versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.23 no.1 Rio de Janeiro jan. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018231.16672015
Os sistemas de informação em saúde (SIS) são definidos como um conjunto de componentes interrelacionados que coletam, processam, armazenam e distribuem informações para apoiar o processo de tomada de decisão e auxiliar na organização do sistema de saúde1. Desta forma, é esperado que contribuam para subsidiar ações dedicadas a melhorar a oferta de cuidado em saúde2. No Brasil, existem diversos SIS, a maior parte de acesso público e administrados pelo Ministério da Saúde, através do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), cujos dados têm orientado a condução de estudos que abordam a análise de parâmetros epidemiológicos, sanitários, de aparelhamento e infraestrutura de oferta de serviços2.
Araújo Lima et al.1 pontuam que a apropriação dos dados veiculados nestes SIS, pelos gestores e pela sociedade, deve considerar os pontos fortes e as limitações desses sistemas. Frisam ainda que o conhecimento a respeito da qualidade dos dados organizados junto a essas bases somente poderá surgir a partir de avaliações regulares e sistemáticas dos dados disponibilizados. Sem a garantia de que os dados oriundos destes sistemas representem a realidade, os processos de formulação de políticas e produção de conhecimento ficam comprometidos em seu cerne3.
A revisão sistemática de literatura realizada por Araújo Lima et al.1 abordou os SIS a partir da compreensão do conceito de qualidade aplicada aos mesmos, destacando as seguintes dimensões: confiabilidade, completude, cobertura, validade, oportunidade, não duplicidade, consistência, acessibilidade e clareza metodológica. Os resultados destacaram que os SIS estavam sendo utilizados para fins acadêmicos e de gestão pública, mas nem todos haviam sido avaliados, no que tange à análise da qualidade de seus dados. Além disso, constatou-se um desequilíbrio geográfico, em relação às unidades da federação que tiveram seus dados avaliados, com apenas algumas sendo contempladas.
Evidências como essas suscitaram a importância de ampliar análises de qualidade dos SIS que desempenham um papel relevante junto ao Sistema Único de Saúde (SUS) como, por exemplo, o Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES), uma base que contém dados da totalidade dos estabelecimentos de saúde brasileiros. A inclusão de um estabelecimento no CNES é feita por meio do preenchimento de formulários específicos com dados sobre área física, recursos humanos, equipamentos, serviços ambulatoriais e hospitalares em funcionamento, independentemente de prestarem ou não atendimento aos usuários do SUS. Uma vez cadastrado, o Ministério da Saúde gera um código numérico para cada estabelecimento. Os gestores responsáveis por cada instituição podem solicitar alterações ou até mesmo sua exclusão da base do CNES.
Os dados do CNES são importantes para a área de planejamento, controle e avaliação em saúde e deveriam refletir a real situação do sistema de saúde4. No entanto, os parcos estudos recentes, que abordaram elementos do CNES, evidenciaram inconsistências na base de dados com potencial para afetar negativamente eventuais análises desenvolvidas com a mesma.
Matos e Pompeu5, ao analisarem a situação contratual da rede assistencial privada vinculada ao SUS, tendo por base os dados do CNES, identificaram inconsistências no número de contratos registrados, tendo em vista que ainda constavam contratos firmados entre 1950 e 1980, e não renovados. As divergências no cadastro do CNES também foram fontes de limitações para o Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde (PNASS) de 2004 a 2006 como, por exemplo, cadastros de Centros de Alta Complexidade em Oncologia, que não apresentavam atividades nem de quimioterapia, de radioterapia ou cirurgia oncológica6. Os dados disponíveis no sistema eram da última atualização do cadastro feita pelo estabelecimento e estavam desatualizados6.
Santos et al.7 e Costa et al.8 realizaram estudos utilizando dados sobre a distribuição de profissionais, cadastrados no CNES por estabelecimento, e puderam constatar as limitações, no que diz respeito à fragilidade de dados para uma parcela dos estabelecimentos analisados. Medeiros e Calvo9, ao descreverem a distribuição dos serviços públicos de fisioterapia cadastrados na média complexidade ambulatorial em Santa Catarina, observaram que o CNES estava desatualizado e sem preenchimento, principalmente em relação ao número de telefone do serviço, quantidade de profissionais e tipo de equipamentos.
A publicação da Portaria N° 134, de 4 de Abril de 201110, foi uma tentativa de minimizar algumas das deficiências reportadas no CNES, pois estipulava novas regras para o cadastramento, de modo a minimizar irregularidades, dentre elas a pluralidade de vínculos públicos de profissionais. A Portaria N° 118, de 18 de Fevereiro de 201411, prevê a desativação automática no CNES dos estabelecimentos que não atualizarem seu registro a cada seis meses, buscando assegurar que os dados estejam mais próximos da realidade. Entretanto, apesar desses esforços, pesa a necessidade de ampliar as ações para avaliar a confiabilidade dos dados disponibilizados pelo CNES.
A confrontação dos dados cadastrados no CNES, com aqueles observados in loco pode contribuir para a identificação de critérios com baixa confiabilidade e direcionar melhorias. Não foram observados na literatura nacional estudos que adotassem essa estratégia comparativa na avaliação da qualidade dos dados, especialmente quanto à dimensão de confiabilidade. Dessa forma, o presente estudo objetiva comparar o que estava cadastrado no CNES com o que pode ser observado nos hospitais brasileiros de pequeno porte. A escolha dessa tipologia de unidades de saúde se deu em função da realização de um estudo censitário dos mesmos12, que acabou por permitir a criação de critérios de comparação em relação ao CNES para todo o conjunto de estabelecimentos de saúde do país. Em um sistema de saúde, a existência de pequenos hospitais se justifica, principalmente, para execução de ações de baixa complexidade, mas não de atenção básica, e ações relacionadas à atenção de urgência/emergência e materno-infantil13, sobretudo em localidades remotas e de difícil acesso.
