versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.27 no.2 São Paulo mar./abr. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152014144
A voz recebe influência do gênero, idade, constituição física, saúde geral e fatores psicossociais, como a personalidade e a emoção; todos esses estão envolvidos na produção vocal( 1 ).
A disfonia é uma alteração na produção vocal que pode apresentar sintomas de leves a graves, originados ou agravados por fatores de risco ambientais e comportamentais, e que pode gerar um distúrbio de voz de ordem funcional, organofuncional e orgânica( 2 ).
A imobilidade de pregas vocais inclui-se dentro dessa classificação e ocorre pelo acometimento do nervo vago, mais especificamente um dos seus ramos, o nervo laríngeo. Imobilidade de pregas vocais é um termo que denota incapacidade muscular de movimentos voluntários, devido à fixação mecânica ou acometimento neurológico. A prega vocal pode apresentar-se com mobilidade reduzida ou completamente imóvel, uni ou bilateralmente, o que vai depender do local da lesão( 3 , 4 ).
Independentemente do tipo, o impacto na qualidade vocal apresenta variação, desde uma intensidade do desvio vocal leve a intenso, acarretando prejuízos na vida profissional, social e emocional do indivíduo( 5 ).
O termo personalidade recebe inúmeras definições na literatura( 6 ). Pode-se citar que são características únicas de cada indivíduo, distinguindo-o dos demais através de padrões consistentes de sentimentos, pensamentos e comportamentos. Costuma englobar aspectos como emoção, sociabilidade, reatividade, energia e interação com o meio ambiente( 7 , 8 ).
Vale ressaltar que pouco se conhece da relação entre personalidade e voz. Pode-se destacar um estudo( 9 ) nessa direção onde os autores analisaram a relação entre personalidade e diferentes distúrbios vocais, porém todos com a gênese relacionada ao comportamento vocal. Perceberam que indivíduos com disfonia funcional tinham um perfil introvertido, estresse reativo, alienado e infeliz, enquanto os pacientes com nódulos vocais foram descritos como socialmente dominantes, estresse reativo, agressivos e impulsivos( 9 ).
Assim, percebe-se o quanto a personalidade pode influenciar na etiologia do distúrbio da voz, principalmente quando este está relacionado ao comportamento vocal do falante. Porém não se sabe se o distúrbio da voz de origem orgânica pode trazer um impacto para a personalidade. Diante disso, este estudo pretendeu verificar as características vocais e de personalidade de indivíduos com disfonia orgânica secundária à imobilidade de prega vocal.
Tratou-se de uma pesquisa de caráter descritivo, de campo e quantitativa do tipo observacional e transversal. Este estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), sob protocolo nº 39145/12.
A casuística foi composta por oito pacientes, a qual resultou de todos os pacientes que chegaram para atendimento em voz na Clínica Escola de Fonoaudiologia da UFPB, desde agosto de 2012 até fevereiro de 2014, com o diagnóstico otorrinolaringológico correspondente à imobilidade unilateral de prega vocal.
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Os pacientes foram selecionados de acordo com os critérios de elegibilidade determinados para este estudo:
diagnóstico de disfonia orgânica secundária à imobilidade unilateral de prega vocal;
não ter diagnóstico médico de outras doenças neurológicas, genéticas ou qualquer outra comorbidade que afetasse a cognição, comunicação e voz.
Os pacientes foram convidados a participar da pesquisa, momento em que foram explanados os objetivos do estudo e os instrumentos a serem utilizados. Após receberem todas as informações necessárias, os pacientes assinaram o TCLE e, em seguida, responderam os instrumentos empregados na pesquisa. Por fim, foi realizada a gravação da amostra vocal.
Durante a coleta dos dados, foram aplicados instrumentos que abrangem mensurações vocais e psicológicas dos participantes da pesquisa.
