Print version ISSN 0102-6720On-line version ISSN 2317-6326
ABCD, arq. bras. cir. dig. vol.29 no.3 São Paulo July/Sept. 2016
https://doi.org/10.1590/0102-6720201600030011
Neste último módulo do consenso, abordou-se alguns temas controversos. O primeiro tópico discutido foi o manejo da doença após progressão na primeira linha de quimioterapia, com foco em se ainda haveria indicação cirúrgica neste cenário. A seguir, o painel debruçou-se sobre as situações de ressecção da doença hepática na presença de doença extra-hepática, assim como, qual a melhor sequência de tratamento. O tratamento de conversão para doença inicialmente irressecável também foi abordado neste módulo, incluindo as importantes definições de quando se pode esperar que a doença se torne ressecável e quais esquemas terapêuticos seriam mais efetivos à luz dos conhecimentos atuais sobre a biologia tumoral e taxas de resposta objetiva. Por último, o tratamento da doença não passível de ressecção foi discutida, focando-se nos melhores esquemas a serem empregados e seu sequenciamento, bem como o papel da quimioembolização no manejo destes pacientes.
DESCRITORES Neoplasias colorretais; Metástase neoplásica; Quimioterapia
In the last module of this consensus, controversial topics were discussed. Management of the disease after progression during first line chemotherapy was the first discussion. Next, the benefits of liver resection in the presence of extra-hepatic disease were debated, as soon as, the best sequence of treatment. Conversion chemotherapy in the presence of unresectable liver disease was also discussed in this module. Lastly, the approach to the unresectable disease was also discussed, focusing in the best chemotherapy regimens and hole of chemo-embolization.
HEADINGS: Colorectal neoplasms; Neoplasm metastasis; Drug therapy
Finalizando a sequência de publicações do Primeiro Consenso Brasileiro de Metástases Colorretais, neste tópico foram discutidos os temas mais controversos em relação ao tratamento multimodal. A primeira parte da discussão interessou a abordagem de progressão de metástases ressecáveis, à quimioterapia de primeira linha e à conduta frente aos pacientes com presença de doença extra-hepática. Em seguida, foi discutido o tratamento sistêmico quando conversão à situação clínica de ressecabilidade é almejada, bem como as estratégias para a abordagem cirúrgica destes casos com vistas a se evitar a ocorrência de insuficiência hepática no pós-operatório. E finalmente fez-se a análise do tratamento sistêmico paliativo, com foco em linhas de tratamento iniciais e subsequentes e possibilidade de tratamentos locoregionais nesta fase da doença.
Nestes tópicos seguiu-se a mesma metodologia definida para o consenso, incluindo a revisão de literatura e a discussão prévia dos tópicos por Comissões de Especialistas que apresentaram suas conclusões na fase presencial do evento, seguido de debate e votação pelos presentes. O Consenso foi considerado atingido quando mais de 75% de concordância era obtido na votação.
O papel da quimioterapia no tratamento dos pacientes com metástases hepáticas colorretal ressecável tem ganhado importância após os ganhos em sobrevida livre de progressão (SLP) observado em estudo randomizado1. No entanto, o momento mais adequado, seja neo ou adjuvante, permanece tema controverso na literatura2. No cenário neoadjuvante, a avaliação de resposta in vivo permite melhor seleção dos candidatos à operação, uma vez que a sensibilidade do tumor à quimioterapia tem se mostrado importante fator prognóstico3,4,5,6,7,8,9,10,11.
O risco de progressão, tornando o paciente inelegível à operação, entretanto, é visto como eventual desvantagem do tratamento neoadjuvante. Este risco, no entanto, tem se mostrado inferior a 10% com o uso de regimes mais modernos3. De uma forma geral, estes pacientes compõem população bastante heterogênea no tocante aos sítios de progressão e outros fatores clínicos e prognósticos, permitindo abordagens terapêuticas diversas que vão desde a quimioterapia paliativa exclusiva aos tratamentos mais complexos com abordagem multidisciplinar envolvendo cirurgia, imagem e radiologia intervencionista.