O conjunto de dados obtido neste trabalho permitiu discutir a confiabilidade dos dados do CNES ao comparar: status de funcionamento/participação do estabelecimento, número de leitos, disponibilidade de equipamentos e localização geográfica. A hipótese é de que há uma defasagem entre os dados registrados no CNES e aqueles observados in loco.
O presente estudo se configura como seccional descritivo. O estudo foi realizado com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal Pelotas (COEP/UFMG).
Foram selecionados para o estudo todos os hospitais de pequeno porte - com até 50 leitos - considerando os registros de setembro de 2013 no CNES. De acordo com este critério obteve-se um total de 3524 hospitais, distribuídos no território nacional, elegíveis para o survey. A Tabela 1 apresenta a distribuição quantitativa dos estabelecimentos selecionados.
Tabela 1 Aceitação em relação a participação na pesquisa para caracterização dos hospitais de pequeno porte, por estados e regiões administrativas, Brasil – 2014.
Em relação à pesquisa: | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
N | % em relação ao Brasil | % Consentiu em participar | % Recusou-se participar | % Imóvel não existe ou não foi encontrado | % Hospital estava fechado | % Recusa por outros motivos | ||
Centro | Distrito Federal | 25 | 0,7 | 32,0 | 36,0 | 8,0 | 12,0 | 12,0 |
Oeste | Goiás | 269 | 7,6 | 78,4 | 10,8 | 1,5 | 0,0 | 9,3 |
Mato Grosso | 114 | 3,2 | 83,3 | 7,0 | 0,9 | 7,0 | 1,8 | |
Mato Grosso do Sul | 80 | 2,3 | 76,3 | 15,0 | 1,3 | 6,3 | 1,3 | |
Nordeste | Alagoas | 52 | 1,5 | 69,2 | 25,0 | 0,0 | 5,8 | 0,0 |
Bahia | 367 | 10,4 | 79,8 | 10,9 | 0,5 | 0,0 | 8,7 | |
Ceará | 166 | 4,7 | 86,7 | 4,2 | 0,6 | 6,0 | 2,4 | |
Maranhão | 161 | 4,6 | 87,6 | 5,0 | 0,6 | 0,0 | 6,8 | |
Paraíba | 94 | 2,7 | 74,5 | 3,2 | 6,4 | 9,6 | 6,4 | |
Pernambuco | 200 | 5,7 | 91,5 | 2,0 | 0,5 | 5,0 | 1,0 | |
Piaui | 134 | 3,8 | 87,3 | 2,2 | 1,5 | 8,2 | 0,7 | |
Rio Grande do Norte | 132 | 3,8 | 84,8 | 3,0 | 2,3 | 3,0 | 6,8 | |
Sergipe | 26 | 0,7 | 96,2 | 0,0 | 0,0 | 3,8 | 0,0 | |
Norte | Acre | 21 | 0,6 | 95,2 | 4,8 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Amapá | 11 | 0,3 | 81,8 | 0,0 | 0,0 | 9,1 | 9,1 | |
Amazonas | 56 | 1,6 | 89,3 | 3,6 | 0,0 | 0,0 | 7,1 | |
Pará | 119 | 3,4 | 83,2 | 5,0 | 0,0 | 6,7 | 5,0 | |
Rondônia | 68 | 1,9 | 80,9 | 11,8 | 4,4 | 0,0 | 2,9 | |
Roraima | 13 | 0,4 | 84,6 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 15,4 | |
Tocantins | 43 | 1,2 | 81,4 | 11,6 | 0,0 | 0,0 | 7,0 | |
Sudeste | Espírito Santo | 49 | 1,4 | 67,3 | 8,2 | 2,0 | 10,2 | 12,2 |
Minas Gerais | 334 | 9,5 | 83,8 | 9,3 | 0,0 | 5,1 | 1,8 | |
Rio de Janeiro | 190 | 5,4 | 40,0 | 25,8 | 2,1 | 16,3 | 15,8 | |
São Paulo | 324 | 9,2 | 67,0 | 22,5 | 1,2 | 3,1 | 6,2 | |
Sul | Paraná | 247 | 7,0 | 82,6 | 10,9 | 0,4 | 4,5 | 1,6 |
Rio Grande do Sul | 119 | 3,4 | 78,2 | 16,8 | 0,0 | 1,7 | 3,4 | |
Santa Catarina | 110 | 3,1 | 90,0 | 6,4 | 0,0 | 1,8 | 1,8 | |
Centro Oeste | 488 | 13,9 | 76,8 | 11,9 | 1,6 | 3,3 | 6,4 | |
Nordeste | 1.332 | 37,8 | 84,2 | 6,2 | 1,2 | 3,6 | 4,9 | |
Norte | 331 | 9,4 | 84,3 | 6,6 | 0,9 | 2,7 | 5,4 | |
Sudeste | 897 | 25,5 | 67,6 | 17,5 | 1,0 | 7,0 | 6,9 | |
Sul | 476 | 13,5 | 83,2 | 11,3 | 0,2 | 3,2 | 2,1 | |
Brasil | 3.524 | 100 | 78,8 | 10,6 | 1,0 | 4,3 | 5,3 |
Grande parte dos hospitais de pequeno porte é municipalizada e a obtenção de autorizações para a realização do estudo precisou ser tratada caso a caso. Cada estabelecimento recebeu uma carta convite assinada, simultaneamente, pela coordenação da pesquisa e pela Diretoria de Atenção Hospitalar e Urgência do Ministério da Saúde, solicitando a cooperação quanto à participação no estudo. Além disso, houve uma negociação com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) para a obtenção da cooperação dos municípios e dos hospitais a serem visitados. Como a participação na pesquisa era voluntária, apenas aqueles que consentissem eram visitados. É importante ressaltar que mesmo os estabelecimentos que se recusaram a participar eram visitados para a coleta de coordenadas geográficas e para preenchimento das informações referentes ao motivo da recusa.
