versão On-line ISSN 2317-6431
Audiol., Commun. Res. vol.19 no.2 São Paulo abr./jun. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312014000200002
A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) é considerada uma doença infectocontagiosa, transmitida pelo Human Immunodeficiency Vírus (HIV), que ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo de doenças.
No início da década de 80, a AIDS era limitada a grupos de risco. Contudo, com o avanço da epidemia, a doença ultrapassou esse grupo e passou a atingir pessoas em todas as faixas etárias, inclusive crianças, pertencentes a grupos distintos. O número de crianças em idade escolar vivendo com AIDS vem crescendo, em parte, em função da existência de complexos terapêuticos que possibilitam maior sobrevida, com melhor qualidade(1,2).
Estudos(3-7) em pessoas que vivem com HIV indicam que essa população é especialmente vulnerável a distúrbios auditivos. A deficiência auditiva dificulta ou torna impossível a comunicação oral, com repercussões diretas no âmbito social e familiar. Dificuldades auditivas criam estigma e afetam a autoimagem, causando a percepção de incapacidade e de dependência, resultando na marginalização do indivíduo. Em crianças, problemas auditivos podem dificultar o acesso à educação, o que tem óbvias consequências socioeconômicas(8).
Estudos que avaliaram a audição em crianças com HIV/AIDS referem a presença de perda auditiva em 32,8% da amostra avaliada(9). Outro estudo(7), refere maior prevalência (59,4%) de perda auditiva em crianças e adolescentes com HIV/AIDS, além de alterações das vias auditivas centrais(5,6). Quanto maior o grau da perda auditiva, menor o vocabulário, a consciência fonológica, a discriminação auditiva e a nota escolar, e maior a incidência de dificuldades articulatórias e de trocas e omissões articulatórias(10).
Autores(11) detectaram atraso no desenvolvimento das habilidades auditivas de uma criança portadora de HIV, decorrente da presença de deficiência auditiva, que pode ter sido provocada pela ingestão de medicamentos para controle do HIV.
Diante do exposto, observa-se a importância do diagnóstico precoce de alterações auditivas em crianças com HIV/AIDS, pois qualquer alteração pode provocar dificuldades no desenvolvimento linguístico, gerando problemas de comunicação e dificuldade no processo de aprendizagem, educação e inclusão social(8). Neste sentido, o presente estudo teve o objetivo de avaliar a audição das crianças com HIV/AIDS, associando à faixa etária e ao tempo de diagnóstico.
Trata-se de um estudo descritivo, transversal, realizado em dois serviços especializados de assistência em HIV/AIDS, localizados em João Pessoa (PB).
A amostra deste estudo foi composta por 23 crianças, com diagnóstico de HIV/AIDS, que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ter sido exposta, ou não, ao tratamento antirretroviral durante gestação, parto e/ou após nascimento e/ou encontrar-se em tratamento e apresentar idade entre 2 anos e 10 anos e 11 meses.
Para analisar a associação dos resultados audiológicos com a faixa etária, foram criados dois grupos: Grupo A, composto por crianças com até 4 anos e 11 meses e Grupo B, formado por crianças com idades que variaram de 5 anos até 10 anos e 11 meses. A média de idade foi de 5,67 anos.
Para a verificação da associação dos resultados audiológicos com o tempo de diagnóstico, a amostra foi distribuída em três grupos: Grupo 1 (crianças com tempo de diagnóstico menor que 1 ano), Grupo 2 (diagnóstico entre 1 e 2 anos) e Grupo 3 (diagnóstico com tempo maior que 2 anos).
A coleta de dados só teve início após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Lauro Wanderlei da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), sob protocolo nº 343/11. Os responsáveis legais pelas crianças assinaram, inicialmente, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em que estavam descritos todos os procedimentos a serem executados, seguindo as disposições contidas na Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
Os procedimentos de coleta de dados incluíram: anamnese, meatoscopia, audiomteria tonal condicionada ou convencional e imitanciometria. Os equipamentos utilizados para a realização desses procedimentos foram: otoscópio Missuri®; audiômetro modelo AA1200, Starkey®, com fones modelo TDH-39 e vibrador ósseo B-71; imitanciômetro modelo AT-237, da Interacoustic®, contendo um fone de ouvido contralateral, modelo TDH-39 e uma sonda, conectados ao equipamento principal.
