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Burnout e tecnologias em saúde no contexto da enfermagem na Atenção Primária à Saúde

Burnout e tecnologias em saúde no contexto da enfermagem na Atenção Primária à Saúde

Autores:

Cleyton Cézar Souto Silva,
Ana Luisa Brandão de Carvalho Lira,
Alexsandra Rodrigues Feijão,
Isabelle Katherinne Fernandes Costa,
Soraya Maria de Medeiros

ARTIGO ORIGINAL

Escola Anna Nery

versão impressa ISSN 1414-8145versão On-line ISSN 2177-9465

Esc. Anna Nery vol.21 no.2 Rio de Janeiro 2017 Epub 27-Abr-2017

http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20170031

Resumen

Objetivo:

Analizar las relaciones del Burnout y de las tecnologías de la salud en el contexto de los enfermeros de la atención primaria de la salud.

Métodos:

Estudio reflexivo según el referencial teórico de Hinds, Chaves y Cypress.

Resultados:

Se analizó el contexto inmediato (enfermería de la atención primaria de la salud y Burnout); el contexto específico (tecnologías de la salud y enfermeros con Burnout en la atención primaria de la salud); el contexto general (estrés ocupacional en el proceso de trabajo de los enfermeros de la atención primaria de la salud); y, el metacontexto (uso de tecnologías en la prevención y enfrentamiento del Burnout en la Enfermería de la atención primaria de la salud).

Conclusión:

La utilización de las tecnologías de la salud, por el enfermero, posibilita la mejoría: del conocimiento, de la salud, del estrés laboral y de la enfermedad mental.

Palabras clave: Burnout; Tecnologías de la salud; Atención Primaria de la Salud; Enfermería

INTRODUÇÃO

As mudanças tecnológicas - e na estrutura do sistema produtivo - tornaram as organizações de trabalho mais complexas, gerando a lógica de sempre produzir mais com menos recursos, e modificando o quadro mundial pela intensificação das condições de insegurança no emprego e terceirização no mercado de trabalho. Isto é refletido na redução de profissionais, na incorporação de mais tecnologias, absenteísmo, acidentes e agravos, conflitos interpessoais e trabalhos precários. Tudo isto vêm influenciando um novo perfil de adoecimento dos trabalhadores com forte repercussão na saúde mental.1,2

Nessa perspectiva, um dos agravos psicossociais que mais vem acometendo os trabalhadores é a Síndrome de Burnout (SB). Considerada como uma resposta ao estresse crônico, acarreta insatisfação e perda do sentido laboral, possuindo três dimensões processuais: exaustão emocional, caracterizada pela falta de energia e esgotamento emocional; despersonalização, que é a insensibilidade com o próximo; e a baixa realização profissional, uma diminuição da satisfação com o emprego e do sentimento de competência em relação ao trabalho de contato com pessoas.3-5

Assim, é importante não confundir o estresse normal com o Burnout. Na SB, em pessoas que não sofriam de nenhum transtorno psíquico, predominam sintomas comportamentais relacionados ao trabalho em detrimento aos sintomas físicos, como: exaustão mental, depressão, diminuição do afeto, exaustão mental, fadiga, depressão e atitudes negativas.6

Existe uma alta incidência da SB entre aqueles trabalhadores que prestam assistência às pessoas necessitadas de cuidados diretos e frequentes.7 Diferentes estudos revelam o nível de comprometimento da saúde mental: pesquisa com residentes de enfermagem identificou níveis altos de exaustão e despersonalização na área de emergência e terapia intensiva;3 outro estudo demonstrou a propensão ao desenvolvimento da síndrome com valores médios de exaustão e despersonalização;8 outra investigação descobriu Burnout em enfermeiras com filhos e dupla jornada (afazeres do lar e plantão noturno);9 observações também foram feitas sobre enfermeiras de um pronto-socorro de hospital universitário, com alto risco para a síndrome,10 e jovens trabalhadores da saúde com a síndrome adquirida na Estratégia Saúde da Família (ESF).11

