versão impressa ISSN 1676-2444versão On-line ISSN 1678-4774
J. Bras. Patol. Med. Lab. vol.55 no.1 Rio de Janeiro jan./fev. 2019 Epub 09-Maio-2019
http://dx.doi.org/10.5935/1676-2444.20190005
O Serviço de Emergência Adulto (SEA) do Hospital Universitário (HU) possui uma equipe de 76 profissionais de enfermagem, 35 médicos efetivos (22 plantonistas e 13 diaristas) e nove residentes nas especialidades de clínica médica e cirúrgica, um psicólogo, um assistente social, um nutricionista, um farmacêutico, assistentes administrativos e de farmácia, seguranças, copeiros e auxiliares de limpeza. De acordo com dados da direção do HU, no ano de 2017, ocorreram 71.048 atendimentos de emergência no SEA. Nesse mesmo período, o Serviço da Divisão de Análises Clínicas (SACL) da instituição realizou aproximadamente 93.727 exames para esse serviço.
As unidades de emergência (UE) atendem 24 horas por dia e funcionam como porta de entrada para o sistema de saúde, acolhendo pacientes da própria urgência, pacientes com quadros percebidos como urgências, pacientes desgarrados da atenção primária e especializada, além das urgências sociais.
Tais demandas misturam-se nas UE, superlotando-as, o que compromete a qualidade da assistência prestada à população(1). Nesse contexto, é necessário êxito na interação com as demais áreas do sistema de saúde a fim de se otimizar a prestação dos serviços(2). Essa otimização é importante quando se considera o curto tempo de decisão, típico da unidade de emergência, o que não permite a existência de dúvidas e exige o máximo de confiabilidade nos resultados laboratoriais(3,4). Estes exercem papel fundamental no processo de tomada de decisão clínica, podendo influenciar até 70% dos diagnósticos e tratamentos médicos(5).
A monitorização e a oportunidade de afinar a satisfação dos usuários, o tempo de resposta (TAT) de resultados laboratoriais e a comunicação de valores críticos são fundamentais para a melhoria da qualidade da relação do laboratório clínico-serviço de emergência-cuidado ao paciente.
A qualidade de um serviço, definida como a conformidade às necessidades dos usuários, pode ser avaliada utilizando-se questionários de satisfação dos usuários como ferramenta(6). No entanto, como não devem ser considerados como único critério de avaliação da qualidade do serviço(7), apenas um quarto dos laboratórios realizam pesquisa de satisfação dos clientes®. Além disso, os índices de satisfação mais baixos estão relacionados com a má comunicação entre as partes(8).
O tempo de liberação de exames pelo laboratório de análises clínicas é considerado um dos mais importantes determinantes do tempo de permanência do paciente na UE, apesar de o tempo de acolhimento ser influenciado por diversos fatores. Para atingir as metas de tempo ideal de liberação dos resultados de exames, todos os aspectos do processo devem ser considerados, desde a requisição de exame até a liberação do resultado no sistema ou sua comunicação direta para o médico solicitante - o TAT®.
A preocupação atual das instituições de saúde para melhorar a segurança do paciente tem renovado o interesse no estabelecimento e na comunicação de valores laboratoriais críticos(10). Essa comunicação pode refletir tanto na eficiência logística do laboratório como na eficácia clínica(11). Por isso, para garantir cuidados médicos adequados, assim como prevenir os danos causados por atrasos no tratamento, é essencial a existência da comunicação oportuna, precisa, completa e inequívoca desses valores críticos.
Devido à escassez de evidências, o objetivo deste estudo é avaliar alguns aspectos da relação entre o SEA e o SACL de um HU quanto ao nível de satisfação dos médicos, ao tempo de liberação de exames e à comunicação de valores críticos pelo laboratório.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (CAAE 01423412.4.0000.0121), seguiu as recomendações da Resolução no. 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi realizado de agosto a outubro de 2017 no SEA e no SACL do HU.
A pesquisa foi realizada em quatro etapas. A primeira consistiu de uma pesquisa de satisfação dos médicos com turno diurno de trabalho no SEA em relação ao serviço prestado pelo SACL do HU, utilizando um questionário (Tabela 1).