A combinação destes fatores tem resultado em literatura escassa sobre abordagem desses pacientes, composta principalmente por séries retrospectivas uni-institucionais e poucos bancos de dados prospectivos. Estas publicações envolvem número reduzido de pacientes que, a despeito da progressão a quimioterapia, foram submetidos à ressecção para doença hepática3,11,12,13,14. Além disso, representam população heterogênea, selecionada através de critérios de inclusão/exclusão variados no tocante ao número e regime de quimioterapia utilizado, presença de doença extra-hepática ou de outros fatores prognósticos. O impacto desta diversidade pode ter influenciado os diferentes resultados em sobrevida encontrado nas séries publicadas. Adam et al, Kornprat et al, e Haas et al observaram sobrevida em cinco anos (SG5a) inferiores a 10%, e portanto semelhante ao esperado em séries de pacientes tratados com quimioterapia exclusiva11,12,15. Entretanto, Neumann et al, Gallagher et al e Vigano et al encontraram SG5a de 36%, 61% e 35%, respectivamente3,13,14. Estes resultados sugerem a existência de população com potencial benefício na operação, sendo, entretanto, de grande importante seleção adequada destes pacientes no contexto de abordagem em reunião multidisciplinar. Fatores relacionados à apresentação clínica no momento da progressão, comorbidades, extensão da operação, riscos iminentes frente a progressão e demais fatores prognósticos devem ser considerados no abordagem terapêutica. Neste sentido, inexiste na literatura dados robustos que auxiliem nesta decisão. Dados do Liver Met Survey, envolvendo 175 pacientes submetidos à hepatectomia após progressão de doença, ressaltam a importância do tamanho da lesão (≥50 mm), número de lesões (>3) e CEA≥200 como fatores prognósticos adversos nesta população3. Embora não constitua fator preditivo de benefício a operação, o reconhecimento de fatores prognósticos, por exemplo, devem ser considerados no manejo destes pacientes.
O benefício da quimioterapia 2a linha, por outro lado, encontra-se baseada em dados robustos com diversos estudos de fase III. Estes estudos observaram sobrevidas medianas de aproximadamente 10 meses e poucos pacientes vivo em cinco anos16,17,18. No entanto, estes resultados devem ser interpretados com certa limitação para a população em questão, uma vez que eles envolvem pacientes não selecionados, sendo representados em sua maioria por não candidatos à operação. Algumas séries, entretanto, sugerem ainda que pacientes submetidos à 2a linha podem ainda se beneficiar uma abordagem cirúrgica. Em dados retrospectivos do M.D. Anderson Cancer Center envolvendo 60 pacientes, Brouquet el al observou sobrevida livre de recorrência (SLR) de 11% e SG5a de 22%19. Dessa forma, considera-se que pacientes com doença hepática ressecável após progresso na quimioterapia, tanto em 1a quanto em 2a linha, devam ter sua abordagem teraêutica discutida em reunião multidisciplinar.
• Todos os casos de progressão de doença ressecável à quimioterapia de primeira linha devem ser discutidos em reunião multidisciplinar na presença de cirurgião com expertise em cirurgia hepatobiliar, oncologista clínico, radiologista intervencionista e radiologista.
Concordância: 97%
• A ressecção de metástases hepáticas é ainda considerada neste cenário, após discussão multidisciplinar, em pacientes selecionados que não apresentem outros fatores de mau prognóstico e condições clínicas e cirúrgicas favoráveis. A despeito do pior prognóstico, pacientes com progressão após quimioterapia, podem ainda se beneficiar de hepatectomia atingindo sobrevidas superiores àquelas observadas com quimioterapia isolada.
Concordância: 87%
• Recomendamos quimioterapia de segunda linha para paciente com outros fatores de risco ou condições clínicas e/ou cirúrgicas desfavoráveis.
Concordância: 100%
• Discussões em ambiente multidisciplinar são ainda recomendadas para avaliação de abordagem cirúrgica de acordo com evolução após o tratamento de 2a linha.
Concordância: 93%
No intuito de formular uma diretriz para o tratamento dos pacientes portadores de neoplasia colorretal com metástase hepática e extra-hepática, o painel de especialistas realizou ampla revisão de literatura (vide descrição no editorial referente a este consenso), associada à análise crítica dos membros do consenso, visando responder importantes questões de ordem prática no manejo da neoplasia colorretal metastática, a saber:
Qual o melhor método de definição de doença extra-hepática?