Os parâmetros analisados para cada procedimento foram:
Audiometria tonal condicionada: limiares de audibilidade nas frequências de 500 a 4000 Hz, por via aérea, para as crianças de 2 anos a 6 anos e 11 meses de idade;
Audiometria tonal convencional: limiares de audibilidade nas frequências de 250 a 8000 Hz, por via aérea, para as crianças com idades entre 7 anos e 10 anos e 11 meses e limiares de audibilidade nas frequências de 500 Hz a 4000 Hz, por via óssea, quando os limiares de via aérea encontravam-se rebaixados (maiores que 15 dB NA);
Medidas de imitância acústica: curva timpanométrica e limiares dos reflexos acústicos contralaterais nas frequências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz e ipsilaterais apenas nas frequências de 1000 e 2000 Hz.
Os resultados das avaliações audiológicas foram classificados como normais ou alterados, de acordo com os padrões referidos na literatura para a audiometria tonal(12) e para as medidas de imitância acústica(13).
Para a audiometria tonal, os resultados foram considerados normais quando os limiares auditivos por via aérea estavam até 15 dB NA e alterados, quando o limiar encontrava-se acima da normalidade em pelo menos uma frequência por orelha. A perda auditiva foi classificada, quanto ao tipo, como condutiva, neurossensorial ou mista(12) e quanto ao grau, como discreta, leve e moderadamente severa(14). Considerando a análise do tipo de perda auditiva, nos casos em que não foi possível obter limiares tonais por via óssea, foi usada a classificação ‘indeterminada’. Esse fato ocorreu em função de dificuldades de condicionamento limitado pelo tempo e/ou idade, ou por não comparecimento da criança ao retorno, para finalizar o procedimento.
Ainda, houve necessidade de se utilizar uma nomenclatura diferente da proposta na classificação das perdas auditivas adotadas para indicar, nas tabelas apresentadas, alterações de limiares auditivos em apenas uma frequência, quando as frequências foram localizadas em 250 Hz, 6000 Hz e/ou 8000 Hz. Assim, o termo escolhido foi: “perda auditiva em frequências isoladas”.
Para a imitanciometria, os resultados foram considerados normais quando a curva timpanométrica foi do tipo A, caracterizada por um pico de máxima complacência ao redor da pressão de ar de 0 daPa, cuja variação não excedeu a -100 daPa. Os resultados dos reflexos acústicos do músculo estapédio foram organizados em três categorias: ausente (quando os reflexos contralaterais e ipsilaterais se apresentaram ausentes em todas as frequências da orelha testada); parcialmente presente (quando se apresentaram presentes em uma ou mais frequências, contralateralmente ou ipsilateralmente, na orelha investigada) e presente (quando os registros dos reflexos estavam presentes em todas as frequências da orelha testada).
Os resultados foram analisados por orelhas (46) e não pelo número de sujeitos da amostra (23). Para análise dos dados, foram obtidas distribuições absolutas, percentuais univariados e bivariados e foi utilizada a técnica de estatística inferencial, através do teste Exato de Fisher, já que as condições para utilização do teste Qui-quadrado não foram verificadas. A margem de erro utilizada nas decisões dos testes estatísticos foi de 5%.
Com relação à avaliação audiométrica, ressalta-se que, dos pacientes avaliados, apenas dois apresentaram normalidade bilateral, ou seja, em ambas as orelhas. Os resultados obtidos na avaliação audiométrica podem ser observados na Tabela 1.
Tabela 1 Distribuição dos resultados da audiometria tonal do grupo estudado (n=46 orelhas)
Resultado | n | % |
---|---|---|
Normal | 07 | 15,2 |
Alterado* | 39 | 84,8 |
| ||
Total | 46 | 100 |
*Diferentes tipos de perda auditiva
Quanto às audiometrias tonais, observou-se, na maioria, grau da perda auditiva discreta (76,95) e, com relação ao tipo de perda auditiva, verificou-se predominância da classificação “indeterminada”’ (30,6%), seguida da neurossensorial (28,2%). Os resultados das audiometrias tonais dos pacientes, quanto ao tipo e grau da perda auditiva por orelha, estão descritos na Tabela 2.
