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Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde: garantia de integralidade nas Equipes de Saúde da Família e Saúde Bucal no Brasil

Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde: garantia de integralidade nas Equipes de Saúde da Família e Saúde Bucal no Brasil

Autores:

Carlo Roberto Hackmann da Cunha,
Erno Harzheim,
Olivia Lucena de Medeiros,
Otávio Pereira D’Avila,
Caroline Martins,
Lucas Wollmann,
Lívia de Almeida Faller

ARTIGO ORIGINAL

Ciência & Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561

Ciênc. saúde coletiva vol.25 no.4 Rio de Janeiro abr. 2020 Epub 06-Abr-2020

http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232020254.31862019

Introdução

Em agosto de 2007, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) divulgou que a principal abordagem para produzir melhoras sustentáveis e equitativas na saúde das populações das Américas seria por meio do desenvolvimento de sistemas de saúde fortemente embasados na Atenção Primária à Saúde (APS)1. Em 2008, a OMS, em seu Relatório Mundial de Saúde, reforçou esta orientação com a afirmação que dá nome àquela publicação: APS – agora mais do que nunca!2 Mais recentemente, em outubro de 2018, ao completarmos 40 anos de Alma-Ata, a Conferência Global sobre APS produziu o documento intitulado Declaração de Astana que salienta ser a APS “o enfoque mais eficaz, eficiente e equitativo para melhorar a saúde, o que faz dela um alicerce necessário para conseguir a cobertura universal de saúde”3.

Ao completarmos 30 anos do SUS, após 40 anos de Alma-Ata4 e logo após a Conferência de Astana3, o Ministério da Saúde do Brasil propõe diversas estratégias de fortalecimento da APS com a criação da Secretaria de Atenção Primária à (SAPS)5. Como competências e compromissos da SAPS, definidas pelo decreto mencionado, destacam-se: ampliar o acesso da população às unidades de saúde da família, definir um novo modelo de financiamento baseado em resultados em saúde e eficiência, estabelecer um novo modelo de provimento e formação de médicos para áreas remotas, fortalecer a clínica da APS e o trabalho em equipe e ampliar a informatização das unidades e a utilização de prontuário eletrônico.

O fortalecimento da clínica e do trabalho em equipe na Estratégia Saúde da Família (ESF) passa pelo reconhecimento dos entes federados sobre a importância da APS para a organização dos serviços. Para isso, além da infraestrutura física das Unidades de Saúde da Família (USF), há que se ter condições de trabalho e divisão clara e com subsidiariedade das atribuições de cada um dos profissionais a partir das ações e procedimentos ofertados à população, sem prejuízo dos processos de cuidado compartilhado entre os profissionais. Nesse sentido, a criação de uma “carteira de serviços de atenção primária” poderá ajudar na definição dos papéis que cada um deverá desempenhar, além de, fundamentalmente, apresentar os procedimentos e os serviços ofertados nesse ambiente de cuidado, reduzindo a heterogeneidade de práticas existentes na APS nacional entre os municípios, mas também entre unidades de um mesmo município, para que a população brasileira possa reconhecer o que se espera de ações e serviços em uma Unidade de Saúde da Família.

Sistemas universais de saúde são sustentáveis se possuírem uma APS forte6,7. A APS objetiva melhor saúde individual e populacional com equidade. Este objetivo só é alcançado caso os serviços de APS funcionarem adequadamente, isto é, se aliarem alta resolutividade clínica com responsabilização pela saúde da população sob cuidado e pela comunicação adequada dos fatos e eventos que caracterizam a trajetória clínica das pessoas. Para atingir os objetivos acima e funcionar adequadamente é essencial que a APS seja organizada com a máxima presença e extensão de suas características operacionais, de seus atributos. Os atributos essenciais da Atenção Primária (acesso de primeiro contato; longitudinalidade; coordenação; integralidade) são características operacionais, cotidianas e mensuráveis dos serviços de APS8. Quanto mais forte a presença e a extensão desses atributos, mais forte será a APS. Para fortalecer cada um dos atributos, serão necessárias ferramentas organizacionais diferentes e complementares.

No Brasil, a carteira de serviços é uma das mais importantes ferramentas organizacionais. Já é utilizada no Rio de Janeiro, em Curitiba e Florianópolis, entre outros lugares9-11. Ela se configura como um importante instrumento para a garantia da integralidade. A APS deve organizar-se de tal forma que o cidadão tenha todos os serviços de saúde necessários, identificando e proporcionando os serviços preventivos, bem como os que possibilitem o diagnóstico e o tratamento das doenças, estabelecendo também a forma adequada para resolução de problemas, sejam orgânicos, funcionais ou sociais.

Ao se definir uma lista transparente de ações e serviços voltados aos problemas e às condições de saúde mais frequentes temos a ‘alavanca’ necessária para mover o ‘mundo’ da integralidade e trazê-lo para o cotidiano da vida das pessoas e das equipes de APS. A carteira de serviços deixa claro para as pessoas quais serviços e ações elas podem encontrar nas Unidades de APS e permite aos profissionais se organizarem na rotina do atendimento, assim como buscarem conhecimentos e habilidades para ofertar as ações e os serviços com competência. Além disso, a carteira torna-se um instrumento de monitoramento da gestão, que deve prover as condições estruturais (equipamentos, insumos, recursos humanos, financiamento) e de processo de trabalho – forma de adscrição das pessoas, estratégias de desenvolvimento pessoal contínuo, monitoramento e avaliação – suficientes para que suas ações e serviços sejam realidade no dia-a-dia da APS.

Destinada aos profissionais da Rede de Atenção à Saúde (RAS), contém a definição das responsabilidades da APS com vistas à garantia fundamental do atributo integralidade/abrangência do cuidado. Busca delimitar diretrizes gerais de organização e definir ações e procedimentos ofertados em cada serviço a partir de critérios essencialmente estruturais. A APS deve ser responsável pelos problemas mais comuns e frequentes de saúde da população e resolver de 80% a 90% de suas demandas. Do ponto de vista clinico, a Carteira de Serviços não visa enumerar nem esgotar todos os sinais/sintomas ou patologias mais prevalentes que devem ser manejados e acompanhados pelo cuidado na APS, especialmente porque a epidemiologia e as necessidades das pessoas são dinâmicas e variadas, principalmente quando falamos de um país com dimensões continentais como o Brasil. Ainda, vale ressaltar que os procedimentos e ações a serem realizados devem respeitar as regulamentações específicas dos conselhos profissionais, bem como as habilidades individuais, sendo mote para a organização e a identificação de treinamentos adicionais necessários.

