versão impressa ISSN 0101-2800versão On-line ISSN 2175-8239
J. Bras. Nefrol. vol.39 no.1 São Paulo jan./mar. 2017
http://dx.doi.org/10.5935/0101-2800.20170008
O citomegalovírus (CMV) pertence à família herpesviridae, e a infecção por este patógeno tem elevada prevalência em todo o mundo. Embora a infecção seja geralmente inofensiva em hospedeiros imunocompetentes, ela pode ser uma das principais causas de morbidade e mortalidade em receptores de transplante de órgãos.1 As taxas relatadas de infecção ativa variam entre 40-100% em diferentes casuísticas de receptores de transplante renal.2,3
Infecção e doença por CMV são mais comuns em pacientes sem exposição prévia ao vírus que receberam órgãos de doadores com infecção latente ou em receptores com exposição prévia que tenham recebido intensa terapia imunossupressora, especialmente as que empregam anticorpos depletores de linfócitos T, como a imunoglobulina antitimócito.2-5
A fim de obter melhores resultados nas populações de transplantes de órgãos, o tratamento eficaz da infecção ativa ou doença e o uso de estratégias preventivas requerem um diagnóstico preciso e precoce. Portanto, métodos diagnósticos rápidos e precisos são necessários e devem ser utilizados.6-8
Os testes atualmente disponíveis na prática clínica para monitorizar a infecção ativa por CMV são a antigenemia pp65, que detecta a presença da fosfoproteína pp65 nos leucócitos do sangue periférico, e a detecção de DNA viral por métodos de amplificação de ácidos nucleicos, tais como a reação em cadeia da polimerase (PCR), que podem ser qualitativos ou quantitativos.9-17 Métodos sorológicos para detectar imunoglobulinas das classes IgM e IgG e culturas virais não são adequados para uso na prática clínica por conta de sua baixa precisão e demora excessiva para a obtenção de resultados.11-13
Estudos anteriores demonstraram a existência de uma boa correlação entre os ensaios quantitativos de PCR (qPCR) e a antigenemia pp65 para detecção de replicação viral.6,10,18-25 Atualmente, as recomendações ditam que tanto a antigenemia como o qPCR podem ser utilizados para monitorizar a replicação viral e a resposta à terapia antiviral. A escolha de um ou outro método depende basicamente da disponibilidade de pessoal e recursos econômicos nas instituições de saúde em questão.11,18,20,26,27
O objetivo do presente artigo foi avaliar a precisão desses testes através de um estudo longitudinal que incluiu pacientes receptores de transplantes renais de nossa instituição.
Duzentas e quarenta amostras de sangue periférico foram colhidas prospectivamente entre abril de 2012 e fevereiro de 2013, de trinta de cada cem pacientes submetidos a transplante renal em nossa instituição no decurso desse período. Foram considerados a aceitação dos pacientes em participar e respeitar a programação do estudo, bem como o orçamento alocado ao mesmo. Os pacientes que concordaram em participar foram incluídos independentemente de sua condição em relação à dosagem de IgG para CMV ou da terapia de indução. As amostras foram colhidas sequencialmente 15, 30, 45, 60, 75, 90, 120, 150 e 180 dias após o transplante. A replicação viral foi avaliada por meio do exame para detecção da antigenemia pp65 e por amplificação do DNA viral por qPCR.
O regime imunossupressor ministrado a todos os pacientes consistiu da combinação de tacrolimus, micofenolato sódico e prednisona. Os pacientes que receberam rins de doadores falecidos foram submetidos a terapia de indução com Basiliximab ou anticorpos policlonais depletores de linfócitos T. Além das amostras do protocolo, foram colhidas amostras adicionais de antigenemia conforme as necessidades relativas ao manejo clínico.
Sempre que possível, antes dos transplantes foram realizados testes serológicos de IgM e IgG específicos para CMV nos doadores e receptores. As doses intravenosas e orais de ganciclovir foram ajustadas segundo a TFG estimada pela equação do MDRD.
Pacientes sob risco elevado de infecção, receptores CMV/IgG- que receberam órgão de doadores CMV/IgG+ e indivíduos tratados com anticorpos depletores de linfócitos T para profilaxia ou tratamento de rejeição aguda receberam ganciclovir por via intravenosa seguido de ganciclovir oral até seis meses após o transplante. Pacientes sob risco moderado, doadores CMV/IgG+ e receptores ou receptores CMV/IgG+ apenas foram monitorizados com antigenemia seriada e preventivamente tratados. O diagnóstico de infecção ativa por CMV foi feito pela positividade do ensaio de antigenemia pp65 sem o conhecimento do ensaio qPCR. Casos de infecção ativa foram tratados com ganciclovir intravenoso em doses ajustadas para a função do enxerto.