Qual o impacto dos diversos sítios na sobrevida?
Há papel para ressecção hepática em pacientes com doença extra-hepática ressecável?
Qual a sequência de tratamento cirúrgico em relação ao sítio extra-hepático e as metástases hepáticas?
Conforme análise da literatura, o painel de experts identificou a tomografia computadorizada (TC) como método preferencial para diagnóstico da doença extra-hepática20,21,22,2,24. Ela é o método de escolha para estadiamento e seguimento de pacientes com neoplasia colorretal, sendo método de imagem bastante difundido em nosso meio, familiar aos oncologistas, radiologistas e cirurgiões, com bom custo benefício. Dessa maneira, recomendamos o uso da TC como método inicial no diagnóstico das metástases extra-hepáticas.
O uso do PET-CT tem papel complementar na avaliação dos pacientes com metástases hepáticas e em outros sítios. Frequentemente detecta outros sítios além daqueles suspeitos pela TC (em até 48% dos casos), resultando em incremento do estadiamento clínico-radiológico. Na grave circunstância do paciente com metástases em múltiplos sítios, o achado de novas lesões frequentemente implica em mudança nas estratégias terapêuticas (20-50% dos casos) e previne operações desnecessárias20,21,22. Apesar de ter acesso limitado em inúmeros centros em nosso país, entendemos que a realização do PET-CT seja benéfica na seleção de pacientes para hepatectomia, portadores de metástases em fígado e outros sítios. Mais além, o PET-CT é recomendável no estadiamento inicial, antes de qualquer tratamento sistêmico, quando da identificação de lesões hepáticas e extra-hepáticas no estadiamento com a TC de base. Esta conduta evitaria os efeitos negativos da quimioterapia sobre a sensibilidade do PET-CT e serviria de guia para futuros tratamentos locais para as metástases. Pelo acima exposto, entendemos que o PET-CT deve ser realizado no cenário do paciente com metástases no fígado e extra-hepáticas sempre que disponível no centro que trata o paciente.
O uso de métodos diagnósticos invasivos - biópsias - não foi avaliado em nenhum trabalho na literatura. Após discussão multidisciplinar durante a realização do consenso, entendeu-se que a avaliação por biópsia deve ser indicada nos casos em que os métodos não invasivos (TC e PET-CT) não forem capazes de definir a presença de metástase/recidiva e, sobretudo, se o resultado da biópsia implicar em mudança terapêutica.
A ocorrência de metástases em outros órgãos concomitantes às lesões no fígado, implica em drástica redução na expectativa de sobrevida destes pacientes e os coloca frequentemente em situação de tratamento paliativo. Ainda assim, há situações em que o tratamento operatório implica em ganho de sobrevida. Neste fato reside a importância da avaliação multidisciplinar desde o princípio do tratamento, visando identificar os potenciais candidatos ao tratamento operatório25,26,27. A Tabela 1 demonstra o impacto dos diversos sítios metastáticos nos pacientes portadores de lesões secundárias no fígado.
TABELA 1 Pacientes submetidos ao tratamento operatório de metástases hepáticas e extra-hepáticas e incidência de lesões extra-hepáticas e sobrevida após tratamento
Sítio | Incidência (em relação ao total de pacientes com doença extra-hepática operados) | Sobrevida média |
Pulmão | 27 a 51% | 39 a 98 meses |
Peritônio | 12 a 15% | 18 a 32 meses |
Linfonodos (hilo hepático, tronco celíaco, aortocava) | 6,7 a 32% | 13 a 48 meses |
Outros (ovário, adrenal, osso) | 2 a 16% | 16 a 82 meses |
Múltiplos sítios | 8 a 10,5% | 15 a 18 meses |
Nesta reunião de consenso considerou-se indicado tratamento operatório em pacientes selecionados com base em dois critérios25,26,27,28,29. O primeiro é o comportamento biológico tumoral favorável frente ao tratamento quimioterápico. Os regimes de quimioterapia serão analisados em outra seção deste consenso, mas cabe dizer que os portadores de múltiplas metástases de câncer colorretal são portadores de doença sistêmica, e portanto necessitam controle sistêmico da neoplasia. O tratamento quimioterápico permite análise temporal da evolução da doença, bem como avalia sua sensibilidade aos medicamentos prescritos.
