versão On-line ISSN 2526-8910
Cad. Bras. Ter. Ocup. vol.27 no.2 São Carlos abr./jun. 2019 Epub 09-Maio-2019
http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoar1601
As lesões traumáticas de membro superior podem trazer inúmeras dificuldades para a rotina de trabalhadores, comprometendo o desempenho ocupacional nas atividades de vida diária e levando frequentemente ao afastamento do trabalho (OLIVEIRA et al., 2013). Tais lesões podem envolver ossos, músculos, tendões, nervos periféricos e a cobertura cutânea, sendo que a complexidade das lesões aumenta à medida que aumentam as estruturas envolvidas e o déficit funcional acarretado (SAXENA; CUTLER; FELDBERG, 2004). Entre as causas mais comuns dessas lesões estão os acidentes de trânsito, acidentes com máquinas, quedas, práticas de atividades de lazer ou decorrentes de violência urbana (BARBOSA et al., 2013).
Em levantamento realizado na cidade de São Paulo entre 2011 e 2013 sobre acidentes de trânsito, 52,1% dos acidentes envolviam motocicletas. Dentre as vítimas dos acidentes com motocicleta, 81,6% eram homens, 46,2% estavam na faixa etária entre 20 e 29 anos, sendo os traumas de membro superior a segunda maior consequência (RODRIGUES et al., 2014). A idade das vítimas chama a atenção, pois se refere a adultos em idade produtiva que, muitas vezes, precisam ser afastados do trabalho.
O trabalho é mais do que uma atividade remunerada, pois colabora na consolidação da identidade, contribuindo para a participação social do indivíduo na medida em que possibilita vínculo e pertencimento a determinado grupo (TOLFO; PICCININI, 2007). A sua importância é individualmente atribuída, se relacionando ao contexto social e histórico em que se insere cada sujeito (MORIN, 2001).
De acordo com Cordeiro (2005), papéis ocupacionais envolvem o engajamento em ocupações significativas, a adoção de comportamentos e ações a elas ligados, proporcionando a consolidação da identidade pessoal. Assim, o engajamento no papel ocupacional de trabalhador propicia ao sujeito o sentimento de vinculação social, de realização pessoal e auxilia na estruturação da rotina diária (MORIN, 2001). Consequentemente, quando o desempenho desse papel ocupacional fica comprometido, acarretará em mudanças não só financeiras, mas também emocionais e sociais.
De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), os traumas de membro superior foram responsáveis por 32,83% dos benefícios de auxílio doença acidentário concedidos no Brasil no ano de 2017, bem como 8,44% dos benefícios auxílio doença previdenciários (BRASIL, 2018).
Nesse sentido, dada a relevância do papel ocupacional de trabalhador, assegurar a sua manutenção deve ser um dos objetivos do terapeuta ocupacional que atua na área de saúde do trabalhador, por meio de ações de prevenção e reabilitação (LANCMAN; GHIRARDI, 2002).
Diversas pesquisas caracterizam e exemplificam a atuação e preocupação da terapia ocupacional no retorno ao trabalho como no estudo de Figueiredo et al. (2006), realizado no setor de terapia ocupacional de um hospital público, que teve por objetivo documentar os resultados alcançados no programa de reabilitação em 3 momentos: admissão, alta e follow-up. Após completar a reabilitação foi observada melhora dos pacientes nos 3 aspectos avaliados: força de preensão, amplitude de movimento e sensibilidade. Essa melhora foi correlacionada positivamente com percepção de melhor funcionalidade e maior satisfação com desempenho ocupacional (FIGUEIREDO et al., 2006).
Considerando o impacto pessoal e sócio econômico destas lesões no cenário brasileiro, conforme descrito anteriormente, fazem-se necessários estudos que possam orientar e direcionar as intervenções de reabilitação e de retorno ao trabalho. O objetivo deste estudo de revisão foi documentar evidências sobre as barreiras e facilitadores para o retorno ao trabalho de pessoas que sofreram traumas agudos em membros superiores.
