versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.84 no.6 São Paulo nov./dez. 2018
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2018.09.002
Quando decidimos escrever o último editorial da edição deste ano do BJORL, despertas pelo compromisso, lembramo-nos dos editoriais de 2013 e fomos reler o que nossos amigos escreveram comemorando os 80 anos. Chamou atenção o do Dr. Sady,1 brilhante, crítico e analítico, propositivo com a premissa de ruptura entre o ciclo vicioso em que incorríamos ou estávamos sugestionados e o ciclo virtuoso que o futuro próximo nos obrigava a proceder para corrigir distorções e seguir em frente. Mas, paradoxalmente, esse imperativo dos próximos passos nos obrigou a olhar para trás. Simplesmente para olhar para uma história de 85 anos, não para inventariar erros. Recorremos então aos editoriais pregressos dos nossos colegas, pois com idealismo e competência, sem exceção, nos contaram a trajetória e desafios superados que, em última análise, construíram e nos contam a história do nosso BJORL.2-4 Foi então que visualizamos a abrangência da imensidão desafiadora de condensar essa história em algumas páginas sem desmerecer nomes, fatos e atitudes. Mais ainda, reafirmar as diretrizes de continuidade conforme propostas pelo Dr. Sady,1 para algum colega também reconhecer, anos mais tarde, ser a história mais importante a que ele estiver escrevendo no momento, porque é sequente ao que hoje fazemos e ao que fizeram antes, antes de nós todos. Ao mesmo tempo, percebemos estar a grandeza de nossa história já documentada em si mesma, expressa por si só nas várias edições que materializam os 85 anos do pensamento e das práticas dos colegas profissionais de nossa especialidade no Brasil, resta-nos apenas compilar, humildemente, alguns fatos e autores dessa trajetória. Ratificamos tudo o que foi feito e reiteramos tudo o que se propôs, se propõe e se fará daqui para frente. Assim o nosso trabalho se fez mais simples.
De onde viemos, o quê foi feito, para onde vamos? Idealizada e fundada em 1933 pelos Drs. Mário Otoni de Rezende e Homero Cordeiro, a Revista Oto-Laryngológica de São Paulo principiou como veículo impresso das discussões acadêmicas da Sociedade Médica de São Paulo e, posteriormente, já com o nome de Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, porta-voz para os artigos específicos dos otorrinolaringologistas de todo o Brasil. Na década de 60 do século passado, com a institucionalização dos cursos de pós-graduação pelo MEC, os órgãos governamentais gerenciadores desses cursos, como a Capes e o CNPq, passaram a exigir que os estudos e pesquisas resultantes fossem publicados em periódicos de abrangência internacional, indexados e com fator de impacto (FI) determinado, para que lhes fossem atribuídos notas em um ranking nacional e, assim, assegurar financiamento público para pesquisas nos cursos e bolsas de estudo para os pesquisadores. Essa era uma condição imprescindível para o fomento das pesquisas e, ao mesmo tempo, um imperativo aos periódicos científicos que se desdobravam para sobreviver na terra tupiniquim.2-6
À revelia da coerência na forma dessas exigências, bastante discutível e criticada, esse fato tornou-se um divisor de águas para a trajetória da revista. Foi a partir delas que se denota um aprimoramento na editoração e qualidade da revista e dos artigos publicados. Resultado dos esforços memoráveis das diretorias que se sucederam, gradativamente a revista foi indexada pelo SciELO Lilacs e Experta Medica. Em 2005 estávamos no PubMed e Medline, quando começamos a usar um título em inglês junto ao título em português. Em 2011 fomos indexados pelo Institute for Scientific Information (ISI). Estamos hoje nos bancos de dados e de consulta bibliográfica desses indexadores internacionais.
Paralelamente ao dificultoso processo de indexação, a perseverança dos editores foi ainda mais instigada com as necessárias mudanças estruturais em todo o processo de elaboração da revista. A principal foi a criação de uma plataforma original de editoração, hoje usada até por outros periódicos do país. Foram digitalizadas todas as edições anteriores à indexação e hoje estão disponíveis à pesquisa na página eletrônica da revista. O advento da informatização e as "maravilhas" da internet resultaram, entre outros corolários, num crescente número de submissões e, por conseguinte, em maior rapidez na avaliação e aprovação dos artigos e, assim, na maior exposição da revista no exterior. Por sua vez, essa última consequência trouxe consigo a necessidade de que a revista fosse também publicada em inglês, para que fosse distribuída in natura nas principais universidades do exterior. Assim nasceu, em 2009 o Brazilian Journal of Otorhinolaryngology - BJORL (registrado no ISSN). Hoje somos, em nossa especialidade, a revista mais importante na América Latina. No exterior nossa presença está consolidada, atingimos uma posição privilegiada e impensável há décadas. Hoje, nosso fator de impacto (FI) é de 1,412, e só quem sabe das dificuldades para se atingir esse pequeno índice atribuído pelo ISI (Institute for Scientific Information) é capaz de dimensionar sua importância. Ocupamos, segundo o Journal Citation Reports, a 25ª posição entre as revistas da especialidade no mundo. Temos uma história ascendente, isso é inegável.
No entanto, caminhar a passos largos para atingir os mesmos níveis de excelência das revistas americanas e europeias não implica acreditar que estamos no caminho certo e que vamos atingir esse objetivo. Nossa responsabilidade aumenta na mesma proporção dos desafios que irão se impor ao longo dos próximos anos, desde a fluidez e transitoriedade das políticas governamentais até a formação/capacitação dos nossos especialistas em diversos cursos deste país continental. Como já avaliava o Dr. Sady1 em seu editorial, ainda estamos muito longe do ideal. Precisamos criar mecanismos oficiais para consolidar novos grupos de pesquisadores nacionais com inserção internacional. Precisamos estimular a produção científica, fomentar as pesquisas básicas na especialidade por este Brasil afora. Precisamos compromissar os diversos cursos de pós-graduação com os objetivos e padrões do BJORL e que esse por sua vez também eleve seu nível de exigência criteriosa para publicações em direção à mesma excelência que nos é cobrada lá fora, aprimore seu corpo editorial, capacite continuamente seus revisores, implante outras ferramentas que nos direcionem à qualidade total.
Enfim, hoje temos outros caminhos e outras inquietações, mas o mesmo objetivo de 85 anos atrás: tornar o BJORL um veículo de referência, nacional e internacional. A história se faz assim, com passos longos. Ela nos orienta sobre o ponto de partida, não o ponto de chegada. Esse será esclarecido com os imperativos temporais do futuro. Talvez tenhamos saído de nossa adolescência e hoje vivemos nossa segunda idade. Outras décadas virão. Com certeza.