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Cistadenoma mucinoso retroperitoneal primário - relato de caso

Cistadenoma mucinoso retroperitoneal primário - relato de caso

Autores:

Marco Aurelio SANTO-FILHO,
Ramiro COLLEONi,
David Carlos SHIGUEOKA,
Ricardo ARTIGIANI,
Milton SCALABRINI,
Gaspar de Jesus LOPES-FILHO

ARTIGO ORIGINAL

ABCD. Arquivos Brasileiros de Cirurgia Digestiva (São Paulo)

Print version ISSN 0102-6720

ABCD, arq. bras. cir. dig. vol.27 no.3 São Paulo July/Sept. 2014

https://doi.org/10.1590/S0102-67202014000300016

INTRODUÇÃO

O cistadenoma retroperitoneal primário é tumor muito raro, descrito por Handfield-Jones em 1924 e observado quase exclusivamente em mulheres1. A sintomatologia é geralmente inespecífica, o que dificulta o seu diagnóstico diferencial com outras massas retroperitoneais e torna os exames de imagem e a conduta cirúrgica essenciais para o diagnóstico e tratamento2.

O presente estudo relata o caso de um cistoadenoma mucinoso retroperitoneal primário benigno.

RELATO DO CASO

Mulher de 51 anos referia dor abdominal há um ano, localizada no flanco direito e irradiando para a região lombar, com piora progressiva. Ao exame físico apresentava massa palpável em flanco direito, indolor. Realizou ultrassonografia que identificou uma volumosa lesão cística abdominal. A tomografia computadorizada (Figuras 1 e 2) revelou lesão cística retroperitoneal homogênea medindo 15x12,5x5,5 cm e deslocando medialmente o cólon ascendente, sugerindo o diagnóstico de linfangioma cístico. A paciente foi submetida à laparotomia exploradora (Figuras 3 e 4), que identificou volumosa lesão cística retroperitoneal a qual foi dissecada das estruturas adjacentes com facilidade, permitindo sua ressecção completa. O pâncreas e os ovários não apresentavam alterações nem contiguidade com a lesão. Não foram observadas intercorrências durante a evolução pós-operatória. O exame anatomopatológico da peça operatória revelou cistadenoma mucinoso retroperitoneal benigno (Figuras 5 e 6).

Figura 1 Tomografia computadorizada de abdome: imagem cística de paredes regulares, sem nódulos ou vegetações murais 

Figura 2 Tomografia computadorizada do abdome: volumosa lesão cística retroperitoneal ocupando flanco e fossa ilíaca direita 

Figura 3 Achado intraoperatório: volumosa lesão cística retroperitoneal deslocando medialmente o cólon ascendente 

Figura 4 Peça operatória: lesão cística íntegra e completamente ressecada 

Figura 5 Parede do cisto (Hematoxilina e Eosina -100x) 

Figura 6 Parede do cisto: células caliciformes sem invasão tecidual, caracterizando cisto benigno Hematoxilina e Eosina - 400x) 

DISCUSSÃO

A maioria dos pacientes apresenta uma massa palpável assintomática ou acompanhada de dor abdominal leve que pode estar associada à queixas gastrointestinais inespecíficas2. O diagnóstico diferencial deve ser realizado com linfangioma cístico, teratoma cístico, neoplasias císticas do pâncreas e do ovário. A avaliação através de TC ou RM identifica lesão cística retroperitoneal, mas não define sua exata natureza3, de modo que a confirmação do diagnóstico só pode ser estabelecida após o exame histológico da peça operatória. Dessa forma, a conduta cirúrgica está indicada para avaliação adequada da topografia e ressecção da lesão.

Histologicamente, classifica-se o cistadenoma mucinoso retroperitoneal primário em três tipos: benigno, limítrofe e maligno4. Benigno, o mais comum, sem recidiva após a ressecção cirúrgica; limítrofe com focos de epitélio colunar proliferativo e pequeno potencial de malignidade; maligno, que pode ser recidivante e metastático5. Compartilha semelhanças histológicas com o cistadenoma mucinoso ovariano e pode localizar-se em qualquer lugar no retroperitônio, sem conexões com o ovário. A histogênese ainda permanece incompreendida; no entanto, existem duas principias hipóteses. Segundo a primeira, como há semelhança com o cistadenoma mucinoso ovariano, há a possibilidade de ele crescer a partir de um tecido ovariano ectópico6; no entanto, tecidos ovarianos foram achados na parede do cisto apenas em alguns casos7 e foram descritos casos em homens8. A segunda hipótese sugere que eles se originam a partir de uma invaginação de células mesoteliais multipotentes com subsequente metaplasia mucinosa das células mesoteliais de revestimento6.

A ressecção cirúrgica completa da lesão, além de permitir a adequada avaliação diagnóstica, também representa o melhor tratamento9.

REFERÊNCIAS

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4. Navin P, Meshkat B, McHugh S, Beegan C, Leen E, Prins H, Aly S. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma - A case study and review of the literature. International Journal of Surgery Case Reports 3 2012;486-488.
5. Min BW, Kim JM, Um JW, Lee ES, Son GS. Kim SJ et al. The First Case of a Retroperitoenal Mucinous Cystadenoma in Korea: A Case Report. The Korean Journal of Internal Medicine 2004;19:282-284.
6. Matsubara M, Shiozawa T, Tachibana R, Hondo T, Osasda K, Kawaguchi K, et al. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma of borderline malignancy: a case report and review of the literature. International Journal of Gynecological Pathology 2005;24:218-23.
7. Pennell TC, Gusdon Jr JP. Retroperitoneal mucinous cystadenoma. American Journal of Obstetrics and Gynecology 1989;160:1229-31.
8. Lai KKT, Chan YYR, Chin ACW, Ng WF, Huang YHH, Mak YLM, et al. Primary retroperitoneal mucinous cystadenoma in a 52-year-old man. Journal of Hong Kong College Of Radiologists 2004;7:223-5.
9. Tapper EB, Shrewsberry AB, Oprea G, Majmudar B. A unique benign mucinous cystadenoma of the retroperitoneum: a case report and review of the literature. Archives of Gynecology and Obstetrics 2010;281:167-9.