Os dados primários foram coletados entre fevereiro e setembro de 2014, e os secundários, obtidos no CNES, foram referentes à competência de setembro de 2014.
O objetivo da pesquisa primária era mais amplo que apenas a caracterização dos equipamentos existentes nos hospitais de pequeno porte. Dessa forma, haviam mais equipamentos avaliados pelo estudo em cada hospital que aqueles existentes no CNES. Foram coletados in loco, por exemplo, dados sobre a quantidade de leitos, as coordenadas geográficas, quantidade de instalações, cumprimento de processo de trabalho, a disponibilidade de apoio diagnóstico, aspectos financeiros e de recursos humanos, dentre outros. Assim, a seleção das variáveis a serem comparadas neste artigo considerou todos os equipamentos que estavam cadastrados no CNES, para os hospitais visitados, em ambas as bases (primária e secundária). Os dados extraídos do CNES, listados no Quadro 1, eram apenas referentes às quantidades de cada equipamento, em condições de uso, existentes em cada hospital.
Quadro 1 Lista de equipamentos analisados.
Laparoscópio/Vídeo | Eletroencefalógrafo |
Endoscópio das Vias Respiratórias | Berço Aquecido |
Endoscópio Digestivo | Desfibrilador |
Gama Câmara | Equipamento de Fototerapia |
Mamógrafo com Comando Simples | Incubadora |
Mamógrafo com Estereotaxia | Marcapasso Temporário |
PET/CT | Monitor de ECG |
Raio X até 100 mA | Monitor de Pressão Invasivo |
Raio X com Fluoroscopia | Monitor de Pressão Não Invasivo |
Raio X de 100 a 500 mA | Reanimador Pulmonar/AMBU |
Raio X mais de 500mA | Respirador/Ventilador |
Raio X Dentário | Oftalmoscópio |
Raio X para Densitometria Óssea | Aparelho de Diatermia por Ultrassom/Ondas Curtas |
Raio X para Hemodinâmica | Aparelho de Eletroestimulação |
Ressonância Magnética | Equipamentos de Aférese |
Tomógrafo Computadorizado | Equipamento de Circulação Extracorpórea |
Ultrassom Doppler Colorido | Equipamento para Audiometria |
Ultrassom Ecógrafo | Equipamento para Hemodiálise |
Eletrocardiógrafo |
O instrumento de coleta do estudo foi concebido em formato eletrônico e baseado na tecnologia extensible markup language (XML). O questionário XML foi aplicado com o auxílio de tablets e do aplicativo open data kit collect (ODK collect). O preenchimento foi presencial, com respostas autodeclaradas e foram fornecidas preferencialmente pelos seguintes profissionais: o diretor clínico, o chefe da enfermagem ou o diretor geral do estabelecimento.
A aplicação eletrônica se deu em função dos benefícios decorrentes da possibilidade de checagem automatizada dos dados imediatamente após a coleta. Todos os dados coletados que infringissem regras de validação específicas eram conferidos. Havia dois níveis de conferência: o primeiro, embutido no ODK collect, somente permitia o envio de questionários completos e com dados que apresentassem o somatório de valores compatibilizados entre as diferentes seções do questionário. Por exemplo, havia um campo para o lançamento do total de despesas do estabelecimento e, logo após, vários campos para o detalhamento dessas despesas. A ferramenta de coleta somente permitia o envio do questionário caso o total e o somatório das despesas detalhadas fosse o mesmo. O segundo nível utilizava cinco indicadores para validação: i) conferência da coordenada geográfica do estabelecimento, ii) porcentagem de missings, iii) número de leitos, iv) percentual de preenchimento dos dados financeiros e v) percentual de preenchimento de dados sobre recursos humanos.
Para cada um dos indicadores foram estabelecidos critérios que, quando infringidos, implicavam a realização de checagem adicional. Quanto à coordenada geográfica era verificado se a mesma pertencia ao município de cadastro do estabelecimento. Quanto ao percentual de missings, preenchimento de dados financeiros e de recursos humanos foram definidos valores médios. Esses valores médios eram dinâmicos e recalculados a cada vez que os dados de um hospital ingressavam no sistema de validação. Dessa forma almejava-se definir níveis de corte que refletissem o perfil de fornecimento de dados dos hospitais que eram visitados. O único indicador que apresentava um critério de comparação fixo era a quantidade de leitos, sendo que qualquer questionário que reportasse um hospital com mais de 50 leitos era encaminhado para a checagem. Para os demais indicadores, sempre que um questionário apresentasse, para pelo menos um dos indicadores monitorados, uma discrepância de três desvios padrões em relação aos critérios médios definidos pelos dados já coletados, este questionário era automaticamente encaminhado para a checagem.
