versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.84 no.6 São Paulo nov./dez. 2018
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2017.08.013
A osteoporose é uma condição médica em que os ossos se tornam frágeis e quebradiços devido à perda de tecido, tipicamente como resultado de alterações hormonais, deficiência de cálcio e/ou deficiência de vitamina D.1,2 A osteopenia é também uma condição médica em que a proteína e o conteúdo mineral do tecido ósseo são reduzidos, mas menos gravemente do que na osteoporose.1,2 Essas duas doenças representam, portanto, um contínuo de medidas da densidade mineral óssea.
A perda mineral óssea é um fenômeno que ocorre em todos os seres humanos. Essa remoção diária de pequenas quantidades de mineral ósseo, um processo chamado reabsorção, deve ser equilibrada por uma deposição igual de mineral novo para que a força óssea seja preservada.3 Quando esse equilíbrio tende em direção à reabsorção excessiva, os ossos enfraquecem e podem tornar-se quebradiços e propensos a fraturas ao longo do tempo. Essa contínua reabsorção e redeposição de mineral ósseo, muitas vezes denominada remodelação óssea, está intimamente ligada à fisiopatologia da osteoporose.3
O equilíbrio entre a reabsorção e a deposição óssea é determinado pelas atividades de dois tipos principais de células, osteoclastos e osteoblastos.4 As alterações nas concentrações intracelulares do íon cálcio (Ca2+) regulam a diferenciação e as funções dos osteoclastos.4 Além disso, as mudanças nas concentrações intracelulares de Ca2+ são conhecidas por funcionar como gatilhos universais de diversas vias de sinalização, inclusive ativação enzimática, sobrevivência e diferenciação celular.4 Isso significaria que não é provável que uma redução na concentração de Ca2+ afete apenas a diferenciação e a sobrevivência das células, mas também afete o funcionamento de várias vias neurais. Tudo isso em conjunto aumenta a fragilidade de vários ossos do corpo.
De acordo com a Fundação Internacional de Osteoporose (International Osteoporosis Foundation [IOF]), 40% das mulheres no mundo têm fraturas devido à osteoporose durante a vida.3 As fraturas estão associadas ao aumento da morbidade/mortalidade e à diminuição da qualidade de vida de várias maneiras, inclusive o declínio na função física e emocional.5 As quedas são responsáveis por 90% das fraturas do quadril6 e são a sexta causa principal de morte entre pacientes com 65 anos ou mais.7 Além da alta mortalidade, existem outras consequências deletérias de quedas, inclusive restrição de mobilidade, deficiência, isolamento social, insegurança e medo, induz uma cascata de eventos prejudiciais à saúde e qualidade de vida em idosos.8,9 A pesquisa sugere que a alteração do equilíbrio seja o maior fator contribuidor para as quedas em idosos, com uma alta correlação entre o déficit de equilíbrio e a incidência de quedas.10 Além disso, os programas que visam principalmente ao treinamento do equilíbrio têm se mostrado efetivos na prevenção de quedas entre os idosos,11 muitos dos quais podem se apresentar com baixa densidade mineral óssea.
Está bem documentado que o cálcio é vital para o funcionamento de vários sistemas de órgãos em nosso corpo, inclusive os sistemas auditivo e vestibular.12,13 Além disso, Madureira et al. observaram que os idosos que sofreram quedas apresentavam função de equilíbrio prejudicada.14 Uma vez que a idade avançada está associada à redução da concentração de Ca2+, existe a probabilidade de que o comprometimento do equilíbrio nesses indivíduos possa ter sido causado pela diminuição da concentração de cálcio (osteopenia/osteoporose).3,4 Alternativamente, há teorias que sugerem que a função vestibular reduzida pode realmente ser a causa da remodelação óssea e, portanto, da osteoporose, cujas evidências se originam de experimentos em animais como ratos e camundongos.15,16 Portanto, parece que poderia haver uma relação entre os níveis reduzidos de cálcio e a capacidade de manter o equilíbrio em um indivíduo. Entretanto, esse aspecto tem sido pouco investigado.