Tabela 1 Questionário de satisfação aplicado aos médicos do SEA usuários do SACL do HU
1. Qual sua satisfação em relação aos seguintes serviços prestados pelo SACL? | |||||
Serviço prestado pelo SACL | Acima do desejável | Excelente | Bom | Regular | Ruim |
Tempo decorrido entre a solicitação de um exame e a coleta da amostra pelo SACL | |||||
Tempo decorrido entre a solicitação de um exame e a liberação do resultado pelo SACL no sistema | |||||
Cortesia dos servidores de coleta do SACL que prestam serviços nessa unidade | |||||
Cortesia dos demais servidores do SACL | |||||
Satisfação geral quanto ao SACL | |||||
2. Qual prazo você considera aceitável para a liberação dos resultados pelo SACL para o SEA? | |||||
Exames | 15 minutos | 30 minutos | 45 minutos | 60 minutos | 90 minutos |
Parcial de urina | |||||
Bioquímica | |||||
Hemograma | |||||
Coagulação | |||||
Sim | Não | ||||
O atraso no tempo de liberação de exames tem retardado o tratamento ou liberação de pacientes? | |||||
você adotaria a solicitação eletrônica de exames caso esta agilizasse a entrega de resultados? | |||||
Você confia nos resultados dos exames liberados pelo SACL do HU?Se não, por quê? | |||||
Na maioria das vezes | Algumas vezes | Poucas vezes | Nunca | ||
Com que frequência o tempo de liberação do resultado dos exames de urgência tem causado atraso no tratamento ou na liberação do paciente? | |||||
Com que frequência você tem recebido notificação de valores críticos pelo SACL? | |||||
Qual a importância da notificação antecipada de valores críticos para o SEA? | Muito importante | Importante | Pouco importante | Não importa | |
Em sua opinião, qual o principal problema do SACL? | |||||
Você tem alguma sugestão para melhoria do SACL? |
SEA: Serviço de Emergência Adulto; SACL: Serviço de Análises Clínicas; HU: Hospital Universitário.
A etapa seguinte foi a coleta de dados do tempo médio decorrido entre a solicitação de exames laboratoriais para pacientes do SEA, a coleta da amostra pela equipe do laboratório e o cadastro da amostra no sistema de informação laboratorial (SIL) do SACL/HU. Considerou-se o momento de solicitação do exame, em que o médico coloca a requisição de exame no local específico para solicitações no balcão de assistência do SEA. Foram monitoradas 80 requisições de exames variados no decorrer de três meses, em dias alternados de segunda a sexta-feira, das 8 às 18 horas. O tempo foi monitorado por apenas um pesquisador, utilizando-se cronômetro, sem que os profissionais envolvidos soubessem da avaliação e sem intervenção por parte do observador sobre os procedimentos. Os exames monitorados na pesquisa foram: hemograma, testes de coagulação (tempo de protrombina e tempo de tromboplastina parcial ativada), troponina e testes bioquímicos [sódio, potássio, cálcio, ureia, creatinina, magnésio, creatinoquinase (CK), CK fração MB (CK-MB), transaminases, gama glutamiltransferase, desidrogenase lática, amilase e lipase].
Na terceira etapa, foi realizado o monitoramento, por meio do SIL, do tempo médio decorrido entre o cadastro da amostra oriunda do SEA e a liberação do resultado, que corresponde à fase informatizada do processo. Nessa fase, foi possível monitorar o tempo médio da fase analítica de um número maior de exames solicitados no mesmo período da segunda etapa, incluindo o exame parcial de urina. Foram analisados os tempos de liberação de 311 hemogramas, 113 exames de coagulação, 325 exames de bioquímica, 54 troponinas e 215 exames de urina.
Os dados foram tabulados em planilhas de Excel e analisados no GraphPad Prism 5.0.
Na última etapa, o laboratório verificou os registros de comunicação dos valores críticos ao SEA. O processo de comunicação de valores críticos foi avaliado nos setores de bioquímica, hematologia, urinálise e microbiologia. Além disso, com base na análise documental, foram analisados: a) quais são os valores considerados críticos; b) como eles foram definidos; c) se houve consenso com a equipe médica; e d) como é registrada a comunicação no laboratório.