Depois de extraídos do sangue periférico, os leucócitos foram incubados com anticorpos monoclonais C10/C11 e outros reagentes do CMV Brite Turbo de acordo com as recomendações do fabricante (IQ® Products, Groningen, Holanda). Os leucócitos com antigenemia positiva exibiram padrão nuclear homogêneo amarelo-esverdeado quando observados por microscopia de fluorescência. O resultado da antigenemia pp65 foi considerado diagnóstico para replicação viral quando houve uma ou mais células positivas por 200.000 analisadas.21
A quantificação de ácidos nucleicos foi realizada utilizando o CMVQ - PCR Alert Kit (Nanogen Advanced Diagnostics, Turim, Itália) em amostras de DNA extraídas de plasma coletado em tubos contendo EDTA, de acordo com as instruções do fabricante. Cinco microlitros de DNA foram transferidos para uma microplaca de amplificação contendo uma mistura de reagentes que incluía iniciadores e sondas específicas para CMV, além de um controle interno e Taq polimerase.
O procedimento consiste em uma reação de amplificação em tempo real em uma microplaca com variação e controle de temperatura programável e um sistema de detecção de fluorescência óptica utilizado simultaneamente à reação em um termociclador. O sistema foi padronizado em torno de equipamentos Applied Biosystems ABI PRISM 7000. O resultado do PCR foi considerado diagnóstico para replicação quando a carga viral foi de pelo menos 1250 cópias/mL.21
A ocorrência de infecção ativa foi verificada pelos métodos de antigenemia e qPCR. A concordância entre os testes foi avaliada por meio do coeficiente Kappa. O teste t de Student para amostras independentes foi utilizado na avaliação das diferenças entre pacientes infectados e não infectados, pelos dois métodos, para as seguintes variáveis: idade do doador; idade do receptor; e creatinina e taxa de filtração glomerular estimada pela equação do MDRD28 no início do estudo e no sexto e décimo-segundo meses após o transplante. O nível de significância foi estabelecido em 5% (p < 0,05). As análises foram realizadas por meio do software estatístico SPSS, versão 20.
Para estabelecer os parâmetros diagnósticos dos dois ensaios, a replicação viral foi considerada presente quando o resultado de qualquer teste fosse positivo e ausente quando os resultados de ambos os ensaios fossem negativos. O estudo foi aprovado em seus aspectos técnicos e metodológicos pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre de acordo com os preceitos da Declaração de Helsinque. Os pacientes incluídos no estudo concordaram em participar e assinaram termos de consentimento livre e esclarecido.
Os dados demográficos da amostra estudada são apresentados na Tabela 1. O número médio de amostras por paciente foi de 8 ± 1. Na análise, 23 amostras (9,6%) foram positivas pela pesquisa de antigenemia e 32 (13,3%) foram positivas pelo teste qPCR. Não houve diferença no tempo médio transcorrido desde o transplante até o primeiro resultado positivo, que foi de 64 ± 23 dias para a antigenemia e 62 ± 21 dias para o qPCR (p = 1,0).
Tabela 1 Dados demográficos e sobre imunossupressão inicial
Receptores | Frequência | % |
---|---|---|
Idade média (anos, média ± DP) | 42 ± 12 | (intervalo: 14 - 64) |
Raça branca/não-branca | 25/5 | (83,3/16,7) |
Sexo masculino/feminino | 18/12 | (60/40) |
CMV IgG + | 30 | (100) |
CMV IgG - | 0 | (0) |
Diabetes pré-transplante | 3 | (10) |
Doadores | ||
Vivos/falecidos | 3/27 | (10/90) |
CMV IgG + | 16 | (53,3) |
CMV IgG - | 7 | (23,3) |
CMV IgG desconhecido | 7 | (23,3) |
Imunossupressão inicial* | ||
Sem indução com anticorpos | 3 | (10) |
Indução com Basiliximab | 16 | (53,3) |
Indução com ATG | 11 | (36,7) |
CMV: citomegalovírus; indução com ATG: terapia de indução com anticorpos depletores de linfócitos
*Todos os pacientes receberam inibidores da calcineurina, micofenolato sódico e prednisona.