A composição óssea alterada resulta em alterações estruturais dos ossos, como a cifose,17 o que também pode levar a problemas de equilíbrio. Em um estudo de Abreu et al. verificou-se que as mulheres com osteoporose apresentavam pior equilíbrio e oscilação máxima na avaliação do equilíbrio com o uso do sistema Polhemus em quatro situações posturais verticais quando comparadas com as mulheres não osteoporóticas.18 No grupo com osteoporose, Lynn et al. observaram maiores amplitudes de oscilação e uso inadequado de estratégias de manutenção de equilíbrio do que os controles quando avaliados com o uso da Posturografia Dinâmica Computadorizada (PDC).19 Evidências recentes sugerem que a densidade da otocônia é reduzida em ratos adultos osteoporóticos do sexo feminino.20 Uma vez que a otocônia está presente no utrículo e no sáculo, que são vitais para a geração dos Potenciais Miogênicos Evocados Vestibulares (VEMP),21,22 a deficiência do VEMP poderia ser esperada nesses pacientes. No entanto, não há relatos que corroborem esses achados. Embora existam evidências esporádicas que sugerem a presença de déficits vestibulares em indivíduos com osteoporose, há escassez de estudos para sugerir que a osteopenia esteja associada a déficits similares como a osteoporose. Isso, portanto, destaca a necessidade de avaliar o funcionamento do sistema vestibular em indivíduos com osteopenia e osteoporose. O presente estudo teve como objetivo investigar o impacto da osteopenia e da osteoporose nos resultados dos testes de avaliação comportamental e vestibular objetiva.
Todos os procedimentos feitos com participantes humanos estavam estritamente em conformidade com os padrões éticos do comitê de pesquisa institucional. O presente estudo incluiu 35 participantes que se submeteram a testes de densidade mineral óssea. A OMS (2007) recomenda o diagnóstico de osteopenia quando o escore T (resultado do teste de densidade mineral óssea) se encontra entre -1.1 a -2.5 e osteoporose quando o escore T é ≥ -2.6 (na negatividade), respectivamente.23 Escores T maiores do que -1.1 (em direção à positividade) são considerados normais. Foram incluídos no estudo 37 participantes; no entanto, dois do sexo feminino, ambas com osteoporose, não conseguiram manter a elevação dos olhos necessária para o oVEMP, pois consideraram a tarefa difícil demais e piscavam com frequência e, portanto, foram excluídas. Finalmente, após as exclusões e com base nos escores T, o estudo incluiu 12 indivíduos no grupo controle (seis do sexo masculino e seis do sexo feminino; faixa etária: 42-75 anos, idade média = 58 anos, DP = 10,5) e 12 no grupo de osteopenia (seis do sexo masculino e seis do sexo feminino, faixa etária: 45-76 anos, idade média = 64,4, DP = 9,6), enquanto que 11 indivíduos foram incluídos no grupo da osteoporose (cinco do sexo masculino e seis do feminino, faixa etária: 47-76 anos, idade média = 62,1, DP = 8,9). Não houve diferença significativa em relação à idade entre os grupos (p > 0,01, Manova). Uma vez que a avaliação vestibular objetiva e as alterações condutivas são conhecidas por causar ausência de cVEMP e oVEMP, os indivíduos com alterações condutivas foram excluídos. Além disso, os indivíduos com déficits neurológicos foram excluídos após consulta com um neurologista. A triagem por um otorrinolaringologista experiente ajudou na exclusão de pacientes portadores de outras causas conhecidas de distúrbios vestibulares. As pessoas com histórico de exposição ao ruído ocupacional e exposição a medicamentos ototóxicos também foram excluídas do estudo. Todos os participantes do estudo apresentaram níveis normais de hormônios da tireoide, embora todos os participantes do sexo feminino estivessem na pós-menopausa. Nenhum dos participantes tinha sido submetido a qualquer tratamento para a alteração da remodelação óssea, pois tinham sido recentemente diagnosticados. Os participantes do sexo masculino tinham estilo de vida sedentário urbano e cinco participantes do sexo feminino em cada grupo eram do lar. Nenhum dos participantes era fumante crônico ou alcoólatra. Todos os participantes assinaram o formulário de consentimento livre e informado por escrito antes de ser recrutados para o estudo e não receberam apoio financeiro por sua participação no estudo. O consentimento informado foi assinado por todos os participantes do estudo.
