versão impressa ISSN 1808-8694
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.80 no.6 São Paulo set./dez. 2014
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.08.002
As cirurgias estéticas estão em plena ascensão, e, dentre elas, destaca-se a rinoplastia. Através de bons fundamentos técnicos na cirurgia de rinosseptoplastia básica é possível a resolução de cerca de 95% dos pacientes primários vistos em uma prática particular de cirurgia estética, evidenciando, cada vez mais, a necessidade de inserção de técnicas mais refinadas de rinoplastia na rotina otorrinolaringológica.1
No final do século XIX, a rinoplastia era basicamente uma cirurgia reparadora empregada na reconstrução de grandes mutilações nasais.2 Já no início do século XX, experimentouse uma rápida difusão mundial como procedimento estético, enquanto que no século XXI tornou-se mais conservadora, com manobras de modelagem em vez de ressecções de cartilagens e redução importante das osteotomias agressivas.3,4
O número de rinoplastias e suas subdivisões (funcional, estética, reconstrutora, pós-traumática e revisional) vem obtendo aumento importante a partir da metade do último século.3,5 Entretanto, trata-se de uma região anatômica complexa, na qual pequenas alterações funcionais podem acarretar grandes prejuízos ao paciente.6 Dessa forma, o estudo das técnicas de rinoplastia associado àquelas da septoplastia tem adquirido destaque nos serviços de referência de otorrinolaringologia, os quais se destacam como órgãos formadores, com extrema responsabilidade na instrução destes profissionais.2,4
Nosso trabalho tem por finalidade avaliar a casuística dos pacientes submetidos à rinoplastia, com foco em suas subdivisões: estética, funcional, pós-traumática, revisional e reconstrutora em um centro de referência. Foram consideradas cirurgias reconstrutoras aquelas realizadas com a finalidade de corrigir defeitos decorrentes de perda de substância (por exemplo, após ressecção de lesão tumoral); revisionais, as reintervenções cirúrgicas, sejam essas do mesmo ou de outro cirurgião; pós-traumáticas, as por lesões decorrentes de causas externas; funcionais, quaisquer abordagens com objetivo de correção da função respiratória; e estéticas, as meramente cosméticas.
Trata-se de uma coorte histórica com corte transversal, através de coleta de dados dos prontuários e protocolos do serviço, no período de janeiro de 2003 a agosto de 2012.7 Os critérios de inclusão foram todos os pacientes submetidos à rinoplastia nesse intervalo, com prontuário contendo todas as informações clínicas e cirúrgicas, enquanto os de exclusão foram apenas aqueles cujos prontuários não apresentavam algumas das informações necessárias. Não houve qualquer situação clínica excludente para o estudo.
Os pacientes foram submetidos à avaliação clínica geral e otorrinolaringológica, avaliação pré-operatória, além da realização de fotos e programação do procedimento cirúrgico através da perfilometria. Nesta última foram avaliados os seguintes parâmetros: terços faciais, quintos faciais, ângulos nasofrontal e nasolabial, ângulo columela-lóbulo, plano facial horizontal natural, extensão nasal e projeção da ponta.8
Os médicos residentes do terceiro ano realizaram a cirurgia de rinoplastia com supervisão dos preceptores responsáveis pelo serviço de cirurgia plástica da face da otorrinolaringologia do nosso hospital. Sempre que necessário, o preceptor interveio na cirurgia, corrigindo falhas, desenvolvendo a técnica e finalizando a cirurgia em um tempo seguro para o paciente. Os procedimentos foram realizados com anestesia local ou geral e, na maioria das vezes, a alta ocorreu, no máximo, em 24 horas.
No pós-operatório os pacientes mantiveram acompanhamento ambulatorial, tendo sido realizados retornos com sete, 15 e 30 dias, mantendo controle em três e seis meses e, após, anualmente. Nessas ocasiões foram realizadas novas fotografias e analisados os resultados operatórios.