Todo o procedimento de cômputo de indicadores, definição de médias de referência, confrontação para a seleção de questionários para a checagem e acompanhamento da resolução das checagens era feito automaticamente, em um sistema especialmente concebido para tal tarefa. Este sistema era web e fornecia gráficos de acompanhamento desses múltiplos aspectos para o controle das ações de validação dos dados do estudo.
Uma vez elencados para a checagem, os questionários não ingressavam no banco de dados definitivo enquanto a conferência não referendasse sua veracidade. Facilitadores logísticos eram os responsáveis por fazer a checagem telefônica de dados fora dos padrões, abordando os respondentes dos hospitais visitados, bem como os entrevistadores responsáveis pela coleta. Eventualmente, poderia ser solicitado ao entrevistador que retornasse a um hospital previamente visitado para a coleta de dados faltantes ou que necessitassem de maiores detalhes. Uma vez feita a checagem era gerado um relatório, detalhando a justificativa para as informações, aparentemente anômalas, e eventuais correções eram realizadas no arquivo eletrônico que continha os dados. Tais correções eram realizadas por programadores dedicados. Posteriormente, o questionário revisado era incorporado ao banco de dados definitivo. Esses procedimentos se deram com o intuito de garantir que grandes diferenças fossem reflexo, de fato, da situação dos hospitais e não oriundas de erros de coleta.
As análises descritivas realizadas observaram aspectos de confiabilidade dos dados, já que examinaram a concordância entre as aferições obtidas pelas diferentes fontes consideradas. Por isso, fez-se a opção de apresentar as diferenças encontradas por meio de proporções.
Primeiramente, o status de funcionamento do estabelecimento foi analisado para se averiguar a existência de cadastros desatualizados no CNES. Em segundo lugar foi verificada a situação quanto ao número de leitos, uma vez que foram encontrados hospitais no CNES com menos de 50 leitos, mas que durante a visita informaram possuir mais de 50 leitos.
Quanto aos equipamentos, as quantidades listadas no CNES foram subtraídas daqueles valores encontrados no levantamento presencial. Sempre que não fossem encontradas quaisquer diferenças a situação do hospital em relação àquele equipamento era definida como “CNES atualizado”. Uma vez comparados todos os equipamentos considerados, de todos os hospitais, foi elaborada uma tabela com aqueles que apresentavam dados atualizados, por equipamento e região administrativa.
Por último, foram analisadas as coordenadas geográficas. As coordenadas do CNES foram obtidas por meio do espelho de cadastro de cada hospital existente nas bases do DATASUS, sendo que as do survey foram coletadas por meio do GPS dos tablets utilizados. Para exame da distância entre ambas foi utilizada a fórmula para cálculo de distância em grandes círculos.
Δσ = Ângulo esférico interior
Δϕ = Latitude survey – Latitude CNES
ϕs = Latitude survey
ϕf = Latitude CNES
Δλ = Longitude survey – Longitude CNES
Essa fórmula é utilizada para a identificação do caminho mais curto entre dois pontos sobre a superfície de uma esfera. Dessa maneira, considerou-se a Terra como uma esfera perfeita, de raio correspondente a 6.371 km. As latitudes e longitudes coletadas pelo GPS foram consideradas como corretas e suas respectivas distâncias, para com aquelas registradas junto ao CNES, examinadas considerando-se km como a unidade de medida de referência.
Conforme a Tabela 1, do universo de 3524 hospitais, 2777 concordaram em participar da pesquisa, sendo que destes, 2455 (88%) prestavam atendimento ao SUS, e 322 (12%) eram exclusivamente privados.
No país, somente 1% (N = 35) dos hospitais não foram encontrados ou o imóvel cadastrado não existe, com destaque para Distrito Federal, Paraíba, Rio Grande do Norte, Espírito Santo e Rondônia, que apresentaram maiores percentuais. A quantidade de hospitais não localizados ou fechados correspondeu a um percentual reduzido frente ao total de hospitais considerados.
Apesar de toda articulação para viabilizar o estudo, alguns estabelecimentos negaram-se a participar. Hospitais privados e militares, por exemplo, apresentaram um padrão de recusas mais elevado que os demais. Estados como São Paulo, Alagoas, Rio de Janeiro e o Distrito Federal também se encaixaram nesta situação, em função do menor envolvimento de instâncias colegiadas que auxiliavam na divulgação da pesquisa.
A Tabela 2 apresenta o percentual de leitos identificados através dos dados primários em relação aos cadastrados na base de dados do CNES. Assim, 44% dos hospitais visitados apresentaram entre 91% e 110% dos leitos cadastrados do CNES. Esta categoria engloba aquelas situações de pequena discrepância entre ambas as fontes utilizadas. Um percentual pequeno (4,5%) de hospitais detinha menos de 50% dos leitos do CNES. Na região Sudeste, mais de 23% dos hospitais obtiveram valores entre 111% e 150% dos leitos do CNES, e na região Nordeste, mais de 12% dos estabelecimentos foram enquadrados na categoria de mais de 150% dos leitos do CNES. Os hospitais com valores acima de 111% indicam uma maior discrepância, afetando a confiabilidade dos dados sobre a capacidade de internação destes estabelecimentos. Considerando o país como um todo, aproximadamente, 31% dos hospitais se encaixou nas categorias acima de 111% e mais de 150%.