Nesse aspecto, o advento dos avanços tecnológicos também ocorreu na área de saúde, trazendo a introdução da informática, dos aparelhos de diagnóstico e modernização de procedimentos, que podem se tornar fatores contributivos para o desenvolvimento da SB. No entanto, não se deve reduzir a tecnologia a uma concepção simplista associada apenas a máquinas e aparatos. Há a necessidade de examinar as relações entre a enfermagem e a tecnologia, principalmente aquelas de caráter relacional, baseada na comunicação, no acolhimento que acontece no momento em que se estabelecem os vínculos e o empoderamento do ser cuidado.12,13

Na atenção primária em saúde (APS), o enfermeiro da ESF está em contato direto com a realidade das comunidades carentes, com recursos escassos para atender as demandas e com pressões e exigências do próprio trabalho. É responsável, ainda, por executar ações de assistência básica e de vigilância requerendo habilidades e perfil psicológico equilibrado capaz de lidar com diferentes usuários, coordenar sua equipe e as políticas públicas de saúde para melhoria da qualidade de vida da população.11

Assim, é importante trazer para a discussão o que se tem feito em relação aos enfermeiros que atuam na ESF para melhoria das condições de trabalho, qualidade de vida, políticas de formação profissional e práticas institucionais que cuidem da saúde mental dos seus trabalhadores. Diante do exposto, tem-se a seguintequestão norteadora: Qual a relação entre o Burnout e as tecnologias no contexto doenfermeiro da APS? Nessa perspectiva, o objetivo deste estudo é analisar as relações do Burnout e das tecnologias em saúde no contexto dos enfermeiros da atenção primária à saúde.

Dessa forma, pretende-se contribuir para uma maior aproximação entre a Síndrome de Burnout e sua relação com as tecnologias do processo de trabalho da APS, a fim de desenvolver práticas que promovam a promoção da saúde ocupacional e prevenção de transtornos mentais do profissional enfermeiro.

MÉTODOS

Estudo de reflexão analítica segundo Hinds, Chaves e Cypress14 acerca do Burnout e das tecnologias em saúde na enfermagem da APS. Utilizando o referencial teórico, o significado dos contextos foi considerado e discutido por meio da bibliografia pertinente.

Nessa perspectiva, a explicação do contexto ocorre em quatro níveis: imediato, específico, geral e metacontexto, cujas fases de análise do fenômeno são graduais e interrelacionadas. O contexto é conceituado como tendo quatro camadas interativas que se distinguem entre si pela extensão com que o significado é compartilhado (individual ou universal), pelo tempo (presente ou futuro) e pela rapidez com que a mudança em cada nível pode ocorrer e ser percebida. Desse modo, a pesquisa do evento da realidade tem início com as características micro que envolvem o processo em que ele acontece, até atingir uma visão macro no tocante aos aspectos político, teórico e filosófico.14

As fontes bibliográficas pesquisadas foram publicações on line de dissertações, monografias, teses e pesquisas registradas nas bases de informação Scientific Eletronic Library Internet (Scielo) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), no período de 10 anos, acessados nos meses de setembro a dezembro de 2015, tendo como critério de inclusão possuir as temáticas em estudo. Utilizaram-se os descritores Burnout, atenção primária em saúde e enfermagem. Foram selecionados 30 artigos, dois manuais e três livros.

Nesse sentido, o contexto imediato no qual o fenômeno ocorre apresenta o agravo, acarretando os enfermeiros que se encontram trabalhando na APS, representado atualmente pela ESF, cujas atividades de prevenção de doenças e de promoção da saúde são realizadas por meio de ações educativas e assistenciais realizadas nos domicílios ou junto às comunidades.

No contexto específico, descrevem-se as tecnologias em saúde enquanto favorecedoras do estresse no trabalho do enfermeiro e sua potencial relação com o desenvolvimento do Burnout.

Já o contexto geral descrito destaca o processo de trabalho do enfermeiro, no qual o estresse ocupacional do trabalhador pode advir das más condições de trabalho, da falta de recursos para lidar com a demanda, da sobrecarga de trabalho, das pressões internas e externas dos gestores, dos baixos salários, entre outras coisas.

Esses contextos estão relacionados a um metacontexto da importância da prevenção desse transtorno mental no profissional de enfermagem, que atua junto às famílias e às comunidades, em um primeiro contato com o usuário que adentra a rede de atenção à saúde.