A segunda característica que norteia o tratamento operatório é de responsabilidade direta do cirurgião: capacidade de ressecção completa em todos os sítios acometidos. Importante salientar que o tratamento operatório resulta em melhora de sobrevida quando as metástases acometem o fígado e mais um sítio; nos casos de neoplasia com implantes secundários em múltiplos sítios (fígado e dois ou mais outros órgãos) a sobrevida é reduzida geralmente não há espaço para resgate cirúrgico25.
O tratamento deve ocorrer no momento em que houver resposta ao tratamento sistêmico e as lesões forem ressecáveis. Quando há intenção de tratamento operatório, não há indicação de prolongar indefinidamente o tratamento quimioterápico, ou seja, uma vez observada a resposta biológica favorável e havendo possibilidade de ressecção completa em todos os sítios, a ressecção deve ser realizada.
Quanto à sequência de tratamento operatório, deve-se começar pela operação de maior complexidade e que trará maior possibilidade de impedir a ressecção completa das lesões alvo. Geralmente o fígado é a sede do maior número de tumores e, nos casos de múltiplas metástases, requer associação de intervenções complexas (hepatectomias estagiadas, oclusão portal, radioablação). Neste cenário, geralmente o fígado será abordado primeiro, seguido dos demais sítios (pulmão, peritônio, etc). Menos frequentemente a abordagem do paciente com doença extra-hepática ocorrerá em sentido inverso, por exemplo, em casos de recidiva locorregional complexa ou múltiplas lesões pulmonares em paciente com doença hepática uninodular. Nestes casos excepcionais o fígado pode ser abordado após a lesão extra-hepática.
É comum considerar a ressecção cirúrgica simultânea em pacientes que apresentam lesões ressecáveis no fígado e outros órgãos. A indicação deve ser seletiva, ponderando o comportamento biológico acima descrito, a possibilidade de ressecção completa em todos os sítios e o porte cirúrgico das operações agregadas.
De acordo com dados da literatura, indica-se hepatectomia e concomitante a ressecção de doença extra-hepática nas seguintes situações25,26,27,28,29,30,31,32,33,34,35,36,37,38,39,40,41,42,43,44,45,46,47,48,49,50,51:
Linfonodos acometidos no hilo hepático: nos com recidiva linfonodal hilar hepática e que apresentam resposta favorável ao tratamento sistêmico, a linfadenectomia do hilo hepático resulta em sobrevida de 25% em cinco anos. O tratamento paliativo exclusivo oferece sobrevida pior (nula). Recidiva linfonodal em cadeias linfáticas distantes, como tronco celíaco e aortocaval não se beneficiam de ressecção.
Carcinomatose peritoneal: também de indicação seletiva, deve levar em consideração o número de lesões hepáticas bem como o índice de carcinomatose peritoneal. Os pacientes que se beneficiam do tratamento concomitante são aqueles com doença hepática limitada (<3 nódulos) e doença peritoneal restrita (carcinomatose peritoneal< 12). A associação com a quimioterapia intra-peritonial hipertérmica encontra respaldo em casos selecionados e em centros com expertise.
Recidiva local (p. ex. recidiva anastomótica, linfadenectomia insuficiente do tumor primário): segue a mesma recomendação das ressecções colorretais e hepáticas sincrônicas. Neste cenário, quando houver recidiva local, ela deve ser abordada no primeiro tempo da ressecção, uma vez que já foram relatados índices de irressecabilidade de até 50%.
Pulmão: apesar de relatos de caso na literatura, em geral o elevado porte operatório impede que a ressecção sincrônica ocorra de forma segura.
Sítios infrequentes (adrenal, ovário): analisar conduta caso a caso em ambiente de discussão multidisciplinar. Os dados de literatura são muito escassos para oferecer suporte científico às decisões terapêuticas.