Os parâmetros vocais foram mensurados a partir da autoavaliação e avaliação perceptivo-auditiva da voz. Optou-se em utilizar o Protocolo de TriagemVocal (PTV) adotado no Laboratório Integrado de Estudos da Voz (LIEV) do Departamento de Fonoaudiologia da UFPB, além da Escala de Sintomas Vocais (ESV).
O PTV foi desenvolvido por fonoaudiólogos especialistas na área de voz. Envolve dados pessoais, sintomas vocais auditivos e sensoriais e uma lista de fatores de risco para a voz, que se subdividem em fatores organizacionais, ambientais e pessoais (Anexo 1).
Os fatores organizacionais compreendem cinco possibilidades: relacionados à jornada de trabalho prolongada, alto número de ouvintes, acúmulo de atividades, tempo de serviço e demanda vocal excessiva. Os fatores ambientais correspondem a nove itens: referentes ao ruído de fundo, baixa umidade do ar, fatores ergonômicos, acústica pobre, poluição, ambiente estressante, distância interfalantes, poeira e mofo e equipamentos inadequados.
E os fatores pessoais são em número de 21 componentes, listados a seguir: fumo, fala muito, fala muito ao telefone, fala acima do ruído, grita com frequência, vida social intensa, automedicação, bebe, fala alto, fala com esforço, fala em público, torce em estádios esportivos com frequência, tosse constante, repouso inadequado, usa drogas, fala rápido, fala agudo/grave demais, imita (atores, cantores), canta fora do tom, hidratação insuficiente e alimentação inadequada. Os resultados foram obtidos por meio da realização de somatória simples das questões pontuadas pelos participantes do estudo. Somaram-se todos os fatores de risco e também se somaram isoladamente só os fatores de risco ambientais, organizacionais e pessoais. Quanto maior o número de fatores de risco, maior chance de a disfonia estar relacionada ao comportamento vocal.
A ESV verifica como o paciente avalia sua própria voz e a presença dos sintomas vocais descritos pelo mesmo. Possui 30 questões e 3 domínios: limitação (15 questões), emocional
(8) e físico (7), os quais se mostram sensíveis a indivíduos com queixa vocal. As respostas das questões variam entre "nunca", "raramente", "às vezes", "quase sempre" e "sempre"( 10 ).
As respostas foram pontuadas de 0 a 4, conforme a frequência de ocorrência. Nessa escala, indivíduos disfônicos apresentam os seguintes valores de referência: escore total - 49,4; escore limitação - 30,1; escore emocional - 8,8; e escore físico - 10,4. Logo, valores acima dessa média revelam a percepção do indivíduo a respeito do impacto e da presença dos sintomas devido à disfonia em sua vida.
Além dos protocolos de autoavaliação, também foi coletada amostra de voz com a emissão da vogal sustentada /e/ da forma mais natural possível.
As gravações foram coletadas em lugar silente através de um microfone headset profissional unidirecional, da marca Logitech, e gravadas no software FonoView(r) (CTS Informática, versão 4.6 h), com a taxa de amostragem de 44100. Também foram armazenadas em um computador da marca HP(r).
Após a coleta das amostras vocais, foi realizada a avaliação das mesmas por meio do consenso entre três fonoaudiólogos especialistas em voz, treinados para tal. Assim, os juízes foram orientados a identificar a intensidade do desvio vocal de alguns parâmetros da emissão de cada paciente por meio da Escala Analógica Visual (EAV).
A EAV possui uma linha de 100 mm, horizontal, onde o avaliador é orientado a marcar a quantidade de sensação causada pela voz naquele momento. Cada milímetro corresponde a um grau de desvio; desta forma, a escala oferece 100 possibilidades de graduação( 11 ). A EAV adotada envolveu o parâmetro de grau geral (GG), rugosidade (R), soprosidade (S), tensão (T) e instabilidade (I). Quanto mais próximo ao 100, maior o desvio vocal.
A intensidade do desvio vocal foi marcada por meio da EAV e, posteriormente, foi categorizada da seguinte forma: 0 a 35,5 mm = variabilidade normal; 35,6 a 50,5 mm = intensidade do desvio leve a moderado; 50,6 a 90,5 mm = moderado a intenso e 90,6 a 100 mm = intenso( 11 ).