O Protocolo, modificado da literatura para adaptação ao nosso serviço,9 foi preenchido com enfoque nas seguintes subdivisões da rinoplastia: rinosseptoplastia funcional, estética, reconstrutora, pós-traumática e revisional. A cada um dos pacientes foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para assinar. Os dados referentes ao tipo de cirurgia realizada foram cuidadosamente checados nas fichas operatórias dos prontuários e processados no programa Microsoft Excel®.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos do hospital sob número 0138.0.203.000-11.
Aplicando os critérios de inclusão e exclusão, encontramos 325 pacientes. Destes, 185 (56,92%) eram do sexo feminino e 140 (43,07%) do masculino. A média de idade foi de 30,9 ± 7,5 anos (tabela 1).
Tabela 1 Aspectos gerais do estudo
Número de pacientes | 325 |
Idade dos pacientes | 12 a 71 anos |
Mulheres | 185 (56,92%) |
Homens | 140 (43,07%) |
Das 325 rinoplastias selecionadas, 184 (56,61%) foram funcionais, 59 (18,15%) pós-traumáticas, 27 (8,30%) estéticas, 15 (4,61%) reconstrutoras e 40 (12,30%) revisionais (fig. 1).
Figura 1 Rinosseptoplastias funcionais, estéticas, pós-traumáticas, reconstrutoras e revisionais realizadas no período de janeiro de 2003 a agosto de 2012.
A média das cirurgias realizadas no período foi de 32,5 por ano, com o mínimo de quatro cirurgias em 2003 e o máximo 59, em 2006 (fig. 2).
A popularidade das cirurgias plásticas da face tem crescido a partir da metade deste século e apresenta uma forte tendência a um maior crescimento, principalmente influenciada pela expansão da indústria da beleza e da metamorfose corporal. O Brasil, hoje, é o segundo mercado em números de cirurgia plástica da face, perdendo somente para os EUA.2,10
Dentre todos os procedimentos estéticos da face destacam-se o lifting facial, a lipoescultura facial, as blefaroplastias e as rinoplastias. As rinoplastias, entretanto, são as cirurgias estéticas da face mais frequentemente realizadas nos Estados Unidos, principalmente devido à sua forte característica tanto estética quanto funcional.9,10
Esta cirurgia, tradicionalmente reparadora e empregada na reconstrução de grandes mutilações nasais, tornou-se mais conservadora, com manobras de modelagem ao invés ressecções de cartilagens e redução importante da necessidade de osteotomias agressivas. Além disso, sua associação com técnicas mais refinadas das septoplastias proporcionou grandes avanços nos tratamentos funcionais associados.4,11 Porém, ainda hoje, é um procedimento que demanda grande conhecimento técnico e científico, o que implica em grande responsabilidade dos centros de referência, que têm como obrigação fornecer educação, treinamento e experiência na área.9
Segundo nossa casuística (fig. 1), observamos uma grande prevalência da categoria funcional (184-56,61%), o que mostra a necessidade cada vez mais crescente de aperfeiçoamento das técnicas de rinosseptoplastias, e não somente das técnicas de septoplastias. Tanna et al. (2012)2 relacionaram a residência médica como o fator principal na curva de aprendizado neste tipo de procedimento, mostrando uma média de 15 cirurgias/ano/residente nos principais centros de referência dos Estados Unidos. Esta afirmação vai ao encontro da nossa casuística, que mostra uma média de 32,5 cirurgias/ano para dois médicos residentes do terceiro ano, propiciando uma grande contribuição na formação profissional na área de plástica facial.
A rinoplastia exige grande habilidade e experiência cirúrgica para atingir bons resultados. Consideramos que os residentes podem realizar tais cirurgias e que os centros de formação devem oferecer número e frequência de casos suficientes. Observa-se uma clara prevalência de queixas respiratórias nos pacientes que buscam avaliação otorrinolaringológica para tal procedimento. Destaca-se, portanto, a importância do ensino da rinoplastia, principalmente associada à septoplastia e outras técnicas que visem melhora do fluxo aéreo nasal, tendo em vista a grande prevalência das rinosseptoplastias funcionais no universo das rinoplastias.