Estudo descritivo, de caráter exploratório e abordagem qualitativa, por meio de revisão bibliográfica pelo método de revisão integrativa (GIL, 2002). A revisão integrativa é uma forma de revisão bibliográfica que tem por objetivo sintetizar o conhecimento sobre um determinado tópico, desenvolvido em 6 etapas previamente estabelecidas: elaboração da pergunta norteadora, busca na literatura, coleta de dados, análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação da revisão integrativa (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).
A primeira etapa consistiu na elaboração da pergunta norteadora, essa pergunta é respondida pela revisão e resume o assunto que se deseja elucidar. Neste trabalho a pergunta utilizada foi: ‘Quais os fatores barreiras e quais os fatores facilitadores do retorno ao trabalho após lesões traumato-ortopédicas agudas nos membros superiores?’.
Na etapa seguinte foram definidos os critérios para a busca nas bases de dados. Para este estudo os descritores foram selecionados de acordo com os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): traumatismos da mão, retorno ao trabalho, readaptação ao emprego, reabilitação profissional e acidentes de trabalho e seus equivalentes em inglês e espanhol. Os descritores foram agrupados por categorias, a primeira foi denominada Grupo 1 – Trabalho e inclui os descritores: Retorno ao Trabalho, Reabilitação Profissional e Readaptação ao Emprego, a segunda foi denominada Grupo 2 – Lesão e inclui os descritores: Traumatismos de Mão e Acidentes de Trabalho. A busca foi realizada a partir da combinação de dois descritores, um de cada categoria nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scielo, Lilacs, Periódicos Capes e Pubmed.
Após a seleção dos descritores, foram definidos os critérios de inclusão e exclusão dos estudos na amostra analisada. Para este estudo foram considerados os seguintes critérios de inclusão:
Artigos científicos com texto completo disponível;
Período de publicação de 2005 a 2015;
Idiomas de publicação: português, inglês ou espanhol;
População estudada: adultos;
Menção ao retorno ao trabalho/papel de trabalhador e traumas ortopédicos agudos no resumo.
Os critérios de exclusão foram:
Artigos cujo texto completo não estava disponível, publicados fora do período definido ou em outro idioma que não os descritos nos critérios de inclusão;
Textos que no resumo não mencionam o retorno ao trabalho/papel de trabalhador e traumas ortopédicos agudos como parte do estudo;
Trabalhos cuja população estudada envolva crianças ou idosos;
Estudos que envolveram outras condições de saúde musculoesqueléticas que não fossem lesões traumato-ortopédicas agudas;
Artigos de revisão.
Na terceira etapa, os artigos selecionados a partir dos critérios de inclusão e exclusão foram lidos na íntegra. Verificou-se a necessidade de criar um instrumento de coleta de dados próprio que fosse sensível a identificar as informações que respondessem à pergunta norteadora. O instrumento continha as seguintes informações: código do artigo, autor(es), título, periódico, ano de publicação, país, idioma, tipo de estudo, objetivo do estudo, fatores barreira para o retorno ao trabalho e fatores facilitadores para o retorno ao trabalho. Os artigos que falharam em responder a esse instrumento foram excluídos da amostra por não apresentarem informações que respondessem à questão norteadora da revisão.
Na quarta etapa os resultados obtidos após a aplicação do instrumento foram sintetizados e agrupados em categorias temáticas para serem discutidos (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).
A busca nas bases de dados gerou um total de 63 artigos que correspondiam aos parâmetros de idioma, data da publicação e disponibilidade do texto completo. A Pubmed foi a base de dados com maior número de achados (n = 24) e ‘Traumatismos da Mão’ AND ‘Retorno ao Trabalho’ foi a combinação de descritores com maior número de artigos selecionados (n = 44).
Dos 63 artigos, 33 foram selecionados para a leitura na íntegra, pois não apresentaram nenhum dos critérios de exclusão. Após a aplicação do instrumento de coleta de dados, 13 artigos foram mantidos para a discussão por responderem à questão norteadora (Figura 1).