Houve mensuração da personalidade por meio da aplicação da Bateria Fatorial de Personalidade (BPF), um instrumento psicológico desenvolvido para a avaliação da personalidade a partir do modelo dos Cinco Grandes Fatores (CGF): extroversão, socialização, realização, neuroticismo e abertura. Possui 126 quesitos, onde o indivíduo deve assinalar, em uma escala de 1 a 7, o quanto cada item o descreve.
As afirmações envolvem as seguintes dimensões: extroversão, socialização, realização, neuroticismo e abertura, bem como suas respectivas subcategorias/facetas, com a finalidade de aferir as características de personalidade dos participantes( 6 ).
De acordo com a literatura( 6 ), escores acima de 3,2 no fator neuroticismo, 4,3 no fator extroversão, 5,4 no fator sociabilidade, 4,9 no fator realização e 4,6 no fator abertura expõem que esses indivíduos apresentam essas características exacerbadas em sua personalidade.
Em seguida, todos os dados referentes à pesquisa foram acoplados em uma planilha digital na plataforma de dados Microsoft(r) Excel 2011. Posteriormente, foi feita a análise estatística descritiva com a finalidade de averiguar a frequência, média e desvio padrão das variáveis estudadas. O software utilizado foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 13.0.
Em um universo de 468 pacientes da Clínica Escola de Fonoaudiologia da UFPB atendidos até fevereiro de 2014, a população deste estudo foi composta por oito pacientes, de ambos os gêneros, 50% (n=4) do gênero feminino, com a idade média de 40,4±16,9 anos e todos com diagnóstico de disfonia orgânica secundária à imobilidade unilateral de prega vocal (Quadro 1). Em seguida, foram expostos os resultados com base na análise estatística descritiva.
Na Tabela 1, estão distribuídos o ponto de corte, a média e o desvio padrão dos fatores de risco, os escores da ESV e da avaliação perceptivo-auditiva dos pacientes com imobilidade de prega vocal.
Em relação aos fatores de risco, a média geral foi de 7,3±3,9, os fatores organizacionais exibiram média de 1,0±1,3, os fatores ambientais apresentaram média de 1,6±1,5 e os fatores pessoais foram os que se mostraram mais presentes, com média de 4,7±2,1.
A ESV apresentou os seguintes valores: média de 48,5±21,2 no escore total, 34,1±15,7 no escore de limitação, 6,2±5,7 no escore emocional e 6,6±4,1 no escore físico.
A avaliação perceptivo-auditiva exibiu média no grau geral de 62,2±19,7, rugosidade de 57,7±25,2, soprosidade de 53,1±9,0, instabilidade de 30,2±16,9 e tensão de 27,3±28,3.
Na Tabela 2, está exposto o ponto de corte, a média e o desvio padrão em relação aos resultados dos fatores e facetas da BFP.
As médias dos escores foram: neuroticismo = 3,8±1,4; extroversão = 4,0±1,1; sociabilidade = 5,2±1,8; realização = 5,2±1,0; e abertura = 3,7±1,7.