RESULTADOS

Os resultados encontrados foram categorizados segundo a perspectiva conceitual de cada contexto em: a enfermagem da atenção primária à saúde e Burnout (imediato), as tecnologias em saúde e enfermeiros com Burnout na atenção primária em saúde (específico), o estresse ocupacional no processo de trabalho dos enfermeiros da atenção primária à saúde (geral) e o uso de tecnologias na prevenção e enfrentamento do Burnout na enfermagem da atenção primária à saúde (metacontexto).

A enfermagem da atenção primária em saúde e Burnout (imediato)

Em um mercado de trabalho altamente competitivo, a enfermagem tem características hierárquicas e conflituosas, buscando sua identidade científica na prestação de cuidados. Com as dificuldades advindas do próprio processo laboral, tal como o desgaste emocional resultante do convívio com pessoas doentes e suas famílias fragilizadas, o profissional ainda enfrenta situações de risco, salários baixos, falta de reconhecimento e estresse do ambiente de trabalho em meio a diversas concepções e culturas.15

Os enfermeiros possuem o cuidar como filosofia e essência de trabalho, esse cuidado envolve um desgaste de energia e recursos ligados a uma contínua exposição a estressores emocionais e interpessoais, o que tornar o profissional favorável ao desenvolvimento da SB. Em todo o mundo, o Burnout surge em diferentes aspectos de trabalho, gerando sentimentos de frustação, frieza e indiferença ao sofrimento e às necessidades do paciente.16

Dessa forma, o trabalhador com Burnout não se vincula aos problemas e dificuldades emotivas do outro, suprimindo o estabelecimento de relações interpessoais, como se o objeto de seu cuidado fosse uma coisa, numa relação subtraída de calor e afetividade humana. Soma-se, ainda, uma grande irritabilidade em seus ambientes laboral, pessoal e familiar.17

No Brasil, a APS do Sistema Único de Saúde (SUS) representa um conjunto de ações individuais e coletivas dentro do contexto de mudança do modelo assistencial da ESF, com vistas à promoção da saúde das famílias e das comunidades, diminuindo a distância entre o profissional e a população.11,16

Os enfermeiros da ESF estão também inseridos na realidade de comunidades carentes de recursos e com demandas complexas de difícil resolução. Além disso, fazem parte da rotina de trabalho os ambientes perigosos, insalubres às pressões e às exigências do trabalho em si.11

Segundo a Política Nacional da Atenção Básica,18 o enfermeiro da ESF deve realizar assistência integral às pessoas e às famílias no domicílio ou espaços comunitários; consultas de enfermagem à criança, à gestante, ao idoso e aos adultos; solicitar exames complementares e prescrever medicações permitidas, conforme disposições legais da profissão e dos protocolos estabelecidos pelo Ministério da Saúde. Também planeja, coordena e avalia as ações desenvolvidas pela equipe; realiza atividades de educação permanente; e gerenciamento dos insumos para o funcionamento do serviço.

Dentro dessa realidade, o acúmulo de responsabilidades, carga de trabalho e tarefas de complexidades diferentes exigem demandas físicas e psicológicas que vão além do suportado pelo trabalhador. Destacam-se, assim, aspectos do trabalho que podem contribuir para o desenvolvimento da SB: pressão por metas, fragmentação de tarefas, questões administrativas, ambientais e de relacionamento, competitividade, baixa autonomia, insegurança no trabalho, sobrecarga, alta demanda, falta de trabalho em equipe e repetitividade de tarefas.16,17

Além disso, no trabalho da ESF coabitam as precárias condições sociais do território, a desarticulação da rede de saúde e a cobrança profissional pelos gestores ou pelo próprio trabalhador.19 Em pesquisa realizada com enfermeiros que atuavam na ESF no interior de São Paulo, foi identificado que a maioria se encontrava com a SB instaurada, em fase inicial ou em nível avançado.15

Pesquisa envolvendo profissionais das ESF, com 30 enfermeiras, apresentou índices de Burnout com combinações de índices altos e médios, apresentando a síndrome já desenvolvida; e com combinações de níveis alto, médio e baixo, com a síndrome em desenvolvimento. Os sintomas que mais acometem os profissionais da ESF são a fadiga e a ansiedade generalizada, o que pode destruir a interação familiar, social e organizacional, interferindo no cuidado prestado aos usuários. Assim, o profissional com Burnout desenvolvido não possui mais condições emocionais e fisiológicas de desempenhar suas funções laborais, devendo ser afastados do trabalho.16,19-21