O objetivo central da carteira de serviços é guiar os profissionais em relação aos que se espera que sejam ofertados nas unidades de APS (especialmente no contexto das diretrizes e metas da SAPS e MS) e se existe alguma condição particular para que este ocorra (tabela de ações/programas e materiais). Além disso, serve para reforçar quais critérios são indicativos para manejar condições ou queixas comuns em um nível maior de complexidade da rede do município, em caráter eletivo (não estão contempladas situações de emergência). É um documento que não visa ser excludente, portanto, a ausência de menção de um sinal, sintoma ou doença não significa que não se deva realizar seu atendimento na APS.

O objetivo deste artigo é apresentar o desenvolvimento da carteira nacional de serviços para a APS e os desafios para o fortalecimento da integralidade do cuidado nas ações desenvolvidas pelas equipes de Saúde da Família e de Saúde Bucal.

Material e métodos

Trata-se de um estudo com análise documental, visando à produção de uma orientação técnica que possa ajudar as equipes de APS e a gestão em nível estadual e municipal na definição da oferta de ações e serviços nas unidades de saúde da família. A chamada “Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde” (CASAPS) é um documento que visa nortear as ações de saúde na APS brasileira com reconhecimento da clínica multiprofissional. É um documento orientador para todos os serviços de APS no Brasil, sendo, portanto, um instrumento que visa contribuir para o fortalecimento da oferta de cuidados próprios da APS. É uma ferramenta importante para a gestão do cuidado que será revisada de forma regular pela SAPS. Ela se destina a todos os profissionais, gestores e cidadãos brasileiros para que se apropriem e tenham conhecimento dos serviços de saúde oferecidos na APS. Uma de suas versões é destinada especificamente aos profissionais e gestores, contendo a lista de serviços e insumos e equipamentos necessários (Tabela 1).

Tabela 1 Grau de concordância com a inclusão dos serviços propostos na consulta pública para a construção de uma carteira nacional de serviços para a APS. 

Grau de concordância (%) de serviços apontados para inclusão
Adulto e Idoso Criança e Adolescente Procedimentos na APS Saúde Bucal Carteira de Serviços geral
Acima de 90% 93,0 94,0 45,0 78,0 77,6
Entre 80 e 89,9% 3,0 6 35,0 22,0 16,6
Entre 70 e 79,9% 2,0 - 20,0 - 5,4
Abaixo de 60% 2,0 - - - 0,4

Fonte: Elaboração dos autores, a partir da consulta pública realizada.

Para sua elaboração consideramos os seguintes materiais: (i) revisão de documentos nacionais e internacionais que apresentam carteiras de serviços de APS. Inicialmente, foi realizada uma ampla revisão de carteiras de serviços da APS publicadas no Brasil e no exterior. Por ser uma ferramenta pouco utilizada em nosso país, revisamos as carteiras do Rio de Janeiro, Florianópolis, Curitiba (Carteira de Serviços e Cartilha de Acesso), Belo Horizonte, Natal e Porto Alegre. Foram também revisadas as carteiras de serviços de Portugal, da Espanha e da cidade de Madrid; (ii) revisão do Manual do Instrumento de Avaliação da Atenção Primária (PCATool) publicado em 2010 pelo Ministério da Saúde12.

Foram elencados todos os serviços descritos nas carteiras de municípios citados anteriormente e realizado um comparativo entre elas, construindo-se um quadro com a listagem dos termos e verificação das cidades onde o serviço constava como presente na carteira. Os serviços foram divididos e apresentados da seguinte forma: atenção à saúde do adulto e do idoso, atenção à saúde da criança e do adolescente, procedimentos na APS e Saúde Bucal. Além disso, foi elaborado um texto de orientação com relação ao processo de trabalho das equipes de saúde na APS tendo os atributos essenciais da APS como eixos-chave.

As etapas da consulta pública foram: (i) interação com avaliadores externos para contribuição na elaboração do conteúdo da carteira; (ii) disponibilização do esboço da carteira de serviços durante o período da consulta pública no Portal do Ministério da Saúde, juntamente com um formulário na Plataforma Google Forms em agosto/2019. Neste momento, o participante manifestou sua opinião pela inclusão ou exclusão e pôde sugerir alterações para cada item de lista de ações e procedimentos13 (iii) revisão após a consulta pública pela SAPS do texto inicial e da lista de ações e serviços apresentadas.

A contribuição das Associações Profissionais, do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS)

Além de outras Secretarias do próprio Ministério da Saúde, ocorreu o envio da proposta para manifestação do CONASS, CONASEMS e das Associações de profissionais da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), Associação Brasileira de Enfermagem de Família e Comunidade (ABEFACO) e Associação Brasileira de Odontologia (ABO), os quais foram chamados de avaliadores externos. Tais entidades foram consultadas tanto no período da consulta pública, quanto em momento posterior, sobre a versão final da carteira resultante da consulta pública. Nesta fase, essas instâncias também opinaram sobre a classificação em padrões essenciais e ampliados de APS previstos na PNAB.

Resultados da versão final da carteira de serviços

Após o término da consulta pública realizou-se uma análise quantitativa e qualitativa das respostas enviadas pelos formulários eletrônicos. Ao todo foram respondidos 1.855 formulários, distribuídos com base no perfil do respondente da seguinte forma: 1.415 (76,3%) profissionais de saúde, 86 (4,6%) usuários do SUS, 81 (4,4%) estudantes, 121 (6,5%) gestores municipais, 28 (1,5%) gestores estaduais, 17 (0,9%) gestores do Ministério da Saúde, 44 (2,4%) pesquisadores e 63 (3,4%) identificado na categoria “outros”.