Variáveis | Ponto de corte | Média (DP) |
---|---|---|
Número Fatores de Risco | 35,0 | 7,3 (3,9) |
Número Fatores Organizacionais | 5,0 | 1,0 (1,3) |
Número Fatores Ambientais | 9,0 | 1,6 (1,5) |
Número Fatores Pessoais | 21,0 | 4,7 (2,1) |
Número Escala de Sintomas Vocais | 49,4 | 48,5 (21,2) |
Número Limitação | 30,1 | 34,1 (15,7) |
Número Emocional | 8,8 | 6,2 (5,7) |
Número Físico | 10,4 | 6,6 (4,1) |
Avaliação perceptivo auditiva | ||
Número Grau Geral | 35,5 | 62,2 (19,7) |
Número Rugosidade | 35,5 | 57,7 (25,2) |
Número Soprosidade | 35,5 | 53,1 (9,0) |
Número Instabilidade | 35,5 | 30,2 (16,9) |
Número Tensão | 35,5 | 27,3 (28,3) |
Variáveis | Ponto de corte | Média (DP) |
---|---|---|
Neuroticismo | 3,2 | 3,8 (1,4) |
N1. Vulnerabilidade | 3,4 | 3,7 (1,7) |
N2. Instabilidade | 3,6 | 3,6 (1,5) |
N3. Passividade | 3,4 | 4,3 (1,1) |
N4. Depressão | 2,3 | 3,5 (1,4) |
Extroversão | 4,3 | 4,0 (1,1) |
E1. Nível de comunicação | 4,2 | 3,7 (1,1) |
E2. Altivez | 3,6 | 3,2 (1,0) |
E3. Dinamismo | 4,7 | 4,5 (1,6) |
E4. Interações sociais | 4,8 | 4,3 (1,6) |
Sociabilidade | 5,4 | 5,2 (1,8) |
S1. Amabilidade | 5,5 | 5,7 (1,0) |
S2. Pró sociabilidade | 5,5 | 5,0 (1,1) |
S3. Confiança nas pessoas | 4,7 | 4,1 (1,1) |
Realização | 4,9 | 5,2 (1,0) |
R1. Competência | 5,1 | 5,5 (1,4) |
R2. Ponderação | 4,9 | 5,7 (1,0) |
R3. Empenho | 4,7 | 4,8 (1,1) |
Abertura | 4,6 | 3,7 (1,7) |
A1. Abertura a ideias | 4,5 | 4,0 (1,0) |
A2. Liberalismo | 4,8 | 4,3 (1,0) |
A3. Busca por novidade | 4,6 | 2,0 (1,6) |
Apenas 1,7% dos pacientes atendidos na Clínica Escola de Fonoaudiologia da UFPB possuíam diagnóstico otorrinolaringológico de imobilidade unilateral de prega vocal; esse fato pode ser atribuído ao foco do serviço oferecido nesse local, por não ser uma referência para essa demanda de pacientes, o que pode ter limitado a casuística deste estudo.
Além do fato exposto anteriormente, é importante mencionar um estudoepidemiológico atual(12) que tratouda prevalência das doenças laríngeas e informou que 4,6% da população teve
o diagnóstico laríngeo compatível com a imobilidade de prega vocal, seja paralisia unilateral, bilateral ou paresia de prega vocal. Assim, pode-se verificar que não há uma alta prevalência desse diagnóstico laríngeo na população de uma forma geral.
Os pacientes com imobilidade unilateral de prega vocal referiram ter apenas 20,9% dos fatores de risco para a voz, o que representa menos de um terço dos 35 fatores de risco listados. Os mais frequentes foram os pessoais, como: fala agudo ou grave demais, fala com esforço, tosse, entre outros.
É sabido que o comportamento vocal abusivo não é a gênese das disfonias orgânicas. O relato desses fatores de risco pode ser atribuído à tentativa do paciente com imobilidade de prega vocal de suprir a demanda vocal, levando ao surgimento de compensações como o esforço vocal durante a emissão, tosse, aproximação das pregas vestibulares e a constrição do vestíbulo laríngeo( 13 , 14 ), intensificando os sintomas vocais pelo esforço da musculatura laríngea.
Inúmeros são os fatores de risco atribuídos à imobilidade de prega vocal, como as afecções do sistema nervoso central ou periférico, sendo esse último o mais comum, além do avanço da idade, trauma no pescoço, cabeça e/ou tórax, intubação, diabetes mellitus, hipertensão arterial, lesões cirúrgicas, neoplasias, cardiopatias, tóxicas, metabólicas, inflamatórias e idiopáticas que acometam o nervo vago, alguns dos seus ramos ou ambos( 4 , 15 , 16 ).
Como visto, são várias as doenças que podem acometer
o nervo vago e afetar, consequentemente, as atividades que demandam as funções da laringe: respiração, proteção e fonação.