Entre os 13 médicos pertencentes ao quadro efetivo do SEA e os nove médicos residentes para os quais os questionários foram enviados, 10 (45%) responderam, sendo cinco efetivos e cinco residentes. A satisfação dos médicos em relação ao SACL está descrita na Tabela 2.
Tabela 2 Opinião dos médicos do SEA em relação ao SACL
Opinião dos médicos em relação: | Acima do desejável n (%) |
Excelente n (%) |
Bom n (%) |
Regular n (%) |
Ruim n (%) |
---|---|---|---|---|---|
ao tempo decorrido entre a solicitação de um exame e a coleta da amostra pelo SACL | 1 (10) | 0 (0) | 1 (10) | 8 (80) | 0 (0) |
ao tempo decorrido entre a solicitação de um exame e a liberação do resultado pelo SACL no sistema | 2 (20) | 0 (0) | 1 (10) | 7 (70) | 0 (0) |
à cortesia dos servidores de coleta do SACL que prestam serviços nessa unidade | 0 (0) | 2 (20) | 7 (70) | 1 (10) | 0 (0) |
à cortesia dos demais servidores do SACL | 0 (0) | 0 (0) | 8 (80) | 2 (20) | 0 (0) |
à satisfação geral quanto ao SACL | 0 (0) | 0 (0) | 4 (40) | 6 (60) | 0 (0) |
SEA: Serviço de Emergência Adulto; SACL: Serviço de Análises Clínicas.
Para 30% (três) dos médicos, o prazo aceitável para a liberação do exame parcial de urina (a partir da coleta) de pacientes da emergência é de 45 minutos; 40% (quatro) consideram 60 minutos e 30% (três), 90 minutos (Tabela 3). Em relação ao hemograma e aos exames de bioquímica e coagulação, o prazo aceitável para liberação do resultado a partir da coleta é de 45 minutos para 60% (seis) dos médicos (Tabela 3).
Tabela 3 Tempo de liberação de resultados considerado aceitável pela maioria dos médicos do estudo, encontrado para os exames do SEA e descrito na literatura
Exames | Aceitável pela maioria dos médicos do estudo | Tempo entre a solicitação e a liberação de resultados | Tempo entre o cadastro/ recebimento da amostra e a liberação de resultados | ||
---|---|---|---|---|---|
Encontrado | Literatura | Encontrado | Literatura | ||
Bioquímica | 45 | 158 ± 51 | 45 a 69(2,12) | 69 ± 34 | 29 a 45(2,13) |
Troponina | - | 179 ± 29 | 58 a 61(12,14) | 90 ± 30 | 39 a 60(14,15) |
Coagulação | 45 | 164 ± 48 | 90*(16) | 75 ± 32 | 37*(17) |
Hemograma | 45 | 176 ± 60 | - | 87 ± 40 | 12 a 27(13) |
Parcialde urina | 60 | - | - | 87 ± 42 | 13(13) |
Os resultados estão expressos como média ± desvio padrão em minutos.
*Dados referentes ao TAT de rotina, não especificamente como exame de emergência como os demais dados da literatura apresentados. SEA: Serviço de Emergência Adulto; TAT: tempo de resposta.
Todos os médicos (10) responderam que confiam nos resultados dos exames liberados pelo SACL e adotariam a solicitação eletrônica de exames, caso esta agilizasse a entrega de resultados.
A maioria (90% - nove) dos médicos respondeu que “na maioria das vezes” o atraso no tempo de liberação de exames retardou o tratamento ou a liberação de pacientes e que a notificação antecipada de valores críticos para o SEA é “muito importante”.
Quanto à frequência com que os médicos receberam a notificação de valores críticos pelo laboratório, 10% (um) respondeu “na maioria das vezes”; 20% (dois), “às vezes”; 50% (cinco), “poucas vezes”; e 20% (dois), “nunca” foram notificados.
Em geral, foram citados como principais problemas do SACL: 1. coletas solicitadas com urgência muitas vezes não são realizadas com a devida urgência; 2. tempo de liberação dos resultados; 3. demora na coleta e na realização dos exames; 4. tempo prolongado entre a solicitação e a liberação do exame; 5. demora para coletar, principalmente em horário de plantão.