• O melhor método de detecção de doença extra-hepática é a tomografia computadorizada com contraste EV. O consenso recomenda a realização de PET-CT neste cenário sempre que disponível.
Concordância: 88%
• A ressecção deve ser indicada nos casos de comportamento biológico favorável, traduzido pela resposta à quimioterapia, sendo considerada nas seguintes localizações: pulmão, peritônio, linfonodos do hilo hepático, ovário e recidiva local.
Concordância: 85%
• Não se deve realizar hepatectomia se não for possível atingir ressecção completa em todos os sítios.
Concordância: 82%
• Sequência terapêutica: Abordar primeiro sítio de maior complexidade terapêutica, em geral o fígado (que limitaria ressecção completa).
Concordância: 88%
• Abordagem simultânea em casos selecionados é possível: fígado e peritônio (limitar número de nódulos e carcinose peritoneal); recidiva local e fígado; ovário e fígado, devendo-se guiar pelo senso que procedimentos complexos não devem ser associados.
Concordância: 84%
A maioria dos pacientes com câncer colorretal que desenvolvem metástases hepáticas não são passíveis de ressecção ao diagnóstico da doença metastática (cerca 80-90% dos casos). Nesse cenário, os pacientes devem ser avaliados quanto à possibilidade de terapia de conversão ou, caso não seja possível, encaminhados para estratégias de tratamento no cenário paliativo. Pode-se classificar os fatores que se associam com a capacidade de conversão em clínicos, biológicos e anatômicos52.
Na avaliação clínica deve-se considerar a idade biológica, comorbidades, status nutricional, performance status, capacidade para tolerar o tratamento (sistêmico e cirúrgico) e suporte social53. Deve-se levar em consideração ainda nessa análise a apresentação do caso: se a doença está restrita ao fígado ou associada à outros sítios de doença extra-hepática passíveis de benefício oncológico com tratamento cirúrgico. Avaliar a biologia ou comportamento da doença através do resultado da resposta ao tratamento sistêmico e controle da doença metastática e, no quesito anatômico, verificar a possibilidade de obtenção de ressecção R0 em caso de resposta ao tratamento, seguindo os preceitos de ressecabilidade já descritos. Os objetivos finais são doença sistêmica controlada e ressecção R052,54.
Essa abordagem multidisciplinar tem por meta avaliar de forma adequada cada paciente, de modo que possamos definir a melhor estratégia e esquema de tratamento. Idealmente, devem participar dessa decisão cirurgiões com experiência em cirurgia hepática complexa, radiologistas e oncologistas clínicos52.
Com relação à escolha do protocolo de quimioterapia sistêmica, as evidências apontam para correlação entre taxa de resposta e ressecção de metástases hepáticas e essa correlação é maior quando calculado a partir de estudos com pacientes com meta hepática exclusiva, quando comparados com estudos de população metastática de maneira geral. Apesar do desfecho taxa de resposta ser utilizado como guia na escolha do esquema terapêutico, sabe-se que ainda não é o desfecho ideal por não se correlacionar de forma fidedigna com desfechos mais sólidos, como por exemplo sobrevida livre de doença pós-ressecção. A definição do esquema terapêutico passa ainda pela análise mutacional do RAS e por questões relacionadas ao paciente, como capacidade de tolerar o esquema proposto ou alguma comorbidade que limite o uso de algum dos agentes quimioterápicos54.
Levando em consideração os dados de taxa de resposta e tolerância ao tratamento, as opções de tratamento sistêmico foram: 1) Pacientes com RAS selvagem: FOLFOX com Panitumumabe ou Cetuximabe, FOLFIRI com Panitumumabe ou Cetuximabe, FOLFOXIRI com ou sem Bevacizumabe, FOLFOX, XELOX ou FOLFIRI com ou sem Bevacizumabe55,56,57,58,59,60; 2) Pacientes com RAS mutado: FOLFOXIRI com ou sem Bevacizumabe, FOLFOX ou XELOX com ou sem Bevacizumabe, FOLFIRI com ou sem Bevacizumabe16,59,60. Nos pacientes com RAS selvagem não há comparação entre FOLFOXIRI com ou sem anticorpo monoclonal versus FOLFIRI ou FOLFOX com anti-EGFR. Entretanto, baseado no perfil de toxicidade, existe predileção pelo uso do esquema quimioterápico menos intenso associado ao anti-EGFR. Nos pacientes com mutação no RAS, caso apresente condições clínicas para tolerar tratamento mais intenso, a preferência inicial seria por FOLFOXIRI com ou sem Bevacizumabe. Preferir FOLFIRI como quimioterapia de conversão em caso de tratamento adjuvante prévio com FOLFOX encerrado à menos de 12 meses e/ou se neuropatia significativa associada.