O nervo vago origina-se nos núcleos do bulbo e estende-se do tronco cerebral ao abdome, dando origem ao nervo laríngeo superior e inferior, este denominado de nervo laríngeo recorrente direito e esquerdo, responsável por suprir toda a musculatura intrínseca da larínge com exceção do músculo cricotireóideo, inervado pelo ramo externo do nervo laríngeo superior( 15 - 17 ).
Portanto, o nervo vago e os seus ramos podem sofrer lesões em qualquer parte do seu percurso, acarrentado a imobilidade de prega vocal, porém o nervo laríngeo recorrente esquerdo possui maior chance de ser lesionado, devido ao seu trajeto mais longo( 18 ). Deste modo, a imobilidade de prega vocal pode apresentar sintomatologia diversa a depender do local da lesão do nervo vago.
Contudo, é necessário que o profissional vá além das questões orgânicas envolvidas na produção vocal e também obtenha conhecimentos dos aspectos psicossociais da voz para o entendimento dos múltiplos fatores envolvidos na disfonia.
Na prática clínica, a autoavaliação e/ou a autopercepção vocal é de grande valor, pois permite a observação que o indivíduo possui sobre sua própria voz, possibilitando o entendimento da alteração vocal e seu impacto social, bem como de suas desvantagens devido a quadros disfônicos( 19 ).
Observou-se que os pacientes com disfonia orgânica secundária à imobilidade de prega vocal apresentaram média do escore de limitação acima da média da população de disfônicos( 10 ). Logo, esses indivíduos possuem a percepção da desvantagem devido à disfonia, em particular nas atividades que demandam o uso da voz, como, por exemplo: falar ao telefone, sentir cansaço para falar e dificuldade em falar forte ou gritar, dentre outros sintomas, que acabam por prejudicar sua comunicação.
Esse fato pode ser atribuído à dificuldade do paciente em coordenar a respiração e a fala, pela presença da fenda glótica decorrente da posição da prega vocal imobilizada, ocorrendo, desta forma, um maior escape de ar durante a fonação, sobrecarregando o trato vocal e, com isso, restringindo as atividades que demandam o uso da voz, ou seja, pelas suas limitações anatomofisiológicas de forma geral.
A fadiga vocal ou cansaço para falar é uma queixa comum, devido ao abuso vocal ou em decorrência de um distúrbio vocal, como na imobilidade de prega vocal( 20 ).
O grau do desvio vocal dos pacientes com imobilidade de prega vocal depende da posição da prega vocal paralisada, da atrofia e flacidez da prega vocal, além da ultrapassagem da prega vocal sadia e da constrição da laringe( 18 ).
Na imobilidade de prega vocal bilateral, a voz caracteriza-se como mais aguda, pela posição paramediana de ambas as pregas vocais, podendo o individuo apresentar problemas respiratórios devido a pneumonias e aspirações frequentes( 4 , 15 ). Já na imobilidade unilateral de prega vocal, o paciente pode evoluir com incoordenação pneumofonoarticulatória, voz fraca, aumento do esforço para falar, fadiga vocal, rouquidão, redução da intensidade e extensão vocal, aumento da frequência fundamental, pouca projeção, tensão, tempo máximo de fonação reduzido, soprosidade e disfagia( 4 ).
A soprosidade e a inabilidade de comunicação são referidas como um dos maiores prejuízos apresentados pelos pacientes com imobilidade unilateral de prega vocal( 18 ).
A voz soprosa resulta do fechamento ineficiente das pregas vocais, provocando escape de ar que modifica a qualidade vocal( 21 ), o que produz impacto negativo para comunicação por demandar maior esforço vocal durante a fala.
Contudo, a rugosidade é citada como um dos sintomas mais frequentes entre os pacientes com imobilidade de prega vocal; entretanto, 35% desses pacientes podem não apresentar sintomas( 15 , 18 ), podendo ser considerada como apenas um sintoma de um envolvimento maior.