Muitas amostras deram resultado positivo ao mesmo tempo. Contudo, uma amostra foi positiva apenas no qPCR quinze dias após o transplante e em cada ponto da análise temporal. A exceção foram as amostras do trigésimo e sexagésimo dias, em que houve mais amostras positivas no qPCR do que na pesquisa de antigenemia. Além disso, não houve amostras positivas 180 dias após o transplante (Figura 1). Dentre as amostras positivas pela pesquisa de antigenemia, o número médio de células positivas foi de 5 ± 6/200.000, enquanto que nos testes positivos de qPCR a média foi de 5987 ± 10.623 cópias virais/mL.
Figura 1 Número de testes positivos por antigenemia pp65 e qPCR em cada momento de amostragem do estudo.
Devido ao pequeno número de amostras positivas, nenhum dos testes levou à identificação de um padrão de proliferação viral.
Segundo a pesquisa de antigenemia, 16 pacientes (53,3%) desenvolveram infecção ativa. Em 11 indivíduos a sorologia IgG foi positiva tanto para doadores como para receptores, e em dois casos apenas o receptor tinha anticorpos. A sorologia do doador era desconhecida em três transplantes. Não houve associação estatisticamente significativa entre sorologia pré-transplante de doadores e receptores e ocorrência de infecção ativa diagnosticada por este método (p = 0,169). Não foi observado nenhum caso de citomegalovírus.
Segundo este teste, 15 pacientes (50%) desenvolveram infecção ativa. Em nove receptores, a sorologia IgG foi positiva tanto para doadores como para receptores; em três, apenas o receptor apresentou anticorpos; e anticorpos IgG para CMV estavam presentes em outros três em que a sorologia do doador era desconhecida. Não houve associação estatisticamente significativa entre sorologia pré-transplante de doadores e receptores e ocorrência de infecção por CMV diagnosticada por qPCR (p = 0,667).
Concordância entre os dois testes foi observada em 217 amostras (90,4%), com ambas positivas em 16 (6,7%) e negativas em 201 (83,7%) casos. Sete amostras (2,9%) apresentaram resultado positivo para antigenemia e negativo para qPCR. Dezesseis (7,4%) testaram negativas por antigenemia e positivas por qPCR. Dessas 16 amostras, apenas duas (12,5%) pertenciam a pacientes com baixas contagens de leucócitos (< 4000/µL).
O coeficiente Kappa entre os testes de antigenemia e qPCR foi de 0,529 (p < 0,001), indicando concordância moderada entre os testes. Ao longo do período de observação, 25 pacientes apresentaram resultados concordantes para antigenemia e qPCR. Três pacientes testaram positivo por antigenemia e negativo por qPCR, enquanto dois pacientes testaram positivo por qPCR e negativo por antigenemia. O coeficiente Kappa para a observação entre pacientes foi de 0,667 (p < 0,001), indicando boa concordância. A Figura 2 exibe o gráfico de dispersão para os valores obtidos nos dois testes.
Figura 2 Coeficiente de correlação de Pearson entre ensaios de CMV por antigenemia pp65 e qPCR. Obs.: (1) Para valores de cópias de DNA no PCR inferiores a 1250 cópias/ml mas com sinal de amplificação foi atribuído o valor de 1250 cópias/ml; (2) Considerando os 480 testes, 88,5% dos resultados foram iguais a zero.
O coeficiente de correlação de Pearson foi de 0,47 (r² = 0,22, p < 0,001), demonstrando uma correlação regular entre as variáveis. Os parâmetros diagnósticos de cada ensaio, comparados ao padrão ouro estabelecido, constam na Tabela 2.
Tabela 2 Parâmetros diagnósticos dos ensaios de replicação de citomegalovíru
Teste/Parâmetro | Sensibilidade | Especificidade | VPP | VPN | Precisão |
---|---|---|---|---|---|
antigenemia pp65 | 59,0% | 100% | 100% | 92,6% | 93,3% |
Quantitative PCR | 82,1% | 100% | 100% | 96,6% | 97,1% |
PCR: reação em cadeia da polimerase; VPP: valor preditivo positivo; VPN: valor preditivo negativo.
Terapia de indução foi utilizada em 27 (90%) pacientes; 16 (53,3%) receberam anticorpos anti-receptores de interleucina-2 (Basiliximab®) e 11 (36,6%) receberam anticorpos depletores de linfócitos T (Thymoglobulin®). Segundo os critérios de antigenemia, infecção ativa ocorreu em 13 (81,3%) dos pacientes que receberam terapia de indução com Basiliximab e em apenas um (9,1%) dos indivíduos em que a indução foi feita com Thymoglobulin (p < 0,001).