A amostra final é composta por estudos realizados predominantemente em Taiwan (n = 3), Estados Unidos (n = 3) e China (n = 2), com exceção de um estudo brasileiro todos foram publicados em inglês. Quanto à data de publicação, foi observado que, na amostra obtida, o número de artigos do período de 2010 a 2015 (n = 9) se mostrou mais de duas vezes maior que o período de 2005 a 2009 (n = 4), o que pode indicar um aumento na preocupação em pesquisas e estudos com essa temática. Os artigos selecionados foram codificados para discussão e são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1 Artigos da amostra.
Artigo | Fonte | Dados da amostra | Tipo de Estudo | Objetivo Principal | Medidas de Avaliação/Resultados Avaliados |
---|---|---|---|---|---|
A1 | Langford, Cheung e Li (2015) | 10 pacientes com fratura cominutiva de base de falange proximal ou cabeça de metacarpo tratados com fixação por fio de 2005 a 2014 | Qualitativo | Avaliar a efetividade (definhada como união óssea e estabilidade articular) de fixação de fraturas cominutiva envolvendo articulação metacarpofalangeana após ferimento por arma de fogo ou lesão por esmagamento | Questionário Quick Disabilities of the Arm, Shoulder, and Hand, amplitude de movimento em metacarpofalangeana, dor, uso da mão afetada, retorno ao trabalho. |
A2 | Loisel et al. (2014) | 79 pacientes que sofreram acidente durante a atividade de carpintaria no período de 2 anos | Qualitativo | Descrever as características demográficas de pacientes com lesões durante atividade de carpintaria | Entrevista/Questionário Subjetivo para identificar contexto do acidente, características da lesão, características sócio ocupacionais do paciente, gravidade da sequela, tempo de afastamento do trabalho. |
A3 | Hu et al. (2014) | 246 casos de trabalhadores com lesão de mão relacionada ao trabalho atendidos em hospitais na região leste da China | Quantitativo e qualitativo | Explorar a situações e os potenciais determinantes do retorno ao trabalho e duração do afastamento após lesão de mão relacionada ao trabalho | Entrevista com questionário estruturado para identificar características demográficas, severidade da lesão de acordo com a Hand Injury Severity Scale, retorno e permanência no trabalho por pelo menos 1 mês |
A4 | Roesler, Glendon e O’Callaghan (2013) | 192 pacientes de uma clínica de terapia da mão | Quantitativo e qualitativo | Desenvolver e testar um modelo conceitual biopsicossocial abrangente e multivariado para prever o retorno ao trabalho como resultado | Instrumentos utilizados: Entrevista com dados sociodemográficos, Escala de Avaliação da Dor, Escala de Satisfação com o Trabalho, General Self-Efficacy Scale, Positive and Negative Affect Scale, Modified Hand Injury Severity Scale, Multi-dimensional Health Locus of Control Scale. |
Dados coletados: Fatores preditores do retorno ao trabalho relacionados por características sociodemográficas, características do trabalho, fatores biomédicos, fatores psicossociais e fatores psicológicos | |||||
A5 | Ramel et al. (2013) | 40 pessoas com idade entre 19-64 anos que sofreram traumas complexos de mão | Quantitativo e qualitativo | Explorar fatores importantes para o retorno ao trabalho de pessoas que sofreram traumas complexos de mão | Questionário auto aplicado para identificar dados demográficos, autopercepção de funções da mão e do corpo, dor, condição de saúde e incapacidade, qualidade de vida física e mental, descrição do ambiente de trabalho, causa de lesão, tratamento e reabilitação. |
A6 | Hoxie et al. (2009) | 134 prontuários de pacientes que sofreram lesão de mão por serra elétrica | Quantitativo | Fornecer informações detalhadas sobre os custos de lesão de mão por serra elétrica | Coleta de dados pelo prontuário |
Custos com tratamento médico e reabilitação, tempo afastado do trabalho e custos com afastamento do trabalho | |||||