Tabela 2 Caracterização da diferença do número de leitos dos hospitais de pequeno porte e no CNES, por porte, regiões administrativas e estados, Brasil – 2014.
N | % com 50% ou leitos do CNES menos dos | % entre 51% e 90% dos leitos do CNES | % entre 91% e 110% dos leitos do CNES | % entre 111% e 150% dos leitos do CNES | % com mais de 150% dos leitos do CNES | ||
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Centro-Oeste | Distrito Federal | 8 | 12,5 | 37,5 | 25,0 | 12,5 | 12,5 |
Goiás | 211 | 9,0 | 29,4 | 30,8 | 22,7 | 8,1 | |
Mato Grosso | 95 | 3,2 | 27,4 | 47,4 | 13,7 | 8,4 | |
Mato Grosso do Sul | 61 | 0,0 | 8,2 | 42,6 | 21,3 | 27,9 | |
Nordeste | Alagoas | 36 | 5,6 | 13,9 | 52,8 | 16,7 | 11,1 |
Bahia | 293 | 5,8 | 14,7 | 43,7 | 21,8 | 14,0 | |
Ceará | 144 | 5,6 | 23,6 | 45,8 | 18,8 | 6,3 | |
Maranhão | 141 | 9,2 | 17,0 | 47,5 | 17,7 | 8,5 | |
Paraíba | 70 | 5,7 | 21,4 | 35,7 | 28,6 | 8,6 | |
Pernambuco | 183 | 4,4 | 25,1 | 31,1 | 20,8 | 18,6 | |
Piaui | 117 | 2,6 | 29,1 | 41,0 | 21,4 | 6,0 | |
Rio Grande do Norte | 112 | 4,5 | 27,7 | 33,0 | 26,8 | 8,0 | |
Sergipe | 25 | 4,0 | 8,0 | 8,0 | 20,0 | 60,0 | |
Norte | Acre | 20 | 0,0 | 5,0 | 55,0 | 25,0 | 15,0 |
Amapá | 9 | 22,2 | 33,3 | 22,2 | 11,1 | 11,1 | |
Amazonas | 50 | 0,0 | 20,0 | 40,0 | 32,0 | 8,0 | |
Pará | 99 | 4,0 | 26,3 | 47,5 | 19,2 | 3,0 | |
Rondônia | 55 | 3,6 | 16,4 | 63,6 | 9,1 | 7,3 | |
Roraima | 11 | 18,2 | 9,1 | 27,3 | 36,4 | 9,1 | |
Tocantins | 35 | 2,9 | 11,4 | 54,3 | 8,6 | 22,9 | |
Sudeste | Espirito Santo | 33 | 3,0 | 18,2 | 33,3 | 33,3 | 12,1 |
Minas Gerais | 280 | 1,1 | 12,9 | 47,9 | 29,3 | 8,9 | |
Rio de Janeiro | 76 | 7,9 | 23,7 | 21,1 | 28,9 | 18,4 | |
São Paulo | 217 | 4,1 | 15,2 | 58,5 | 12,4 | 9,7 | |
Sul | Paraná | 204 | 2,5 | 16,2 | 56,9 | 20,1 | 4,4 |
Rio Grande do Sul | 93 | 5,4 | 15,1 | 52,7 | 19,4 | 7,5 | |
Santa Catarina | 99 | 0,0 | 17,2 | 54,5 | 22,2 | 6,1 | |
Centro-Oeste | 375 | 6,1% | 25,6 | 36,8 | 20,0 | 11,5 | |
Nordeste | 1121 | 5,4% | 20,9 | 40,1 | 21,4 | 12,2 | |
Norte | 279 | 3,9% | 19,4 | 49,1 | 19,0 | 8,6 | |
Sudeste | 606 | 3,1% | 15,3 | 47,5 | 23,4 | 10,6 | |
Sul | 396 | 2,5% | 16,2 | 55,3 | 20,5 | 5,6 | |
Brasil | 2777 | 4,5% | 19,5 | 44,3 | 21,3 | 10,4 |
Na Tabela 3 encontram-se os dados relacionados aos equipamentos. Considerando os 39 equipamentos avaliados, a média de hospitais com dados atualizados, para o Brasil, foi de 82%. As porcentagens dos equipamentos analisados revelaram que aqueles de alto custo, como PET/CT, ressonância magnética, hemodiálise, mamógrafo, tomógrafo e outros, apresentaram um grau de atualização maior que aqueles de menor custo, como desfibriladores, AMBU, monitores de ECG e eletrocardiógrafos.
Tabela 3 Percentual de equipamentos encontrados, dentre os registrados nos hospitais de pequeno porte, por região – Brasil, 2014.