As tecnologias em saúde e enfermeiros com Burnout na atenção primária em saúde (específico)

Com a reestruturação produtiva, as organizações prestadoras de serviços de saúde, apoiadas em princípios tayloristas, seguem a lógica capitalista que tem como prioridade os aspectos econômicos. O enfermeiro da APS, nesse sentido, não ficou isento e vem sofrendo em um mundo de trabalho afastado do afeto que deveria existir nas relações de trabalho do cuidado.22

Nesse momento histórico, observa-se que a tecnologia, em seu conceito, tem sido utilizada de forma equivocada e simplista de objetos, máquinas, procedimentos técnicos ou qualquer coisa que fique entre o pensamento humano e o produto final. Entretanto, a tecnologia pode revelar como as pessoas reagem com a natureza do trabalho e se relacionam umas com as outras.23,24

As tecnologias em saúde são classificadas em três categorias, a saber: tecnologia dura, que são os equipamentos, máquinas e instrumentos utilizados no processo de trabalho; tecnologia leve-dura, que inclui o conhecimento das disciplinas em saúde como clínica, epidemiologia, semiologia e outras; e a tecnologia leve, que são os processos relacionais do encontro, de produção do cuidado, vínculo e acolhimento.25

Uma compreensão mecanicista das tecnologias em saúde na APS, seja das duras, leves ou leves-duras, pode prejudicar o processo de trabalho do enfermeiro da ESF trazendo alienação ao trabalhador e esgotamento dos recursos em seu processo produtivo.26 Acredita-se que a relação exclusiva com as máquinas e aparatos mecanizão cuidado, como se o paciente fosse apenas uma extensão dessa tecnologia dura, contribuindo para a desumanização na assistência e distanciamento humano.12

Para um profissional da ESF com SB em desenvolvimento devido ao estresse laboral crônico, esses fatores podem se tornar mais um contributivo para o agravamento dos sintomas, para a prestação de cuidados sem qualidade e para o sentimento de abandonado e insignificância pelo paciente, pois o enfermeiro não reconhece a importância das tecnologias leves do acolhimento, do vínculo, do autocuidado e da educação em saúde. Essa tecnologia, enquanto concepção desumanizada, despersonalizada e coisificada, não deve estar presente nos processos de trabalho da enfermagem na APS.12

A inclusão de novas tecnologias sejam equipamentos, relações ou ferramentas gerenciais, mudam também os interesses pessoais, os modos de pensar e de viver. Minimamente, há uma expansão do conhecimento, habilidades, intuição, emoção, sensações, razão e sensibilidade enquanto instrumentos de fortalecimento da enfermagem. Isto é o que a sociedade moderna exige: um profissional crítico- reflexivo, criativo e com capacidade de aprender a aprender e de trabalhar em grupo.24,26

Para que o emprego de uma tecnologia em saúde não seja a causa da geração de mais uma fonte de estresse no trabalho, deve-se levar em consideração sua segurança, eficácia, ética, impacto social e relação custo-benefício, utilizando-as de forma humanizada. Um bom exemplo é visualizado pelo emprego da tecnologia emancipatória que envolve a apreensão e a aplicação de conhecimentos que possibilitam a reflexão e o agir do trabalhador numa perspectiva crítica e cidadã, tornando possível, no ambiente de trabalho, a liberdade, a autonomia, a integralidade, a ética, a qualidade de vida e autorrealização.12,26

Dessa forma, a tecnologia em enfermagem, enquanto conjunto de conhecimentos científicos ou empíricos sistematizados, preza a qualidade de vida considerando as questões éticas e os processos reflexivos do ato de cuidar. Os tipos de tecnologias utilizadas pelo enfermeiro incluem o conjunto de relações do cuidado interpessoal e troca de aprendizado entre profissional e paciente, que acontece de forma direta com conexão interpessoal e troca de aprendizado (leves); o uso de conhecimentos estruturados que não necessitam de alta tecnologia como massagens, banho de imersão, terapias integrativas (leves-duras); bem como a utilização de alta tecnologia para diagnósticos e tratamentos como bombas de infusão, ventiladores mecânicos e demais maquinários (duras).27