No presente estudo, todos os testes comportamentais foram feitos em uma sala bem iluminada e com ar condicionado. Esses incluíram Prova dos Passos de Fukuda, Marcha em tandem e Vertical Visual Subjetiva (VVS). Os testes objetivos foram feitos em uma sala com tratamento de som com níveis de ruído permitidos bem dentro dos limites permitidos e recomendados pelo American National Standards Institute (ANSI S3.1, 1991).24 Os testes objetivos incluíram VEMP cervical e ocular (cVEMP e oVEMP). Os VEMP cervicais e oculares foram gravados com o uso do Biologic Navigator Pro versão 7.2.1 com fones de ouvido de inserção Sinser - 012.
Para a Prova dos Passos de Fukuda, os participantes foram instruídos a esticar os dois braços à sua frente e marchar com os olhos fechados no mesmo local por 50 vezes. O ângulo de desvio > 45º em qualquer direção e/ou distância de desvio > 1 m foi considerado anormal como relatado anteriormente.25 Para a Marcha em tandem, pediu-se aos participantes que imaginassem uma linha reta no chão, caminhassem ao longo dela te ocassem o solo com o pé todo, do calcanhar aos dedos dos pés, por 30 segundos. Perda de equilíbrio ou elevação de braços para garantir a manutenção do equilíbrio antes de 30 segundos foi considerado anormal, conforme relatado anteriormente.26 Durante a VVS, os participantes receberam um balde com uma faixa brilhante colocada dentro dele. Eles foram instruídos a colocar a cabeça dentro do balde tão confortavelmente quanto possível e alinhar a posição da tira em sua posição vertical percebida. O balde foi entregue em ângulos diferentes para os participantes, a fim de reduzir o viés. O ângulo de desvio da verdadeira vertical foi observado por um ponteiro que indicava os ângulos em um transferidor de 360º preso à parte de trás do balde. Um desvio > 3º da vertical percebida em relação à verdadeira vertical foi considerado um resultado anormal. Isso está de acordo com os achados relatados anteriormente.27,28
Antes de registrar os potenciais evocados, os locais de colocação de eletrodos foram lavados com um gel abrasivo comercialmente disponível. Os eletrodos de superfície do tipo disco foram colocados com o uso de pasta de condução comercialmente disponível e fixados no local com gesso cirúrgico. A impedância absoluta e entre eletrodos foi mantida abaixo de 5 kΩ e 2 kΩ, respectivamente, tanto para o cVEMP quanto para o oVEMP.
Para os registros de cVEMP, os eletrodos foram colocados na junção esternoclavicular (inversa), superior a 1/3 do músculo esternocleidomastóideo (não inversor) e testa (terra). Para a ativação do músculo esternocleidomastóideo, foi pedido aos participantes para virar a cabeça para o lado oposto da orelha que era estimulada. O registro foi feito para estímulos tone burst de 500 Hz, 750 Hz e 1000 Hz com tempos de aumento/queda de 1 ms e um tempo de platô de 2 ms.
Os estímulos tone burst foram apresentados à orelha com uma intensidade de 125 dB pe SPL com o uso de uma taxa de estimulação de 5,1 Hz. Usou-se um filtro de passagem de banda de 1-1500 Hz e as respostas foram calculadas em média para 200 varreduras. A retificação pré-estímulo foi usada para controlar os efeitos das variações na atividade eletromiográfica entre os registros cVEMP.