Regiões e N de dos hospitais | Centro Oeste N = 375 | Nordeste N = 1121 | Norte N = 279 | Sudeste N = 60 | Sul N = 396 | Brasil N = 2777 | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Equipamentos | N | % de hospitais com CNES atualizado, por equipamento | |||||
Aparelho de Diatermia por Ultrassom/Ondas Curtas | 215 | 90 | 88 | 81 | 84 | 91 | 87 |
Aparelho de Eletroestimulação | 294 | 87 | 88 | 82 | 85 | 89 | 86 |
Berço Aquecido | 3072 | 54 | 62 | 62 | 51 | 56 | 57 |
Desfibrilador | 3789 | 35 | 53 | 54 | 37 | 42 | 45 |
Eletrocardiógrafo | 2749 | 55 | 56 | 61 | 46 | 51 | 53 |
Eletroencefalógrafo | 114 | 93 | 97 | 97 | 94 | 98 | 96 |
Endoscópio das Vias Respiratórias | 130 | 95 | 97 | 95 | 92 | 94 | 95 |
Endoscópio Digestivo | 282 | 88 | 86 | 86 | 82 | 89 | 86 |
Equipamento de Circulação Extracorpórea | 56 | 100 | 99 | 99 | 98 | 99 | 99 |
Equipamento de Fototerapia | 1771 | 68 | 78 | 67 | 58 | 62 | 69 |
Equipamento para Audiometria | 134 | 95 | 99 | 96 | 95 | 98 | 97 |
Equipamento para Hemodiálise | 135 | 99 | 100 | 99 | 98 | 99 | 99 |
Equipamentos de Aférese | 104 | 99 | 99 | 98 | 97 | 97 | 98 |
Equipo Odontológico Completo | 359 | 93 | 76 | 77 | 94 | 95 | 85 |
Forno de Bier | 113 | 95 | 91 | 90 | 89 | 88 | 91 |
Gama Câmara | 7 | 99 | 99 | 100 | 99 | 99 | 99 |
Incubadora | 2400 | 58 | 67 | 59 | 58 | 57 | 62 |
Laparoscópio/Vídeo | 655 | 83 | 91 | 85 | 82 | 85 | 86 |
Mamógrafo com Comando Simples | 138 | 95 | 96 | 91 | 93 | 96 | 95 |
Mamógrafo com Estereotaxia | 24 | 99 | 99 | 99 | 99 | 99 | 99 |
Marcapasso Temporário | 233 | 94 | 97 | 96 | 91 | 95 | 95 |
Monitor de ECG | 4855 | 37 | 59 | 54 | 29 | 36 | 46 |
Monitor de Pressão Invasivo | 1170 | 86 | 91 | 90 | 76 | 84 | 86 |
Monitor de Pressão Não-Invasivo | 4101 | 58 | 71 | 66 | 34 | 56 | 58 |
Oftalmoscópio | 1280 | 72 | 82 | 81 | 58 | 67 | 73 |
PET/CT | 5 | 99 | 100 | 100 | 100 | 100 | 100 |
Raio X até 100 mA | 1079 | 66 | 73 | 64 | 56 | 69 | 67 |
Raio X com Fluoroscopia | 77 | 97 | 98 | 98 | 93 | 97 | 97 |
Raio X de 100 a 500 mA | 1062 | 62 | 71 | 62 | 57 | 64 | 65 |
Raio X Dentário | 227 | 94 | 88 | 81 | 95 | 97 | 91 |
Raio X mais de 500mA | 175 | 87 | 93 | 90 | 84 | 89 | 90 |
Raio X para Densitometria Óssea | 35 | 97 | 99 | 98 | 98 | 98 | 98 |
Raio X para Hemodinâmica | 24 | 100 | 99 | 100 | 99 | 99 | 99 |
Reanimador Pulmonar/AMBU | 9182 | 28 | 40 | 19 | 7 | 13 | 26 |
Respirador/Ventilador | 2665 | 55 | 69 | 71 | 38 | 51 | 58 |
Ressonância Magnética | 25 | 99 | 99 | 99 | 99 | 99 | 99 |
Tomógrafo Computadorizado | 98 | 97 | 98 | 98 | 96 | 98 | 97 |
Ultrassom Doppler Colorido | 544 | 78 | 85 | 78 | 80 | 86 | 82 |
Ultrassom Ecógrafo | 659 | 62 | 74 | 68 | 71 | 70 | 71 |
Quanto às coordenadas geográficas, Tabela 4, observa-se que 63% delas exibiram uma diferença menor ou igual a um quilômetro. Do total, quase 10% dos hospitais estão a mais de cinco quilômetros do que está cadastrado no CNES. Nos estados de menor densidade populacional este percentual de imprecisão aumenta como é o caso do Acre, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão, Pará e Roraima.
Tabela 4 Distribuição das distâncias entre as coordenadas geográficas de localização dos hospitais de pequeno porte, por regiões administrativas e estados, Brasil -2014.