Tabela 2 Caracterização dos resultados alterados das audiometrias tonais por orelha
Variável | n | % |
---|---|---|
Tipo de perda auditiva | ||
Indeterminada | 12 | 30,8 |
Neurossensorial | 11 | 28,2 |
Condutiva | 8 | 20,5 |
Perda auditiva nas frequências isoladas | 5 | 12,8 |
Mista | 3 | 7,7 |
Grau da perda auditiva | ||
Perda discreta | 30 | 76,9 |
Perda leve | 08 | 20,5 |
Perda moderadamente severa | 01 | 2,6 |
| ||
Total | 39 | 100,0 |
O exame imitaciométrico, conforme seu protocolo de realização, revela os resultados das curvas timpanométricas e os reflexos acústicos do músculo estapédio. A curva timpanométrica tipo A foi observada em 5 (10,9%) orelhas. Observou-se predominância na curva timpanométrica do tipo B (67,4%) e reflexos acústicos ausentes (65,2%) (Tabela 3).
Tabela 3 Caracterização dos resultados do exame de imitanciometria – timpanometria e medida do reflexo acústico do grupo estudado (n=46 orelhas)
Variável | Grupo total |
|
---|---|---|
n | % | |
Timpanometria | ||
Tipo A | 5 | 10,9 |
Tipo B | 31 | 67,4 |
Tipo As | 5 | 10,9 |
Tipo C | 4 | 8,7 |
Tipo Ad | 1 | 2,2 |
Reflexo acústico | ||
Ausente | 30 | 65,2 |
Presente parcialmente | 15 | 32,6 |
Presente | 1 | 2,2 |
| ||
Total | 46 | 100,0 |
No uso do teste de associação entre a variável faixa etária e os resultados dos exames audiométrico e imitanciométrico, evidenciou-se semelhança de proporções e a não existência de associações entre as categorias que compõem as variáveis timpanometria, reflexos acústicos e as faixas etárias. Já os resultados do exame audiométrico apresentaram associação significativa com a faixa etária. Destaca-se que as maiores diferenças percentuais entre as faixas etárias ocorreram nas categorias “indeterminada”, que teve frequência nula no grupo B e 60,0% no grupo A e “perda das frequências isoladas”, em 19,2% para o grupo B (Tabela 4).
Tabela 4 Análise do nível de associação entre os resultados do exame audiométrico, da timpanometria e do reflexo acústico e a faixa etária no grupo estudado (n=46 orelhas)
Variável | Faixa etária
|
Valor de p | |||||
---|---|---|---|---|---|---|---|
Grupo A | Grupo B | Grupo Total | |||||
| |||||||
n | % | n | % | N | % | ||
Exame audiométrico | |||||||
Normal | 3 | 15,0 | 4 | 15,4 | 7 | 15,2 | p<0,001* |
Condutiva | 2 | 10,0 | 6 | 23,1 | 8 | 17,4 | |
Neurossensorial | 3 | 15,0 | 8 | 30,8 | 11 | 23,9 | |
Mista | - | - | 3 | 11,5 | 3 | 6,5 | |
Indeterminada | 12 | 60,0 | - | - | 12 | 26,1 | |
Perda nas frequências isoladas | - | - | 5 | 19,2 | 5 | 10,9 | |
Timpanometria | |||||||
Tipo A | 3 | 15,0 | 2 | 7,7 | 5 | 10,9 | p=0,884 |
Tipo B | 14 | 70,0 | 17 | 65,4 | 31 | 67,4 | |
Tipo C | 1 | 5,0 | 3 | 11,5 | 4 | 8,7 | |
Tipo As | 2 | 10,0 | 3 | 11,5 | 5 | 10,9 | |
Tipo Ad | - | - | 1 | 3,8 | 1 | 2,2 | |
Reflexos acústicos | |||||||
Ausente | 11 | 55,0 | 19 | 73,1 | 30 | 65,2 | p=0,267 |
Presente parcialmente | 8 | 40,0 | 7 | 26,9 | 15 | 32,6 | |
Presente | 1 | 5,0 | - | - | 1 | 2,2 | |
| |||||||
Total | 20 | 100,0 | 26 | 100,0 | 46 | 100,0 |
*Valores significativos (p<0,05) - Teste Exato de Fisher
Legenda:Grupo A = até 4 anos e 11 meses; Grupo B = de 5 anos até 10 anos e 11 meses
Quanto à relação dos exames audiológicos ao tempo de diagnóstico da doença, verificou-se associação significativa na variável “resultados do exame audiométrico”. Observou-se que, para crianças do Grupo 3, houve uma porcentagem expressiva de 6 (37,5%) orelhas com perda auditiva neurossensorial, em relação aos demais resultados (Tabela 5).