Algumas observações a respeito do tratamento de conversão: não temos dados que suportem o uso de anticorpos monoclonais de rotina após a ressecção; ausência de evidência de benefício de irinotecano no cenário pós-operatório com ausência de doença residual; papel da mudança do tratamento sistêmico, em caso de ausência de resposta patológica na peça cirúrgica pós-ressecção, ainda não está estabelecido61,62,63,64.
Durante o tratamento a avaliação de resposta deve ser realizada de forma multidisciplinar a cada 2-3 meses com exames laboratoriais (incluindo provas hematológicas, função hepática, marcadores tumorais CEA e CA19.9) e re-estadiamento por imagem (tomografia computadorizada multidetectores trifásica e/ou ressonância nuclear magnética, se possível com difusão e contraste fígado específico), sempre com comparação aos exames anteriores65. Na avaliação de resposta, utilizam-se os critérios de RECIST 1.165,66. O uso do PET-CT não encontra suporte para uso rotineiro na avaliação de resposta, resguardando seu uso para situações especiais.
O momento para programar a ressecção deve ser decido em conjunto e de forma geral indica-se operação assim que a equipe cirúrgica julgar as lesões ressecáveis, respeitando-se os critérios estabelecidos de ressecabilidade e fígado remanescente. Postergá-la quando as lesões já se encontram passíveis de ressecção pode gerar problemas como maior morbidade pós-operatória e missing metástases. As operações frequentemente necessárias são: hepatectomia em dois tempos, com ou sem embolização portal ou ligadura de veia porta. Pode-se ainda realizar a radiofrequência em associação à cirurgia em fígados com múltiplas lesões em que o fígado residual futuro não seria suficiente, em lesões de até 3 cm, distando pelo menos 1 cm da via biliar. Em geral programa-se a operação de 4-6 semanas do último ciclo de quimioterapia e de 6-8 semanas da última apliacação do bevacizumabe, caso ele tenha sido empregado54,67,68,69.
Na avaliação cirúrgica desses pacientes candidatos à ressecção após terapia de conversão, um ponto crucial a ser definido é a estimativa de função do fígado remanescente futuro. Este dado depende obviamente da massa residual hepática, mas também de outros fatores tais como antecedentes pessoais de síndrome plurimetabólica e hepatopatias bem como do número de ciclos de quimioterapia a que o paciente fora exposto antes da operação70. Embora alguns autores tenham relacionado esquemas terapêuticos com lesões específicas ao parênquima hepático não tumoral e a morbidades características, o que se consolida nos estudos mais recentes é que tais achados se correlacionam mais fortemente ao número de ciclos que ao esquema terapêutico propriamente dito, sendo que mais que 6-8 ciclos de tratamento podem elevar significativamente o risco de insuficiência hepática pós-operatória71,72. Nestes casos o consenso advoga liberalidade no emprego de técnicas para aumentar o volume de fígado remanescente futuro, trabalhando com percentual mínimo de 30% do volume hepático total, conforme discutido em sessão específica73. Além disso, durante a operação, técnica cirúrgica meticulosa, que vise a preservação do máximo de parênquima possível e evite a necessidade de transfusões sanguíneas é aconselhada, visto que estes dados estão associados também com maior ocorrência de complicações pós-operatórias, dentre elas a falência hepática. Outros dados de alerta neste cenário são os achados de esteatose intensa nos exames de imagem, esplenomegalia e outros estigmas de hipertensão portal e a hipertrofia inadequada do parênquima hepático após embolização portal nos casos em que ela se fizer necessária, reforçando a necessidade da expertise do time multiprofissional no cuidado destes pacientes.