A prega vocal imobilizada pode assumir posições diferentes, desde mediana até lateral, o que vai diferenciar o modo de coaptação destas e o grau dos sintomas( 22 ). Tal fato é importante para direcionar o tratamento, que pode ser cirúrgico ou fonoterápico( 18 ).
Em um estudo realizado através de um levantamento de prontuários e exames de laringe e voz de pacientes do sexo masculino com diagnóstico de imobilidade de prega vocal unilateral, teve-se predomínio de rugosidade, soprosidade, seguido de aspereza e tensão com intensidade do desvio vocal de moderado a intenso( 18 ).
O mesmo resultado também foi constatado neste estudo apresentado a partir da avaliação perceptivo-auditiva. Pôde-se perceber uma prevalência entre os pacientes com imobilidade de prega vocal de rugosidade seguida de soprosidade, ambas com uma intensidade do desvio vocal de grau moderado, compatível com o quadro clínico apresentado e com a literatura consultada.
Esse fato advém da posição da prega vocal paralisada, ou seja, da dificuldade de coaptação glótica, que interfere negativamente na vibração da mucosa das pregas vocais. Quanto maior a incompetência glótica, maiores serão as limitações vocais do paciente( 4 , 18 ).
Desta forma, ressalta-se a importância do atendimento fonoaudiológico para que se alcance melhor vibração da mucosa das pregas vocais e fechamento glótico adequado, livre de ajustes vocais desnecessários, o que vai refletir em uma emissão vocal mais longa, com menor esforço e risco de aspiração.
Além do impacto vocal, o distúrbio vocal também interfere no âmbito social, emocional e funcional, restringindo as atividades diárias e a participação social, em razão da inteligibilidade de fala( 23 , 24 ).
A limitação vocal ocasionada pela a imobilidade de prega vocal pode levar o indivíduo ao estresse e ansiedade, devido à sensação de incapacidade e frustração, pela dificuldade de desempenhar suas tarefas diárias.
A voz e o estresse possuem nítida relação, em razão de a musculatura da laringe apresentar sensibilidade ao estresse, ocasionando ansiedade, irritabilidade, impaciência, frustração e depressão; desta forma, a reação do individuo ao estresse pode variar conforme as suas características de personalidade( 9 , 25 ).
Estudos envolvendo a personalidade vêm ganhando cada vez mais importância na área científica; com isso, o modelo fatorial de personalidade baseado nos cinco grandes fatores é de fundamental valor por possibilitar a descrição da personalidade( 26 ).
Cada indivíduo possui características próprias de personalidade. Os traços de personalidade distinguem os indivíduos uns dos outros; entretanto, esses traços são estáveis em cada pessoa e podem resumir, prever e explicar a forma de agir de cada indivíduo. De forma geral, as pessoas são influenciadas por aspectos motivacionais, afetivos, comportamentais e pelo ambiente( 26 ).
Verificou-se que os pacientes com imobilidade de prega vocal obtiveram escores próximos do ponto de corte para neuroticismo e realização; logo, esses pacientes possuem essas características e/ou traços de personalidade.
O alto grau de neuroticismo está associado à depressão e ansiedade. Esse traço está relacionado a indivíduos que tendem a vivenciar intensamente o sofrimento emocional, dando pouca ênfase aos aspectos positivos dos fatos, e que costumam criar problemas para si próprios( 6 ). Esse fato traz impacto na comunicação do indivíduo, visto que a ansiedade interfere na expressão corporal, fala e voz, aumentando os sintomas vocais( 27 ). A ansiedade pode sobrecarregar o trato vocal, levando à produção de uma voz que se distancia de seus padrões naturais.
Assim, a ansiedade e o estresse podem causar sintomatologia vocal, pois contribuem para alterações fisiológicas no corpo. O contrário também ocorre. As alterações vocais podem ocasionar estresse, depressão e frustração; logo, o diagnóstico da disfonia pode ter íntima relação com a ansiedade( 27 , 28 ). No caso dos pacientes com imobilidade de prega vocal, essas características de personalidade apresentadas podem ser reflexo da sua limitação de comunicação.