O estresse ocupacional no processo de trabalho dos enfermeiros da atenção primária à saúde (geral)

A enfermagem é uma das profissões mais estressantes do setor público, tanto pela falta de reconhecimento social, como por fatores ocupacionais, como excesso de atividades executadas, número reduzido de profissionais por serviço, dificuldades de relacionamento entre a própria equipe, redução salarial, dupla ou tripla jornada, vários vínculos de trabalho, cargas longas e exaustivas.22

Em seu processo de trabalho, o enfermeiro na APS exerce cargos distintos, porém com muitos elementos que favorecem ao estresse. Os enfermeiros assistenciais lidam com recursos inadequados, consulta a usuários, relações interpessoais, carga emocional advinda do acolhimento, vinculo e cuidado à família. Enfermeiros coordenadores confrontam-se com sobrecarga de trabalho burocrático, poder, tomada de decisão e cobranças dos gestores. Enfermeiros preceptores/docentes somam as atividades com os alunos, as políticas e normativas universitárias e questões de carga hora-aula. Dessa forma, o exercício da enfermagem requer saúde física, mental e proteção social para o seu desempenho, a fim de que se previnam acidentes e doenças do trabalho.22

Raramente essa proteção social ocorre, pois os trabalhadores de enfermagem, mesmo motivados, sentem-se sobrecarregados em relação às atividades desenvolvidas.28 Considerando a diversidade de atividades existentes entre APS e atenção hospitalar, um estudo comparativo realizado no Rio de Janeiro apontou prevalência notável da ocorrência da SB nos setores da atenção terciária, em que 80% dos enfermeiros hospitalares demonstravam indícios da síndrome, contra 10% dos enfermeiros de uma ESF.29

Embora se saiba que os enfermeiros da ESF enfrentam rotineiramente usuários poliqueixosos e sem entendimento das diretrizes do serviço na promoção da saúde e na prevenção de agravos, há uma culpabilização destes profissionais pelas deficiências do serviço e por uma maior cobertura de consultas e exames. Além disso, são pressionados também pela gestão no cumprimento das metas e atividades paralelas às assistenciais, como os grupos de convivência, educação permanente da equipe e educação em saúde para comunidade, sem condições favoráveis ao bom desempenho destas ações.21

Nesse sentido, o trabalho na APS torna-se insalubre e penoso, podendo levar a doenças e transtornos mentais, em função do estresse gerado pelos diferentes graus de controle que o trabalhador tem sobre essas tarefas. A exposição a esses fatores podem ser evidência para a SB e para outro conjunto de sinais e sintomas orgânicos e psíquicos que prejudicam a qualidade de vida do profissional.17

Tal estresse decorrente do trabalho pode diminuir a qualidade do serviço prestado por mau atendimento, procedimentos equivocados, negligência e imprudência, afetando a saúde do usuário e a qualidade da instituição. Já para a saúde do trabalhador, o Burnout e o estresse ocupacional têm relação com a liberação do hormônioglicocorticoide, modulador das defesas do organismo, e pode se manifestar pela baixa da imunidade, infecções, alergias, hipertensão, distúrbios respiratórios e gastrointestinais, perda de peso, depressão, ansiedade, insônia e disfunções sexuais.16

O uso de tecnologias na prevenção e enfrentamento do Burnout na Enfermagem da atenção primária à saúde (metacontexto)

O enfermeiro deve ser consciente e ter a capacidade de refletir criticamente sobre seu papel na sociedade enquanto profissional. Dessa forma, é importante que se tenha convicção da necessidade de afastar a possibilidade de desenvolver a SB pela autonomia, controle sobre o ambiente de trabalho, relações cordiais com os outros trabalhadores, suporte da gestão e práticas inovadoras, sentindo-se realizado e satisfeito.20,30

A forma de se reduzir ou prevenir essa síndrome seria com estratégias de enfrentamento ativos através de medidas interventivas ou preventivas, como atividades de educação permanente, melhor utilização das tecnologias em saúde, pausas ao longo da jornada, administração de conflitos, melhoria das condições ambientais de trabalho, tornado a rotina mais produtiva e menos desgastante.17