• Devem ser candidatos à terapia de conversão os pacientes com doença irressecável restrita ao fígado (ou com doença extra-hepática ressecável, com potencial benefício oncológico) e perspectiva de operação R0 em caso de resposta. Devem tolerar tratamento sistêmico e o risco cirúrgico proposto.
Concordância: 91%
• Os esquemas quimioterápicos devem ser escolhidos pela maior taxa de resposta (TR) apresentada devido à correlação entre TR e ressecção:
o KRAS e NRAS selvagem: FOLFOX ou FOLFIRI com Panitumumabe ou Cetuximabe ou FOLFOXIRI com ou sem Bevacizumabe ou FOLFOX, XELOX, FOLFIRI com ou sem bevacizumabe;
o KRAS ou NRAS mutado: FOLFOXIRI com ou sem bevacizumabe, FOLFOX, XELOX ou FOLFIRI com ou sem bevacizumabe;
Concordância: 88%
• Deve-se realizar avaliação de resposta a cada 2-3 meses com marcadores (CEA, CA 19-9) e exames de imagem (tomografia ou ressonância - RECIST) e proceder a operação assim que a equipe cirúrgica julgar que é possível ressecção R0.
Concordância: 95%
• Não existe metodologia com acurácia ideal para mensurar o impacto da quimioterapia na função hepática. Utilizar dados clínicos, laboratoriais, radiográficos e biópsia hepática em casos selecionados. Sempre que possível, realizar o menor número de ciclos de quimioterapia, utilizar técnicas de hipertrofia hepática, mensuração de fígado remanescente futuro, técnicas que visem poupar parênquima e contar com equipe cirúrgica com experiência em cirurgia hepática oncológica.
Concordância: 97%
O tratamento é definido como paliativo quando a doença não é passível de ressecção completa mesmo após quimioterapia de conversão74,75. Nestes casos, os principais objetivos são aumentar a sobrevida global e/ou sobrevida livre de progressão, com controle dos sintomas secundários ao câncer e minimização de efeitos colaterais da terapia.
O tratamento do câncer colorretal metastático incurável é um contínuo de linhas sequenciais. É importante identificar a priori os critérios que impactam na escolha do tratamento76. Recomendam-se avaliar: a) status das mutações KRAS e NRAS e avaliação de BRAF é opcional; b) variáveis clínicas: volume de doença, presença de sintomas, idade, performance status, comorbidades e desejo do paciente;
São opções de quimioterapia em primeira linha: a) os esquemas FOLFOX, CAPOX ou FOLFIRI são equivalentes16,77; b) monoterapia com capecitabina ou fluorouracil é opção válida para pacientes frágeis; c) FOLFOXIRI é opção válida, mas com maior toxicidade59,78; d) Fluorouracil infusional é preferencial em relação aos esquemas em bolus79.
Após obter a melhor resposta, são opções válidas manter o mesmo tratamento; manter fluoropirimidina (com ou sem anticorpo monoclonal); ou intervalo livre de quimioterapia. Esta decisão é baseada no conjunto das variáveis clínicas (volume de doença, presença de sintomas, idade, performance status, comorbidades, resposta ao tratamento e desejo do paciente)80,81,82.
Pacientes que são expostos a todas as drogas disponíveis têm sobrevida mais longa e pacientes que recebem mais drogas em linha precoces têm mais chances de serem expostos a todas as drogas83,84,85.
Opções de anticorpos monoclonais em primeira linha: a) KRAS ou NRAS mutado: não utilizar cetuximabe ou panitumumabe57. Bevacizumabe pode ser combinado com FOLFOX, CAPOX, FOLFIRI ou FOLFOXIRI78,86,87; b) KRAS e NRAS selvagem: bevacizumabe, cetuximabe ou panitumumabe podem ser combinados aos protocolos de quimioterapia. Não há evidência definitiva de qual combinação seja superior. Não combinar cetuximabe ou panitumumabe à quimioterapia contendo capecitabina. Bevacizumabe pode sem combinado com FOLFOX, CAPOX, FOLFIRI ou FOLFOXIRI. Cetuximabe e panitumumabe podem ser combinados com FOLFOX ou FOLFIRI55,57,76,77,86,87,88,89.