Destacaram-se dentro do traço de neuroticismo as suas face-tas de vulnerabilidade, instabilidade, passividade e depressão.
O alto grau de realização é encontrado em pessoas motivadas, organizadas, pontuais, entusiasmadas e perseverantes, que planejam metas e são dedicadas ao trabalho. O nível de realização é um componente importante no desempenho das atividades e contextos variados( 6 , 26 ).
Esse achado é um dado importante e bastante útil para a terapia fonoaudiológica, visto que, de forma geral e devido às suas limitações, esses indivíduos tendem a ser ativos, motivados, perseverantes na busca de seus objetivos, o que pode influenciar positivamente na sua evolução durante a fonoterapia.
É importante salientar que, dentro do traço de realização, destacou-se a faceta de competência e empenho; dentre essas, evidenciou-se a faceta de ponderação, o que significa dizer que os pacientes com imobilidade de prega vocal são cuidadosos em relação ao que dizem e/ou fazem e tendem a controlar a sua impulsividade ao resolver problemas, avaliando com cautela as possíveis consequências de suas ações, como, por exemplo, a escolha das palavras com cuidado e o cuidado no conteúdo da fala( 6 ).
Houve destaque ainda para a faceta de amabilidade dentro do traço de sociabilidade; assim, os pacientes com imobilidade de prega vocal, em geral, são atenciosos, amáveis e costumam tratar bem os outros( 6 ).
Em vista disso, a limitação ocasionada pela imobilidade de prega vocal pode trazer impacto para a personalidade, o que pode ter interferido negativamente na produtividade desses indivíduos, gerando depressão, estresse e ansiedade, que, neste caso, pode ser reflexo do distúrbio vocal.
A elevação dos traços de personalidade de neuroticismo e realização nos pacientes com imobilidade de prega vocal atendidos na Clínica Escola de Fonoaudiologia da UFPB reflete a intensidade de tais características em sua personalidade.
Reconhecer as características de personalidade dos pacientes com imobilidade de prega vocal ajuda a prever alterações de comportamento que causam riscos à saúde, o que vai ajudar o profissional a saber lidar com tais eventos, vendo o indivíduo como um todo, além das questões físicas envolvidas na patologia.
Dessa forma, entende-se que os pacientes com imobilidade de prega vocal estudados possuem um padrão de personalidade que se acredita ser reflexo do seu distúrbio de voz e não um padrão de comportamento único exacerbado que afete a produção vocal ou que influencie na determinação da disfonia e na maneira de enfrentar tal situação. Esse fato é esperado nas disfonias orgânicas que independem do comportamento vocal. O inverso ocorre nas disfonias organofuncionais e funcionais, as quais podem ser desencadeadas pelo comportamento vocal abusivo.
Todavia, é exposto na literatura que, independentemente da disfonia funcional ou orgânica, os indivíduos disfônicos possuem sofrimento psíquico acentuado( 29 , 30 ).
Tendo em vista a importância do conhecimento das características vocais e de personalidade desses indivíduos, propõem-se a continuidade deste estudo com uma amostra maior, para que se garanta o aprofundamento do saber sobre essa temática, ainda escassa na literatura.
Os pacientes com disfonia orgânica secundária à imobilidade de prega vocal relatam poucos fatores de risco, fato esse que não influencia no comportamento vocal; têm médias acima dos valores de referência dos disfônicos no escore limitação da ESV e apresentam intensidade do desvio vocal moderada, com característica vocal predominante de rugosidade.
Quanto à personalidade, esses indivíduos apresentam escores acima do ponto de corte para os fatores neuroticismo e realização. Assim, sugere-se que indivíduos com imobilidade de prega vocal demonstram características de personalidade que podem ser reflexo do seu distúrbio de voz, e não um fator de risco que determine ou seja preditor da sua disfonia.