O oVEMP foi obtido com a colocação do eletrodo não inversor na superfície da pele 1 cm abaixo do centro da pálpebra inferior do olho, o eletrodo inversor 2 cm abaixo do não inverso e preso à testa, conforme apropriado e usado anteriormente.29,30 Os participantes foram instruídos a manter o olhar para cima, centralizado, a 30º, olhar para uma tira colocada à altura apropriada. A gravação foi feita com o uso de estímulos tone burst de 500 Hz, 750 Hz e 1000 Hz com tempos de aumento/queda de 1 ms e um tempo de platô de 2 ms. Os estímulos tone burst foram apresentados no canal auditivo com uma intensidade de 125 dB pe SPL, com o uso de uma taxa de repetição de 5,1 Hz. Usou-se um filtro de passagem de banda de 1-1000 Hz e as respostas foram calculadas para 200 varreduras.
Para comparar os resultados da avaliação vestibular com os resultados audiológicos conhecidos de pessoas com densidade mineral óssea reduzida, foram feitas avaliações audiológicas. Essas incluíram audiometria tonal óssea e aérea, limiar de reconhecimento da fala (LRF), escores de identificação da fala (EIF), avaliação de imitância (tipo de timpanograma, limiar do reflexo acústico e frequência de ressonância) e emissões otoacústicas de produtos de distorção (EOAPD).
O teste de proporções foi feito para encontrar a proporção de participantes que apresentavam achados anormais. Isso também foi feito para investigar a diferença entre os grupos na taxa de resposta (número de orelhas com presença de cVEMP/oVEMP a 500 Hz) e sintonização de frequência. Testes individuais Anova de medidas repetidas para orelhas entre grupos e entre indivíduos foram feitos para a obtenção de latências de picos individuais e amplitude pico a pico. Além disso, a Anova de medidas repetidas foi feita para orelhas entre grupos e também entre indivíduos para a obtenção da média do tom puro, do limiar de reconhecimento da fala, dos escores de identificação da fala e da conformidade estática. O teste de comparação de proporções foi feito para encontrar as diferenças, se existissem, nas taxas de resposta de reflexo acústico e EOAPD. As análises do qui-quadrado foram feitas para investigar a associação entre os grupos e os resultados de várias avaliações.
Um histórico detalhado e estruturado dos casos foi obtido de todos os participantes em cada um dos três grupos. Verificou-se que apenas um participante no grupo controle havia relatado sintomas vestibulares (oscilava enquanto caminhava). Nenhum dos outros participantes no grupo de controle relatou qualquer sintoma vestibular, como vertigem, oscilação e desequilíbrio. Esses sintomas foram relatados por quatro participantes (três com vertigem e um com desequilíbrio) no grupo da osteopenia e sete participantes (cinco com vertigem e dois com desequilíbrio) no grupo da osteoporose. Para investigar a significância estatística das observações acima mencionadas a partir do histórico do caso, o teste de proporções foi feito. Uma proporção significativamente maior de indivíduos com osteoporose apresentou sintomas vestibulares do que o grupo controle (Z = 2,78, p = 0,005). Entretanto, não houve diferença significativa na proporção de indivíduos com sintomas vestibulares entre o grupo da osteopenia e o grupo controle (Z = 1,50, p = 0,15) e também entre o grupo da osteopenia e o grupo da osteoporose (Z = 1,45, p = 0,14).
Um desvio da vertical percebida > 3º em qualquer um dos lados da vertical verdadeira foi considerado um resultado anormal no teste VVS.27,28 Considerando essa normativa, os resultados anormais foram encontrados no teste VVS em uma proporção significativamente maior de indivíduos com osteoporose (Z = 2,40, p = 0,01) e osteopenia (Z = 1,88, p = 0,05) do que o grupo controle. No entanto, não houve diferença significativa entre o grupo da osteopenia e o grupo da osteoporose (Z = 0,61, p = 0,53).