O grau de concordância (pessoas que assinalaram “concordo com a inclusão” ou “concordo com a inclusão com alterações”) foi elevado (Tabela 1). O item com menor percentual de concordância (46,7%) foi: “Identificação quanto à posse de arma de fogo por parte do adulto e orientação sobre como guardá-la com segurança”. Houve menor concordância também com os procedimentos na APS, entre os quais destacam-se: “infiltração de substâncias em cavidade sinovial (articulação, bainha tendinosa) (70,8%)”, “biópsia/punção de tumores superficiais de pele com envio de material para análise anatomopatológica” (73,9%) e “remoção manual de fecaloma” (74,1%).

Quando analisamos as contribuições e as alterações realizadas sob a ótica qualitativa, após a consulta pública, destacamos seis pontos que mais chamaram a atenção: (i) abordar o que compete à APS e a necessidade de protocolos com articulação com a rede; (ii) a inclusão de item em que constasse a promoção de práticas integrativas e complementares; (iii) a menção de que, para exames e procedimentos, alguns itens da carteira serão de difícil execução, considerando a infraestrutura de algumas unidades; (iv) a inclusão de itens que meçam a avaliação da fragilidade e avaliação multidimensional em idosos; (v) no texto que antecede a lista seria necessário constar a necessidade da equipe de APS ter suporte de outros serviços da rede de atenção; (vi) a necessidade do reforço e possibilidade de adaptação da carteira à realidade local.

Quadro 1 Lista de serviços da Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde do Brasil - CASAPS. 

