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Consolidações/opacidades em vidro fosco periféricas

Consolidações/opacidades em vidro fosco periféricas

Autores:

Edson Marchiori,
Bruno Hochhegger,
Gláucia Zanetti

ARTIGO ORIGINAL

Jornal Brasileiro de Pneumologia

versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756

J. bras. pneumol. vol.46 no.1 São Paulo 2020 Epub 20-Jan-2020

http://dx.doi.org/10.1590/1806-3713/e20190384

Paciente do sexo masculino, 27 anos, transexual, HIV positivo, com história de dispneia progressiva há dois dias. A TC de tórax evidenciou opacidades em vidro fosco difusas, com distribuição predominantemente periférica (Figura 1).

Figura 1 Cortes axiais de TC ao nível dos campos pulmonares superiores (em A) e médios (em B) mostrando opacidades em vidro fosco associadas a discretas áreas de consolidação nas regiões periféricas dos pulmões. 

Embora qualquer afecção que cause ocupação do espaço aéreo possa resultar em consolidações ou opacidades em vidro fosco na periferia dos pulmões, algumas doenças apresentam distribuição preferencial nessa região. Frente a um paciente com esse padrão de distribuição, algumas doenças devem ser inicialmente incluídas no diagnóstico diferencial. São elas: pneumonia por influenza A (H1N1), pneumonia eosinofílica, pneumonia em organização, embolia gordurosa e embolia por silicone. Muitas vezes, o padrão tomográfico é superponível nessas doenças, e apenas a associação com os dados clínicos e laboratoriais possibilita estreitar o diagnóstico diferencial.

Os achados clínicos mais comuns na pneumonia pelo vírus H1N1 são febre, tosse, dispneia, mialgia, cefaleia e hipotensão. Na maioria dos casos, os sintomas são leves; no entanto, uma pequena proporção de indivíduos tem um curso grave. As alterações laboratoriais mais frequentes são linfopenia e trombocitopenia, aumento da desidrogenase lática sérica, aumento de proteína C reativa e aumento dos níveis séricos de creatinoquinase.1

Na pneumonia eosinofílica os sinais e sintomas são inespecíficos e incluem tosse seca, dispneia e, com menos frequência, mal-estar, mialgia, sudorese noturna, calafrios e dor pleurítica. A chave diagnóstica é a presença de eosinofilia periférica ou no LBA e a exclusão de outras doenças que podem se apresentar com infiltrados pulmonares e eosinofilia.2

O diagnóstico de pneumonia em organização é desafiador, uma vez que é uma afecção associada a achados clínicos, radiográficos e laboratoriais não específicos. Ela pode ser primária ou ser secundária a vários fatores causais, inclusive infecciosos, iatrogênicos (medicamentos, radioterapia) e doenças autoimunes, dentre outros. O diagnóstico de certeza é histopatológico.3

Embolia gordurosa refere-se à embolização para as artérias pulmonares de gordura liberada na corrente sanguínea, em geral derivada de medula óssea, após trauma com fratura de ossos longos ou cirurgias ortopédicas ou cosméticas (lipoaspiração). O diagnóstico é suspeitado quando o quadro respiratório se associa à confusão mental e ao aparecimento de petéquias na conjuntiva, pescoço ou tórax. Caracteristicamente o quadro clínico e radiológico aparece de 24 a 48 h após o procedimento causal.4

Nosso paciente tinha história de ter se submetido à injeção de silicone líquido nas nádegas um dia antes do aparecimento dos sintomas. Foi submetido a LBA, que mostrou hemorragia pulmonar e macrófagos contendo vacúolos com silicone, confirmando o diagnóstico de embolia pulmonar por silicone. A embolia por silicone é uma condição relativamente rara, potencialmente fatal, decorrente, na maior parte dos casos, de injeção subcutânea de silicone líquido para efeitos cosméticos.5 A doença apresenta semelhanças clínicas e fisiopatológicas, assim como nos exames de imagem, com a embolia gordurosa. É observada mais comumente em homens transexuais, que injetam o silicone com o objetivo de feminilizar sua aparência física.

REFERÊNCIAS

1 Amorim VB, Rodrigues RS, Barreto MM, Zanetti G, Hochhegger B, Marchiori E. Influenza A (H1N1) pneumonia: HRCT findings. J Bras Pneumol. 2013;39(3):323-329.
2 De Giacomi F, Vassallo R, Yi ES, Ryu JH. Acute Eosinophilic Pneumonia. Causes, Diagnosis, and Management. Am J Respir Crit Care Med. 2018;197(6):728-736.
3 Faria IM, Zanetti G, Barreto MM, Rodrigues RS, Araujo-Neto CA, Silva JL, et al. Organizing pneumonia: chest HRCT findings. J Bras Pneumol. 2015;41(3):231-237.
4 Newbigin K, Souza CA, Torres C, Marchiori E, Gupta A, Inacio J, et al. Fat embolism syndrome: State-of-the-art review focused on pulmonary imaging findings. Respir Med. 2016;113:93-100.
5 Restrepo CS, Artunduaga M, Carrillo JA, Rivera AL, Ojeda P, Martinez-Jimenez S, et al. Silicone pulmonary embolism: report of 10 cases and review of the literature. J Comput Assist Tomogr. 2009;33(2):233-237.