Os resultados do Teste de Marcha de Fukuda foram considerados anormais quando houve desvio > 45º em cada lado e/ou uma distância de mais de um metro do ponto de partida.25 Considerando essa normativa, um número significativamente maior (marginalmente) de indivíduos com osteoporose apresentou resultados anormais do que os controles saudáveis no Teste de Marcha de Fukuda, conforme revelado pelo teste de proporções (Z = 1,82, p = 0,06). A comparação entre os outros grupos não revelou diferença significativa (p > 0,1).
A incapacidade de fazer uma caminhada equilibrada com toque do solo com o pé todo, do calcanhar aos dedos dos pés (por exemplo, tendência para cair, levantar as mãos para manter o equilíbrio ou tropeçar), foi considerada um resultado anormal na marcha em tandem.26 O grupo da osteoporose apresentou proporções significativamente maiores de resultados anormais na marcha em tandem do que os controles saudáveis (Z = 2,10, p = 0,03) ou o grupo de osteopenia (Z = 2,59, p = 0,09). Não houve diferença significativa entre os outros grupos (p > 0,1). A figura 1 mostra a porcentagem de indivíduos com resultados anormais em cada grupo nos testes comportamentais.
cVEMPs ipsilaterais foram registrados em ambas os orelhas de todos os participantes em cada um dos grupos. A figura 2 mostra as formas de onda representativas de cVEMP de um participante em cada um dos três grupos. A média, mediana e o desvio-padrão de latências e a amplitude de pico a pico de 500 Hz em cVEMP evocado com estímulo de tone burst foram calculados e são mostrados na tabela 1.
Figura 2 Formas de onda cVEMP representativas obtidas de um participante com densidade mineral óssea normal (painel superior) e um participante cada com osteopenia (painel central) e osteoporose (painel inferior).
Tabela 1 Média, mediana e desvio-padrão de latências de P1, N1 e amplitude de pico a pico de 500 Hz de cVEMP evocado por estímulo tone burst dos três grupos de participantes
cVEMP | Grupo controle (n = 21) | Osteopenia (n = 24) | Osteoporose (n = 17) | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
x̅ | M | DP | x̅ | M | DP | x̅ | M | DP | |||
P1 | 15,80 | 16,01 | 1,78 | 16,06 | 16,17 | 1,23 | 16,12 | 16,13 | 1,65 | ||
N1 | 23,81 | 23,77 | 2,95 | 24,26 | 24,23 | 1,90 | 23,69 | 22,92 | 2,48 | ||
P1N1 | 12,82 | 11,38 | 7,49 | 12,15 | 11,09 | 6,79 | 9,44 | 6,13 | 6,66 |
cVEMP, potencial evocado miogênico vestibular cervical; DP, desvio-padrão; M, mediana; N1, latência do pico N1 em milissegundos; P1, latência do pico P1 em milissegundos;P1N1, amplitude pico a pico de cVEMP em microvolts; x̅, média.
A comparação intra e entre grupos de vários parâmetros do cVEMP foi alcançada com o uso de Anova de medidas repetidas para as orelhas tanto entre grupos como entre os indivíduos de cada grupo. Embora houvesse uma tendência à menor amplitude nos dois grupos clínicos do que nos grupos de controle (menor amplitude no grupo de osteoporose), os resultados da Anova de medidas repetidas não revelou um efeito principal significante na comparação intra e entre grupos para qualquer um dos parâmetros acima mencionados de cVEMP (p > 0,1).
oVEMP ipsilaterais foram registrados em ambas as orelhas de todos os participantes de cada um dos grupos. A figura 3 mostra as formas de onda representativas de oVEMP de participantes de cada grupo. A média, a mediana e o desvio-padrão das latências e a amplitude de pico a pico de 500 Hz em oVEMP evocado com estímulo de tone burst foram calculados e são mostrados na tabela 2.
