versão On-line ISSN 2526-8910
Cad. Bras. Ter. Ocup., ahead of print Epub 22-Maio-2020
http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1938
O Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC) é caracterizado como uma condição atrelada à capacidade prejudicada de realizar e aprender habilidades motoras apropriadas à idade, na ausência de qualquer condição médica conhecida ou disfunção neurológica (American Psychiatric Association, 2014; Yu et al., 2019). Sendo assim, crianças com TDC apresentam uma série de dificuldades em vários domínios (função executiva, função sensório-perceptual, controle motor fino e grosso), que tendem a potencializar limitações em sua capacidade acadêmica, física e social, gerando impacto em sua qualidade de vida (Zwicker et al., 2012).
Dependendo dos critérios de análise e instrumento utilizado, a prevalência de TDC pode variar de 1,4 a 19% em crianças em idade escolar (Zwicker et al., 2012), no entanto, a estimativa mais aceita e utilizada é a estabelecida pela Associação Americana de Psiquiatria – APA (American Psychiatric Association, 2014), a qual indica que essa prevalência atinge em torno de 5 a 6% das crianças. Todavia, o diagnóstico do TDC baseia-se em quatro critérios estabelecidos pelo Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais – DSM-V (American Psychiatric Association, 2014), o qual estabelece que: A) o desempenho em tarefas de coordenação motora está substancialmente abaixo da expectativa, dada a idade da pessoa e oportunidades; B) as dificuldades de coordenação motora interferem significativamente nas atividades da vida diária ou conquista acadêmica; C) as dificuldades começaram no período de desenvolvimento inicial; e D) as dificuldades não podem ser atribuídas a uma deficiência intelectual ou condição neurológica.
Nesse sentido, diversos instrumentos visam a avaliar o desempenho motor de crianças e identificar possíveis dificuldades motoras ou indicativos de TDC. Dentre esses, estudos de avaliação do desempenho motor (Beltrame et al., 2017; Hsu et al., 2018; Cappelen et al., 2018; Caçola & Killian, 2018; Karras et al., 2019) frequentemente utilizam o Movement Assessment Battery for Children Second Edition – MABC-2, criado por Henderson et al. (2007) e validado para crianças brasileiras por Valentini et al. (2014).
O MABC-2 consiste em uma bateria de testes motores que verifica o desempenho das crianças nas tarefas de destreza manual, lançar e receber e equilíbrio, e propõe que, concomitante a esse, seja utilizado um checklist, preenchido por uma pessoa a qual tenha contato expressivo com a criança avaliada, que contemple uma lista de comportamentos motores específicos observados no cotidiano da criança (Capistrano et al., 2015a).
Outro instrumento amplamente utilizado para identificar crianças com TDC trata-se de um questionário destinado aos pais com perguntas relacionadas ao desempenho em atividades cotidianas, denominado Developmental Coordination Disorder Questionnaire (DCDQ), desenvolvido no Canadá (Wilson et al., 1998; Wilson et al., 2009) e validado para o Brasil (Prado et al., 2009). Normalmente, o DCDQ é utilizado para coletar dados de grandes amostras (Rivard et al., 2014; Zhu et al., 2012) ou para auxiliar no diagnóstico de TDC, a fim de atender ao critério B, estabelecido pelo DSM-V (Bhoyroo et al., 2018; Karras et al., 2019).
Ambos os instrumentos são apontados como ferramentas válidas e confiáveis para caracterizar crianças com indicativo de TDC. No entanto, apresentam propostas de medidas diferentes, levantando necessidade de compreensão da concordância entre os testes, a fim de permitir diagnósticos precisos e coerentes. Sendo assim, a considerar que o TDC é um distúrbio que afeta diretamente o desenvolvimento infantil, o presente estudo teve como objetivo verificar a concordância dos resultados de diferentes tipos de instrumentos, MABC-2 teste motor, MABC checklist e DCDQ-BR, para a indicação de TDC.
O presente estudo faz parte de um macro projeto intitulado “Perfil de saúde de crianças da Grande Florianópolis/SC”, desenvolvido pelo Laboratório de Distúrbio da Aprendizagem e do Desenvolvimento – LADADE – da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) – Brasil, o qual foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UDESC, sob o CAAE nº 70599017.6.0000.0118.