De acordo com os critérios do qPCR, infecção ativa ocorreu em 11 (68,8%) dos 16 pacientes que receberam terapia de indução com Basiliximab® e em dois (18,2%) dos 11 pacientes que fizeram indução com Thymoglobulin®. Três pacientes que receberam terapia de indução com ATG testaram positivo para infecção ativa por citomegalovírus, dois por qPCR e um por antigenemia pp65. Em todos os casos, a TFG estimada pela equação do MDRD foi superior a 60 mL/min e a dose profilática de ganciclovir foi de 1 g três vezes ao dia.
A profilaxia com ganciclovir foi ministrada a 15 pacientes. Pelo critério de antigenemia, três pacientes (20%) que receberam tratamento profilático desenvolveram infecção ativa, comparado a 13 (86,7%) dentre os que não receberam profilaxia (p < 0,001). Na análise segundo os critérios do qPCR, quatro (26,7%) pacientes que receberam tratamento profilático desenvolveram infecção ativa em comparação a 11 (73,3%) que não receberam profilaxia (p = 0,011).
Não foram identificadas diferenças significativas entre os pacientes que desenvolveram infecção ativa e os que não o fizeram para os parâmetros idade de doadores e receptores, sexo, raça, presença de diabetes mellitus antes ou após o transplante, distribuição de sorologias anti-CMV, terapia de indução com anticorpos ou ocorrência de rejeição (Tabela 3).
Tabela 3 Fatores de risco para desenvolvimento de infecção ativa por citomegalovírus
Antigenemia pp65 | PCR quantitativo | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Teste Variável | Infecção | Sem infecção | p | Infecção | Sem infecção | p |
Idade (anos) | 42,3 | 42,1 | 0,982 | 39,2 | 45,2 | 0,200 |
Sexo (M/F) | 10/6 | 8/6 | 0,765 | 8/7 | 10/5 | 0,456 |
Raça (B/N) | 14/2 | 11/3 | 0,642 | 11/4 | 14/1 | 0,330 |
Pré-TxDM (Y/N) | 2/14 | 1/13 | 1,0 | 0/15 | 3/12 | 0,224 |
D+R+/D-R+ | 11/2 | 5/5 | 0,169 | 9/3 | 7/4 | 0,667 |
Profilaxia (Y/N) | 3/13 | 12/2 | < 0,001 | 4/11 | 11/4 | 0,011 |
Indução (Y/N) | 14/2 | 13/1 | 1,0 | 13/2 | 14/1 | 1,0 |
Rejeição (Y/N) | 6/10 | 3/11 | 0,440 | 7/8 | 2/13 | 0,109 |
M: Masculino; F: Feminino; B: Branco; N: Negro; DM: diabetes mellitus.
A TFG estimada pela equação do MDRD não revelou diferenças estatisticamente significativas entre os grupos de pacientes com e sem infecção ativa por CMV no sexto e décimo-segundo meses ou tampouco na última avaliação, por qualquer método diagnóstico (Figura 3). A terapia profilática com ganciclovir oral evitou o desenvolvimento de infecção ativa segundo os critérios diagnósticos por antigenemia (RR: 0,22; IC 95% 0,07-0,62; p < 0,001) e qPCR (RR: 0,36; IC 95%: 0,15-0,88; p = 0,026).
No presente estudo, a amostra de pacientes é representativa da população atual de receptores de transplante na região sul do Brasil. Os pacientes são predominantemente jovens caucasianos do sexo masculino submetidos a terapia de indução com anticorpos, que receberam rins de doadores falecidos. As variáveis envolvidas na replicação viral e relacionadas aos desfechos dos enxertos foram analisadas em relação aos métodos diagnósticos, e não foram estabelecidas correlações entre estas e o desenvolvimento de infecção ativa.
Avaliamos os dois métodos diagnósticos atualmente recomendados para o diagnóstico de infecção ativa por CMV, antigenemia pp65 e qPCR. A comparação entre os dois revela vantagens e desvantagens de um em relação ao outro.