N | % Menor ou igual a 1 km | % Mais de 1km e menor ou igual a 2km | % Mais de 2km e menor ou igual a 3km | % Mais de 3km e menor ou igual a 4km | % Mais de 4km e menor ou igual a 5km | % Maior que 5km | ||
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Centro Oeste | Distrito Federal | 20 | 35,0 | 20,0 | 20,0 | 10,0 | 10,0 | 5,0 |
Goiás | 260 | 48,5 | 24,2 | 7,3 | 3,8 | 3,1 | 13,1 | |
Mato Grosso | 104 | 45,2 | 25,0 | 7,7 | 1,9 | 1,0 | 19,2 | |
Mato Grosso do Sul | 67 | 55,2 | 23,9 | 9,0 | 4,5 | 0,0 | 7,5 | |
Nordeste | Alagoas | 31 | 58,1 | 19,4 | 9,7 | 6,5 | 3,2 | 3,2 |
Bahia | 335 | 57,0 | 20,6 | 11,0 | 1,5 | 1,2 | 8,7 | |
Ceará | 146 | 63,7 | 19,9 | 3,4 | 1,4 | 0,0 | 11,6 | |
Maranhão | 145 | 53,1 | 17,2 | 5,5 | 3,4 | 2,1 | 18,6 | |
Paraíba | 86 | 65,1 | 17,4 | 3,5 | 8,1 | 0,0 | 5,8 | |
Pernambuco | 189 | 63,5 | 19,6 | 7,4 | 1,6 | 2,1 | 5,8 | |
Piaui | 123 | 74,8 | 17,1 | 3,3 | 0,0 | 1,6 | 3,3 | |
Rio Grande do Norte | 121 | 76,0 | 16,5 | 3,3 | 0,8 | 0,8 | 2,5 | |
Sergipe | 24 | 58,3 | 25,0 | 8,3 | 0,0 | 0,0 | 8,3 | |
Norte | Acre | 20 | 30,0 | 25,0 | 5,0 | 0,0 | 5,0 | 35,0 |
Amapá | 10 | 70,0 | 30,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | |
Amazonas | 49 | 55,1 | 8,2 | 6,1 | 2,0 | 0,0 | 28,6 | |
Pará | 115 | 47,8 | 26,1 | 2,6 | 1,7 | 3,5 | 18,3 | |
Rondônia | 66 | 59,1 | 28,8 | 4,5 | 3,0 | 1,5 | 3,0 | |
Roraima | 13 | 53,8 | 7,7 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 38,5 | |
Tocantins | 40 | 57,5 | 30,0 | 7,5 | 0,0 | 0,0 | 5,0 | |
Sudeste | Espirito Santo | 45 | 68,9 | 15,6 | 4,4 | 2,2 | 2,2 | 6,7 |
Minas Gerais | 302 | 64,9 | 16,9 | 7,0 | 2,3 | 0,7 | 8,3 | |
Rio de Janeiro | 137 | 81,8 | 2,9 | 1,5 | 2,9 | 0,7 | 10,2 | |
São Paulo | 267 | 77,5 | 8,6 | 3,4 | 1,1 | 0,7 | 8,6 | |
Sul | Paraná | 215 | 67,4 | 17,2 | 7,0 | 4,7 | 0,9 | 2,8 |
Rio Grande do Sul | 106 | 73,6 | 10,4 | 6,6 | 0,0 | 0,9 | 8,5 | |
Santa Catarina | 106 | 79,2 | 13,2 | 3,8 | 0,0 | 3,8 | 0,0 | |
Centro Oeste | 451 | 48,1% | 24,2 | 8,2 | 3,8 | 2,4 | 13,3 | |
Nordeste | 1200 | 62,8% | 19,0 | 6,7 | 2,1 | 1,3 | 8,3 | |
Norte | 313 | 52,4% | 23,6 | 4,2 | 1,6 | 1,9 | 16,3 | |
Sudeste | 751 | 72,7% | 11,3 | 4,5 | 2,0 | 0,8 | 8,7 | |
Sul | 427 | 71,9% | 14,5 | 6,1 | 2,3 | 1,6 | 3,5 | |
Brasil | 3142 | 63,2% | 17,8 | 6,0 | 2,3 | 1,4 | 9,2 |
A importância dos sistemas de informação para a eficaz gestão dos serviços de saúde é inegável. A possibilidade de se obter dados precisos sobre uma grande quantidade de serviços, com a potencialidade de caracterizá-los quanto à sua infraestrutura, credenciamentos, localização e características de recursos humanos, instrumentaliza os gestores em saúde com dados capazes de subsidiar decisões baseadas em evidências.
A hipótese inicial deste estudo foi de que os dados cadastrados no CNES apresentavam defasagens em relação àqueles existentes nos estabelecimentos de saúde, o que pode ser observado, em parte. Diferentes graus de divergências entre os dados registrados no CNES e os observados nas visitas aos hospitais foram verificados, dependendo do tipo de informação analisada.
De fato, aqueles aspectos mais dinâmicos existentes nos estabelecimentos de saúde avaliados apresentaram um padrão de discrepância mais elevado. Foi possível observar diversos hospitais fechados que ainda constavam como ativos nas bases do CNES. A abordagem de questões desta natureza exige uma alteração nas etapas e procedimentos necessários para que um dado aparato de saúde deixe de ser considerado ativo.
O recente instrutivo divulgado pelo DATASUS, orientando os passos necessários para a exclusão de um estabelecimento do CNES, demonstra uma postura incipiente para abordagem dessa situação14. Ainda assim, outras iniciativas se fazem necessárias como o possível estabelecimento de parcerias com outras entidades públicas, como juntas comerciais e a receita federal, de forma que somente dessa forma seja possível dar por encerradas as atividades inerentes à prestação de serviços de saúde de uma instituição. Ou seja, mediante uma certidão de baixa de cadastro dos sistemas de informação.
Divergências quanto ao número de leitos interferem em diversos âmbitos da formulação de políticas públicas em saúde. Por diversas vezes esses dados são utilizados como base para o enquadramento em linhas de financiamento público, tornando estabelecimentos de saúde, até um determinado porte, aptos a pleitear recursos oriundos de políticas públicas12. Erros ou inconsistências de porte contribuem para o aumento de dificuldade em diferenciar instituições que pleiteiam recursos, fomentando desequilíbrios de financiamento. Além disso, a impossibilidade de estimar, precisamente, o porte de um dado hospital dispara um efeito cascata que afeta negativamente as atividades de regulação, uma vez que dificulta o real conhecimento da disponibilidade de leitos nas diferentes redes de assistência à saúde12.