A população do estudo consiste em crianças do ensino fundamental de sete a 10 anos, devidamente matriculadas em escolas municipais de São José/SC – Brasil, no ano de 2017. Segundo dados da secretaria de Educação do município investigado, a população consiste em 9.414 crianças. A seleção da amostra foi realizada por conveniência em duas escolas com maior número de alunos matriculados na região. A pesquisa foi apresentada às direções das escolas envolvidas e, após sua aprovação, deu-se início às coletas de dados.
O MABC-2 (Henderson et al., 2007) é um teste motor criado para identificar dificuldades motoras em crianças com idades entre três e 16 anos. A bateria de testes motores é dividida em três conjuntos de tarefas (destreza manual, lançar e receber e equilíbrio), para faixas etárias específicas: faixa um de 3 a 6 anos; faixa dois de 7 a 10 anos e faixa três de 11 a 16 anos. Para cada faixa etária são estabelecidas tarefas diferenciadas, de acordo com os níveis distintos de complexidade. O teste categoriza as crianças de acordo com seu nível de dificuldade motora. A pontuação varia de 1 a 19 e para cada valor há um percentil correspondente que pode variar de 0,1% a 99,9%. Crianças com pontuação total abaixo do 5º percentil são consideradas com indicativo de dificuldade motora; entre o 5º e o 15º percentil indicam que a criança tem risco de dificuldade motora; e acima do 15º percentil indicam um desenvolvimento motor normal. Nesse estudo foi utilizada somente a faixa etária dois (Henderson & Sugden, 1992; Henderson et al., 2007).
Propõe-se que juntamente ao teste motor seja aplicado o checklist, o qual consiste em uma lista de comportamentos motores específicos que podem ser observados no cotidiano das crianças, como: habilidades em cuidado pessoal, sala de aula e atividades recreativas. É dividido em três seções, sendo que as seções A e B buscam identificar as interações cada vez mais complexas entre a criança e o ambiente físico, e a seção C aborda fatores não motores que podem afetar negativamente o movimento da criança. No total, essa lista é composta por 43 perguntas que foram respondidas por um adulto (pais/responsável). As questões das seções A e B foram respondidas quanto à eficiência de execução do movimento da criança em determinada tarefa, sendo graduadas em uma escala Likert: 0 – criança executa a tarefa muito bem; 1 – executa bem; 2 – a criança não é capaz de realizar a tarefa, mas está próxima a realizar; 3 – não está nem perto de realizar a tarefa. De acordo com a idade da criança, a pontuação total pode indicar desenvolvimento motor normal/típico (zona verde), risco para dificuldade motora (zona amarela) e dificuldade motora (zona vermelha) (Henderson et al., 2007).
O DCDQ é um questionário destinado aos pais, específico para a detecção do TDC em crianças de cinco a 15 anos de idade (Wilson et al., 1998; Prado et al., 2009), composto por 15 itens divididos em três grupos: controle motor, motricidade fina/escrita e coordenação geral. Os pais devem marcar a resposta que melhor descreve o desempenho da criança na tarefa questionada, utilizando uma escala Likert, que varia de escore 1 – “não é nada parecido com sua criança” a 5 – “extremamente parecido com sua criança”. A pontuação final é a somatória dos escores de cada item, que varia de 15 a 75 pontos, sendo que a pontuação total classifica a criança com indicativo de TDC de acordo com três pontos de corte das faixas etárias: 05-07 anos e 11 meses – pontuação de 15-46; 8 a 9 anos e 11 meses – pontuação de 15-55; 10 a 13 anos e 11 meses – pontuação de 15-57. Pontuações acima desses pontos de corte indicam que a criança provavelmente não tem TDC.
As coletas de dados foram realizadas em duas escolas do município de São José/SC, sendo as instituições com o maior número de alunos na rede municipal de educação. O MABC-checklist e o DCDQ-BR foram respondidos por pais/responsáveis em domicílio, juntamente com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Após a devolução dos termos e desses instrumentos, participaram do estudo 302 crianças, as quais, em seguida, realizaram o MABC-2 teste motor. Todas as atividades foram executadas por dois avaliadores, previamente treinados, um realizava as orientações e controle do teste e o outro observava e auxiliava no ajuste dos materiais. As crianças realizaram o teste individualmente em um espaço reservado e exclusivo para a atividade.
Para fins estatísticos, em todos os instrumentos as crianças foram divididas em duas categorias: sem indicativo de TDC (desempenho motor normal ou risco para o desenvolvimento de dificuldade motora) e com indicativo de TDC (problema motor definido).