A7 | Cheng (2008) | 27 entrevistados com incapacidade moderada a severa decorrente de trauma de mão | Qualitativo | Examinar as experiências vividas por trabalhadores que sofreram trauma de mão em Hong Kong | Entrevistas abertas com trabalhadores que sofreram trauma de mão para identificar a percepção da incapacidade decorrente da lesão e suas consequências para o retorno ao trabalho e ao convívio familiar. |
A8 | Kadzielski, Bot e Ring (2012) | 93 trabalhadores com lesão de dedo | Quantitativo e qualitativo | Avaliar os efeitos separados de satisfação com o trabalho, burnout e ganho secundário em incapacidade do membro superior decorrente de trauma em dedo. | Instrumentos utilizados: Shirom-Melamed’s Burnout Measure, Job Descriptive Index questionnaire, Disabilities of the Arm, Shoulder, and Hand, Short Form Health Survey (SF-36), Mental Component Summary, Physical Component Summary. |
Dados coletados: dados demográficos, burnout, satisfação com o trabalho, condição funcional de membro superior e estado de saúde geral. | |||||
A9 | Matsuzaki et al. (2009) | 50 pacientes com amputação total ou parcial de dedo | Quantitativo | Investigar os efeitos da severidade e forma de lesão de traumas de mão na recuperação funcional e retorno ao trabalho | Instrumentos utilizados: Tamai’s Score, Quick Disabilities of the Arm, Shoulder, and Hand, Hand Injury Severity Scale. |
Dados coletados: recuperação sensorial, amplitude de movimento do dedo, temperatura da pele, função manual, condição de retorno ao trabalho, duração do tratamento, tempo afastado do trabalho, gravidade de lesão, número de dedos envolvidos e tipo de lesão. | |||||
A10 | Chen et al. (2012) | 120 pacientes de um centro de reabilitação plástica e reconstrutiva com lesão traumática de membro superior | Quantitativo e qualitativo | Investigar as relações entre severidade da lesão, autopercepção de saúde, características demográficas e tempo de afastamento do trabalho, após traumatismo de membro superior relacionado ao trabalho e a influência de fatores psicológicos para aptidão para o retorno ao trabalho | Instrumentos utilizados: Modified Hand Injury Severity Score, Short Form Health Survey (SF-36). |
Dados coletados: severidade do trauma, autopercepção de saúde, tempo afastado do trabalho | |||||
A11 | Cabral et al. (2010) | 35 trabalhadores com trauma de mão atendidos em um centro de reabilitação | Quantitativo e qualitativo | Descrever os trabalhadores que retornaram ao trabalho após um trauma de mão e analisar os fatores que se associaram a esse desfecho após três anos da alta da reabilitação. | Instrumentos utilizados: anamnese, dinamômetro e Canadian Occupational Performance Measure. |
Dados coletados: sexo, idade, estado civil, nível de escolaridade, situação trabalhista, tipo de acidente, ocupação, lado acometido, dominância, agente causador, diagnóstico, tempo de exercício da atividade prfissional, tempo de reabilitação, força de preensão, desempenho ocupacional e situação com relação ao trabalho. | |||||
A12 | Du, Lai e Wang (2007) | 102 trabalhadores hospitalizados com fratura não severa do membro superior | Qualitativo | Estudar os fatores que influenciam o retorno ao trabalho de indivíduos com fratura de extremidade em membro superior | Instrumentos utilizados: entrevista com questionário estruturado, relatório do departamento de seguro trabalhista e inspeção trabalhista. |
Dados coletados: gravidade da lesão, dados sociodemográficos, informações sobre o tratamento médico e hospitalização, condição psicossocial, condições do emprego. | |||||
A13 | Lee et al. (2010) | 140 pacientes hospitalizados por lesão de mão | Qualitativo | Examinar a relação entre a severidade anatômica inicial e a probabilidade de retorno ao trabalho de pacientes com lesão de mão | Instrumentos utilizados: Hand Injury Severity score e entrevista. |
Dados coletados: características sociodemográficas, características ocupacionais, gravidade da lesão. |
Fonte: As autoras (2017).