Como sugestão para a melhoria do SACL, foram feitas as seguintes propostas: 1. manter um profissional somente para os exames de urgência, além dos coletadores de rotina; 2. agilizar todos os procedimentos; 3. contratar um maior número de funcionários ou otimizar o tempo daqueles que já atuam na instituição para agilizar o serviço; e 4. criar um posto de coleta com funcionários na UE.
A Figura 1A apresenta o tempo gasto em cada etapa da fase pré-analítica para a realização dos exames laboratoriais solicitados pelo SEA, ou seja, o tempo entre a solicitação do exame e a coleta da amostra e entre a coleta da amostra e o seu cadastro no SIL.
Figura 1 Tempo envolvido nas diferentes etapas do processo laboratoriaA) tempo das etapas da fase pre-analitica; B) tempo entre a coleta da amostra e a liberacao do resultado. As linhas continuas e pontilhadas azuis representam a media e o desvio padrao, respectivamente; as linhas pretas, a mediana; e as barras de erros, os quartis minimo e maximo.
O tempo médio da fase analítica, ou seja, o tempo entre o recebimento/cadastro da amostra e a liberação do resultado de cada exame estudado está representado na Tabela 3. Já o tempo médio entre a coleta da amostra e a liberação do resultado e entre a solicitação do exame e a liberação do resultado estão representados na Figura 1B e Tabela 3, respectivamente.
A comunicação é feita por telefone nos setores de hematologia e microbiologia, embora neste, tanto a comunicação quanto a liberação de resultado preliminar sejam feitas no sistema informatizado. Também para ambos os setores, os valores críticos são reportados para qualquer indivíduo que atender o telefone sem qualquer obrigação de registro no prontuário. O registro da comunicação de valor crítico no setor de microbiologia é realizado no próprio mapa de trabalho de cada exame, onde são registrados o resultado crítico, o nome e a função de quem recebeu a informação, bem como a data, a hora e o nome de quem comunicou o resultado. Esse mapa é desprezado depois de um ano. O registro de comunicação não é realizado pelo setor de hematologia.
Apenas o setor de hematologia tem uma lista de valores críticos, que foram obtidos na literatura. O setor de bioquímica também possui lista obtida a partir da literatura, contendo parâmetros de várias áreas, mas sem rotina de utilização. O setor de uroanálise não possui lista de valores críticos. Embora o setor de microbiologia não possua um procedimento operacional padrão, a comunicação de valores críticos é realizada sempre que ocorre hemocultura positiva em qualquer unidade do hospital. A comunicação de alguns valores críticos também é realizada de forma não sistematizada pelo setor de hematologia. Já os setores de bioquímica e uroanálise não realizam a comunicação de valores críticos.
Visando ao aperfeiçoamento do sistema de serviço de saúde, a satisfação dos usuários é considerada uma meta a ser alcançada(7,18,19). A utilização de questionário de satisfação como ferramenta é apenas uma maneira de receber um retorno dos profissionais que utilizam um serviço(18,19); no caso desta pesquisa, o SACL do HU não pode ser considerado o único critério de avaliação da qualidade do serviço.
Em nosso estudo, embora o número de participantes da pesquisa de satisfação pareça pequeno - 45% daqueles em posição de responder -, em pesquisas semelhantes a taxa média de médicos respondentes foi de 40,8% e 57,3%(20,21).
A cortesia é importante para o bom relacionamento entre os profissionais da equipe. Nesse contexto, a cortesia do pessoal do laboratório foi considerada boa por aproximadamente 75% dos médicos. Resultado semelhante foi observado em estudos realizados em hospitais da Etiópia, onde a satisfação médica foi observada em relação à cortesia pelo pessoal do laboratório(22,23). No entanto, essa taxa fica abaixo da satisfação média (96%) relatada por um estudo realizado pelo Colégio Americano de Patologistas (CAP) com 81 laboratórios(24).
O elevado percentual de médicos que consideraram que o atraso no tempo de liberação de exames tem retardado muitas vezes o tratamento ou a alta de pacientes é preocupante, pois geralmente o atraso no diagnóstico e/ou tratamento prolonga a permanência de pacientes no SEA, contribuindo para sua superlotação e aumentando os custos hospitalares.
