimento vesical pôde ser dividido em duas etapas. A 1ª etapa, de lento e progressivo enchimento, “Estágio Inicial do Enchimento” - o qual representou maior ativação simpática -, “1º Registro” até o “PSE”. A 2ª etapa correspondeu ao “Pré-Micção”, que foi do “PSE” até “CVM”, com maior ativação parassimpática, apresentando valores significativos nos três Registros (PDU, FDU, CVM) (p<0,05), promovendo a vontade de urinar. Em relação ao grupo incontinente (Figura 2(B)), as comparações dos valores de LogCVI foram significativamente maiores que o LogCSI (p<0,01), exceto no 1º Registro, porém, ainda assim, o LogCVI apresentou maiores valores. Com isso, pôde-se observar uma hiperatividade parassimpática no grupo incontinente, observando que o SNA parassimpático permaneceu mais ativado em todo o processo.

DISCUSSÃO

O grupo incontinente compôs-se por um número substancialmente superior de participantes de idade mais avançada do que o grupo continente, sugerindo que a idade avançada é um fator facilitador para o desenvolvimento da IU, como um estudo15 relatou recentemente. O volume de urina recolhido foi significativamente menor no grupo IU, isto pode estar relacionado com o desequilíbrio autonômico, ocasionado principalmente pelo aumento do parassimpático.

Nesta pesquisa, o grupo IU apresentou o pior balanço autonômico comparado com o controle. Blanc et al. (16 compararam a atividade do SNA nos diferentes tipos de IU por meio da análise da VFC. A comparação foi realizada entre 11 mulheres incontinentes sem instabilidade do detrusor idiopática (IDI), e com 14 mulheres incontinentes com IDI. A atividade global do SNA de pacientes com IDI foi significativamente menor (p<0,05) do que os com IUE, porém o balanço simpático-vagal não foi significativamente diferente entre os grupos. Os pesquisadores apontaram que uma instabilidade do IDI estava associada com uma redução global de atividade do SNA comparada com a de pacientes sem IDI.

Neste estudo, a variável LogRMSSD, a qual representou a atividade parassimpática, não foi significativa na maioria dos registros, porém o grupo incontinente apresentou maiores valores da LogRMSSD do que o controle, exceto para o PSE e o 6º Registro. Estes resultados não foram semelhantes aos de outro estudo6, que avaliou 12 mulheres com síndrome da bexiga hiperativa (SBH) e 53 mulheres em grupo-controle. A variável RMSSD foi menor nas pacientes do que no controle (p=0,018). Já para a LF/HF, os valores foram maiores nos pacientes do que nos controles (p=0,007), o que não está de acordo com esta pesquisa, em que, para todos os momentos avaliados, o grupo-controle apresentou maiores valores de LF/HF do que o grupo IU (p<0,05).

Outra pesquisa17 visou avaliar a função do SNA, utilizando a VFC de 40 pacientes com SBH em comparação com 131 voluntárias saudáveis. Os resultados evidenciaram que a variável SDNN das pacientes com SBH foi significativamente menor do que no grupo-controle. Esse resultado é semelhante ao de outro estudo18, que investigou a VFC de 33 mulheres com SBH e 176, controle. A avaliação consistiu na gravação do ECG a partir do início de urgência urinária e 5 minutos após a micção. Os valores de SDNN também foram significativamente menores no grupo SBH. Esses resultados corroboraram com os desta pesquisa, em que, apesar de não apresentar significância, o grupo-controle expressou, em sua maioria, maiores valores para o LogSDNN em relação ao grupo IU.

Outros resultados do estudo17 evidenciaram que a variável VLF das pacientes com SBH foram significativamente menores do que no grupo-controle. Este desfecho foi semelhante ao desta pesquisa, apesar de não apresentar diferença significativa em todos os momentos, o grupo-controle reportou, predominantemente, maiores valores de LogVLF. Já a variável LF/HF não demonstrou diferença significativa17, o que diferiu deste estudo, em que o LogLF/HF foi significativo em todos os registros. Essa divergência pode ter ocorrido porque os autores não padronizaram o enchimento vesical.