Todos os dados coletados foram registrados em uma planilha do Microsoft Excel, acessada somente pelos pesquisadores, na qual foi utilizado um número de identificação para cada criança, com o intuito de preservar a identidade dos participantes, mantendo as informações em sigilo.
As análises estatísticas foram realizadas pelo software SPSS, versão 20.0. Os dados foram apresentados em forma de estatística descritiva (média, desvio padrão e frequência relativa e absoluta). Os dados de frequência de indicativo de TDC foram apresentados para cada instrumento e posteriormente pela combinação destes, para isso foi considerado com indicativo de TDC aqueles que apresentaram diagnóstico em ambos os instrumentos combinados na análise. A análise de concordância entre os resultados dos instrumentos utilizados para avaliação (MABC teste motor, MABC checklist e DCDQ-BR) foi investigada por meio do coeficiente Kappa. Foram considerados como valores de referência: maior que 0,80 – concordância quase perfeita; entre 0,61 e 0,80 – concordância substancial; entre 0,41 e 0,60 – concordância moderada; entre 0,21 e 0,40 – concordância regular; abaixo de 0,21 – concordância fraca (Landis & Koch, 1977). O nível de significância estatístico adotado foi de α=0,05.
Participaram do estudo 302 crianças, 54% do sexo feminino, com média de idade de 8,5 (±1,09) anos. As classificações por meio do MABC teste motor, checklist e DCDQ-BR, para indicativo de TDC, estão descritas na Tabela 1, podendo-se observar que a frequência de indicativo de TDC varia de 2,3% (referente à combinação dos três instrumentos ou combinação entre DCDQ e MABC-2 teste motor) a 39,7% (utilizando-se apenas o MABC-2 checklist).
Tabela 1 Classificação de desempenho motor pelos diferentes instrumentos avaliados.
Teste | N | % | |
---|---|---|---|
MABC-2 – teste motor | Sem ITDC | 277 | 91,7 |
Com ITDC | 25 | 8,3 | |
MABC-2 – checklist | Sem ITDC | 182 | 60,3 |
Com ITDC | 120 | 39,7 | |
MABC-2 – teste motor + checklist | Sem ITDC | 289 | 95,7 |
Com ITDC | 13 | 4,3 | |
DCDQ-BR | Sem ITDC | 252 | 83,4 |
Com ITDC | 50 | 16,6 | |
MABC-2 – teste motor + DCDQ | Sem ITDC | 295 | 97,7 |
Com ITDC | 7 | 2,3 | |
MABC-2 – checklist + DCDQ | Sem ITDC | 266 | 88,1 |
Com ITDC | 36 | 11,9 | |
MABC-2 (teste motor e checklist) + DCDQ-BR | Sem ITDC | 295 | 97,7 |
Com ITDC | 7 | 2,3 |
Legenda: DCDQ-BR: Developmental Coordination Disorder Questionnaire – Brasil; ITDC: indicativo de Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação; MABC-2: Movement Assessment Battery for Children – Second Edition; N: número de crianças.
Por meio do teste Kappa, foi possível identificar que não houve concordância entre o MABC-2 teste motor com o DCDQ-BR (p=0,067), assim como entre o MABC-2 teste motor com o MABC-2 checklist (p=0,138). No entanto, na análise entre o MABC-2 checklist com DCDQ-BR e na do MABC-2 teste motor + checklist com DCDQ-BR, verificou-se significância estatística para o teste (p<0,05), porém, os valores do coeficiente são considerados fracos (Tabela 2).
Tabela 2 Análise de concordância entre instrumentos para avaliação de Indicativo de TDC.
Instrumentos | Coeficiente Kappa | Valor de “p” |
---|---|---|
MABC-2 teste motor x MABC-2 checklist | 0,045 | 0,138 |
MABC-2 teste motor x DCDQ-BR | 0,080 | 0,067 |
MABC-2 checklist x DCDQ-BR | 0,056 | 0,028 |
MABC-2 (teste motor + checklist) x DCDQ-BR | -0,019 | <0,001 |
Legenda: DCDQ-BR: Developmental Coordination Disorder Questionnaire – Brasil; MABC-2: Movement Assessment Battery for Children – Second Edition; p: probabilidade de significância.