Todos os participantes da pesquisa de satisfação responderam que confiam nos resultados dos exames liberados pelo SACL/HU. Em outros estudos, a taxa de confiança nos resultados foi de 80% a 98%(22,24). A confiança nos resultados é importante para agilizar o atendimento ao paciente e evitar os custos da repetição dos exames. Além disso, todos os médicos participantes responderam que fariam a solicitação eletrônica de exames, se isso pudesse agilizar a entrega dos resultados, o que demonstra uma oportunidade de melhoria do processo.
Enquanto a satisfação geral quanto ao SACL foi considerada “regular” para 60% dos médicos, em outros estudos a taxa variou de 51% a 84%(7,22-24). Contudo, diferentemente do que foi exposto em nossa pesquisa, outro estudo reportou 86% de satisfação no tratamento de pedidos urgentes(22).
As reclamações e as sugestões descritas pelos participantes ao SACL foram muito diferentes daquelas citadas no estudo de Mengesha(23), o que demonstra diversas realidades organizacionais dos laboratórios e dos hospitais.
A utilização de questões abertas em questionário de satisfação de clientes pode ser muito útil, visto que as respostas podem apontar problemas desconhecidos do laboratório(18). O monitoramento da satisfação do cliente é um componente valioso de um programa de melhoria de qualidade do laboratório, pois permite que se tenha um retorno quanto à qualidade do serviço oferecido(25).
No entanto, o monitoramento em si não aumenta a qualidade caso ações corretivas não sejam adotadas(18).
O CAP requer que os laboratórios meçam a satisfação dos usuários (médicos, clientes e pacientes), pelo menos uma vez a cada dois anos, como um componente vital para avaliação do desempenho do laboratório(24).
Entre os médicos que responderam ao questionário de satisfação, a maioria (80%) considerou que o tempo entre a solicitação de um exame e a coleta da amostra é “regular” no SEA. Verificou-se que o tempo médio entre a solicitação e a coleta da amostra foi de 50 minutos, o que realmente pode ser excessivo quando se trata de pacientes em estado crítico. Esse tempo excessivo da fase pré-analítica do SACL pode ocorrer devido a vários fatores, incluindo falha de comunicação ao SACL da solicitação de exame, não exclusividade dos coletadores para o SEA, grande número de solicitações para coleta, tempo de locomoção dos coletadores entre o SACL e o SEA e tempo para cadastro das requisições, além de variáveis eventuais.
Para 70% dos participantes da pesquisa de satisfação, o tempo total entre a solicitação de um exame e a liberação do resultado no sistema foi considerado “regular”. Em outros estudos foi observada satisfação semelhante (61% a 80%)(7,22). Em geral, o CAP afirma que o TAT é uma área de insatisfação, sem associação significativa com a satisfação geral quanto ao serviço laboratorial. Esse paradigma destaca a necessidade dos laboratórios permanecerem vigilantes sobre o TAT24.
Embora a medida do tempo de liberação de exames seja um método comum em análises clínicas, a comparação de estudos é complexa pois há diferentes definições de TAT sendo utilizadas. Alguns autores consideram que o TAT começa com a solicitação do exame; outros, com a coleta da amostra; e outros, ainda, com a entrada da amostra no setor de análises26. Considerando o TAT o tempo entre a solicitação do exame e a liberação do resultado, observamos que o tempo desejável pela maioria dos médicos participantes do estudo está condizente com o descrito na literatura(2,12-14,16,17). Contudo, o tempo de liberação de exames do SACL foi aproximadamente três vezes maior do que aquele desejado pelos médicos do SEA da instituição.
Da mesma forma, considerando o TAT o tempo entre o cadastro/ o recebimento da amostra e a liberação dos resultados, também chamado TAT laboratorial, o SACL demonstrou desempenho muito abaixo do descrito na literatura(2,13,15). Podemos perceber que o TAT laboratorial (tempo das fases analítica e pós-analítica) do SACL do
HU (para os exames pesquisados) está próximo daquele encontrado em outras instituições como TAT total (tempo entre a solicitação e a liberação do resultado). Nota-se ainda que o TAT laboratorial foi aproximadamente 50% do TAT total. Esse percentual também foi observado por Goswami et al. (2010)(27), embora eles tenham encontrado um TAT total para todos os exames de emergência muito inferior (60 a 90 minutos) ao encontrado em nosso estudo. No nosso caso, os dados sugerem que a fase pré-analítica deve ser o principal alvo de melhoria.