Os anticorpos monoclonais não devem ser utilizados em combinação entre si, pois a associação é deletéria90,91.
Opções de quimioterapia em linhas subsequentes: a) se primeira linha baseada em oxaliplatina, utilizar esquema baseado em irinotecano, ou vice-versa16,83; b) se primeira linha foi monoterapia com capecitabina ou fluorouracil, considerar oxaliplatina e irinotecano sequenciais (em qualquer ordem), oxaliplatina não deve ser utilizada em monoterapia e irinotecano pode ser utilizado em monoterapia84,85; c) após progressão à fluoropirimidina, capecitabina em monoterapia não é recomendada; d) após FOLFOXIRI, não há esquema de quimioterapia padrão definido.
Opções de anticorpos monoclonais e droga-alvo em linhas subsequentes: a) KRAS ou NRAS mutado: não utilizar cetuximabe ou panitumumabe e o Bevacizumabe pode ser utilizado com FOLFOX, XELOX, FOLFIRI ou irinotecano. Aflibercept pode ser utilizado com FOLFIRI92,93,94; b) KRAS ou NRAS selvagem: cetuximabe ou panitumumabe somente estão indicados se não houve progressão a uma destas drogas em linha anterior; após progressão a cetuximabe, não está indicado panitumumabe e vice-versa; cetuximabe e panitumumabe podem ser combinados com FOLFOX, FOLFIRI ou irinotecano; cetuximabe e panitumumabe podem ser utilizados como monoterapia e são equivalentes entre si; bevacizumabe pode ser utilizado com FOLFOX, XELOX, FOLFIRI ou irinotecano; aflibercept pode ser utilizado com FOLFIRI58,92,95,96; c) Bevacizumabe e aflibercept não devem ser utilizados em monoterapia; d) após progressão a bevacizumabe em primeira linha, podem ser utilizados em segunda linha bevacizumabe ou aflibercept81,94; e) após progressão a fluoropirimidina, oxaliplatina, irinotecano, bevacizumabe e/ou aflibercept e cetuximabe ou panitumumabe (se KRAS e NRAS selvagem), está indicado o uso de regorafenibe, se disponível97.
Recomenda-se avaliação de resposta com métodos de imagens reprodutíveis (TC, RNM ou PET-CT). CEA é utilizado em conjunto com exames de imagem e não deve ser utilizado como critério isolado para avaliar resposta98,99.
É opção válida em casos de doença exclusivamente ou predominantemente hepática. Nestes casos, o uso de microesferas de irinotecano (DEBIRI) é o tratamento de escolha. Não há evidência que defina em qual linha de tratamento seu uso está melhor indicado100.
• Tratamento paliativo é definido em casos de doença não passível de ressecção R0, mesmo após terapia de conversão, com objetivo de aumentar a sobrevida global e/ou sobrevida livre de progressão e controlar dos sintomas do câncer, com o mínimo de efeitos colaterais.
Concordância: 94%
• Recomenda-se avaliação de resposta com métodos de imagens reprodutíveis (TC, RNM ou PET-CT), devendo o CEA ser utilizado em conjunto com estes exames e não como critério isolado para avaliar resposta.
Concordância: 96%
• O protocolo de quimioterapia inicial pode incluir uma fluoropirimidina em monoterapia, fluropirimidina associada a oxaliplatina ou irinotecano ou a combinação das três classes de drogas. Após melhor resposta, pode ser mantido a pleno, descalonado para monoterapia (manutenção) ou interrompido (intervalo livre de quimioterapia), conforme condições clínicas e resposta ao tratamento.
Concordância: 98%
• Para agentes biológicos (aflibercept, bevacizumabe, cetuximabe e panitumumabe) não há evidência definitiva de qual sequência ou combinação com quimioterápicos seja superior. Cetuximabe e panitumumabe são exclusivos para RAS selvagem e regorafenibe utilizado após exposição a todas as demais classes de drogas.
Concordância: 96%
• Quando optado por quimioembolização, DEBIRI é o agente de escolha em doença exclusivamente ou predominantemente hepática.
Concordância: 77%