Figura 3 Formas de onda oVEMP representativas obtidas de um participante com densidade mineral óssea normal (painel superior) e um participante cada com osteopenia (painel central) e osteoporose (painel inferior).
Tabela 2 Média, mediana e desvio-padrão das latências de N1, P1 e amplitude pico a pico de 500 Hz de oVEMP evocado por estímulo tone burst dos três grupos de participantes
oVEMP | Grupo controle (n = 21) | Osteopenia (n = 24) | Osteoporose (n = 17) | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
x̅ | M | SD | x̅ | M | SD | x̅ | M | SD | |||
N1 | 11,72 | 11,87 | 1,40 | 11,31 | 11,78 | 1,92 | 13,10 | 12,91 | 2,38 | ||
P1 | 16,89 | 16,77 | 1,94 | 17,09 | 17,12 | 2,81 | 17,75 | 17,92 | 1,03 | ||
P1N1 | 2,41 | 2,69 | 1,50 | 2,28 | 2,08 | 2,98 | 1,45 | 1,74 | 3,82 |
DP, desvio-padrão; M, mediana; N1, latência do pico N1 em milissegundos; oVEMP, potencial evocado miogênico vestibular ocular; P1, latência do pico P1 em milissegundos;P1N1, amplitude pico a pico de oVEMP em microvolts; x̅, média.
Houve uma tendência para latências mais longas e amplitudes de pico a pico menores nos dois grupos clínicos (latências mais longas e menor amplitude na osteoporose) do que no grupo controle. No entanto, os resultados da Anova de medidas repetidas para orelhas tanto entre grupos como entre indivíduos não revelou fator principal significante em qualquer um dos parâmetros acima mencionados de oVEMP (p > 0,1).
O teste de proporções foi feito para investigar a diferença entre os grupos na taxa de resposta (número de orelhas com presença de cVEMP/oVEMP a 500 Hz) e sintonia de frequência. Não houve diferença significativa na taxa de resposta de cVEMP e proporções de sintonia de frequência em nenhuma das frequências (p > 0,1). No entanto, proporções significativamente maiores de indivíduos com osteoporose apresentaram ausência completa de oVEMP do que o grupo controle (Z = 3,23, p = 0,001) e o grupo de osteopenia (Z = 3,54, p = 0,000). Não houve diferença significativa nas taxas de resposta de oVEMP entre o grupo com osteopenia e o grupo controle (Z = 0,36, p = 0,71). A figura 4 mostra as taxas de resposta de cVEMP e oVEMP em todos os grupos e o resultado do teste de proporções.
Todos os participantes foram submetidos à audiometria tonal, audiometria vocal, avaliação de imitância e emissões otoacústicas de produtos de distorção (EOAPD). Nenhum dos participantes apresentava patologia condutiva, pois isso serviu como um dos critérios de exclusão. Houve uma tendência para o aumento da média de tom puro (PTA), LRF, frequência de ressonância e limiar de reflexo acústico e redução na amplitude de EIF e EOAPD nos dois grupos clínicos quando comparados com os controles; no entanto, os grupos não foram significativamente diferentes em nenhum desses testes (p > 0,1). O grupo da osteoporose mostrou uma proporção significativamente maior de orelhas com reflexos acústicos ausentes e emissões otoacústicas do produto de distorção do que o grupo controle e o grupo osteopenia (p < 0,05). Houve uma associação significativa entre os grupos e LRF [χ2 (2) = 35,7, p = 0,000], grupos e EIF [χ2 (2) = 131,85, p = 0,000] e grupos e frequência de ressonância [χ2 (2) = 46,49, p = 0,001) com mais indivíduos com valores mais altos de LRF e frequência de ressonância e menor valor de EIF nos dois grupos clínicos do que no grupo controle.