Após a análise qualitativa, os resultados foram agrupados em quatro categorias temáticas para a verificação das barreiras e facilitadores correspondentes: Paciente, Lesão, Reabilitação e Trabalho. A categoria Paciente se refere às características dos pacientes que foram identificadas como barreiras ou facilitadores para o retorno ao trabalho, encontrada em 8 artigos. A categoria Lesão aponta os aspectos das lesões traumáticas de membro superior que se relacionam como barreiras ou facilitadores para o retorno ao trabalho, encontrada em 11 artigos. A categoria Reabilitação se refere ao tratamento pós-cirúrgico ao qual os pacientes foram submetidos e às estratégias utilizadas classificadas como barreiras ou facilitadores para o retorno ao trabalho, encontrada em 5 artigos. Por fim, a categoria Trabalho se refere às condições relacionadas ao trabalho que foram classificadas como barreira ou facilitadores para o retorno ao trabalho, encontrada em 8 artigos (Tabela 2).
Tabela 2 Categorias de análise.
Categoria | Fatores facilitadores do RT | Artigos com a evidência | Fatores barreiras ao RT | Artigos com a evidência |
---|---|---|---|---|
Pacientes | Maior escolaridade | A3, A13 | Morar sozinho | A4 |
Menor número de dependentes familiares | A3 | Locus de controle externo | A4 | |
Auto eficácia | A4 | Menor satisfação com a saúde | A5 | |
Suporte sócio familiar | A7, A13 | Ausência de suporte sócio familiar | A7 | |
Maior satisfação com a saúde e funcionalidade | A1, A10 | Abandonar a reabilitação | A1 | |
Burnout anterior a lesão | A8 | |||
Lesão | Menor número de procedimentos cirúrgico | A1, A6 | Maior número de procedimento cirúrgico | A1, A6 |
Lesões que não necessitaram hospitalização | A3 | Maior tempo de hospitalização | A2, A3, A5 | |
Menor gravidade da lesão | A3, A6, A9 | Maior gravidade da lesão | A3, A6, A9, A10, A12, A13 | |
Lesão não ocasionada por acidente de trabalho | A3 | Dor | A8 | |
Menor tempo de tratamento | A9 | Maior tempo de tratamento | A9, A10 | |
Dor mínima a moderada | A1 | Lesão no membro dominante | A12 | |
Incapacidade permanente | A7 | |||
Lesões que demandaram maior custo econômico | A6 | |||
Reabilitação | Recuperação de ADM | A1 | Aderência cicatricial | A1 |
Treinamento ocupacional | A2 | Pior função manual, preensão, força, destreza e mobilidade articular | A5 | |
Programa de reabilitação precoce | A5 | Maior tempo em reabilitação | A10 | |
Maior força de preensão na alta da reabilitação | A11 | Menor força de preensão na alta da reabilitação | A11 | |
Início precoce em programas de reabilitação voltados ao trabalho | A10 | Menor tempo em reabilitação | A11 | |
Trabalho | Receber seguro por acidente de trabalho | A3, A12, A13 | Receber indenização por acidente de trabalho | A8 |
Não ter alteração salarial decorrente do afastamento | A3 | Diminuição do salário decorrente do afastamento | A3 | |
Menor tempo de afastamento do trabalho | A3, A9 | Maior tempo afastado do trabalho | A2, A3, A5, A9 | |
Apoio no local de trabalho | A5, A7 | Ausência de suporte no local de trabalho | A7 | |
Satisfação com o trabalho | A8 | |||
Estabilidade no emprego | A12 | |||
Trabalhadores não braçais | A12, A13 | |||
Maiores salários | A13 |
Fonte: As autoras (2017).