Apenas a exigência de atualização dos dados segundo uma periodicidade temporal definida é uma estratégia incapaz de assegurar a qualidade no preenchimento. Na verdade, apenas abre espaço para que alterações pontuais sejam feitas, não garantindo que os dados informados sejam atuais, tornando a medida inócua para o manejo da situação. A definição de protocolos ou formas de controle diferenciadas para registro de critérios que apresentem mudanças rápidas, como a existência de leitos ou equipamentos de baixo custo, pode contribuir para a melhoria da confiabilidade dos dados disponibilizados nesse SIS.
Buscando uma aproximação para compreender esses achados foram elaboradas algumas hipóteses. O controle de itens de menor valor, que podem ser comprados sem a mobilização de um volume grande de recursos, parece estar atrelada à demora no ajuste dos critérios de infraestrutura do CNES para os hospitais visitados.
Outro tópico que chama a atenção em relação à confiabilidade dos dados referentes aos equipamentos é o grau elevado de desatualização de itens dedicados a subsidiar cuidados mínimos de urgência e emergência como: RAIO-X de 500 mA ou menos, respirador/ventilador, eletrocardiógrafo, incubadoras, AMBU e monitores de ECG. Assim os achados do presente trabalho suscitam cuidados em relação à utilização de alguns dados do CNES para análise da infraestrutura de oferta de serviços.
Por último, a precisão quanto à localização de estabelecimentos de saúde é fundamental para que possam ser feitos estudos capazes de balizar critérios de espacialização de serviços. A estruturação de redes de atenção, análises de cobertura e acesso demandam dados confiáveis sobre a existência de equipamentos de alto custo, por exemplo. Assim, a distribuição geográfica de instalações de saúde é uma importante informação para a organização de fluxos de oferta de serviços.
Considerando que o raio de influência de um hospital, frequentemente, ultrapassa os limites geográficos do município de instalação, as imprecisões evidenciadas quanto às coordenadas geográficas cadastradas no CNES, exercem pouca influência na organização das redes de assistência. Apesar disso, os achados deste trabalho suscitam questionamentos se diferenças superiores a 2 km não poderiam gerar impacto deletérios quando remetem à atenção primária.
A importância do CNES se dá por reunir todos os estabelecimentos de saúde do país. Mais que o amplo escopo de abrangência, pesa a relevância de veiculação de dados de alta qualidade. Imprecisões neste SIS podem distorcer as informações necessárias para a tomada de decisão gerencial e prejudicar a formulação de políticas. O fornecimento impreciso de coordenadas geográficas pelo CNES pode dificultar a indução de estudos que busquem avaliar a adequação da alocação espacial de serviços de saúde, por exemplo. Este debate é perpassado pela condução de ações que fomentem a alimentação regular e precisa de dados, de modo a coibir inadequações.
Estudos prévios que se debruçaram sobre a qualidade dos dados existentes junto aos SIS brasileiros abordaram, tangencialmente, o CNES e sem a possibilidade de comparar dados primários e secundários1,6–9. Não foram reportados estudos mais amplos que contemplassem o país como um todo1. Alguns estudos6,7, destacaram, em alguns estabelecimentos e em algumas unidades da federação, a desatualização dos dados, o não lançamento de informações sobre abertura ou fechamento de estabelecimentos, bem como o descompasso entre os serviços cadastrados e aqueles de fato existentes. Os achados deste trabalho confirmaram em parte essas evidências e suscitaram alguns novos questionamentos como, por exemplo, qual a relação entre o custo dos equipamentos e a brevidade na atualização do CNES, ou o que leva algumas regiões e estados a apresentarem um nível mais alto de imprecisão relativa às coordenadas geográficas. Apesar da limitação do estudo ao não ter abordado questões inerentes a este nível de atenção, os achados aqui discutidos apontam a relevância de se examinar com cuidado os dados de localização geográfica dos estabelecimentos de saúde, dependendo do nível de atenção analisado. O exame da precisão quanto à localização das unidades básicas de saúde surge como um potencial trabalho futuro, uma vez que discrepâncias elevadas quanto à sua real localização podem modificar critérios de acesso, características sócio demográficas da população assistida, atendimento via transporte público, dentre outros critérios relevantes que permitiriam a melhor caracterização do ambiente circunscrito às unidades de saúde.
Como recomendações destacam-se a possibilidade de adoção de medidas de incentivo financeiro, a estipulação de condicionantes para a participação em políticas públicas voltadas para o financiamento de ações, bem como o desenvolvimento de indicadores de qualidade de informação, que utilizem múltiplas fontes de dados e que sejam capazes de evidenciar a validade dos dados, são exemplos de estratégias que podem fomentar a melhora de confiabilidade dos dados vinculados ao CNES.
Cabe frisar, ainda, como limitações desse estudo, a impossibilidade de estratificar os aparelhos comparados em termos de sua disponibilidade ou não para o SUS, assim como a não realização de comparações de aspectos de disponibilidade de força de trabalho. Quanto a este último, a elevada quantidade de missings, decorrentes da não disponibilização, por parte dos hospitais, das informações de recursos humanos acabou por comprometer as possibilidades comparativas deste aspecto. Em função dos achados e, levando-se em conta o tempo necessário para a realização da coleta de dados primários, é possível, que para os hospitais avaliados no início do survey, tenha ocorrido alguma variação no quantitativo de equipamentos cadastrados no CNES, o que poderia impactar nos resultados destes estabelecimentos.
A despeito dos desafios e limitações que foram colocados, os achados deste trabalho procuram elucidar alguns aspectos existentes junto à confiabilidade do CNES e podem contribuir para que o exame de determinados aspectos dos sistemas de informação em saúde do país se dê com maior segurança e validade.