Em outra investigação14 foi comparada a função do SNA entre 9 mulheres com SBH e 15 sem SBH, durante o enchimento da bexiga. Os sinais de ECG foram utilizados para avaliar a VFC. As variáveis analisadas foram RMSSD, LF e HF para investigar as funções autônoma simpática e parassimpática, respectivamente. Para RMSSD e HF não foi observada diferença significativa entre os grupos, fato este semelhante ao desta pesquisa, em que também não ocorreu diferença considerável entre os grupos estudados. As análises revelaram que os valores de LF foram mais baixos, significativamente, durante todo o enchimento da bexiga em mulheres com SBH do que no controle, resultados estes que se aproximaram dos obtidos neste estudo. Apesar de não haver diferença relevante da variável LogLF entre os grupos, o grupo continente apresentou maiores valores de LogLF durante o enchimento em relação ao grupo IU.

Em estudos realizados7), (14), (18 foi apontado um aumento do SNA simpático, durante as sensações de enchimento da bexiga nos grupos-controle, visto que os autores defenderam a teoria de que era necessário o aumento contínuo da atividade simpática, durante o enchimento da bexiga, para permitir que esta se expanda sem a contração do detrusor. Entretanto, nesta pesquisa houve um declínio da ativação simpática, com diferença significativa (p<0,02) entre o LogLF e LogHF para PDU, FDU e CVM. Isso sugeriu a sobreposição do parassimpático em relação ao simpático, sendo que houve alguma contração do detrusor, devido ao relato de FDU, bem como de CVM. Isso faz com que reflitamos sobre a neurofisiologia da continência, que chega ao SNC por via aferente, retornando sinais por via eferente, que regulam o SNA para que se mantenha a continência ou o início da micção.

Com base em uma revisão sistemática19 em periódicos brasileiros, foi observado que a VFC é utilizada no âmbito da Fisioterapia como recurso para a avaliação de intervenções fisioterapêuticas, como forma de investigação de condições patológicas comuns à prática clínica e para a interpretação de condições fisiológicas. A sua utilização é feita, principalmente, pela especialidade cardiorrespiratória. No entanto, poucos estudos discutem e abordaram essa temática no âmbito da fisioterapia na área da saúde da mulher.

Outra revisão de literatura20 que aborda a temática da VFC e IU constatou que, embora existam pesquisas que utilizam a VFC como ferramenta importante na Fisioterapia, poucos estudos estão centrados na análise da disfunção do SNA em pacientes com IU.

Conhecer a VFC no âmbito da Fisioterapia é de fundamental importância, uma vez que se pode observar com mais detalhes o comportamento do SNA da população estudada. A utilidade dessa ferramenta, no que se refere ao tratamento, requer maior investigação no que tange à aplicabilidade e eficiências de técnicas com propósito na modulação do SNA, com consequente inibição da hiperatividade parassimpática de mulheres incontinentes.

Este estudo teve como limitação a não realização da comparação dos parâmetros da VFC nos diferentes tipos de IU. Sugere-se, também, a investigação da ativação simpática e parassimpática de forma isolada para o detrusor e esfincter uretral.

CONCLUSÃO

Esta pesquisa evidenciou que as mulheres continentes apresentaram um melhor balanço autonômico em comparação com as incontinentes durante todo processo de enchimento da bexiga. Observou-se que as mulheres incontinentes apresentaram valores maiores da função parassimpática, antes mesmo de iniciar o enchimento, visto que nas continentes não houve este comportamento, iniciando o procedimento com maior relaxamento vesical.

A redução da função simpática (LogCSI), bem como o aumento do parassimpático (LogCVI) no grupo IU, pôde reportar uma diminuição da capacidade de relaxamento e aumento das contrações do detrusor, ainda na fase de enchimento. O que repercute em uma diminuição da capacidade vesical, uma vez que as continentes apresentaram capacidade volumétrica maior que as incontinentes.

Pode-se constatar também que a VFC mostrou-se ser uma ferramenta efetiva para a investigação da atividade do sistema nervoso autônomo simpático e parassimpático durante o enchimento vesical.

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