Diversos instrumentos podem ser utilizados como ferramenta para identificar crianças com TDC, dentre eles, o MABC e o DCDQ são os mais utilizados, tanto na prática clínica quanto em pesquisas (Beltrame et al., 2017; Hsu et al., 2018; Cappelen et al., 2018; Caçola & Killian, 2018; Bhoyroo et al., 2018; Karras et al., 2019). No entanto, a concordância dos resultados desses instrumentos ainda não está bem clara (Schoemaker et al., 2006; Capistrano et al., 2015b; Montoro et al., 2016). Sendo assim, o presente estudo possibilitou um maior conhecimento e discussões em relação ao tema, destacando que, apesar de serem utilizados para apontar indicativos de TDC, eles não apresentaram um alto poder de concordância, trazendo reflexões sobre os métodos de avaliação para tal diagnóstico.
Dentre os quatro critérios estabelecidos pelo DSM-V (American Psychiatric Association, 2014), o primeiro item propõe que a aquisição e a execução de habilidades motoras coordenadas estejam substancialmente abaixo do esperado, sendo tal dificuldade atrelada à falta de jeito e imprecisão no desempenho de habilidades motoras. Segundo Kirby & Sugden (2013), não há um teste que possa ser considerado padrão ouro para estabelecer tal critério, mas uma revisão realizada por Gueze et al. (2001) estabeleceu que o MABC teste motor é o mais utilizado por clínicos e pesquisadores para a avaliação motora com identificação de TDC, o que pode ser visto em estudos atuais (Beltrame et al., 2017; Hsu et al., 2018; Cappelen et al., 2018; Caçola & Killian, 2018; Karras et al., 2019).
Nesse sentido, utilizando apenas a avaliação por meio do MABC-2 teste motor, foi possível identificar que 8,3% das crianças avaliadas apresentaram dificuldade significativa do movimento. Mesmo que a American Psychiatric Association (2014) aponte que o TDC atinja de 5 a 6% das crianças em idade escolar, estudos que utilizaram do MABC-2 teste motor para apontar tal indicativo evidenciaram resultados variados quanto à frequência de indicativo de TDC, como no estudo de Amador-Ruiz et al. (2018), o qual indicou que 9,9% das crianças investigadas apresentavam possível TDC. Os estudos com população brasileira apresentam frequências de indicativo de TDC ainda mais elevada, com a proximidade de 11% dos escolares (Silva et al., 2006; Santos & Vieira, 2013).
Já no segundo critério estabelecido pela American Psychiatric Association (2014) é indicado que o deficit nas habilidades motoras do critério “A” impliquem significativamente e persistentemente nas atividades cotidianas apropriadas à idade cronológica (autocuidado e automanutenção), causando impacto na produtividade acadêmica/escolar, em atividades profissionais, no lazer e nas brincadeiras. Para tal, o MABC-2 propõe a utilização do checklist, o qual contempla o critério “B”. Dessa forma, ao considerar os resultados apenas do checklist, foi possível identificar uma frequência de 39,7% da amostra com indicativo de TDC. No estudo realizado por Capistrano et al. (2015b), que utilizou a MABC-2 Checklist para a avaliação do desempenho motor em atividades cotidianas, contando com a participação dos pais ou responsáveis pelas crianças, 42,5% das crianças foram classificadas como tendo “dificuldade significativa de movimento”, valores acima do identificado no presente estudo. O estudo aponta ainda a importância da avaliação por profissionais da educação em colaboração com os pais, visto que o nível de compreensão e percepção do movimento humano por esses profissionais possa ser mais criterioso do que dos pais.
No entanto, ao considerar a combinação dos resultados entre o teste motor e o checklist, a frequência de indicativo de TDC passa a ser de 4,3%, assim como na combinação de o MABC-2 teste motor com o DCDQ-BR, que passa a ser de 2,3%. Nesse sentido, ao analisar a concordância entre os instrumentos, verificou-se que entre o DCDQ-BR e o MABC-2 teste motor não se obteve valores estatisticamente significativos, e na análise de concordância entre DCDQ-BR com MABC-2 checklist obteve-se significância estatística, porém, com valor de coeficiente muito fraco. Apesar dos resultados, deve-se considerar que ainda grande parte dos estudos encontrados na literatura utiliza apenas o teste motor para classificar as crianças com e sem TDC (Batey et al., 2014; Valentini et al., 2014; Raz-Silbiger et al., 2015; Beltrame et al., 2017; Golenia et al., 2013).
