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Caso 4/2016: Mulher de 32 Anos, com Estenose Valvar Pulmonar Crítica. Operada com 4 Meses, em Evolução Normal de Cura

Caso 4/2016: Mulher de 32 Anos, com Estenose Valvar Pulmonar Crítica. Operada com 4 Meses, em Evolução Normal de Cura

Autores:

Edmar Atik

ARTIGO ORIGINAL

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170

Arq. Bras. Cardiol. vol.106 no.6 São Paulo jun. 2016

https://doi.org/10.5935/abc.20160090

Dados clínicos: Após correção de acentuada estenose pulmonar valvar crítica, com orifício central de 01 (um) mm de diâmetro de abertura valvar, em quadro de insuficiência cardíaca direita e cianose por shunt da direita para a esquerda por forame oval, em caráter de emergência, com parada circulatória sem circulação extracorpórea, aos 4 meses de idade, verificou-se boa evolução clínica posterior, em vida normal. Na ocasião, foi realizada comissurotomia da valva pulmonar trivalvulada através do tronco pulmonar. Sopro sistólico discreto na área pulmonar, embora menos intenso que anteriormente à cirurgia, permaneceu audível até a adolescência. Atualmente, tolera bem os exercícios rotineiros e não refere sintomas. Manteve-se ao longo do tempo em vida normal tendo se formado em advocacia em faculdade tradicional e com desempenho físico habitual e bem tolerado.

Exame físico: bom estado geral, eupneica, acianótica, pulsos normais. Peso: 57 Kgs. Alt.: 158 cm, PAMSD: 110/70 mmHg, FC: 74 bpm. A aorta não era palpada na fúrcula.

No precórdio, ictus cordis não era palpado e não havia impulsões sistólicas. As bulhas cardíacas eram normofonéticas e não se auscultava sopro cardíaco. O fígado não era palpado e os pulmões eram limpos.

Exames Complementares

Eletrocardiograma mostrava ritmo juncional e discreto distúrbio final de condução pelo ramo direito com complexo rSr' em V1 com duração normal do QRS de 0,094 segundos. AP = -30º, AQRS = -10º, AT = +10º (Figura 2). O ECG, realizado antes da cirurgia com 4 meses de idade, salientava a importante sobrecarga ventricular e atrial direitas com sinais elétricos de pressão sistólica de ventrículo direito superior à sistêmica com infradesnivelamento do segmento ST nas precordiais direitas e onda QR de V1 a V5, ondas T amplamente negativas de V1 a V6 e onda P apiculada com amplitude de 5 a 6 mm de V2 a V4; AP = +50º, AQRS = +170°, AT = -60º. (Figura 1).

Figura 1 Radiografías de tórax mostram área cardíaca aumentada, com trama vascular pulmonar diminuída em período prévio e imediato à cirurgia da correção da estenose pulmonar valvar, e com eletrocardiograma com acentuada sobrecarga das cavidades cardíacas direitas com sinais de pressão sistólica suprassistêmica. 

Figura 2 Radiografías de tórax mostram área cardíaca discretamente aumentada e plenamente normal, respectivamente 3 e 32 anos após a correção operatória da estenose pulmonar valvar e eletrocardiograma com mínimo distúrbio final de condução pelo ramo direito. 

Radiografia de tórax mostra área cardíaca discretamente aumentada, três anos após a operação, e inteiramente normal com 32 anos de idade com trama vascular pulmonar normal (Figura 2), em contraste com a nítida cardiomegalia por aumento das cavidades direitas em períodos pré e pós-operatório imediato (Figura 1).

Ecocardiograma mostrou cavidades cardíacas com dimensões normais, função biventricular normal e sem anormalidades valvares, exceto valva pulmonar levemente espessada e revelando gradiente de pressão de 10 mmHg e sem qualquer insuficiência valvar. Havia forame oval patente com mínima passagem para o átrio direito.

Diagnóstico Clínico: Estenose valvar pulmonar crítica operada com parada circulatória em período de lactente, com 4 meses de idade, em evolução para cura anátomo-funcional a longo prazo.

Raciocínio Clínico: os elementos clínicos evolutivos eram compatíveis com o diagnóstico de estenose pulmonar valvar prévia dada à manutenção de distúrbio final de condução do ramo direito no eletrocardiograma, expressão elétrica de sobrecarga acentuada de ventrículo direito anteriormente à correção operatória. A ausência de sopro sistólico residual acentua a boa evolução, que ocorre quando o gradiente de pressão através a valva pulmonar for inferior a 10 mmHg, como demonstrado pelo ecocardiograma. Acresce elemento favorável o tamanho normal da área cardíaca na radiografia de tórax, o que salienta a normalidade anátomo-funcional.

Diagnóstico diferencial: cardiopatias congênitas operadas que também mostram o mesmo aspecto clínico e laboratorial figuram as representadas pela comunicação interventricular e interatrial, a persistência do canal arterial, coartação da aorta, transposição das grandes artérias, drenagem anómala das veias pulmonares, dentre as principais.

Conduta: Em face da normalização anátomo-funcional, recomenda-se vida saudável e normal com assertiva da capacidade de exercer qualquer tipo de atividade humana, sem restrições.

Comentários: A normalidade anátomo-funcional, após correção da estenose valvar pulmonar, só pode ser obtida através da atuação adequada operatória, sob visão direta, em anatomia valvar sem distrofias e com válvulas bem constituídas, além do anel pulmonar de tamanho normal. Esse pensamento cirúrgico defende a ideia de que a comissurotomia percutânea com rompimento da própria válvula e não da comissura, resulta, em geral, em evolução mais desfavorável, principalmente se relacionada a graus variados de insuficiência valvar pulmonar. No entanto, segundo relatos na literatura, graus mais acentuados de insuficiência valvar pulmonar ocorrem em 20 a 30% dos casos e necessitam de ulterior reparo operatório com colocação de valva biológica, independentemente da técnica prévia empregada, cirúrgica ou percutânea. Daí que, o procedimento percutâneo se tornou rotineiro na prática clínica.1,2 A maioria dos pacientes submetidos ao tratamento percutâneo evolui favoravelmente em vista de que a insuficiência valvar pulmonar inexiste em 12%, é discreta em 64%, moderada em 18% e acentuada em 6%.2 Os resultados, em geral, são comparáveis entre os dois procedimentos. Reafirma-se que a melhor evolução guarda relação com a anatomia mais adequada da valva pulmonar, principalmente quando se realiza a comissurotomia, cirúrgica ou percutânea, de maneira perfeita.

REFERÊNCIAS

1 Xu XD, Liu SX, Zhao XX, Qin YW. Comparison of medium-term results of transcatheter correction versus surgical treatment for secundum type atrial septal defect combined with pulmonary valve stenosis. Int Heart J. 2014;55(4):326-30.
2 Al Balushi AY, Al Shuaili H, Al Khabori M, Al Maskri S. Pulmonary valve regurgitation following balloon valvuloplasty for pulmonary valve stenosis: Single center experience. Ann Pediatr Cardiol. 2013;6(2):141-4.