A categoria Paciente identificou como barreiras e facilitadores características sociodemográficas, comportamentais e de saúde. Os facilitadores encontrados foram maior escolaridade (A3 e A10), menor número de dependentes familiares (A3), autoeficácia (A4), suporte sócio familiar (A7 e A13) e maior satisfação com a saúde e funcionalidade (A1 e A10). Os dados encontrados são condizentes com os achados na literatura que relatam maior escolaridade e presença de suporte sócio familiar como facilitadores para o retorno ao trabalho (SILVA; GUIMARÃES; RODRIGUES, 2007). As barreiras encontradas foram morar sozinho (A4), menor satisfação com a saúde (A5), ausência de suporte sócio familiar (A7), abandonar a reabilitação (A1), diagnóstico de Síndrome burnout anterior a lesão (A8), e atribuir a recuperação a fatores externos (A4). Em estudo realizado para analisar fatores relacionados a duração de benefícios por incapacidade concedidos pelo INSS, foi apontado idade abaixo de 39 anos, pior situação socioeconômica e alta expectativa de retorno ao trabalho como fatores associados com menor de duração do benefício (SOUZA; SANTANA, 2012). Outro estudo realizado com vítimas de acidente de trânsito para analisar variáveis preditoras do retorno ao trabalho identificou que aqueles que retornaram ao trabalho 6 meses após a lesão apresentavam valores mais altos no SF-36 para os domínios de capacidade funcional, estado geral de saúde, dor, aspectos físicos, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental (PAIVA et al., 2016).
A categoria Lesão identificou a severidade da lesão como eixo central para definição de barreiras e facilitadores, apontando como barreiras as lesões de maior gravidade (A3, A6, A9, A10, A12 e A13), que necessitaram de mais de uma intervenção cirúrgica (A1 e A6), maior tempo de hospitalização (A2, A3 e A5) ou maior tempo de tratamento (A9 e A10). Outras barreiras apontadas foram presença de dor residual (A8), lesões que acometeram membro dominante (A12), lesões que acarretaram incapacidade permanente (A7) e lesões que acarretaram maior custo econômico para tratamento (A6). A literatura aponta uma relação direta entre maior gravidade de lesão e maior dificuldade em retornar ao trabalho (CHEN et al., 2016). Outro estudo associou maior gravidade da lesão com maior tempo de tratamento tendo como consequência maior tempo de afastamento do trabalho e menor probabilidade de retornar ao trabalho na função anterior (SHI et al., 2014).
Os elementos facilitadores encontrados na categoria Lesão foram concordantes com as barreiras já apresentadas, sendo eles menor gravidade da lesão (A3, A6 e A9), menor número de procedimentos cirúrgicos (A1 e A6), não necessitar de internação hospitalar (A3), menor tempo de tratamento (A9) e queixa de dor mínima a moderada (A1). Ainda, lesões não causadas por acidente de trabalho também foi apontado como facilitador (A3). Corroborando com os achados, a literatura aponta que pacientes com menor tempo de hospitalização voltaram ao trabalho mais rapidamente do que os pacientes com maior tempo de hospitalização (HOU et al., 2008).
A categoria Reabilitação identificou as estratégias e aspectos relacionados à reabilitação que influenciam no retorno ao trabalho. Entre os fatores barreiras estão: piores função manual, preensão, força, destreza e mobilidade articular (A5) e aderência cicatricial (A1). Quanto ao tempo de reabilitação, o estudo A10 relacionou maior tempo de reabilitação com maior tempo de afastamento e trabalho sendo, portanto, um elemento barreira ao retorno ao trabalho. Todavia, o estudo A11 apontou maior tempo de reabilitação como um facilitador para o retorno ao trabalho em lesões complexas, considerando que as ações deveriam ser voltadas para identificar dificuldades e auxiliar no retorno ao trabalho. As estratégias em reabilitação encontradas na literatura como facilitadores foram manejo terapêutico adequado que envolve o uso de melhores estratégias diagnósticas – doppler, ultrassonografia, angiografia e tomografia computadorizada –, reabilitação com fisioterapia e terapia ocupacional para controle da dor, suporte psicológico e uso de dispositivos de tecnologia assistiva (GALANAKOS et al., 2014).