Guidelines recomendam que o tempo de liberação do resultado de troponina, a partir da coleta da amostra, seja de 30 minutos(15), tempo quatro vezes menor do que o observado em nosso estudo; quando for superior a 1 hora, deve ser implantado teste laboratorial remoto no local(15).
Nesta pesquisa, a falta de informatização dos processos dificultou a coleta dos tempos de liberação de exame. Esse fato foi o motivo do reduzido número de solicitações monitoradas, as quais podem não representar o SACL de forma geral. A dificuldade de obtenção dos dados reforça ainda mais a necessidade de informatização de todas as etapas do processo, desde a requisição eletrônica do exame e do recebimento automático da solicitação de coleta, o cadastro, a impressão de etiquetas e a identificação das amostras no momento da coleta até o registro (leitura de código de barras) no momento da entrada da amostra no setor de análise, para que se possa ter controle sobre cada uma das etapas.
A notificação antecipada de valores críticos para o SEA foi considerada importante por todos os médicos participantes da pesquisa e muito importante por 90% deles. Esse resultado corrobora a opinião descrita na literatura(28) e provavelmente demonstra a possibilidade de ação imediata diante de uma situação de risco para o paciente. Apesar disso, metade dos participantes refere que poucas vezes recebeu notificação de valores críticos pelo laboratório. De forma semelhante, outros estudos também relataram insatisfação de 39% a 56% dos médicos em relação à falta de comunicação de valores críticos(7,22). Por outro lado, o estudo realizado pelo CAP apresentou uma taxa de 95% de satisfação com as notificações realizadas, demonstrando essa cultura na relação dos laboratórios com os médicos(24). Ainda relatou que a notificação de valores críticos é uma área de insatisfação sem associação com a satisfação geral quanto ao serviço laboratorial(24).
Quando há o monitoramento em tempo real da ocorrência de resultados críticos, por meio de sistema informatizado de alerta e/ou os profissionais estão motivados a realizar a notificação efetiva, a comunicação de valores críticos fornece informações que podem acelerar decisões terapêuticas e, potencialmente, melhorar o cuidado ao paciente. Constatou-se também que não há cultura de notificação de valores críticos no SACL pelos setores analisados. Não observamos a padronização na maneira de se estabelecer a lista de resultados considerados críticos, os procedimentos de comunicação e tampouco os treinamento dos colaboradores (tanto do laboratório quanto do SEA), conforme preconizado na literatura(28).
Para que ocorra comunicação ativa dos valores críticos é preciso que haja sistematização do processo. O ideal é que os valores críticos sejam estabelecidos de acordo com a patologia ou a especialidade médica e que haja um consenso entre equipe médica, laboratório e bibliografias acerca desses valores e da melhor forma de comunicá-los(28-30). A tecnologia deve ser uma aliada, de forma que o próprio sistema de informação, alimentado com os valores considerados críticos, emita alerta quando detectado um valor relevante durante o interfaceamento dos resultados(28,31).
Assim como o laboratório deve se organizar para comunicar os valores críticos de forma eficiente, a unidade de emergência também deve estar preparada para receber e registrar a informação. Alguns critérios devem ser estabelecidos - como quem está apto a receber o valor crítico e onde registrá-lo - e são fundamentais para o sucesso da sistemática(28).
O grau de satisfação dos médicos com o serviço do laboratório foi aceitável, mas várias oportunidades de melhoria foram observadas, principalmente no tempo de liberação dos resultados de exames e na comunicação de valores críticos. Nossa pesquisa aponta que para aprimorar o processo de obtenção imediata de um resultado de exame laboratorial, desde a solicitação até a comunicação dos valores críticos, também é necessário o envolvimento dos médicos e enfermeiros para fornecer serviços de qualidade. Neste contexto, reduzir o tempo de liberação de exames é uma tarefa complexa que envolve monitoramento, planejamento, educação e investimento em informatização do sistema. Mais estudos são recomendados, com maior tamanho amostral, uso de outros indicadores de qualidade e comparação da relação diurna entre o SE e o SACL com a relação noturna e de fins de semana.