Atenção e Cuidados Centrados no Adulto e no Idoso
1 Assistência ao pré-natal da gestante e do parceiro, com utilização da Caderneta da Gestante.
2 Assistência no período do puerpério.
3 Assistência à mulher no período do climatério.
4 Abordagem em saúde sexual e reprodutiva: orientação individual e em grupos de métodos contraceptivos; gestão de risco; oferta e dispensação de insumos de prevenção e testes rápidos; disfunções sexuais; avaliação pré-concepção; diagnóstico precoce de gravidez e orientação sobre infertilidade conjugal.
5 Manejo de problemas ginecológicos mais comuns: sangramento uterino anormal, miomatose, corrimento vaginal (abordagem sindrômica) e dor pélvica.
6 Prevenção, identificação, acolhimento e acompanhamento de situações de violência contra mulheres, violência sexual, intrafamiliar e de gênero, preferencialmente em parceria intersetorial com serviços de assistência social e segurança pública.
7 Promoção do aleitamento materno e manejo de problemas mamários comuns relacionados à lactação.
8 Rastreamento para neoplasia de colo uterino e acompanhamento da mulher com diagnóstico de câncer do colo uterino.
9 Rastreamento para neoplasia de mama e acompanhamento da pessoa com diagnóstico de câncer de mama.
10 Acompanhamento de adultos e idosos em cuidados paliativos, com orientação aos familiares/cuidadores.
11 Atendimento das populações em situação de vulnerabilidade, como população de rua, cigana, quilombola, privados de liberdade, dentre outras.
12 Acompanhamento de pessoas com doenças relacionadas ao trabalho.
13 Análise epidemiológica da situação de saúde local.
14 Realizar notificações e ações de vigilância em saúde.
15 Atendimento domiciliar de pessoas em situação de restrição ao leito/acamados, com impossibilidade de locomoção; assim como em situações com indicação de avaliação domiciliar pós óbito, ou de resistência ao tratamento.
16 Atendimento domiciliar para pessoas idosas restritas ao lar ou com dificuldade de mobilidade, incluindo informações, orientações de saúde, aconselhamento e apoio aos familiares/cuidadores.
17 Identificação e acompanhamento da pessoa idosa vulnerável, em risco de declínio funcional ou frágil (multimorbidades, polifarmácia, internações recentes, incontinência esfincteriana, quedas recorrentes, alteração de marcha e equilíbrio, comprometimento cognitivo, comprometimento sensorial, perda de peso não intencional, dificuldade de mastigação e/ou deglutição, sinais e sintomas de transtornos de humor, insuficiência familiar, isolamento social, suspeitas de violência, grau de dependência para atividades da vida diária) com o estabelecimento de um plano de cuidados adaptado a cada caso.
18 Prevenção, identificação, acolhimento e acompanhamento de situações de violência contra idosos, preferencialmente em parceria intersetorial com serviços de assistência social e segurança pública.
19 Prevenção de acidentes domésticos, quedas e fraturas.
20 Promoção do envelhecimento ativo e saudável.
21 Prevenção, identificação, tratamento e acompanhamento de distúrbios nutricionais no adulto e idoso.
22 Rastreamento e aconselhamento para uso abusivo de medicamentos e polifarmácia.
23 Imunização conforme Calendário Vacinal do adulto e do idoso, atentando para situações de surtos de doenças imunopreviníveis e situações clínicas específicas.
24 Identificar e acompanhar adultos e idosos em programas de assistência social ou benefícios sociais.
25 Estímulo a adoção de hábitos de vida saudáveis, como alimentação adequada e saudável, práticas corporais e atividades físicas, controle do álcool, tabaco e outras drogas, dentre outros.
26 Prevenção, busca ativa, diagnóstico, tratamento e acompanhamento da pessoa com hanseníase.
27 Prevenção, rastreamento de sintomáticos respiratórios, diagnóstico, tratamento e acompanhamento da pessoa com Tuberculose (tratamento de primeira linha, tratamento diretamente observado, rastreamento em sintomáticos respiratórios e busca de contatos de pacientes com tuberculose pulmonar).
28 Prevenção, identificação e aconselhamento em relação ao uso abusivo de álcool e outras drogas.
29 Prevenção, identificação, aconselhamento e tratamento em relação ao tabagismo.
30 Prevenção, rastreamento, diagnóstico, tratamento e acompanhamento da pessoa com diagnóstico de Sífilis, Hepatites Virais, outras IST e da pessoa vivendo com HIV, com atenção especial a populações-chave.
31 Promoção da paternidade responsável e ativa.
32 Rastreamento de neoplasia de cólon e reto em pessoas entre 50 e 75 anos.
33 Rastreamento e acompanhamento de DM2 em adultos assintomáticos.
34 Rastreamento e identificação de Risco Cardiovascular Global (RCVG) baseado em idade, gênero, história clínica de manifestações cardiovasculares, exame físico focado em manifestações de aterosclerose, medida da pressão arterial, circunferência abdominal, peso, altura e IMC; para pessoas com 40 anos ou mais ou indicadores de risco indeterminados solicitação de colesterol total, hdl colesterol e glicemia de jejum visando a realização de Escore para Estratificação de RCVG.
35 Identificação, manejo e acompanhamento da pessoa com Diabetes Mellitus (DM).
36 Identificação, manejo e acompanhamento da pessoa com Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS).
37 Manejo de doenças cardiovasculares: doença arterial periférica, doença aterosclerótica, dor torácica, insuficiência cardíaca, palpitações e arritmias crônicas, varizes, sindrome pós-trombótica.
38 Manejo de condições endocrinológicas mais prevalentes: hipotireoidismo, hipertireoidismo, nódulos de tireóide, obesidade, dislipidemia.
39 Manejo de pessoas com parasitoses intestinais.
40 Manejo de pessoas com exposição e agravos a doenças negligenciadas, como raiva, doença de Chagas, esquistossomose, leishmaniose (visceral e cutânea), tracoma, malária.
41 Manejo de arboviroses (dengue, zika, febre amarela e chikungunya).
42 Manejo das condições mais prevalentes do aparelho digestivo: dispepsia, refluxo gastroesofágico, alterações de hábito intestinal, gastroenterites, hemorróidas e outras doenças orificiais, dor abdominal, esteatose hepática, alterações laboratoriais hepáticas.
43 Manejo de doenças crônicas respiratórias mais prevalentes: Asma, DPOC, tosse crônica, apnéia obstrutiva do sono, dispnéia, nódulos pulmonares.
44 Manejo das condições neurológicas mais frequentes: cefaléia, síndromes demenciais, síndrome do túnel do carpo, epilepsia, acidente vascular encefálico, Doença de Parkinson, vertigem, paralisia facial.
45 Manejo das condições musculo-esqueléticas mais prevalentes: lombalgia, cervicalgia, osteoartrite, dor no ombro, bursite/tendinite, dor no quadril, problemas de mãos/punhos, dor no joelho, patologias do tornozelo e pé, disfunção temporomandibular (DTM), fibromialgia, osteoporose, gota.
46 Manejo das condições genitourinárias mais prevalentes: doença renal crônica (pacientes renais crônicos não transplantados), infecção urinária, litíase renal, hiperplasia prostática benigna, incontinência urinária.
47 Manejo das condições hematológicas mais prevalentes no âmbito da APS: anemia, anemia falciforme, linfonodomegalia periférica, leucopenia, leucocitose, trombocitopenia, trombocitose.