Ainda em relação aos programas de reabilitação, outros facilitadores identificados foram inserção precoce em programa de reabilitação (A5) ou em programa de reabilitação voltado ao trabalho (A10), participação em programas de treinamento ocupacional (A2) e recuperação de mobilidade articular (A1). Por outro lado, atraso para inserção em serviços de reabilitação em saúde e falta de ações integradas entre saúde, previdência e reabilitação profissional foram identificados como barreiras para o retorno ao trabalho e prejudiciais para a qualidade de vida dos indivíduos (TOLDRÁ, 2010).
Por fim, a categoria Trabalho identificou como elementos facilitadores receber seguro por acidente de trabalho (A3, A12 e A13), menor tempo de afastamento do trabalho (A3 e A9), não sofrer alteração salarial decorrente do afastamento (A3), apoio no local de trabalho (A5 e A7), satisfação com o trabalho (A8), estabilidade no emprego (A12), realizar trabalhos não braçais (A12 e A13) e receber maiores salários (A13). Em concordância com esses achados, apoio da empresa e dos colegas de trabalho também foi um facilitador encontrado na literatura (SILVA; GUIMARÃES; RODRIGUES, 2007).
Em contrapartida, as barreiras identificadas nesta categoria foram diminuição do salário decorrente do afastamento (A3), maior tempo de afastamento do trabalho (A2, A3, A5 e A9) e ausência de suporte no local de trabalho (A7). O estudo A8 identificou que receber indenização por acidente de trabalho é uma barreira para o retorno ao trabalho, porém a literatura aponta que receber indenização prejudica o retorno ao trabalho quando associado ao não encaminhamento a um programa de reabilitação (VACARO; PEDROSO, 2011).
Ressalta-se que, embora os resultados tenham sido agrupados em categorias, é possível perceber que a maioria dos fatores identificados estão inter-relacionados. A severidade da lesão, por exemplo, é uma característica da lesão, mas interfere no tempo de reabilitação, na maior possibilidade de sequelas e na necessidade de adaptações na função exercida. Nesse sentido, é importante que os profissionais não lidem com os fatores isolados, mas sim, compreendam a sua complexidade, buscando ações integradas entre as equipes de saúde, programas de reabilitação profissional e previdência social.
Os principais fatores limitantes encontrados se referem ao número expressivo de textos internacionais, em comparação ao número de publicações nacionais, o que, em alguma medida, pode não apresentar a realidade brasileira. Ainda, a ausência de estudos publicados em periódicos europeus para a composição da amostra final pode estar limitada pelos critérios de inclusão e exclusão estabelecidos. Outro fator limitante do estudo é a busca somente de artigos gratuitos disponíveis na íntegra, uma vez que a pesquisa não recebeu financiamento. Por fim, os descritores utilizados direcionaram os resultados para estratégias de intervenção a serem desenvolvidas nas instituições de saúde e reabilitação, em detrimento de ações realizadas no ambiente de trabalho.
Os principais resultados encontrados apontam a gravidade da lesão, o tempo de hospitalização e número de procedimentos cirúrgicos como elementos que se relacionam diretamente com o retorno ao trabalho. Os achados apontam a necessidade de um programa de reabilitação integrado envolvendo principalmente profissionais de fisioterapia, terapia ocupacional e psicologia com ações direcionadas ao manejo da dor, recuperação funcional e intervenções voltadas ao trabalho.
O suporte social, tanto familiar, quanto no ambiente de trabalho, foi identificado como fator influente no retorno ao trabalho, cabendo aos profissionais envolvidos no cuidado auxiliar para que esses fatores atuem como facilitadores. O ambiente de trabalho e a organização do trabalho, sempre que possível, devem ser avaliados e modificados dentro de um programa de reabilitação profissional para garantir que ao término da reabilitação o indivíduo possa efetivamente retornar ao trabalho.