Todos os indivíduos nos grupos de osteopenia e osteoporose foram submetidos a avaliações audiológicas e de equilíbrio. Para estudar a associação entre os déficits relacionados à audição e ao equilíbrio, a PTA de 20 dBNA ou mais foi considerada um resultado anormal (a pessoa tinha perda auditiva) enquanto que a presença de achado anormal em dois dos três testes de avaliação comportamental do equilíbrio (Teste de Marcha de Fukuda, Marcha em Tandem e teste Vertical Visual Subjetiva) foi considerado um resultado anormal. Em termos de testes objetivos de avaliação vestibular, a ausência de cVEMP ou oVEMP ou ambos em um lado ou em ambos os lados foi considerada um resultado anormal. O teste do qui-quadrado revelou associação significativa entre a presença de perda auditiva e resultado anormal nos testes de avaliação comportamental do equilíbrio [χ2 (1) = 4,82, p = 0,028] e associação marginalmente significativa entre a presença de perda auditiva e resultado anormal na avaliação vestibular objetiva [χ2 (1) = 3,45, p = 0,063].
No presente estudo, uma proporção significativamente maior de indivíduos com osteoporose relatou sintomas vestibulares do que indivíduos com osteopenia ou indivíduos do grupo controle. Esses achados estão de acordo com os relatados anteriormente a esse respeito.17,19 A idade mais avançada mostrou estar associada a maior prevalência de sintomas vestibulares.18,31 No entanto, não houve diferença significativa na idade entre os grupos. Portanto, a idade mais avançada não poderia explicar esses achados. Essas descobertas podem ser atribuídas à redução do conteúdo de cálcio no sistema vestibular. A crista ampullaris presente no fim de cada um dos canais semicirculares e a mácula presente em cada um dos órgãos otolíticos consistem em grandes volumes de cálcio (CaCO3).20 Estudos experimentais demonstraram a presença de alterações ultraestruturais (diminuição da densidade) nas máculas de ratos com osteoporose em comparação aos controles. Embora não existam estudos em seres humanos que relatem a presença de tais mudanças ultraestruturais, alterações semelhantes podem estar associadas à osteoporose e, por sua vez, podem afetar a manutenção do equilíbrio corporal.
Os resultados da VVS no presente estudo demonstraram uma proporção significativamente maior de resultados anormais nos dois grupos clínicos do que no grupo controle. A VVS foi considerada um teste sensível para a detecção de doença utricular.32-34 Portanto, os resultados apontam para a presença de alteração utricular em casos de osteopenia e osteoporose. A alteração utricular na osteopenia e na osteoporose poderia ser o resultado da redução do cálcio dentro da mácula. A mácula utricular consiste em grandes quantidades de cristais de carbonato de cálcio (otocônia) que formam a maior massa da mácula e são relatados como vitais para a ativação (despolarização) ou inibição (hiperpolarização).35 Estudo em animais com osteoporose mostrou alterações ultraestruturais na otocônia do utrículo.20 Embora não haja estudos em humanos, pode-se esperar um padrão semelhante de mudanças ultraestruturais na otocônia. Como o utrículo desempenha um papel vital na identificação da verticalidade de um objeto,34 as alterações anatômicas causadas pela osteoporose e osteopenia no utrículo poderiam causar mais desvios na vertical percebida.
Os resultados em outros testes de avaliação comportamental do equilíbrio (FST e TGT) revelaram resultados anormais em uma proporção significativamente maior de indivíduos com osteoporose do que aqueles com osteopenia e os controles saudáveis. Outros testes (CDP, Romberg e equilíbrio permanente) já haviam mostrado maiores amplitudes de equilíbrio e resultados mais anormais em indivíduos com osteoporose do que controles saudáveis.19,31 Dessa forma, a presença de alterações vestibulares em indivíduos com osteoporose fica demonstrada, pode ser atribuída às mudanças ultraestruturais no sistema vestibular periférico,20 como descrito acima.