48 Manejo das condições mais prevalentes em dermatologia: acne, celulites, dermatites, erisipela, escabiose, feridas, furúnculo, herpes simples, herpes zoster, hiperidrose, intertrigo, larva migrans, micoses, miliária, nevos, pediculose, piodermites, doenças das unhas, psoríase, tungíase, urticária, verrugas.
49 Manejo das condições mais prevalentes em oftalmologia: conjuntivite, hordéolo e calázio, pterígio e blefarite.
50 Manejo das condições mais prevalentes em otorrinolaringologia: vertigem, rinossinusite, otite, hipoacusia, amigdalite bacteriana, obstrução nasal, apneia do sono, labirintopatia, epistaxe.
51 Manejo das doenças mais prevalentes em Alergia e Imunologia: rinite alérgica, eczemas alérgicos, urticária/angioedema, alergia à picada de insetos, alergias alimentares, alergia a medicamentos.
52 Identificação e manejo das condições psiquiátricas mais prevalentes: sofrimento emocional e tristeza, transtornos depressivos, de ansiedade, do espectro obsessivo-compulsivo e/ou pós-traumático, transtornos por uso de substâncias (álcool, tabaco e drogas ilícitas), transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, transtornos psicóticos e ações de prevenção ao suicídio e automutilação.
53 Oferta de Práticas Integrativas e Complementares no cuidado integral do Adulto e do Idoso.
54 Emissão de atestados médicos e laudos, incluindo declaração de óbito, quando solicitados e indicados.
Atenção e Cuidados Centrados na Criança e no Adolescente
55 Consulta para acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da criança (pesar, medir e avaliar o desenvolvimento registrando na caderneta da criança).
56 Promoção e apoio ao aleitamento materno exclusivo até 6 meses e continuado até 2 anos ou mais e manejo de problemas relacionados a lactação.
57 Promoção de alimentação e hábitos saudáveis.
58 Aconselhamento para introdução da alimentação complementar na criança, de acordo com as diretrizes vigentes.
59 Imunização conforme Calendário Vacinal da criança e do adolescente, orientação aos pais ou responsáveis, avaliação e monitoramento da situação vacinal e busca ativa de faltosos.
60 Prevenção, identificação, tratamento e acompanhamento de situações relacionadas a distúrbios nutricionais (baixo peso, desnutrição, sobrepeso e obesidade).
61 Rastreamento em saúde da criança: triagem neonatal (teste do pezinho e reflexo vermelho) e identificação precoce de sopros cardíacos.
62 Realizar notificações e ações de vigilância em saúde.
63 Análise epidemiológica da situação de saúde local.
64 Vigilância do recém-nascido de risco/vulnerável tendo por base os registros e informes oferecidos pelas maternidades.
65 Suplementação nutricional (vitaminas, minerais, fórmulas) - quando indicado.
66 Prevenção, busca ativa, diagnóstico, tratamento e acompanhamento da criança e adolescente com hanseníase.
67 Prevenção, rastreamento de sintomáticos respiratórios, diagnóstico, tratamento, acompanhamento e investigação de contactantes da criança e adolescente com diagnóstico de tuberculose.
68 Acompanhamento da criança com microcefalia / Zika vírus.
69 Prevenção, rastreamento, diagnóstico, tratamento e acompanhamento da criança e adolescente com sífilis, hepatites virais, HIV e outras ISTs.
70 Prevenção, identificação, aconselhamento e tratamento em relação ao tabagismo.
71 Prevenção, identificação e aconselhamento em relação ao uso abusivo de álcool e outras drogas.
72 Prevenção, identificação, acolhimento e acompanhamento de situações de violência contra crianças e adolescentes, preferencialmente em parceria intersetorial com serviços de assistência social e segurança pública.
73 Prevenção e promoção da segurança da criança e do adolescente contra injúrias físicas: segurança do pedestre, de passageiros de veículos automotores e bicicletas, prevenção de afogamento, queimaduras, quedas, acidentes por armas de fogo e intoxicação.
74 Acompanhamento de crianças e adolescentes com necessidades de cuidados paliativos, oferecendo orientação aos familiares/cuidadores.
75 Atendimento domiciliar de crianças e adolescentes acamadas, com impossibilidade de locomoção, em algumas situações pós óbito, ou de resistência ao tratamento.
76 Identificação e acompanhamento de crianças e adolescentes com dificuldade de aprendizado e problemas relacionados ao contexto escolar e/ou trabalho infantil.
77 Identificação e acompanhamento de crianças e adolescentes com deficiências físicas e/ou mentais.
78 Identificação e manejo de problemas de crescimento e desenvolvimento na infância e adolescência.
79 Identificação e seguimento de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade (violência, trabalho infantil, medida socioeducativa, acolhimento institucional, em situação de rua, migrantes e refugiados).
80 Atendimento à demanda espontânea com avaliação de risco.
81 Atendimento de urgências/emergências para crianças e adolescentes.
82 Identificação e manejo dos problemas mais comuns do recém-nascido e lactente: cólicas do lactente, regurgitação e vômitos, constipação intestinal, monilíase oral, miliária, dermatite das fraldas, impetigo, dermatite seborréica, icterícia, problemas do umbido, hérnia inguinal e hidrocele, testículo retido, displasia do desenvolvimento do quadril.
83 Identificação e manejo de condições graves de saúde em crianças menores de 2 meses: convulsões, letargia/flacidez, esforço respiratório (tiragem subcostal, batimento de asas do nariz, apnéia), gemido/estridor/sibilância, cianose central, palidez intensa, distensão abdominal, peso < 2000g, enchimento capilar lento (>2s), pústulas ou vesículas na pele, manifestações de sangramento (equimoses, petéquias e/ou hemorragias), secreção purulenta do ouvido ou da conjuntiva.
84 Identificação e manejo dos problemas mais comuns na infância: asma, deficiência de ferro e anemia, parasitoses intestinais, febre, infecções de vias aéreas superiores, excesso de peso em crianças, diarréia aguda, rinite alérgica, eczemas alérgicos, urticária/angioedema, alergia à picada de insetos.
85 Atendimento aos agravos prevalentes na adolescência: atraso puberal, puberdade precoce, acne, dor escrotal (criptorquidismo, torção testicular, epididimite, varicocele), ginecomastia puberal, dismenorréia, obesidade, vulvovaginites.
86 Identificação, manejo e acompanhamento do adolescente com Hipertensão Arterial Sistêmica, Diabetes Mellitus e/ou com dificuldades na acuidade visual.
87 Manejo das doenças crônicas respiratórias mais prevalentes.
88 Atendimento e escuta do adolescente em qualquer situação, mesmo desacompanhado, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente.
89 Promoção, aconselhamento e cuidado integral à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes: orientação individual e em grupos de métodos contraceptivos; gestão de risco; oferta e dispensa de insumos de prevenção e testes rápidos.
90 Identificação, acompanhamento e atenção integral à adolescente gestante.
91 Identificação, acompanhamento e manejo de crianças e adolescentes em sofrimento psíquico incluindo ações de prevenção ao suicídio com adolescentes.
92 Oferta de Práticas Integrativas e Complementares no cuidado integral da Criança e do Adolescente.
93 Identificar e acompanhar crianças e adolescentes inscritos no Programa Bolsa Família ou outros programas de assitência social ou benefícios sociais.
Procedimentos na Atenção Primária à Saúde
94 Abordagem e tratamento da pessoa com alterações em seu pé devido a doenças neuropáticas, como Diabetes Mellitus (DM) e hanseníase.