Deve-se, ainda, valorizar os aspectos participativos do trabalhador, possibilitando o diálogo sobre condições salariais, horas trabalhadas, cargas de trabalho e políticas de humanização com acompanhamento psicológico para suporte ao estresse, alcoolismo e drogadição.16

É mistera reflexão contínua sobre políticas públicas com base na proteção social, prevenção, tratamento e reabilitação. Nesse sentido, a preocupação com as condições de trabalho, qualidade de vida e satisfação do profissional reformula a discussão da saúde física e mental do trabalhador através da política de saúde mental e de saúde do trabalhador que, embora, muitas vezes, não caminhem juntas, estão em paralelo no que diz respeito às novas práticas de cuidado ocupacional.4,21

Em nível individual, a melhor estratégia para prevenir o Burnout é a organização interna do processo de trabalho pelo próprio trabalhador: racionalidade para alcançar os objetivos, estabelecimento de metas e prioridades, flexibilidade para solução dos problemas, divisão do tempo entre as atividades administrativas e assistenciais. É relevante, também, ter uma alimentação adequada, usufruir de férias, manter uma vida longe do sedentarismo, realizar atividades de lazer e recreação, bem como buscar suporte social intra e extralaboral com apoio terapêutico profissional.17,20

Em relação às políticas de saúde para o enfrentamento dessa síndrome, destaca-se a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC), a qual inclui a Medicina Tradicional Chinesa (MTC), a Acupuntura, a Homeopatia, a Fitoterapia, a Medicina Antroposófica e a Medicina do Termalismo-Crenoterapia. Essas tecnologias em saúde se destacam na eficácia e segurança, pois baseiam-se na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano como o meio ambiente e a sociedade.31

Dentre as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), a auriculoterapia tem ganhado reconhecimento de seus efeitos positivos em distúrbios físicos, psíquicos e mentais. Sendo uma das práticas da MTC, utiliza específicos pontos do pavilhão auricular para tratar várias desordens do corpo, empregando como instrumentos agulhas, sementes ou imãs para fazer a estimulação dos pontos energéticos.32,33

Estudos realizados vêm demonstrando a eficácia e efetividade dessa tecnologia no enfrentamento do estresse dos profissionais de enfermagem. Um ensaio clínico comprovou que a auriculoterapia tanto com agulhas quanto com sementes pode produzir impacto positivo na melhoria de enfrentamento em uma equipe de enfermagem.32 No uso da técnica com agulhas semipermanentes na enfermagem de um hospital-escola, os níveis de estresse também foram reduzidos eficazmente.34 Em um terceiro ensaio clínico randomizado, conseguiu-se ampliar o alcance da técnica, sem protocolo, na redução do estresse em profissionais de enfermagem hospitalar.35

Assim, as PICS podem ser utilizadas no enfrentamento do Burnout como tecnologias em saúde e em enfermagem, que consideram os indivíduos como seres integrais, buscando o equilíbrio do corpo humano por meio de técnicas que promovem a valorização da mente e das emoções no processo saúde-doença.31

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificou-se que tanto o estresse ocupacional, quanto o Burnout, são agravos que estão presentes no processo de trabalho do enfermeiro na atenção primária à saúde. Os próprios trabalhadores não têm conhecimento suficiente sobre a síndrome, embora muitos tenham consciência de que já estejam em adoecimento mental devido ao estresse das condições do processo de trabalho e, particularmente, como isso vem afetando sua qualidade de vida pessoal e organizacional.

Não foram encontrados estudos que façam a relação do emprego de tecnologias em saúde na sua concepção ampliada ena influência do estresse ocupacional e do Burnout na Enfermagem na APS. É preciso ampliar essa discussão e reconhecer que as tecnologias na enfermagem são instrumentos que podem favorecer ao conhecimento do enfermeiro no cotidiano de sua práxis e não apenas como força produtiva que atua nos serviços de saúde.

Também não se pode deixar de evidenciar a necessidade de mais estudos alinhando as políticas de saúde do trabalhador, de saúde mental e a PNIC desenvolvidos no âmbito da prevenção, promoção, assistência e reabilitação do profissional acometido pelos agravos à saúde mental relacionados ao trabalho, principalmente o Burnout.

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