Tabela 5 Análise do nível de associação entre os resultados do exame audiométrico, da timpanometria e do reflexo acústico e o tempo de diagnóstico do HIV/AIDS no grupo estudado (n=46 orelhas)
Variável | Tempo de
diagnóstico (anos) |
Valor de p | |||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 | Grupo Total | ||||||
| |||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | ||
Exame audiométrico | |||||||||
Normal | 3 | 15,0 | 1 | 10,0 | 3 | 18,8 | 7 | 15,2 | p<0,001* |
Condutiva | 1 | 5,0 | 4 | 40,0 | 3 | 18,8 | 8 | 17,4 | |
Neurossensorial | 4 | 20,0 | 1 | 10,0 | 6 | 37,5 | 11 | 23,9 | |
Mista | - | - | 1 | 10,0 | 2 | 12,5 | 3 | 6,5 | |
Indeterminada | 12 | 60,0 | - | - | - | - | 12 | 26,1 | |
Perda nas frequências 6000 Hz e 8000 Hz | - | - | 3 | 30,0 | 2 | 12,5 | 5 | 10,9 | |
Timpanometria | |||||||||
Tipo A | 3 | 15,0 | - | - | 2 | 12,5 | 5 | 10,9 | p=0,196 |
Tipo B | 14 | 70,0 | 7 | 70,0 | 10 | 62,5 | 31 | 67,4 | |
Tipo C | - | - | 3 | 30,0 | 1 | 6,3 | 4 | 8,7 | |
Tipo As | 3 | 15,0 | - | - | 2 | 12,5 | 5 | 10,9 | |
Tipo Ad | - | - | - | - | 1 | 6,3 | 1 | 2,2 | |
Reflexos acústicos | |||||||||
Ausente | 12 | 60,0 | 7 | 70,0 | 11 | 68,8 | 30 | 65,2 | p=1,000 |
Presente parcialmente | 7 | 35,0 | 3 | 30,0 | 5 | 31,3 | 15 | 32,6 | |
Presente | 1 | 5,0 | - | - | - | - | 1 | 2,2 | |
| |||||||||
Total | 20 | 100,0 | 10 | 100,0 | 16 | 100,0 | 46 | 100,0 |
*Valores significativos (p<0,05) - Teste Exato de Fisher
Legenda:Grupo 1 = tempo de diagnóstico menor de 1 ano; Grupo 2 = diagnóstico entre 1 e 2 anos; Grupo 3 = diagnóstico com tempo maior que 2 anos
No Brasil, a incidência de casos de crianças com HIV vem diminuindo, após a adoção das medidas de prevenção da transmissão vertical do HIV(15). Assim, considera-se que a população encontrada para este estudo, especificamente crianças com até 10 anos, embora pequena, mostrou-se suficiente para avaliar as bases estatísticas, comparando-se a outras pesquisas que apenas realizaram estudos de caso ou apresentaram amostra semelhante(16,17).
Estudos que avaliaram a audição em crianças e adolescentes com HIV/AIDS através da audiometria tonal, referem perda auditiva do tipo condutiva como a mais frequente(17,18). Autora(7) identificou perda condutiva (58%), mista (23,6%) e neurossensorial (18,4%). Outro estudo(19), refere o tipo da perda auditiva por orelha, observando perda condutiva à direita (22,5%) e à esquerda (33,7%), sensorioneural à direita (10,1%), à esquerda (7,9%) e mista à direita (9%) e à esquerda (7,9%).
Outra pesquisa(20) contradiz os estudos mencionados, revelando perda auditiva neurossensorial como a mais prevalente em 64,0% das crianças com HIV/AIDS, sendo o grau leve (44%) o de maior ocorrência.
Os resultados da presente pesquisa indicaram que a audição de crianças com HIV/AIDS pode apresentar-se alterada, variando quanto ao tipo, grau e configuração da perda auditiva. Observou-se ainda que apenas 15,2% das orelhas examinadas apresentaram audição normal para tons puros durante o exame audiométrico.
É importante salientar que perdas auditivas condutivas não se restringem apenas a crianças com HIV/AIDS(21), pois na infância é comum a ocorrência de infecções otológicas na presença de fatores de riscos que podem afetar o sistema auditivo(22). Em geral, as perdas auditivas em indivíduos com HIV/AIDS podem ser decorrentes de doenças oportunistas, de medicações ototóxicas ou de infecção direta do vírus(23,24).