O teste de PCR não exige equipe altamente treinada, pode ser realizado em pacientes com leucopenia, é automatizado, permite o processamento simultâneo de várias amostras e não requer materiais biológicos frescos. Entretanto, são necessários equipamentos e reagentes mais caros, especialmente no PCR quantitativo (qPCR), que é mais preciso. Os testes de qPCR foram padronizados em 2010 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), por meio de um padrão de referência produzido no National Institutes of Biological Standards and Controls do Reino Unido. A titulação padrão é de 5 x 106 UI/mL. Os testes comerciais e laboratoriais devem ser recalibrados de forma a mostrar colinearidade em relação a esta Referência.8,29. Em função de sua baixa especificidade, o PCR qualitativo não é atualmente utilizado para o diagnóstico de infecção por CMV.9,11,18,30
A antigenemia pp65 é um método semi-quantitativo que detecta, através de técnicas de imunoistoquímica ou imunofluorescência, a presença da fosfoproteína 65 expressa em leucócitos do sangue periférico infectado por CMV.11-13,18,31
Dentre suas vantagens destacam-se a elevada sensibilidade e especificidade, o baixo custo e a facilidade de execução, que não requer equipamentos sofisticados. Contudo, a execução do método exige pessoal treinado, a amostra de sangue total deve ser processada dentro de seis a oito horas, e a sensibilidade do teste é perdida na presença de neutropenia. Além disso, a antigenemia pode ser negativa ou apresentar contagens baixas em casos de patologia invasiva tecidual. Enfim, este método consome bastante tempo e exige trabalho intensivo da parte do pessoal do laboratório.2,3,11,13
A avaliação do objetivo principal deste estudo - analisar a correlação entre os dois métodos diagnósticos - revelou que ambos apresentam boa correlação. Este achado está de acordo com os dados da literatura para os métodos de antigenemia pp65 e qPCR para o diagnóstico de infecção ativa por CMV.12,18-20,25,32 Rhee et al.18 analisaram resultados de antigenemia pp65 e qPCR para 899 amostras de 111 pacientes de transplante renal no período pós-transplante recente, em grupo que apresentava perfil demográfico semelhante ao da população do nosso estudo. Os autores apontaram concordância entre 84% das amostras e indicaram correlação estatisticamente significativa entre os métodos diagnósticos.
Cariani et al.19 compararam 475 amostras consecutivas obtidas de 156 pacientes de transplante (rim e medula óssea), indivíduos com infecção por HIV e pacientes com neoplasias malignas hematológicas, e observaram uma correlação significativa entre os testes com concordância em 77% das amostras. Gouarin et al.22 analisaram 248 peças de 21 pacientes de transplante renal e identificaram uma correlação significativa entre qPCR em sangue total e antigenemia pp65, considerando o qPCR para CMV em sangue total uma alternativa adequada para diagnosticar e monitorizar a infecção por CMV em pacientes transplantados renais.
Piiparinen et al.24 encontraram uma correlação quase linear entre os resultados dos dois testes em 253 amostras consecutivas de sangue de pacientes submetidos a transplantes de rim ou fígado. Mengelle et al.25 relataram uma boa correlação entre qPCR com o DNA extraído de leucócitos e antigenemia pp65 a partir de 198 amostras de sangue de 14 pacientes submetidos a transplantes de rim, fígado ou coração, considerando o qPCR uma boa alternativa ao ensaio de antigenemia pp65.
Em nosso estudo, possivelmente por conta dos critérios do padrão-ouro para o diagnóstico de replicação viral, o qPCR apresentou maior sensibilidade para a identificação da replicação viral; porém, todos os demais parâmetros diagnósticos foram semelhantes. Em corroboração a esta ideia, devemos ressaltar que o qPCR revelou mais amostras positivas do que a antigenemia na maior parte da amostragem programada para o estudo.
O presente estudo apresenta algumas limitações. Em primeiro lugar, o tamanho da amostra é limitado e um percentual considerável dos doadores não tinha sorologia IgG disponível para avaliação, o que prejudicou a análise deste fator de risco. Além disso, o tempo de seguimento poderia ter sido mais longo e não houve casos de patologia invasiva tecidual. Apesar destas limitações, os resultados mostraram que o tamanho da amostra foi adequado para a avaliação dos métodos diagnósticos testados.
Concluímos que antigenemia pp65 e qPCR são métodos comparáveis para a detecção de replicação viral. A escolha de um método em detrimento do outro deve levar em conta os fatores locais, a presença de conhecimento especializado, os custos e o número necessário de exames a serem realizados em um programa de transplante específico, além da estratégia adotada pelo programa de transplante para monitorizar infecção ativa e doença por CMV. No entanto, o qPCR é um teste provavelmente mais sensível e ligeiramente mais preciso para a detecção de replicação viral, podendo substituir a antigenemia pp65 à medida em que se avoluma a necessidade de executar testes em programas de transplante.