95 Administração de medicamentos por via intradérmica, intramuscular, nasal, ocular, oral, parenteral, retal, subcutânea e tópica.
96 Aferição e monitoramento de Pressão Arterial.
97 Aplicação de Ácido Tricloroacético em paciente sem indicação de referenciamento - cauterização química de pequenas lesões de pele (condilomas, verrugas).
98 Assistência ao parto em casos de urgência / emergência, quando não houver possibilidade de remoção para serviços mais adequados em tempo oportuno.
99 Biópsia/punção de tumores superficiais de pele com envio do material para análise anatomopatológica.
100 Busca ativa de faltosos e contactantes/parcerias de pessoas com doenças transmissíveis.
101 Cateterismo vesical (de alívio e de demora).
102 Cirurgia de unha (cantoplastia).
103 Coleta de exames (urina, fezes, sangue e escarro).
104 Coleta de material para realização do Citopatológico Cérvico Uterino.
105 Colocação de imobilização provisória (bandagens e enfaixamentos).
106 Cuidados com estomas (digestivos, urinários e traqueais).
107 Curativos simples ou com coberturas especiais.
108 Desbridamento autolítico, enzimático ou mecânico, e curativo em lesões por pressão ou ulceração.
109 Drenagem de abscesso.
110 Drenagem de hematoma subungueal.
111 Estesiometria (teste de sensibilidade).
112 Exérese de calosidades.
113 Exérese de cistos, lipomas e nevos.
114 Fundoscopia.
115 Imunização / Administração de vacinas.
116 Inalação com espaçador e nebulometro.
117 Infiltração de substâncias em cavidade sinovial (articulação, bainha tendinosa).
118 Inserção e retirada de DIU.
119 Manobras para diagnóstico e reposição otolítica para manejo da vertigem posicional paroxística benigna (Dix-Halpicke e Epley).
120 Oferta de Práticas Integrativas e Complementares (auriculoterapia/acupuntura/agulhamento seco/infiltração de anestésico em ponto-gatilho).
121 Ordenha mamária, considerando sempre que necessário a integração com a Rede de Bancos de Leite Humano.
122 Oxigenioterapia.
123 Realização de intradermorreação com derivado dermato proteico (PPD).
124 Realização de Prova do Laço para avaliação de pessoas com quadro clínico suspeito de dengue.
125 Remoção de cerume de conduto auditivo externo (lavagem otológica).
126 Remoção de molusco contagioso.
127 Remoção manual de fecaloma.
128 Remoção não cirúrgica de vermes e parasitas.
129 Retirada de pontos.
130 Retirada/remoção de corpo estranho: farpas de madeira e metálicas, vidro, corpo estranho subcutâneo, ferimento por prego, remoção de anzol, anel, corpo estranho ocular, em cavidade auditiva, nasal, corpo estranho vaginal, anal, desde que sem perfuração.
131 Sondagem nasogástrica.
132 Suturas de lesões superficiais de pele.
133 Tamponamento da epistaxe.
134 Terapia de reidratação oral.
135 Teste KOH (teste das aminas positivo ou Whiff test).
136 Teste rápido para gravidez.
137 Teste rápido para Hepatite B.
138 Teste rápido para Hepatite C.
139 Teste rápido para HIV.
140 Teste rápido para sífilis.
141 Tratamento de feridas.
142 Tratamento de miíase furunculóide.
143 Tratamento/cuidado da pessoa com queimaduras (exceto grande queimado).
144 Utilização de ferramentas de abordagem e orientação familiar: genograma, APGAR familiar, avaliação do ciclo de vida familiar, ECOMAPA, Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), os modelos FIRO e PRACTICE, identificação da dinâmica e estrutura familiar, inclusão das famílias no tratamento de condições complexas e inquéritos alimentares.
145 Utilização de ferramentas de abordagem e orientação comunitária: espaços para abordagem comunitária na unidade de saúde ou outro ponto da comunidade, grupos, realização de oficinas, elaboração de materiais educativos/informativos, territorialização (conhecendo todos os pontos de apoio da comunidade, sejam da saúde ou não), terapia comunitária e utilização dos dados para realização de vigilância epidemiológica.
146 Utilização de referência e contra-referência como ferramentas para o compartilhamento do cuidado com os demais serviços da rede de atenção, bem como os serviços do Sistema Telessaúde Brasil.
147 Verificação de sinais vitais (temperatura, frequência cardíaca, frequencia respiratória, pressão arterial).
Atenção e Cuidados Relacionados à Saúde Bucal - Odontologia
Procedimentos de Promoção e Prevenção em Saúde Bucal
148 Ação coletiva de aplicação tópica de flúor gel.
149 Ação coletiva de escovação dental supervisionada.
150 Aplicação tópica de flúor (individual por sessão).
151 Atendimento odontológico da gestante.
152 Atividade educativa / Orientação em grupo na atenção primária.
153 Consulta/Atendimento domiciliar.
154 Evidenciação de placa bacteriana.
155 Exame bucal com finalidade epidemiológica.
156 Orientação de higiene oral.
157 Orientação de higienização de próteses dentárias.
Procedimentos Clínicos
158 Acesso a polpa dentária e medicação (por dente).
159 Adaptação de prótese dentária.
160 Aplicação de cariostático.
161 Aplicação de selante (por dente).
162 Atendimento de urgência odontológica na APS.
163 Biópsia de tecidos moles da boca.
164 Capeamento pulpar.
165 Cimentação de Prótese Dentária.
166 Confecção, instalação e ajuste de placa miorelaxante.
167 Contenção de dentes por splintagem (imobilização dental).
168 Coroa provisória.
169 Curativo de demora com ou sem preparo biomecânico.
170 Curetagem periapical.
171 Diagnóstico de distúrbio de Articulação Têmporo-Mandibular (ATM).
172 Drenagem de abscesso da boca e anexos.
173 Excisão e sutura de lesão na boca.
174 Excisão de lesão e/ou sutura de ferimento da pele, anexos e mucosas (boca e anexos).
175 Excisão de rânula ou fenômeno de retenção salivar.
176 Exodontia de dente decíduo.
177 Exodontia de dente permanente.
178 Exodontia múltipla com alveoloplastia.
179 Frenectomia.
180 Gengivectomia.
181 Instalação de prótese dentária.
182 Moldagem dento-gengival para construção de prótese dentária.
183 Oferta de Práticas Integrativas e Complementares na Saúde Bucal (auriculoterapia, acupuntura, agulhamento a seco, infiltração de anestésico em ponto-gatilho).
184 Primeira consulta odontológica programática.
185 Profilaxia e remoção de placa bacteriana.
186 Pulpotomia dentária.
187 Radiografia interproximal (bite wing)
188 Radiografia peri-apical.
189 Raspagem corono-radicular por sextante.
190 Raspagem e alisamento subgengivais por sextante.
191 Raspagem, alisamento e polimento supragengivais por sextante.
192 Realização de procedimento estético em urgência sentida (ex.: necessidade do trabalho).
193 Reembasamento e conserto de prótese dentária.
194 Reimplante dental (Por dente).
195 Restauração de Dente decíduo posterior.
196 Restauração de dente decíduo.
197 Restauração de dente permanente anterior.
198 Restauração de dente permanente posterior.
199 Retirada de pontos de cirurgias básicas de pele/anexo e mucosas (boca e anexos).
200 Selamento provisório de cavidade dentária.
201 Tratamento cirúrgico de hemorragia buco-dental.
202 Tratamento de alveolite.
203 Tratamento de Gengivite Ulcerativa Necrosante Aguda (GUNA).
204 Tratamento de lesões da mucosa oral.
205 Tratamento de nevralgias faciais.
206 Tratamento de pericoronarite.
207 Tratamento endodôntico de dente decíduo.
208 Tratamento endodôntico de dente permanente anterior.
209 Tratamento inicial do dente traumatizado.
210 Tratamento Restaurador Atraumático (TRA).