Os resultados do exame de imitanciometria, em que foram observados percentuais elevados de timpanometria alteradas que não apresentaram alterações audiométricas, demonstram a importância do exame na identificação precoce das possíveis alterações da cavidade timpânica e tuba auditiva, tão comum em crianças e que talvez passem despercebidas na audiometria tonal, pois os limiares tonais podem não estar ainda prejudicados na presença dessas alterações, em sua fase inicial.
Com relação à ausência ou presença parcial do reflexo acústico, observou-se que pode ter havido um problema na eferência, tendo em vista que a maioria da população apresentou perda auditiva condutiva e alteração do tipo B, na timpanometria. Nesses casos, a expectativa é de ausência ou de elevação dos reflexos acústicos.
Pesquisadores revelam que o HIV penetra precocemente no sistema nervoso central (SNC) e seu acometimento pode representar a manifestação inicial da AIDS em até 18% das crianças infectadas(25).
Observou-se, neste estudo, que o maior número de perdas auditivas foi identificado em crianças com 5 anos ou mais, embora tenha se verificado associação significativa para as perdas da categoria “indeterminada” em crianças com até 4 anos de idade. Estudo(18) anterior verificou maior prevalência de alterações auditivas em crianças com HIV/AIDS entre 3 e 6 anos, do que em crianças maiores, entre 7 e 10 anos. Em outro estudo(20), a prevalência de perda auditiva em pacientes positivos para HIV/AIDS foi de 33%, na faixa etária de 6 meses a 5 anos, considerado um percentual bastante inferior (85%) ao encontrado neste estudo, para as crianças menores que 5 anos. Contudo, alerta-se para o fato dessas perdas auditivas apresentarem possível comprometimento progressivo nas regiões afetadas, sendo necessárias maiores investigações nas crianças com HIV/AIDS.
Embora este estudo tenha observado maior ocorrência de perda auditiva neurossensorial e condutiva nas crianças do grupo B (com 5 anos ou mais), do que nas menores (Tabela 4), crianças com HIV apresentam, frequentemente, perda auditiva condutiva decorrente de alterações de orelha média(18).
Em relação ao tempo de diagnóstico da doença HIV, percebe-se que, quanto mais cedo se diagnosticar, melhores os resultados de controle do vírus. Crianças infectadas pelo HIV apresentam rápida progressão da doença, tornando-se muito vulneráveis a infecções oportunistas(15). Pesquisa revela que não foram encontradas alterações na audição em indivíduos avaliados 16 a 32 semanas após o início da terapia com antirretrovirais(26).
Nenhum dos estudos consultados sobre as questões da audição na criança com HIV/AIDS fala sobre a idade em que o diagnóstico da doença foi realizado. Todos falam da importância do diagnóstico precoce de problemas auditivos. Neste estudo, evidenciou-se que, quanto maior o tempo de diagnóstico, maior o comprometimento da audição, observado na ocorrência de perda auditiva neurossensorial (37,5%) (Tabela 5). Outro estudo(27), mostrou a detecção de carga viral elevada em pacientes que apresentaram manifestações otológicas, justificando a associação com o tempo de diagnóstico.
A maioria dos estudos com indivíduos infectados pelo HIV (crianças ou adultos) revela a presença de infecções otológicas, além de sintomas auditivos, a exemplo do zumbido e otalgia, que são os mais prevalentes, principalmente em pacientes tratados com antirretroviral(7,19,24,27,28). Diante do exposto, mostra-se relevante a realização de exames audiológicos para o acompanhamento da saúde auditiva de crianças com HIV/AIDS, com vistas à prevenção de futuras sequelas audiológicas, como a perda auditiva.
Observa-se, neste estudo, associação significativa das alterações auditivas à faixa etária e ao tempo de diagnóstico do HIV, para os diferentes resultados encontrados no grupo estudado.
Conclui-se que crianças com HIV/AIDS são susceptíveis a alterações auditivas de diversos tipos, em diferentes faixas etárias durante a primeira infância (até os 10 anos e 11 meses) e em diversos períodos de diagnóstico.
Dessa forma, evidencia-se a necessidade de realizar o acompanhamento auditivo em crianças com HIV/AIDS, além do trabalho educativo junto aos familiares acerca de medidas preventivas à saúde auditiva, que possam auxiliar no desenvolvimento da linguagem e desempenho escolar dessas crianças.