Todavia, essa redução da frequência de TDC, ao considerar ambas as formas de avaliações, mostra a importância do uso de mais de um meio de avaliação, até porque, como descrito anteriormente, o diagnóstico do TDC baseia-se em quatro critérios estabelecidos pela APA (American Psychiatric Association, 2014) e cada instrumento se propõe a atender um critério diagnóstico diferente, o que justifica a ausência de concordância estatística encontrada nas análises entre o MABC-2 teste motor e o DCDQ-BR e entre o MABC-2 teste motor e o MABC-2 checklist. Essa junção dos instrumentos na avaliação é muito relevante para que a identificação de indicativo do transtorno seja mais precisa, uma vez que a percepção da capacidade das crianças nas atividades de vida diária é essencial para os profissionais que atuam com esse tipo de condição, não só para diagnosticar o TDC, mas também para fornecer tratamento ideal, com o propósito de amenizar as consequências diárias para essas crianças (van der Linde et al., 2015). Diferentemente, os valores de frequência resultantes de instrumentos em forma de questionário acabaram sendo superestimados (DCDQ-BR: 16,6%; MABC-2 checklist: 39,7%), mostrando ainda haver concordância considerada regular entre os instrumentos que envolvem questionários.
Sendo assim, algumas diferenças entre os instrumentos devem ser pontuadas. O MABC-2 teste motor envolve a criança diretamente ao realizar um conjunto de tarefas, cujos movimentos são analisados por profissional qualificado, permitindo reunir dados quantitativos e qualitativos (Henderson & Sugden, 1992; Toniolo & Capellini, 2010). Entretanto, não avalia de maneira mais direta o modo como a criança executa tarefas do dia a dia. Já o MABC-2 checklist e o DCDQ são perguntas destinadas aos pais ou professores, os quais convivem mais com a criança, sobre comportamentos motores específicos observados no cotidiano. Assim, quando respondido pelos pais, favorece, principalmente, a análise de tarefas realizadas em casa do que aquelas realizadas na escola, as quais muitas vezes os pais não têm muito contato, sendo que quando respondidas pelo professor, o contrário também é evidente. Os próprios instrumentos não discriminam perguntas destinadas a diferentes avaliadores. Além disso, a literatura aponta que o nível de compreensão de diferentes avaliadores também poderia interferir nos resultados (Pasquali, 2009; Capistrano et al., 2015b).
Ao analisar o questionário respondido pelos pais/professores, outro fato que também pode estar relacionado com maior número de crianças com indicativo de TDC pode ser que ao vivenciar alguma dificuldade motora das crianças, os adultos passam a superprotegê-las e, ao responderem as perguntas dos questionários, acabam subestimando as habilidades motoras delas (Galvão et al., 2014). Diferentemente de um profissional específico para a avaliação da bateria motora, a qual muitas vezes pode não ter convívio diário com a criança e precisa somente observar a atividade no momento da sua execução durante a aplicação do teste motor. No entanto, essa relação ainda precisa ser mais investigada.
Diante disso, ressalta-se a necessidade de utilizar mais de um instrumento no processo de identificação de indicativo de TDC, uma vez que diagnósticos incertos ou não confiáveis podem gerar ansiedade e prejuízos aos familiares e para a própria criança. A associação de instrumentos de avaliação motora e entrevista ou questionários, com pais e professores, permite uma avaliação do desempenho motor das crianças de forma mais abrangente para que se obtenha uma melhor definição do diagnóstico de TDC (Green et al., 2005; Junaid et al., 2000; Toniolo & Capellini, 2010).
A principal limitação do presente estudo refere-se à amostra não ser representativa, o que compromete a extrapolação dos dados para a população de crianças brasileiras. Entretanto, os dados apresentados permitem ampliar o conhecimento de profissionais envolvidos no diagnóstico de crianças com TDC, além de auxiliá-los, de forma mais crítica, quanto às escolhas dos instrumentos para esse fim. Além disso, como os resultados presentes na literatura ainda são controversos, novos estudos comparando resultados entre diferentes avaliadores e instrumentos, assim como a combinação entre eles, devem ser realizados.
O presente estudo não identificou boa concordância entre os resultados dos instrumentos MABC-2 teste motor, checklist e DCDQ-BR para indicação de crianças com TDC. No entanto, evidenciou que, por responderem a dois critérios diagnósticos diferentes estabelecidos pela APA, a melhor forma para avaliar possíveis diagnósticos de crianças com TDC é por meio da combinação dos instrumentos, uma vez que eles se complementam.