A reorganização dos itens da carteira

Na construção da versão final da carteira foram consideradas as atribuições para os profissionais de nível superior, sendo mantidos os atributos essenciais nos grupos “Criança/Adolescente”, “Adulto e Idoso”, “Ações/Procedimentos na APS”, “Saúde Bucal”, considerando, portanto, o processo de trabalho dos médicos, enfermeiros e cirurgiões-dentistas. De um total de 209 ações e procedimentos inicialmente listados na consulta pública, entre inclusões e exclusões, ao final de sua criação, foram definidos 210 itens, incluindo o conjunto de ações previstas para a integração entre atenção primária e vigilância em saúde. Cita-se também a importante contribuição advinda da consulta pública com a alteração e qualificação no texto de 109 itens no total: 44 ítens alterados para “Adulto/Idoso”, 27 para “Criança/Adolescente”, 17 para “Procedimentos na APS” e 21 para “Saúde Bucal”. Além disso, foram incluídos o detalhamento de insumos, equipamentos e até as referências técnicas necessárias para a realização de cada ação/procedimento por parte da equipe. Ressaltamos que o modelo da carteira nacional pode ser adaptado à realidade e ao contexto municipal em cada uma das unidades da federação, inclusive considerando a disponibilidade da rede de atenção local.

Discussão

A carteira de serviços é um documento que visa nortear as ações de saúde e apresenta-se como ordenador da APS nos locais onde foi implantada. Seu conteúdo abrange o conjunto das atividades assistenciais e clínicas, de vigilância em saúde, de promoção e de prevenção oferecidos como serviços que objetivam a melhoria de qualidade do cuidado na APS. Para a atual gestão do Ministério da Saúde e da SAPS, ela faz parte do processo de fortalecimento da clínica da APS, estabelecendo-se como guia para as pessoas que utilizam os serviços de saúde, para os profissionais da APS e dos demais níveis de atenção e cuidado em saúde e para os gestores. O ponto de partida para a elaboração deste documento foi a revisão e a avaliação de carteiras de serviços implantadas em importantes cidades brasileiras. O município do Rio de Janeiro adotou, como uma estratégia de inovação gerencial, a carteira de serviços na APS ainda em 20109. De forma semelhante, após este movimento iniciado na capital fluminense, importantes cidades brasileiras seguiram na mesma linha com a elaboração do seu próprio documento municipal. Isso ocorreu em Curitiba, Florianópolis, Natal, Belo Horizonte e, mais recentemente, em Porto Alegre10,11,14-16. A iniciativa de elaborar carteiras de serviços da APS em âmbito municipal foi incentivada por algumas secretarias estaduais de saúde no Brasil. Mesmo assim, já passados 9 anos da primeira divulgação do documento no Rio de Janeiro, observa-se que, ao considerarmos todos os 5.570 municípios brasileiros, um número ainda muito restrito e pequeno de cidades dispõe de um documento próprio, não conseguindo oferecer e descrever com transparência para sua população o espectro clínico, de vigilância em saúde e preventivo ofertado por suas equipes de APS/ESF. Nesse sentido, a carteira elaborada pelo Ministério da Saúde, de abrangência nacional, visa auxiliar os gestores municipais na implementação de uma lista de ações e serviços da APS. É um documento que não pretende ser excludente, uma vez que o não mencionamento de um sintoma, sinal, diagnóstico, ação ou cuidado não significa que o mesmo não deva ser realizado na APS. É uma ferramenta que deve ser revisada periodicamente, visto a mudança natural do processo de manutenção da saúde e do de adoecimento.

Está estruturada com ênfase no atributo essencial Integralidade – Abrangência do Cuidado – e dividida em Atenção e Cuidados Centrados no Adulto e no Idoso, na Criança e no Adolescente, Procedimentos na APS e Atenção e Cuidados Relacionados à Saúde Bucal. Entre os problemas que visa resolver podemos citar a concentração de pacientes nos níveis secundário e terciário de cuidados em saúde, que buscam por procedimentos inerentes ao âmbito da APS, como remoção de cerume e tratamento da unha encravada, por exemplo. Mas o desafio do fortalecimento da clínica vai além da realização de procedimentos ou intervenções de maior complexidade no ambiente da APS. Passa também pela realização de acompanhamento e de cuidados resolutivos para problemas clínicos altamente prevalentes e de relativa baixa complexidade, como é o caso da Hipertensão Arterial e do Diabetes Mellitus tipo 2. E isso se torna cada vez mais importante com o passar dos anos e o consequente maior número de idosos em nossa população: cuidar, abordar, manejar e trabalhar com prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, em nível individual, familiar e comunitário, é um dos importantes papéis da APS elencados na carteira brasileira. Ao descrever 210 ações e serviços típicos do ambiente da APS, distribuídos pela clínica desta, vigilância em saúde, atividades de promoção e prevenção em saúde e de abordagem familiar e comunitária, a carteira de serviços propõe um desafio de qualidade na atenção à saúde, que passa também pelo desafio da formação e qualificação dos escopos de práticas dos profissionais da APS estimulando a capacitação clínica de médicos, enfermeiros e odontólogos e ordenando a necessidade de formação pelos programas de residência em Medicina de Família e Comunidade, Enfermagem de Família e Comunidade e Odontologia na APS.

A APS é ordenadora dos sistemas de saúde, mas para que ela possa desempenhar essa função com competência ainda necessita melhorar sua eficiência17. Estudos que se propuseram a investigar a presença e a extensão dos atributos da APS no Brasil indicaram que os serviços possuem baixa orientação para APS, sobretudo quando observados os atributos essenciais18-22. Dentre os atributos essenciais, a integralidade ainda parece ser um dos desafios mais consistentes. O baixo desempenho deste pode estar relacionado à incapacidade organizacional dos serviços de APS para a oferta de serviços e à heterogeneidade dos mesmos. Nessa perspectiva, é importante ressaltar que um conjunto de ações estruturadas para fortalecimento da APS é fundamental para se obter ganho de eficiência. Isso passa por uma rede de atenção à saúde organizada e com fluxos estabelecidos, melhoria contínua do acesso, investimentos em residências (medicina de família e comunidade e multiprofissional) e a definição de uma carteira de serviços que atenda as necessidades da população.

