versão impressa ISSN 1808-8694
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.81 no.2 São Paulo mar./abr. 2015
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.12.008
O neurinoma do nervo facial é uma entidade rara, porém de grande interesse, principalmente do ponto de vista do diagnóstico diferencial das causas de paralisia facial periférica.1 São neoplasias benignas, derivadas das células de Schwann. Manifestam-se principalmente com paralisia facial periférica, que pode ser lenta, acometendo vários ramos do nervo gradativamente, ou de forma súbita.1 , 2 Invade progressivamente o ouvido médio e a parede posterior do conduto auditivo externo, causando diminuição da acuidade auditiva.1 , 2
Apresenta-se com incidência de 0,15% a 0,8%.2 - 4 Trabalhos recentes sugerem que a localização anatômica mais comum seria no seguimento timpânico e vertical do nervo; porém, estudos mais atuais têm observado presença deste no gânglio geniculado.2 , 4
As avançadas técnicas radiológicas atuais têm proporcionado um diagnóstico mais precoce, principalmente a tomografia computadorizada (TC) de alta resolução e a ressonância magnética (RM).3 O advento da RM teve um impacto significativo no diagnóstico e no manejo dos neurinomas do nervo facial, pois, além do diagnóstico precoce, há maior acurácia nos limites e na extensão das lesões.3
Pretende-se, com este caso, relatar a ocorrência de um neurinoma do nervo facial localizado próximo ao gânglio geniculado, porém, sem acometê-lo.
Paciente masculino, 28 anos, referia desvio de rima labial para a esquerda, desde a infância, evoluindo há oito meses com paralisia do terço superior da face, percebido durante avaliação médica. Apresentava hipoacusia e zumbido intermitente à esquerda há aproximadamente dois anos.
Exame otorrinolaringológico apresentava paralisia facial periférica Grau II de House-Brackmann (HB) à esquerda. RNM mostrando formação expansiva na topografia do canal do nervo facial esquerdo, próxima ao gânglio geniculado, com hiposinal em T1 e hipersinal em T2, sugestiva de neurinoma do nervo facial. Foram discutidas opções terapêuticas com o paciente, que decidiu por seguimento clínico.
Evoluiu, após dois anos de seguimento, com piora da paralisia facial periférica, HB grau IV e RNM mostrando aumento volumétrico da lesão em relação ao exame anterior, medindo 1,7 3 1,3 cm (fig. 1), comprimindo o giro temporal inferior.
Figura 1 Ressonância magnética em corte axial em T1 com contraste mostrando formação expansiva localizada próxima ao gânglio geniculado e porção timpânica do nervo facial à esquerda.
Diante dos achados e avaliação da neurocirurgia, decidiu-se pela abordagem cirúrgica.
Audiometria tonal apresentava perda condutiva moderada à esquerda e audição normal à direita. Impedanciometria com curva A bilateral. Eletroneuromiografia compatível com lesão parcial do nervo facial esquerdo, de grave intensidade e com sinais de atividade, sem fibrilação. Estudo tomográfico dos ossos temporais mostrando massa em região timpânica do nervo facial, rechaçando ossículos. Erosão do tégmen com provável manutenção da dura-máter.
Paciente foi submetido à cirurgia, que revelou lesão na projeção do gânglio geniculado na parte petrosa do osso temporal, com extensão extradural, com característica amolecida, pouco vascularizada, com extensão até o canal do facial da mastoide. Presença de nervo facial viável próximo ao forame estilo mastoideo. Realizada ressecção da lesão e enxerto com nervo auricular maior.
Paciente manteve paralisia Grau IV no pós-operatório. O exame histopatológico da lesão revelou Schwannoma celular, com gânglio geniculado livre de acometimento neoplásico.
O manejo do neurinoma do facial é delicado. As opções terapêuticas incluem observação clínica, ressecção cirúrgica e radioterapia.4
Atualmente, a ressecção cirúrgica é reservada para pacientes com função do facial ruim, House-Brackmann III ou pior. Nos pacientes com boa função, HB I ou II, pode-se optar por observação clínica inicial, associado a seguimento com exames de imagem.4 A radioterapia só é indicada para pacientes HB III ou pior, sem condições clínicas para cirurgia.4
Neste caso, observamos inicialmente uma boa função do nervo facial (HB II), tendo sido optado, naquele momento, por seguimento clínico, com exames de imagem. Devido à progressão da lesão, tanto em tamanho volumétrico quanto em piora clínica do nervo facial (HB IV) em dois anos de seguimento, decidiu-se pela ressecção cirúrgica e enxerto com o nervo auricular maior, com manutenção da função do nervo (HB IV).
É preconizada a intervenção cirúrgica precoce nos seguintes casos: tumores intratemporais com extensão para a parótida, tumores com múltiplos seguimentos, estendendo-se para ângulo ponto cerebelar e fossa média, lesões de crescimento rápido ou que apresentam compressão do lobo temporal.4