No presente estudo, os resultados da avaliação objetiva demonstraram uma proporção significativamente maior de resultados anormais em indivíduos com osteoporose do que naqueles com osteopenia e no grupo controle em relação ao oVEMP, mas não ao cVEMP. Embora tenha sido demonstrado que o processo de envelhecimento está associado à redução de amplitude e ausência de cVEMP36 e oVEMP,37,38 isso provavelmente não poderia ter sido a razão por trás desse resultado no presente estudo, uma vez que não houve diferença de idade significativa entre os três grupos. Além disso, os critérios de seleção garantiram que os indivíduos com alterações condutivas não fossem incluídos no estudo, uma vez que alterações condutivas são conhecidas por afetar negativamente os VEMPs.39,40 Assim, também é improvável que a ausência de respostas em um número maior de orelhas com osteoporose tenha sido causada por perda auditiva condutiva. Uma vez que oVEMP é mediado ao longo da via utrículo-ocular e o cVEMP ao longo da via sáculo-cólica, os resultados anormais em oVEMP confirmam ainda mais a presença de alteração utricular. Também indicam maior robustez e menor susceptibilidade do sáculo e do nervo vestibular inferior aos efeitos prejudiciais da doença. O mesmo foi confirmado através dos achados de cVEMP e oVEMP em outras doenças vestibulares como vertigem posicional paroxística benigna,41,42 neurite vestibular43 e distúrbios do espectro da neuropatia auditiva.44
Um pensamento opcional que vale a pena discutir aqui é o da possibilidade de distúrbios vestibulares que resultem em todo o processo de remodelação óssea. Algumas das evidências experimentais em animais como ratos e camundongos sugerem que a função vestibular reduzida poderia realmente ser a causa da remodelação óssea e, portanto, da osteoporose.15,16 Se isso é verdadeiro em seres humanos é uma questão que ainda precisa ser debatida e requer mais estudos em indivíduos com problemas vestibulares. Esse fato poderia ser um resultado importante, se as evidências assim o sugerirem.
Os achados do presente estudo revelaram uma associação significativa entre a presença de perda auditiva e a presença de déficits de equilíbrio. Que seja de nosso conhecimento, não há estudos que tenham analisado essa associação entre audição e equilíbrio em indivíduos com osteopenia e osteoporose. Essa associação significativa indica que as pessoas com densidade mineral óssea reduzida têm déficits de audição, bem como de equilíbrio, e os dois estão intimamente relacionados. Isso indica ainda a necessidade não só da avaliação de audição, mas também da avaliação do equilíbrio em indivíduos com osteopenia e osteoporose.
Um exame minucioso dos resultados gerais do teste de equilíbrio mostra uma grande variedade de resultados que indicam um espectro em vez de uma única condição generalizada. Isso sugere a necessidade de uma avaliação mais abrangente e o uso do perfil dos resultados na avaliação do equilíbrio na osteopenia e na osteoporose, a fim de desenvolver um protocolo no futuro.
De um modo geral, os resultados do presente estudo mostram que a osteopenia e a osteoporose estão associadas a maior prevalência de desequilíbrio e disfunção vestibular em particular. No entanto, o estudo teve apenas 35 participantes divididos em três grupos para chegar a essas conclusões. Esse não é um tamanho de amostra adequado se considerarmos a prevalência de osteoporose e osteopenia na população em geral. No entanto, o estudo é uma investigação preliminar e os resultados são encorajadores o suficiente para justificar o estudo continuado na área do equilíbrio e testes de função vestibular com tamanhos de amostra maiores.
Os achados do presente estudo demonstram a presença de déficits relacionados ao equilíbrio em indivíduos com osteopenia e osteoporose. Portanto, as avaliações clínicas devem incluir uma avaliação do equilíbrio como um aspecto obrigatório da avaliação geral, de modo que um manejo holístico, inclusive a reabilitação relacionada ao equilíbrio, possa ser planejado.