Outra importante função gerencial propiciada pela carteira de serviços é a de auxiliar na produção da lista de insumos e na estrutura física necessárias para a execução dos procedimentos e serviços pelos profissionais das equipes de APS. Nesse sentido, a Carteira de Serviços da APS do Brasil, em sua versão completa para profissionais e gestores, apresenta em sua estrutura de descrição de cada serviço a lista dos insumos necessários, assim como um breve trecho de orientações relacionadas ao tópico, seguidas ao final pela sessão “Saiba mais em”, ponto em que se referencia o serviço do item em avaliação aos conteúdos clínicos elaborados e presentes nos materiais do Ministério da Saúde (Cadernos de Atenção Básica, Protocolos, etc.).

É importante ressaltar que a carteira de serviços desempenha importante papel de indutor de uma maior oferta de ações e procedimentos pelas equipes de APS. Esta característica foi demonstrada em estudo que identificou a oferta de ações e procedimentos pelas equipes de Saúde da Família, tendo por base a Carteira de Serviços do Município do Rio de Janeiro9, e que comparou a cidade de Rio de Janeiro com outros locais divididos por estratos populacionais23. Este estudo concluiu que a cidade do Rio de Janeiro mostrou melhor desempenho quando comparado à média de municípios de grande porte no que diz respeito à oferta de ações de saúde e serviços.

Ao compararmos a carteira brasileira com a de outros países, principalmente as portuguesa e espanhola24,25, vemos que a lista estabelecida para o cenário brasileiro contempla a execução de uma APS forte e abrangente em todos seus aspectos. Seguindo o modelo e o exemplo utilizados principalmente na carteira de serviços da Espanha, poderemos incorporar na carteira brasileira, numa próxima revisão, a descrição e a definição dos indicadores utilizados para monitoramento e avaliação da APS no país, ressaltando desta forma cada vez mais o princípio da transparência nas ações da SAPS.

O mais importante princípio da atual gestão da SAPS é colocar as pessoas em primeiro lugar, isto é, fortalecer o SUS para que seja factualmente um sistema de saúde que coloca as pessoas no centro, se consolidando como um sistema de saúde centrado na pessoa. Esse sistema manifesta-se por uma APS forte e clinicamente resolutivo, com transparência, monitoramento, avaliação e oferecendo autonomia e flexibilidade para o processo de gestão realizado em cada cidade brasileira. A carteira de serviços faz isso ao colocar as pessoas no centro do processo e ao contribuir para o fortalecimento da oferta de cuidados próprios da APS. Da mesma forma oferece transparência ao elencar para toda a sociedade a lista de ações e serviços da APS, contribuindo para o monitoramento, a avaliação e os processos de gestão ao permitir a construção de alguns indicadores de acompanhamento para a implementação dos serviços de saúde listados na carteira.

REFERÊNCIAS

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9 Rio de Janeiro. Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil (SMSDC). Guia de Referência Rápida. Carteira de Serviços: Relação de serviços prestados na Atenção Primária à Saúde. Rio de Janeiro: SMSDC; 2011.
10 Curitiba. Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Carteira de Serviços - Guia para profissionais de saúde - Relação de serviços e condições abordadas na Atenção Primária à Saúde. Curitiba: SMS; 2014.
11 Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. Carteira de Serviços Atenção Primária à Saúde. Florianópolis: Prefeitura Municipal de Florianópolis; 2014.
12 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual do instrumento de avaliação da atenção primária à saúde: primary care assessment tool pcatool - Brasil. Brasília: MS; 2010.
13 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Carteira de serviços da Atenção Primária à Saúde Brasileira: avaliação por convidados externos e consulta pública. [acessado 2019 Out 29]. Disponível em:
14 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Carteira Orientadora de Serviços do SUS - BH. Relação de serviços prestados na atenção primária à saúde. Belo Horizonte: SMS; 2018.
15 Natal. Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Carteira de Serviços da Atenção Básica de Natal. Natal: SMS; 2014.
16 Porto Alegre. Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde de Porto Alegre. Porto Alegre: SMS; 2019.
17 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2011.
18 Ferrer APS. Avaliação da atenção primária à saúde prestada a crianças e adolescentes na região oeste do município de São Paulo [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2013.
19 Elias PE, Ferreira CW, Alves MCG, Cohn A, Kishima V, Escrivão JA, Gomes A, Bousquat A. Atenção Básica em Saúde: comparação entre PSF e UBS por estrato de exclusão social no município de São Paulo. Cien Saude Colet 2006; 11(3):633-641.
20 Silva AS. Avaliação dos atributos da atenção primária à saúde na estratégia saúde da família em municípios do sul de Minas Gerais [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2014.
21 Van Stralen CJ, Belisário SA, van Stralen TBS, Lima AMD, Massote AW, Oliveira CL. Percepção dos usuários e profissionais de saúde sobre atenção básica: comparação entre unidades com e sem saúde da família na Região Centro-Oeste do Brasil. Cad Saude Publica 2008; 24(Supl. 1):s148-s158.
22 Pinto LP, Harzheim E, Hauser L, D'Avila OP, Gonçalves MR, Travassos P, Pessanha R. A qualidade da Atenção Primária à Saúde na Rocinha - Rio de Janeiro, Brasil, na perspectiva dos cuidadores de crianças e dos usuários adultos. Cien Saude Colet 2017; 22(3):771-781.
23 Salazar BA, Campos MR, Luiza VL. A Carteira de Serviços de Saúde do Município do Rio de Janeiro e as ações em saúde na Atenção Primária no Brasil. Cien Saude Colet 2017; 22(3):783-796.
24 Portugal. Portaria nº 1368/2007, de 18 de outubro de 2007. Diário da República 2007; 18 out.
25 España. Ministerio de Sanidad y Politica Social. Cartera de servicios de atención primaria - Desarollo, organización, usos y contenido. Madrid: Gobierno de España; 2010.